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Procedimento artroscópico de Bankart: estudo comparativo do uso de âncoras com fio duplo ou simples após seguimento de dois anos Trabalho desenvolvido no Grupo de Ombro do Hospital Ortopedico e no Hospital Lifecenter, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Resumos

OBJETIVO:

comparar o uso de âncoras com carregamento duplo e com carregamento simples de fio no procedimento artroscópico de Bankart com fileira simples.

MÉTODOS:

foram submetidos à cirurgia artroscópica de Bankart e avaliados após seguimento mínimo de dois anos 252 pacientes (258 ombros). Foram submetidos a reparo com âncoras com carregamento simples de fio trançado não absorvível de alta resistência 206 ombros (grupo AS) e com âncoras com carregamento duplo com fios de mesmas características 52 (grupo AD). Os pacientes foram avaliados segundo as escalas UCLA e Carter-Rowe. O retorno à atividade esportiva e a recidiva também foram comparados.

RESULTADOS:

não houve diferença significante entre os grupos quanto à taxa de falha cirúrgica (grupo AS 5,8%; grupo AD 7,7%; p = 0,62). O grupo AS apresentou melhor Carter-Rowe médio (grupo AS 94,4; grupo AD 88,6; p < 0,05) e maior retorno ao mesmo nível esportivo (grupo AS 79,1; grupo AD 72,1; p < 0,05).

CONCLUSÃO:

o uso de âncoras com carregamento duplo de fios não demonstrou vantagem clínica no reparo artroscópico da instabilidade anterior traumática do ombro em relação ao uso de âncoras simples no seguimento de dois anos.

Instabilidade articular; Luxação do ombro/epidemiologia; Luxação do ombro/cirurgia


OBJECTIVE:

To compare the use of anchors with double and single-thread loading in the single-row Bankart arthroscopic procedure.

METHODS:

252 patients (258 shoulders) underwent Bankart arthroscopic surgery with evaluation after a minimum follow-up of 2 years. They underwent repairs either using anchors with single loading of a high-resistance non-absorbable braided thread (206 shoulders; group AS) or using double loading of thread with the same characteristics (52 shoulders; group AD). The patients were evaluated using the UCLA and Carter-Rowe scales. The patients' return to sports activity and recurrences were also compared.

RESULTS:

There was no significant difference between the groups regarding the surgical failure rate (group AS 5.8%; group AD 7.7%; p = 0.62). Group AS presented a better mean Carter-Rowe score (group AS 94.4; group AD 88.6; p < 0.05) and greater return to the same sports level (group AS 79.1; group AD 72.1; p < 0.05).

CONCLUSION:

Use of anchors with double thread loading did not show any clinical advantage for arthroscopic repair of traumatic anterior shoulder instability, in relation to use of single-thread anchors, over a 2-year follow-up.

Joint instability; Shoulder dislocation/epidemiology; Shoulder dislocation/surgery


Introdução

A articulação glenoumeral é a que mais sofre instabilidade no corpo humano (luxação e subluxação), com incidência de 17 casos por 100 mil habitantes por ano.11. Kroner K, Lind T, Jensen J. The epidemiology of shoulder dislocations. Arch Orthop Trauma Surg. 1989;108(5):288-90. A instabilidade anterior representa aproximadamente 85% dos casos de luxação traumática. A história natural dessa patologia, após um primeiro episódio, é largamente estudada e sabe-se da existência de fatores importantes que influenciam as taxas de recidiva, como idade, envolvimento em esportes de contato, magnitude dos defeitos ósseos, frouxidão ligamentar do paciente e tempo decorrido entre o primeiro episódio e a cirurgia.22. Voos JE, Livermore RW, Feeley BT, Altchek DW, Williams RJ, Warren RF, et al. Prospective evaluation of arthroscopic Bankart repairs for anterior instability. Am J Sports Med. 2010;38(2):302-7. , 33. Boileau P, Villalba M, Héry JY, Balg F, Ahrens P, Neyton L. Risk factors for recurrence of shoulder instability after arthroscopic Bankart repair. J Bone Joint Surg Am. 2006;88(8):1755-63. and 44. Porcellini G, Campi F, Pegreffi F, Castagna A, Paladini P. Predisposing factors for recurrent shoulder dislocation after arthroscopic treatment. J Bone Joint Surg Am. 2009;91(11):2537-42. Robinson et al.55. Robinson CM, Howes J, Murdoch H, Will E, Graham C. Functional outcome and risk of recurrent instability after primary traumatic anterior shoulder dislocation in young patients. J Bone Joint Surg Am. 2006;88(11):2326-36. encontraram 55% de recidiva em dois anos em pacientes abaixo de 35 anos, com probabilidade de 86% para os pacientes com 15 anos e 26% para os pacientes com 35 anos.

No passado, a opção de eleição para tratamento da instabilidade anterior traumática era a cirurgia aberta, mesmo após a introdução da técnica artroscópica, visto que por esse método os estudos mostravam maior taxa de recidiva.66. Lane JG, Sachs RA, Riehl B. Arthroscopic staple capsulorrhaphy: a long-term follow-up. Arthroscopy. 1993;9(2):190-4. , 77. Grana WA, Buckley PD, Yates CK. Arthroscopic Bankart suture repair. Am J Sports Med. 1993;21(3):348-53. and 88. Godinho GG, Souza JM, Freitas JMA, Santos FM, Vieira AW, João FM. Tratamento da instabilidade anterior do ombro Experiência com a técnica de Morgan. Rev Bras Ortop. 1997;32(4):265-71. Lane et al.66. Lane JG, Sachs RA, Riehl B. Arthroscopic staple capsulorrhaphy: a long-term follow-up. Arthroscopy. 1993;9(2):190-4. fizeram capsulorrafia artroscópica e obtiveram 33% de recidiva em 54 pacientes. No mesmo ano, Grana, por meio da técnica de sutura trans-óssea, introduzida por Morgan em 1987, mostrou resultados com 44% de recidiva.77. Grana WA, Buckley PD, Yates CK. Arthroscopic Bankart suture repair. Am J Sports Med. 1993;21(3):348-53. Godinho et al.,88. Godinho GG, Souza JM, Freitas JMA, Santos FM, Vieira AW, João FM. Tratamento da instabilidade anterior do ombro Experiência com a técnica de Morgan. Rev Bras Ortop. 1997;32(4):265-71. em 1997, também por meio da sutura trans-óssea, obtiveram 13,9% de recidiva em 79 pacientes.

Estudos mais recentes mostram melhoria dos resultados clínicos pela técnica artroscópica, principalmente no que se refere à recidiva, com taxas de 4% a 18%,22. Voos JE, Livermore RW, Feeley BT, Altchek DW, Williams RJ, Warren RF, et al. Prospective evaluation of arthroscopic Bankart repairs for anterior instability. Am J Sports Med. 2010;38(2):302-7. , 99. Carreira DS, Mazzocca AD, Oryhon J, Brown FM, Hayden JK, Romeo AA. A prospective outcome evaluation of arthroscopic Bankart repairs: minimum 2-year follow-up. Am J Sports Med. 2006;34(5):771-7. , 1010. Kim SH, Ha KI, Cho YB, Ryu BD, Oh I. Arthroscopic anterior stabilization of the shoulder: two to six-year follow-up. J Bone Joint Surg Am. 2003;85(8):1511-8. and 1111. Godinho GG, França FO, Freitas JM, Menezes CM, Freire SG, Wanderley AL, et al. Tratamento artroscópico da instabilidade anterior traumática do ombro: resultados em longo prazo e fatores de risco. Rev Bras Ortop. 2008;43(5):157-66. equivalentes às da técnica aberta. Isso é fruto do melhor conhecimento anatômico da patologia, do ganho de experiência por parte dos cirurgiões e da evolução do material artroscópico, principalmente com o surgimento das âncoras de sutura, introduzidas por Wolf.1212. Wolf EM. Arthroscopic capsulolabral repair using suture anchors. Orthop Clin North Am. 1993;24(1):59-69. O desafio de diminuir as recidivas faz com que o aprimoramento da técnica se torne um objetivo. Estudo biomecânico recente de Kamath et al.1313. Kamath GV, Hoover S, Creighton RA, Weinhold P, Barrow A, Spang JT. Biomechanical analysis of a double-loaded glenoid anchor configuration: can fewer anchors provide equivalent fixation? Am J Sports Med. 2013;41(1):163-8. mostrou que o uso de duas âncoras duplamente carregadas tem resistência igual ou superior ao uso de três âncoras com um único fio.

Para o sucesso do tratamento cirúrgico, além do reparo anatômico da lesão de Bankart, é fundamental a identificação de fatores de risco comprovadamente associados à falência do tratamento artroscópico, como o não reconhecimento de um defeito ósseo glenoumeral ou de uma cápsula anterior redundante.33. Boileau P, Villalba M, Héry JY, Balg F, Ahrens P, Neyton L. Risk factors for recurrence of shoulder instability after arthroscopic Bankart repair. J Bone Joint Surg Am. 2006;88(8):1755-63. and 1414. Burkhart SS, De Beer JF. Traumatic glenohumeral bone defects and their relationship to failure of arthroscopic Bankart repairs: significance of the inverted-pear glenoid and the humeral engaging Hill-Sachs lesion. Arthroscopy. 2000;16(7):677-94. A técnica aberta nos casos de lesões ósseas extensas é indicada.

O propósito deste estudo é avaliar se o uso de âncoras duplamente carregadas para tratamento da instabilidade anterior traumática do ombro melhora os resultados clínicos, principalmente no que tange à recidiva, e compará-lo com os resultados do uso de âncoras carregadas com um fio.

Materiais e métodos

Análise retrospectiva de pacientes que foram tratados em nossa instituição de 2000 a 2010 para reparo artroscópico de lesão de Bankart. Os critérios de inclusão foram: (1) instabilidade anterior traumática recidivante do ombro; (2) defeitos ósseos do glenoide e/ou lesão de Hill-Sachs < 25%; (3) assinar termo de concordância pelo Conselho de Ética dos hospitais envolvidos. Pacientes com grandes defeitos ósseos umerais e glenoides, instabilidade posterior, lesão associada de manguito rotador e cirurgia prévia no ombro foram excluídos. Não foram excluídos aqueles com lesão SLAP associada.

Foram submetidos 59 pacientes (61 ombros) consecutivos, entre dezembro de 2007 e agosto de 2010, a tratamento artroscópico da lesão de Bankart com âncoras metálicas duplamente carregadas com fio de alta resistência (grupo AD). Esse grupo foi comparado a um segundo formado de 202 pacientes (206 ombros) operados entre janeiro de 2000 e novembro de 2005 submetidos ao mesmo procedimento, porém com âncoras com carregamento simples (grupo AS). As características dos dois grupos são comparadas na tabela 1. O seguimento mínimo foi de 24 meses.

Tabela 1 -
Perfil epidemiológico comparativo dos grupos submetidos à cirurgia de Bankart

Todas as cirurgias foram feitas por dois cirurgiões (G.G.G. e J.M.F.) com habilidade cirúrgica e experiências comparáveis. Todos os pacientes receberam anestesia geral e bloqueio regional de plexo braquial e posicionados em decúbito lateral. Foram aplicadas trações lateral e distal e manteve-se o ombro afetado em abdução de 30°, flexão de 15° e inclinação dorsal do tronco de 30°. Usamos portais clássicos artroscópicos, com o artroscópio posicionado no portal anterossuperior, a instrumentação feita pelo portal anteroinferior e a irrigação pelo portal posterior. A articulação glenoumeral foi inspecionada e a patologia, constatada (fig. 1). Procedeu-se então ao desbridamento da área da lesão de Bankart, com decorticação da borda anterior da glenoide e do colo da escápula adjacente com um shaver motorizado. Demarcamos os pontos de fixação das âncoras metálicas de 4 mm (Revo, ConMed/Linvatec). As do grupo AD foram carregadas com dois fios de sutura trançados não absorvíveis (Ethibond n° 2). As âncoras devem ser posicionadas com inclinação de 45° em relação à superfície da glenoide e avançadas até 3 mm da borda glenoidal medialmente. A primeira âncora é introduzida na posição de 5 horas (ombro direito) e as demais com distância mínima de 1 cm superiormente. Após a inserção de cada âncora, é feita a passagem de penetrador curvado de partes moles (Suture Hook) com fio monofilamentar n° 1, a primeira através do lábio e do ramo anterior do ligamento glenoumeral inferior (LGUI) em um ponto situado aproximadamente a 1 cm no sentido caudal em relação a sua respectiva âncora. O primeiro fio não absorvível é atado ao fio monofilamentar e transportado através do tecido. O tecido é tensionado ao encontro da âncora e são dados cinco nós intercalados (tipo "revo") para fixação ( fig. 2).

Figura 1 -
Visão através do portal anterossuperior da lesão de Bankart e do ramo anterior do LGUI.

Figura 2 -
Retensionamento do LGUI após a primeira sutura.

No caso dos pacientes do grupo AD, a passagem do segundo fio da âncora foi feita da mesma maneira, com transfixação do restante do tecido ainda frouxo (Figura 3 and Figura 4). Esse reforço aperfeiçoa o efeito de retensionamento capsuloligamentar. Procedeu-se então ao posicionamento das outras âncoras até o reparo completo da lesão de Bankart. Usam-se habitualmente três âncoras, com seis pontos de reparo labial anteroinferior (fig. 5). Quando presente, a lesão SLAP é reparada de acordo com cada tipo apresentado.

Figura 3 -
Passagem de pinça tipo Hook através do ramo anterior do LGUI após a primeira sutura.

Figura 4 -
Aspecto do ramo anterior do LGUI após término da segunda sutura da âncora mais inferior.

Figura 5 -
Reparo completo do complexo capsulolabral anterior após seis suturas (três âncoras com pontos duplos).

Os pacientes foram imobilizados em tempo integral com tipoia tipo Velpeau (abdução neutra e rotação interna de 70°) e estimulados a fazer flexo-extensão do cotovelo duas vezes por dia. Após três semanas, o uso da tipoia foi descontinuado e o paciente iniciou programa de fisioterapia para ganho passivo de amplitude de movimento em todas as direções. Reforço muscular foi iniciado após 12 semanas e participação completa em atividade esportiva após seis meses.

A avaliação clínica e a coleta dos dados foram feitas por um médico especializando (R4) em cirurgia de ombro e constavam de questionário e exame físico. Os pacientes foram perguntados quanto ao primeiro episódio de instabilidade, ao tipo de prática esportiva e ao retorno ao esporte após o procedimento. O arco de movimento foi mensurado com o goniômetro e comparado com o lado contralateral. Os escores funcionais usados foram o UCLA e o Carter-Rowe. A recidiva ou falha cirúrgica foi definida quando o paciente apresentava qualquer evidência ou sintoma de instabilidade (apreensão, subluxação ou luxação).

Para as análises estatísticas descritivas e os testes apresentados neste trabalho usamos o pacote estatístico IBM SPSS versão 19.0.0. A fim de testar se as frequências de duas variáveis categóricas apresentam algum grau de independência usamos o teste qui-quadrado. A magnitude da associação entre duas variáveis categóricas foi mensurada por meio do teste de correlação de Spearman. De modo a testar e mensurar o grau de correlação das respostas entre duas variáveis de natureza contínua usou-se o teste de correlação de Pearson. Por causa da necessidade de comparação dos dados obtidos nos dois estudos usamos o teste t de Student para verificar a significância da diferença entre médias de amostras diferentes. No entanto, o teste t apresenta diferença caso as variâncias dos dados nas duas amostras, sejam iguais ou diferentes. Nesse caso, o primeiro passo é testar a hipótese nula de igualdade entre as variâncias. Para isso usamos o teste F de Fisher. 1515. Triola MF. Elementary statistics: technology update. 11th ed. Boston: Addison Wesley; 2010.

Resultados

Não houve diferença estatística na incidência de recidiva do grupo com âncora de carregamento simples (5,83%) em relação ao grupo com âncora de duplo carregamento (7,69%) após o período final de seguimento (tabela 2).

Tabela 2 -
Diferença da recidiva após procedimento artroscópico de Bankart

No fim do estudo (após seguimento mínimo de dois anos) os dois grupos apresentaram - segundo os critérios de Carter-Rowe - faixa de resultados bons-excelentes semelhantes, porém surgiu diferença quando avaliado o valor médio da classificação (tabela 3). Já segundo a escala funcional da UCLA, não houve diferença entre os grupos (valor médio do grupo AS = 33,64 e AD = 34,25; p = 0,178). A presença de lesão SLAP não interferiu na função pós-operatória.

Tabela 3 -
Resultado funcional comparativo segundo Carter-Rowe

Os pacientes do grupo AD tiveram perda média da rotação lateral com o braço aduzido de 13,93° (p < 0,001) e com o braço a 90° de abdução, de 16,29° (p < 0,001) em relação ao ombro contralateral. Não houve diferença em relação à elevação anterior e à rotação medial.

Houve uma tendência a um maior retorno ao esporte no mesmo nível anterior à cirurgia no grupo AS, porém sem significância estatística (tabela 4). Para essa análise, foram excluídos 53 pacientes do grupo AS e sete do grupo AD que eram sedentários.

Tabela 4 -
Retorno à atividade esportiva após reparo de Bankart

Discussão

Ambos os grupos estudados no presente trabalho obtiveram índice de falha inferior a 10%, o que corresponde à taxa de sucesso de outros estudos com uso de âncoras com seguimento de dois anos.22. Voos JE, Livermore RW, Feeley BT, Altchek DW, Williams RJ, Warren RF, et al. Prospective evaluation of arthroscopic Bankart repairs for anterior instability. Am J Sports Med. 2010;38(2):302-7. , 99. Carreira DS, Mazzocca AD, Oryhon J, Brown FM, Hayden JK, Romeo AA. A prospective outcome evaluation of arthroscopic Bankart repairs: minimum 2-year follow-up. Am J Sports Med. 2006;34(5):771-7. , 1616. Thal R, Nofziger M, Bridges M, Kim JJ. Arthroscopic Bankart repair using knotless or bioknotless suture anchors: 2- to 7-year results. Arthroscopy. 2007;23(4):367-75. , 1717. Hantes ME, Venouziou AI, Liantsis AK, Dailiana ZH, Malizos KN. Arthroscopic repair for chronic anterior shoulder instability: a comparative study between patients with Bankart lesions and patients with combined Bankart and SLAP. Am J Sports Med. 2009;37(6):1093-8. and 1818. Netto NA, Tamaoki MJ, Lenza M, dos Santos JB, Matsumoto MH, Faloppa F, et al. Treatment of Bankart lesions in traumatic anterior instability of the shoulder: a randomized controlled trial comparing arthroscopy and open techniques. Arthroscopy. 2012;28(7):900-8. Kim et al.1919. Kim KC, Shin HD, Cha SM, Kim JH. Arthroscopic double-loaded single-row repair in chronic traumatic anterior shoulder dislocation. Arch Orthop Trauma Surg. 2012;132(10):1515-20. foram os únicos a publicar série de pacientes com instabilidade anterior traumática tratados com reparo artroscópico e uso de âncoras com carregamento duplo de fios e apresentaram um índice de 8,9% de recidiva, resultado bastante semelhante aos 7,69% do presente estudo. O sucesso, entretanto, não foi superior ao grupo comparativo de pacientes tratados com âncoras com carregamento simples.

Os dois grupos conseguiram resultados semelhantes aos da literatura99. Carreira DS, Mazzocca AD, Oryhon J, Brown FM, Hayden JK, Romeo AA. A prospective outcome evaluation of arthroscopic Bankart repairs: minimum 2-year follow-up. Am J Sports Med. 2006;34(5):771-7. , 1919. Kim KC, Shin HD, Cha SM, Kim JH. Arthroscopic double-loaded single-row repair in chronic traumatic anterior shoulder dislocation. Arch Orthop Trauma Surg. 2012;132(10):1515-20. , 2020. Castagna A, Markopoulos N, Conti M, Delle Rose G, Papadakou E, Garofalo R. Arthroscopic Bankart suture-anchor repair: radiological and clinical outcome at minimum 10 years of follow-up. Am J Sports Med. 2010;38(10):2012-6. , 2121. Van der Linde JA, Van Kampen DA, Terwee CB, Dijksman LM, Kleinjan G, Willems WJ. Long-term results after arthroscopic shoulder stabilization using suture anchors: an 8- to 10-year follow-up. Am J Sports Med. 2011;39(11):2396-403. , 2222. Yan H, Cui GQ, Wang JQ, Tian DX, Ao YF. Arthroscopic Bankart repair with suture anchors: results and risk factors of recurrence of instability. Zhonghua Wai Ke Za Zhi. 2011;49(7):597-602. , 2323. Zaffagnini S, Marcheggiani Muccioli GM, Giordano G, Bonanzinga T, Grassi A, Nitri M, et al. Long-term outcomes after repair of recurrent post-traumatic anterior shoulder instability: comparison of arthroscopic transglenoid suture and open Bankart reconstruction. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2012;20(5):816-21. and 2424. Mahirog ullari M, Ozkan H, Akyüz M, Ug ras AA, Güney A, Kus kucu M. Comparison between the results of open and arthroscopic repair of isolated traumatic anterior instability of the shoulder. Acta Orthop Traumatol Turc. 2010;44(3):180-5. quando avaliados por meio da classificação de Carter-Rowe, com resultados bons e excelentes que giraram em torno de 90%. Do mesmo modo, Kim et al.1919. Kim KC, Shin HD, Cha SM, Kim JH. Arthroscopic double-loaded single-row repair in chronic traumatic anterior shoulder dislocation. Arch Orthop Trauma Surg. 2012;132(10):1515-20. obtiveram excelente resultado funcional, com Carter-Rowe médio de 96,8. Entretanto, ao compararmos os grupos do nosso estudo, o aumento do número de pontos de sutura não se correlacionou com a melhoria da função, principalmente ao avaliarmos a média do Carter-Rowe, na qual houve um pior resultado do grupo com carregamento duplo.

Encontramos uma limitação importante de arco de movimento quando comparado ao lado contralateral nos pacientes submetidos a reparo com âncoras com carregamento duplo, particularmente da rotação lateral em abdução. Ainda que a perda da rotação lateral seja praticamente universal nas séries que usaram âncoras com carregamento simples de fio,22. Voos JE, Livermore RW, Feeley BT, Altchek DW, Williams RJ, Warren RF, et al. Prospective evaluation of arthroscopic Bankart repairs for anterior instability. Am J Sports Med. 2010;38(2):302-7. and 1818. Netto NA, Tamaoki MJ, Lenza M, dos Santos JB, Matsumoto MH, Faloppa F, et al. Treatment of Bankart lesions in traumatic anterior instability of the shoulder: a randomized controlled trial comparing arthroscopy and open techniques. Arthroscopy. 2012;28(7):900-8. obtivemos um resultado expressivamente maior do que a casuística de Kim (perda de 7° da rotação externa em abdução).1919. Kim KC, Shin HD, Cha SM, Kim JH. Arthroscopic double-loaded single-row repair in chronic traumatic anterior shoulder dislocation. Arch Orthop Trauma Surg. 2012;132(10):1515-20. Isso pode ser ocasionado pelo maior tensionamento da cápsula anterior. A despeito desse achado, não houve correlação de perda da rotação lateral com recidiva ou piores escores funcionais.

A literatura tem mostrado que os resultados do reparo artroscópico da lesão de Bankart com âncoras com um fio se deterioram com o transcorrer do tempo. Castagna et al.2020. Castagna A, Markopoulos N, Conti M, Delle Rose G, Papadakou E, Garofalo R. Arthroscopic Bankart suture-anchor repair: radiological and clinical outcome at minimum 10 years of follow-up. Am J Sports Med. 2010;38(10):2012-6. encontraram 23% de recidiva com seguimento médio de 10,9 anos. Van der Linde et al.2121. Van der Linde JA, Van Kampen DA, Terwee CB, Dijksman LM, Kleinjan G, Willems WJ. Long-term results after arthroscopic shoulder stabilization using suture anchors: an 8- to 10-year follow-up. Am J Sports Med. 2011;39(11):2396-403. registraram taxa de 35% de recidiva com oito a 10 anos de seguimento, 20% após dois anos. Acreditamos que com o uso de âncoras duplamente carregadas as taxas de recidiva podem se revelar inferiores com o decorrer do seguimento. Teoricamente, essa superioridade já foi mostrada em recente estudo biomecânico de Kamath et al.,1313. Kamath GV, Hoover S, Creighton RA, Weinhold P, Barrow A, Spang JT. Biomechanical analysis of a double-loaded glenoid anchor configuration: can fewer anchors provide equivalent fixation? Am J Sports Med. 2013;41(1):163-8. em que o uso de duas âncoras com carregamento duplo apresentou resistência à falência igual ou superior ao uso de três âncoras com fio único. Um seguimento maior trará melhores conclusões a respeito dessa hipótese.

Uma das limitações do nosso trabalho foi a discrepância entre o tamanho da casuística de cada grupo, apesar de eles serem homogêneos em relação às características epidemiológicas. Outra questão é o fato de o trabalho não ser prospectivo e randomizado, o que pode gerar vieses. Apesar disso, nosso trabalho é o primeiro estudo comparativo do reparo artroscópico da instabilidade anterior traumática com âncoras de carregamento simples e duplo de fios. Novos trabalhos são necessários para esclarecer e aperfeiçoar a técnica no tratamento da patologia.

Conclusão

Até o momento, o tratamento da instabilidade anterior traumática com âncoras com carregamento duplo de fios não apresenta vantagem em termos de recidiva ou melhoria funcional em relação a âncoras com carregamento simples.

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  • Trabalho desenvolvido no Grupo de Ombro do Hospital Ortopedico e no Hospital Lifecenter, Belo Horizonte, MG, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2015

Histórico

  • Recebido
    21 Nov 2013
  • Aceito
    06 Jan 2014
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