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Profilaxia para tromboembolismo venoso em pacientes cirúrgicos: quem sabe faz a hora, não espera acontecer!!!

EDITORIAL

Profilaxia para tromboembolismo venoso em pacientes cirúrgicos: quem sabe faz a hora, não espera acontecer!!!

Prophylaxis for venous thromboembolism in surgical patients: who knows does the time, not waiting to happen!!!

Eduardo Fonseca Sad

Coordenador da UTI do Hospital Luxemburgo e Coordenador da Comissão de Profilaxia de TEV do Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG, Brasil

Nos últimos anos temos assistido a um avanço sem precedentes no desenvolvimento técnico e capacitação profissional na cirurgia. Foram anos em que o enorme salto de qualidade dos equipamentos, aliado ao desenvolvimento de novas habilidades e a grande capacidade técnica dos cirurgiões melhoraram sobremaneira muitos aspectos importantíssimos na cirurgia tais como, avaliação e exames pré-operatórios, tempo cirúrgico, recuperação pós-operatória, uso de medicações per-operatórias, tempo de internação e, mais importante ainda, melhora significativa nos resultados com grande diminuição da morbimortalidade relativa aos procedimentos. Estes avanços mudaram sobremaneira também a cirurgia do aparelho digestivo com técnicas sofisticadas que melhoraram o prognóstico de operações hepáticas, pancreáticas, intestinais, transplantes, cirurgia bariátrica e cirurgia digestiva oncológica.

Apesar deste avanço, um aspecto muito importante tem sido deixado de lado: a profilaxia para tromboembolismo venoso (TEV) nos pacientes submetidos a estes procedimentos. O TEV é a principal causa prevenível de morte em pacientes internados clínicos e cirúrgicos. A sua incidência é muito maior que a geralmente percebida clinicamente, sendo que cerca de 50 a 60% dos casos são assintomáticos ou oligossintomáticos, o que dificulta muito a sua percepção e diagnóstico. Em cirurgia geral a incidência de TEV sem profilaxia varia muito conforme o tipo de operação e os fatores de risco do paciente; ela incide em torno de 20% a 25%. Em cirurgia oncológica e bariátrica a incidência aumenta para 30% a 35%.

Embolia pulmonar ocorre em torno de 650.000 pessoas por ano nos EUA, com cerca de 200.000 mortes. Cerca de 80% destes casos são relacionados à internação hospitalar e procedimentos realizados. Um estudo em 2002 mostrou que dois de cada três casos de TEV poderiam ser evitados se as recomendações para profilaxia fossem seguidas de acordo com as diretrizes existentes.

Os dados da literatura são bem preocupantes. Um levantamento de 20081 nos EUA mostrou que somente 30% dos pacientes cirúrgicos recebiam profilaxia para TEV adequadamente. No Brasil, os dados do estudo ENDORSE (2008) mostraram 46% de profilaxia correta em pacientes cirúrgicos elegíveis internados em hospitais de referência.

Os motivos para o não uso ou uso incorreto de profilaxia para TEV são muitos, contudo, em pacientes cirúrgicos alguns se destacam: estratificação incorreta do risco de TEV; foco na doença de base; medo de sangramento; e desconhecimento ou descrença nas evidências favoráveis à profilaxia.

Diversos estudos tentam nos mostrar opções para correção desta falha no tratamento dos nossos pacientes; contudo, o melhor caminho parece ser a conscientização dos profissionais quanto à incidência e aos riscos para o paciente e a disponibilização de ferramentas para avaliação adequada destes riscos com orientações claras e de fácil execução para evitar o TEV.

Neste número da revista do CBCD, Malafaia et al.2, descrevem uma ferramenta com orientações tanto para avaliação de risco como para aplicação de métodos farmacológicos e mecânicos para profilaxia de TEV.Ela é apresentada em forma de uma diretriz e foi elaborada baseada nas mais atuais técnicas para confecção de diretrizes com formulação de perguntas-chave e construção de respostas baseadas em evidências bem sólidas da literatura. Esta diretriz está em perfeita harmonia com as novas diretrizes publicadas pelo American College of Chest Physicians (ACCP) (fevereiro 2012)3 que são mundialmente aceitas e elaboradas dentro dos mais rigorosos padrões da medicina baseada em evidências pela conceituada Universidade Mc Master do Canadá. Apesar desta semelhança o trabalho de Malafaia et al.2 apresenta adaptações necessárias à nossa realidade. É claro que esta diretriz não pretende substituir a avaliação, o julgamento e a experiência do médico responsável pelo paciente; o seu objetivo é ajudá-lo a tomar decisões que sejam mais adequadas ao seu paciente naquele momento do tratamento respondendo à questões-chave e orientando em relação à dúvidas que aparecem frequentemente quanto a escolha da profilaxia e o melhor momento para início e duração.

Esta iniciativa do CBDC, na realização desta diretriz, é digna de elogios e esperamos que sirva de exemplo para outras sociedades médicas brasileiras para que possamos diminuir a carga que este inimigo - muitas vezes invisível -, exerce sobre o tratamento e, infelizmente, sobre a vida de nossos pacientes.

  • 1. Cohen AT, Tapson VF, Bergmann JF, Goldhaber SZ, Kakkar AK, Deslandes B, Huang W, Zayaruzny M, Emery L, Anderson FA Jr; ENDORSE Investigators. Venous thromboembolism risk and prophylaxis in the acute hospital care setting (ENDORSE study): a multinational cross-sectional study. Lancet. 2008 Feb 2;371(9610):387-94.
  • 2. Malafaia O, Montagnini AL, Luchese A, Accetta AC, Zilberstein B, Malheiros CA, Jacob CE, Quireze-Junior C, Bresciani CJC, Kruel CDP, Cecconello I, Sad EF, Ohana JAL, Aguilar-Nascimento JE, Manso JEF, Ribas-Filho JM, Santo MA, Andreollo NA, Torres OJM, Herman P, Cuenca RM, Sallum RAA, Bernardo WM. Prevenção do tromboembolismo na cirurgia do câncer do aparelho digestivo. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2012; 24(1):216-223
  • 3. Monagle P, Chan AK, Goldenberg NA, Ichord RN, Journeycake JM, Nowak-Göttl U, Vesely SK; American College of Chest Physicians. Antithrombotic therapy in neonates and children: Antithrombotic Therapy and Prevention of Thrombosis, 9th ed: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest. 2012 Feb;141(2 Suppl):e737S-801S

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Fev 2013
  • Data do Fascículo
    Dez 2012
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