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Estudos Eletrofisiológicos e Ablações com Radiofrequência em Crianças e Adolescentes com Arritmia

Resumos

Fundamento:

A ablação com radiofrequência é o tratamento não farmacológico de eleição para arritmias na população pediátrica. Porém, as arritmias e suas causas apresentam características particulares nesta população.

Objetivos:

Analisar as características epidemiológicas e os achados de estudo eletrofisiológico diagnóstico e ablação com radiofrequência na população pediátrica encaminhada à Eletrofisiologia do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, a fim de caracterizar as suas particularidades.

Resultados:

Foram realizados 330 procedimentos (9,6% do total de procedimentos) em pacientes com idade inferior a 20 anos (14,33 ± 3,25 anos, variação entre 3 meses e 19 anos), dos quais 201 eram do sexo masculino (60,9%). Foram realizados 108 (32,7%) exames eletrofisiológicos diagnósticos e destes, 48,1% apresentaram anormalidades em seus achados. Ao todo, 219 ablações com radiofrequência foram realizadas (66,3%), obtendo-se sucesso em 84,8%. A presença de feixe acessório foi o achado mais prevalente, responsável por 158 casos (72,1%), seguida de taquicardia por reentrada nodal atrioventricular (16,8%), flutter atrial típico (3,1%) e extrassístole de via de saída de ventrículo direito (2,7%). Três pacientes apresentaram complicações durante a ablação (1,4%). Cardiopatia congênita esteve presente em 51 (15,4%) casos, sendo a comunicação interatrial a mais encontrada (27,4%), seguida de comunicação interventricular (25,4%) e anomalia de Ebstein (17,6%).

Conclusão:

Estudo eletrofisiológico e ablação com radiofrequência constituem ferramentas eficazes no diagnóstico e tratamento das arritmias na população pediátrica.

Arritmias cardíacas; Ablação por Cateter; Criança; Adolescente; Técnicas Eletrofisiológicas Cardíacas


Background:

Radiofrequency ablation is the standard non-pharmacological treatment for arrhythmias in pediatric patients. However, arrhythmias and their associated causes have particular features in this population.

Objective:

To analyze the epidemiological characteristics and findings of electrophysiological diagnostic studies and radiofrequency ablations in pediatric patients referred to the Electrophysiology Unit at Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, in order to characterize the particularities of this population.

Methods:

Cross-sectional study with 330 electrophysiological procedures performed in patients aged less than 20 years between June 1997 and August 2013.

Results:

In total, 330 procedures (9.6% of the overall procedures) were performed in patients aged less than 20 years (14.33 ± 3.25 years, age range 3 months to 19 years), 201 of which were males (60.9%). A total of 108 (32.7%) electrophysiological diagnostic studies were performed and of these, 48.1% showed abnormal findings. Overall, 219 radiofrequency ablations were performed (66.3%) with a success rate of 84.8%. The presence of an accessory pathway was the most prevalent finding, occurring in 158 cases (72.1%), followed by atrioventricular nodal reentrant tachycardia (16.8%), typical atrial flutter (3.1%) and extrasystoles originating from the right ventricular outflow tract (2.7%). Three patients developed complications during ablation (1.4%). Among congenital heart diseases, which occurred in 51 (15.4%) patients, atrial sept defect was the most frequent (27.4%), followed by ventricular sept defect (25.4%) and Ebstein's anomaly (17.6%).

Conclusion:

Electrophysiological study and radiofrequency ablation are effective tools for diagnosis and treatment of arrhythmias in the pediatric population.

Arrhythmias; Cardiac; Catheter Ablation; Child; Adolescent; Electrophysiologic Techniques, Cardiac


Introdução

O diagnóstico e o tratamento de arritmias em pediatria são desafiantes, uma vez que o conhecimento sobre arritmias em pacientes pediátricos decorre de dados obtidos da população adulta. Entretanto, as causas de arritmias são consideravelmente diferentes entre estes grupos. Em adultos, as arritmias estão normalmente associadas a episódios de isquemia, enquanto que em crianças, ocorrem principalmente por alterações no desenvolvimento do sistema de condução cardíaco11. Mosaed P, Dalili M, Emkankoo Z. Interventional electrophysiology in children: a single-center experience. Iran J Pediatr. 2012;22(3):333-8.. A taquicardia supraventricular se destaca como a taquiarritmia mais comum em pacientes pediátricos, sendo responsável por aproximadamente 95% das arritmias em tal população22. Hafez MM, Abu-Elkheir MM, Shokier M, Al-Marsafawy HF, Abo-Haded HM, Abo El-Maaty M. Radiofrequency catheter ablation in children with supraventricular tachycardias: intermediate term follow up results. Clin Med Insights Cardiol. 2012;6:7-16..

Por muitos anos as drogas antiarrítmicas consistiram no único tratamento disponível para arritmias. Em 1987, a ablação por cateter de radiofrequência (RF) foi introduzida no tratamento de pacientes adultos, e a partir de 1989 passou a ser aplicada como uma modalidade de tratamento para taquiarritmias na população pediátrica. A ablação com RF foi um grande avanço científico no tratamento de taquiarritmias e é hoje considerada o tratamento não farmacológico de eleição na população infantil e adolescente33. Melo SL, Scanavacca MI, Pisani C, Darrieux F, Hachul D, Hardy C, et al. Ablação com RF de arritmia na infância: registro observacional em 125 crianças. Arq Bras Cardiol. 2012;98(6):514-8.. A taxa de sucesso na realização de tal procedimento é alta, enquanto que a taxa de complicações severas é baixa44. Nielsen JC, Kottkamp H, Piorkowski C, Gerds-Li J, Tanner H, Hindricks G. Radiofrequency ablation in children and adolescents: results in 154 consecutives patients. Europace. 2006;8(5):323-9..

A fim de caracterizar as particularidades da população pediátrica, o objetivo deste estudo foi analisar as características epidemiológicas, e os achados de estudo eletrofisiológico (EEF) e ablação com RF na população infantil e adolescente em nossa instituição.

Métodos

Analisamos as características dos pacientes com idade inferior a 20 anos submetidos a EEF e/ou ablação por cateter de RF no setor de Eletrofisiologia e Holter do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul entre 1997 e 2013 e os resultados de 330 procedimentos realizados nestes pacientes. Seguindo a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS), consideramos parte da população infantil os pacientes com idades inferiores a 9 anos e como parte da população adolescente aqueles com idades entre 10 e 19 anos55. World Health Organization. (WHO). Young People's Health - a Challenge for Society. Report of a WHO Study Group on Young People and Health for All. Technical Report Series 731. Geneva; 1986..

Os pacientes foram encaminhados para os procedimentos quando apresentavam refratariedade ao tratamento medicamentoso, ocorrência de efeitos adversos com medicamentos ou piora clínica secundária a arritmia. Antes dos procedimentos, todos os pacientes preencheram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). No caso de pacientes menores de idade, os procedimentos foram consentidos e o TCLE foi assinado pelos pais.

Os procedimentos foram realizados sob anestesia geral com midazolam, propofol, fentanil e sevoflurano. Todas as medicações antiarrítmicas foram suspensas em um período de cinco meias-vidas antes do procedimento. Foram utilizados de um a três cateteres eletrodos multipolares (deflectíveis ou não, de 5 a 7 French) introduzidos por punção venosa femoral direita e/ou esquerda. Para procedimentos envolvendo ablação, um cateter de ablação também era utilizado. Em pacientes com feixe acessório esquerdo, foi realizada punção da artéria femoral direita seguida de introdução retrógrada do cateter via aorta para mapeamento do anel mitral. Todos os pacientes realizaram previamente EEF quando a ablação estava indicada. Durante o EEF, foram realizados os registros de eletrograma intracavitário, e estimulação supraventricular e ventricular. Caso não fosse induzida arritmia, era utilizado isoproterenol endovenoso. Em todos os casos foi utilizada fluoroscopia para posicionar os cateteres nas cavidades cardíacas. As escolhas quanto à energia de RF a ser utilizada, o tempo de aplicação da mesma e a temperatura foram individualizadas e decididas pelo eletrofisiologista responsável pelo procedimento. Caso fosse realizada ablação de feixe acessório esquerdo ou na circulação sistêmica (câmaras cardíacas esquerdas), era prescrito AAS 200 mg por dia por três meses. Este cuidado visou prevenir um estado trombogênico que pode ser acarretado pela ablação por cateter, aumentando o risco de eventos tromboembólicos graves na circulação esquerda66. Lee DS, Dorian P, Downar E, Burns M, Yeo EL, Gold WL, et al. Thrombogenicity of radiofrequency ablation procedures: what factors influence thrombin generation? Europace. 2001;3(3):195-200.

7. Manolis AS, Vassilikos V, Maounis TN, Psarros L, Melita-Manolis H, Papatheou D, et al. Pretreatment with aspirin and ticlopidine confers lowers thrombogenic potential of radiofrequency catheter ablation. Am J Cardiol. 1997;79(4):494-7.
-88. Zhou L, Keane D, Ruskin J. Thromboembolic complications of cardiac radiofrequency catheter ablation: a review of the reported incidence, pathogenesis and current research directions. J Cardiovasc Electrophysiol. 1999;10(4):611-20.. O seguimento ambulatorial foi realizado pelo Serviço de Eletrofisiologia e Holter, Serviço de Cardiologia Pediátrica e por médicos assistentes.

Todas as pacientes do sexo feminino em idade fértil (10 a 50 anos) foram submetidas a teste de gravidez (beta-hCG sérico) no dia anterior ao procedimento. Uma paciente de 14 anos teve o seu procedimento suspenso devido à positividade no teste do beta-hCG que detectou um início de gestação, desconhecida até aquele momento.

Análise estatística

Trata-se de um estudo descritivo, no qual as variáveis categóricas foram expressas como números absolutos e percentagens. Variáveis contínuas foram descritas como média ± desvio padrão. Cálculo amostral, realizado com o software WinPepi, foi efetuado com intervalo de confiança de 95%, com proporção esperada de 0,50 (50%), margem de erro de ± 5,5 pontos percentuais, o que totalizou uma amostra mínima de 318 pacientes. O software SPSS foi utilizado para compor o banco de dados e para cálculos estatísticos.

Resultados

De 3406 procedimentos eletrofisiológicos conduzidos entre junho de 1997 e agosto de 2013 no setor de Eletrofisiologia e Holter do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, 330 (9,6%) foram realizados em pacientes com idade inferior a 20 anos. A idade mínima destes pacientes foi de 3 meses e a máxima de 19 anos, com média de 14,33 ± 3,25 anos. No total, 60,9% eram do sexo masculino (Tabela 1).

Tabela 1
Dados epidemiológicos da população estudada

Foram realizados 108 EEF diagnósticos, compondo 32,7% do total de procedimentos realizados na população pediátrica. Destes, 48,1% apresentaram anormalidades nos seus achados, das quais se destacaram a indução de taquicardia atrial (19,2%), seguida de fibrilação atrial (17,3%), síndrome de pré-excitação ventricular (15,3%), bloqueio de ramo direito (7,6%) e taquicardia ventricular polimórfica (7,6%) (Tabela 2). Quatro pacientes realizaram mais de um procedimento diagnóstico durante o seguimento. Em três casos houve impossibilidade de acesso ao coração após as punções femorais devido a anomalias venosas.

Tabela 2
Estudos eletrofisiológicos realizados na população estudada

No total, 184 pacientes foram submetidos a 219 procedimentos de ablação com RF (66,3% do total de procedimentos realizados). O número mediano de procedimentos foi 1 (mínimo 1 - máximo 5). A presença de feixe acessório constituiu o achado mais prevalente, responsável por 158 casos (72,1%), seguida de taquicardia por reentrada nodal atrioventricular (TRNAV; 16,8%), flutter atrial típico (3,1%) e extrassístole de via de saída de ventrículo direito (2,7%). A ablação foi realizada com sucesso em 84,8% dos pacientes (Tabela 3).

Tabela 3
Resultado da ablação com radiofrequência de acordo com o tipo de cardiopatia

Três pacientes (1,4%) apresentaram complicações durante o procedimento, incluindo bloqueio atrioventricular total em dois pacientes e pseudo-aneurisma da artéria femoral direita tratado conservadoramente em um paciente. Cardioversão elétrica foi necessária em três casos por indução de fibrilação atrial, em dois casos por taquicardia ventricular polimórfica e em um caso por taquicardia ventricular monomórfica. Em seis casos não foi possível definir a causa de instabilidade hemodinâmica transitória.

Foram realizados 31 procedimentos em pacientes com idade até 9 anos, e 296 em pacientes com idade entre 10 e 19 anos, correspondentes à população infantil e adolescente, respectivamente. Nos pacientes de 0 a 9 anos, a ablação foi realizada em 19 casos, com sucesso em 17 (89,4%) destes. A ablação de feixe acessório se destacou como o achado principal, totalizando 16 casos (84,2%), seguido de dois casos de TRNAV (10,5%). Nos pacientes entre 10 e 19 anos de idade foram realizadas 200 ablações, com sucesso imediato obtido em 157 (75,5%). Assim como no grupo de pacientes de 0 a 9 anos, ablação de feixe acessório também constituiu o achado de maior prevalência neste grupo, com 142 casos (71,0%), seguido de TRNAV (17,5%) e flutter atrial típico (1,5%). Doze EEF foram realizados em pacientes de 0 a 9 anos e destes, 8 (66,6%) demonstraram anormalidades em seus achados dos quais os principais foram fibrilação atrial e síndrome de pré-excitação ventricular. No grupo de pacientes de 10 a 19 anos, foram realizados 96 EEF que resultaram em 44 achados anormais, destacando-se taquicardia atrial (9,4%), fibrilação atrial (7,3%) e síndrome de Wolff-Parkinson-White (6,3%) (Tabela 4). Estes achados revelam uma predominância de casos em indivíduos de idade acima de 10 anos e uma diferença sutil em relação às arritmias presentes nas duas populações.

Tabela 4
Procedimentos realizados por faixa etária

Dentre os pacientes submetidos aos procedimentos, 51 apresentaram cardiopatia congênita estrutural (17,5%). Destes, 24 (47.0%) apresentaram cardiopatia congênita complexa. Foram encontradas 25 formas de cardiopatia estrutural congênita. Destas, comunicação interatrial (CIA) consistiu a patologia mais encontrada com 14 casos (27,4%). Também se destacaram a comunicação interventricular (CIV; 25,4%), anomalia de Ebstein (17,6%), estenose pulmonar (17,6%) e persistência do canal arterial (PCA; 15,6%) (Tabela 5). Dentre as patologias presentes nos casos de cardiopatia complexa destacaram-se a CIV (45,8%), CIA (41,6%), estenose pulmonar (37,5%), PCA (29,1%) e atresia tricúspide (20,8%).

Tabela 5
Diagnósticos associados com cardiopatias congênitas estruturais

A média dos intervalos de condução intra-atrial (PA), átrio-His (AH) e His-ventrículo (HV) foram, respectivamente, 20,8 ± 8,8 ms; 82,4 ± 25,5 ms; e 30,6 ± 21,0 ms. O ponto de Wenckebach médio encontrado foi 386,4 ± 81,2 ms.

Discussão

O EEF intracardíaco consiste em um procedimento invasivo que utiliza cateteres-eletrodo sob controle fluoroscópico, com o objetivo de estudar o processo de despolarização cardíaca. Esta avaliação é realizada durante o ritmo sinusal ou na vigência de arritmias induzidas com estimulação programada, e/ou com diversas drogas cardioativas99. Sosa EA, Lorga AM, Paola AA, Maia IG, Pimenta J, Gizzi JC, et al. [Indications for intracardiac electrophysiological studies--1988. Recommendations of the Committee of the Society of Cardiology of the State of São Paulo and of the Arrhythmia and Electrophysiology Study Group of the Brazilian Society of Cardiology]. Arq Bras Cardiol. 1988;51(5):427-8.. A ablação por cateter utilizando energia de RF revolucionou o tratamento das arritmias cardíacas e melhorou a qualidade de vida dos pacientes a um custo menor do que o tratamento medicamentoso a longo prazo1010. Scanavacca MI, Brito FS, Maia I, Hachul D, Gizzi J, Lorga A, et al; Sociedade Brasileira de Cardiologia; Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular; Departamento de Estimulação Cardíaca Artificial (DECA) da SBCCV. Diretrizes para avaliação e tratamento de pacientes com arritmias cardíacas. Arq Bras Cardiol. 2002;79(5):1-50..

Embora uma relevante parcela de EEF e ablação com RF seja realizada em pacientes pediátricos, frequentemente os médicos não estão familiarizados com os manejos específicos nesta faixa etária. Isto se deve principalmente à carência de estudos na literatura sobre as características epidemiológicas e eletrofisiológicas desta população, em especial na nossa região. Tais procedimentos têm seus riscos e maiores taxas de complicações na população pediátrica devido a particularidades como limitações do acesso vascular, dimensões cardíacas reduzidas e possíveis variações anatômicas devido à cardiopatia congênita33. Melo SL, Scanavacca MI, Pisani C, Darrieux F, Hachul D, Hardy C, et al. Ablação com RF de arritmia na infância: registro observacional em 125 crianças. Arq Bras Cardiol. 2012;98(6):514-8..

Em crianças, a ablação com RF é o tratamento de primeira linha para as taquicardias supraventriculares, forma mais comum de arritmia em pacientes pediátricos e correspondente a cerca de 95% das taquiarritmias nesta população1111. Van Hare GF. Supraventricular tachycardia. In: Gillette PC, Garson A. (editors). Clinical pediatric arrhythmias. Philadelphia: WB Saunders; 1999. p. 97-120.,1212. Ludomirisky A, Garson A. Supraventricular tachycardia. In: Gillette PC, Garson A. (editors). Pediatric arrhythmias: electrophysiology and pacing. Philadelphia: WB Saunders; 1990. p. 380-426.. As principais indicações de ablação com RF em crianças são a taquicardia atrioventricular envolvendo vias acessórias de condução, seguida de TRNAV e taquicardia atrial1111. Van Hare GF. Supraventricular tachycardia. In: Gillette PC, Garson A. (editors). Clinical pediatric arrhythmias. Philadelphia: WB Saunders; 1999. p. 97-120.. Em nosso estudo, a taquicardia envolvendo vias acessórias constituiu a principal indicação de ablação com RF, seguida de TRNAV. Por ser incomum em crianças, a taquicardia ventricular é raramente uma indicação para ablação com RF1111. Van Hare GF. Supraventricular tachycardia. In: Gillette PC, Garson A. (editors). Clinical pediatric arrhythmias. Philadelphia: WB Saunders; 1999. p. 97-120..

Van Hare e cols.1313. Van Hare GF, Javitz H, Carmelli D, Saul JP, Tanel RE, Fischbach PS, et al. Prospective assessment after pediatric cardiac ablation: demographics, medical profiles, and initial outcomes. J Cardiovasc Electrophysiol. 2004;15(7):759-70. relataram uma taxa de sucesso de 95,7% na ablação com RF na taquicardia supraventricular devida a vias acessórias e TRNAV em pacientes pediátricos, enquanto Tanel e cols.1414. Tanel RE, Walsh EP, Triedman JK, Epstein MR, Bergau DM, Saul JP. Five-year experience with radiofrequency catheter ablation: implication for management of arrhythmias in pediatric and young adult patients. J Pediatr. 1997;131(6):878-87. relataram 90% de sucesso na ablação com RF em arritmias pediátricas. Na população do nosso estudo, observamos sucesso em 91,7% das ablações na TRNAV e de 83,5% nas vias acessórias. As razões para uma menor taxa de sucesso nas vias acessórias em nossa população podem estar relacionadas ao não uso de punção transeptal para realização desses casos, bem como uma maior prevalência de cardiopatias congênitas complexas em nossa amostra (12% de todas as ablações), que foi obtida de uma instituição de referência em cardiopatias congênitas.

Em nosso estudo, ocorreram complicações em três procedimentos, correspondendo a 1,4% do total de pacientes que foram submetidos à ablação com RF. As taxas de complicação presentes na literatura variam de 1,2% a 8,7%88. Zhou L, Keane D, Ruskin J. Thromboembolic complications of cardiac radiofrequency catheter ablation: a review of the reported incidence, pathogenesis and current research directions. J Cardiovasc Electrophysiol. 1999;10(4):611-20.,1313. Van Hare GF, Javitz H, Carmelli D, Saul JP, Tanel RE, Fischbach PS, et al. Prospective assessment after pediatric cardiac ablation: demographics, medical profiles, and initial outcomes. J Cardiovasc Electrophysiol. 2004;15(7):759-70.

14. Tanel RE, Walsh EP, Triedman JK, Epstein MR, Bergau DM, Saul JP. Five-year experience with radiofrequency catheter ablation: implication for management of arrhythmias in pediatric and young adult patients. J Pediatr. 1997;131(6):878-87.
-1515. Lee PC, Hwang B, Chen SA, Tai CG, Chen YJ, Chiang CE, et al. The results of radiofrequency catheter ablation of supraventricular tachycardia in children. Pacing Clin Electrophysiol. 2007;30(5):655-61.. Os achados do presente estudo sugerem que a ablação por RF e o EEF são procedimentos seguros para serem realizados na população pediátrica, apresentando baixa probabilidade de complicações. A indicação de diferentes técnicas de mapeamento que não utilizam radiação, tais como ressonância magnética1616. Razavi R, Hill DL, Keevil SF, Miquel ME, Muthurangu V, Hegde S, et al. Cardiac catheterization guided by MRI in children and adults with congenital heart disease. Lancet. 2003;362(9399):1877-82. e mapeamento eletroanatômico1717. Pires LM, Leiria TL, Kruse ML, Ronsoni R, Gensas CS, Lima GG. Ablação de arritmias por cateter com mapeamento eletroanatômico exclusivo: uma série de casos. Arq Bras Cardiol. 2013;101(3):226-32., assim como o uso de diferentes técnicas ablativas como a crioablação1818. Miyazaki A, Blaufox AD, Fairbrother DL, Saul JP. Cryo-ablation for septal tachycardia substrates in pediatric patients: mid-term results. J Am Coll Cardiol. 2005;45(4):581-8., deve ser individualizada para cada paciente e suas características para minimizar os riscos dos procedimentos.

O desenvolvimento de arritmias na população infantil está muito relacionado à presença de cardiopatias congênitas. Estas acometem aproximadamente 1% de nascidos vivos, contribuindo significativamente com mortalidade e morbidade na infância1919. Hoffman JI. Congenital heart disease: incidence and inheritance. Pediatr Clin North Am. 1990;37(1):25-43.. As alterações da arquitetura cardíaca, seja pela própria cardiopatia ou pela cirurgia corretiva, podem em determinados casos resultar em alterações do sistema de condução cardíaco, levando estes indivíduos a ter uma maior propensão de desenvolver arritmias2020. Deal BJ, Mavroudis C, Backer CL. The role of concomitant arrhythmia surgery in patients undergoing repair of congenital heart disease. Pacing Clin Electrophysiol. 2008;31 Suppl 1:S13-6.. Algumas formas de cardiopatia congênita, tais como anomalia de Ebstein, transposição de grandes vasos e atresia tricúspide estão associadas a uma alta incidência de vias acessórias de condução2121. Dalili M, Rao JY, Brugada P. Radiofrequency ablation of accessory pathways in children with complex congenital cardiac lesions: a report of three cases. J Tehran Heart Cent. 2013;8(2):111-5..

Em nossa instituição, a dosagem sérica de beta-hCG foi realizada em todas as pacientes em idade fértil que, segundo a OMS, compreende as idades de 10 a 50 anos. A exposição de mulheres em idade fértil à radiação ionizante durante ablação com RF oferece um risco substancial de teratogenicidade devido à susceptibilidade do feto durante todo o período pré-natal2222. Lima GG, Gomes DG, Gensas CS, Simão MF, Rios MN, Pires LM, et al. Risco da radiação ionizante em mulheres férteis submetidas à ablação por radiofrequência. Arq Bras Cardiol. 2013;101(5):418-22.. Portanto, o rastreamento foi realizado a fim de identificar gestações potencialmente desconhecida até o momento do procedimento.

Limitações do estudo

Este é um estudo transversal no qual as características epidemiológicas dos pacientes e os achados dos procedimentos eletrofisiológicos realizados foram retirados de dados de prontuário. Descreve, portanto, apenas os resultados imediatos das intervenções, mas não inclui informações sobre o acompanhamento a longo prazo destes pacientes.

Conclusões

O presente estudo demonstra que, em nosso centro, uma parcela significativa da população pediátrica encaminhada para o estudo invasivo das arritmias apresentava cardiopatia congênita. Os resultados dos procedimentos de ablação por RF e EEF apresentaram taxas adequadas de sucesso, semelhantes às da literatura. A taxa de complicações em nossa população foi baixa, como descrita em outros estudos.

  • Fontes de financiamento
    O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
  • Vinculação acadêmica
    Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Nov 2014
  • Data do Fascículo
    Jan 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Jul 2014
  • Revisado
    08 Set 2014
  • Aceito
    18 Ago 2014
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