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Mucosectomia esofágica versus esofagectomia: estudo comparativo dos resultados cirúrgicos imediatos e tardios em pacientes operados por megaesôfago avançado

Resumos

RACIONAL:

O tratamento cirúrgico do megaesôfago avançado não é consensual sendo mais comumente usada a esofagectomia. Por tratar-se de técnica que apresenta maior morbimortalidade e empregada em doença benigna, foi introduzida nos últimos anos, como alternativa, a mucosectomia esofágica.

OBJETIVO:

Comparar os resultados imediatos e tardios das duas técnicas avaliando-se os tempos operatório, de internação em UTI, de internação do pós-operatório, de internação total; taxas de complicações intra-operatórias e pós-operatórias; taxa de mortalidade; e resultados a longo prazo.

MÉTODOS:

Foram avaliados 40 prontuários, retrospectivamente, sendo 23 esofagectomias e 17 mucosectomias. Na avaliação dos resultados pós-operatórios, foram realizadas entrevistas, mediante uso de questionário específico.

RESULTADOS:

Comparando-se as médias da esofagectomia e mucosectomia, respectivamente, os dados foram: 1) tempo cirúrgico - 310,2 min e 279,7 min (p>0,05); 2) tempo de internação em UTI - 5 dias e 2,53 dias (p<0,05); 3) tempo de internação total - 24,25 dias e 20,76 dias (p>0,05); 4) tempo de internação após a operação - 19,05 dias e 14,94 dias (p>0,05); 5) presença de complicações intra-operatórias - 65% e 18% (p<0,05); 6) presença de complicações pós-operatórias imediatas - 65% e 35% (p>0,05). Na avaliação do escore pós-operatório tardio (escala 0-10) a esofagectomia (n=5) obteve 8,8 pontos e também 8,8 pontos obteve a mucosectomia (n=5).

CONCLUSÕES:

A mucosectomia esofágica mostrou-se boa alternativa no tratamento cirúrgico do megaesôfago avançado. Foi vantajosa no pós-operatório imediato por apresentar menor média de tempo na operação, na internação total, na UTI e no índice de complicações. No pós-operatório tardio, o resultado foi excelente e bom nas duas operações.

Acalásia esofágica; Doença de Chagas; Transtornos da motilidade esofágica; Esofagectomia


BACKGROUND:

The surgical treatment of advanced megaesophagus has no consensus, being esophagectomy the more commonly used method. Since it has high morbimortality - inconvenient for benign disease -, in recent years an alternative has been introduced: the esophageal mucosal resection.

AIM:

To compare early and late results of the two techniques evaluating the operative time, length of ICU stay; postoperative hospitalization; total hospitalization; intra- and postoperative complication rates; mortality; and long-term results.

METHODS:

Were evaluated retrospectively 40 charts, 23 esophagectomies and 17 mucosectomies. In assessing postoperative results, interviews were conducted by using a specific questionnaire.

RESULTS:

Comparing the means of esophagectomy and mucosal resection, respectively, the data were: 1) surgical time - 310.2 min and 279.7 min (p> 0.05); 2) length of stay in ICU - 5 days and 2.53 days (p <0.05); 3) total time of hospitalization - 24.25 days and 20.76 days (p> 0.05); 4) length of hospital stay after surgery - 19.05 days and 14.94 days (p> 0.05); 5) presence of intraoperative complications - 65% and 18% (p <0.05); 6) the presence of postoperative complications - 65% and 35% (p> 0.05). In the assessment of late postoperative score (range 0-10) esophagectomy (n = 5) obtained 8.8 points and 8.8 points also got mucosal resection (n = 5).

CONCLUSIONS:

Esophageal mucosal resection proved to be good alternative for surgical treatment of megaesophagus. It was advantageous in the immediate postoperative period by presenting a lower average time in operation, the total hospitalization, ICU staying and complications rate. In the late postoperative period, the result was excellent and good in both operations.

Esophageal achalasia; Chagas disease; Esophageal motility disorders; Esophagectomy


INTRODUÇÃO

A tripanossomíase americana descrita por Carlos Chagas em 1909 é, ainda hoje, um problema socioeconômico regional e nacional, afligindo principalmente os países do cone sul da América.

Segundo o Banco Mundial ("World Development Report", 1993), o peso relativo da doença de Chagas com respeito às outras enfermidades transmissíveis endêmicas na América Latina - medido em "anos de vida ajustados à incapacidade" -, na ocasião só era superado pelo conjunto de enfermidades diarreicas, respiratórias e AIDS; assim, é importante problema de saúde pública.

O megaesôfago é uma das formas de apresentação clínica da doença de Chagas. Estima-se que ao menos 4% dos chagásicos brasileiros apresentem essa alteração (cerca de 300 mil doentes)88. Ceneviva R, Ferreira-Santos R, Santos JS, Mente ED, Sankarankutty AK. Alterações cronológicas do perfil dos pacientes e da modalidade de tratamento cirúrgico do megaesôfago chagásico. Acta Cir Bras 2002; 17: 125-128.. Nele, ocorre destruição de plexos nervosos intramurais do esôfago, redução de peristaltismo ao nível do corpo do órgão e não abertura do esfíncter inferior (acalásia) à deglutição. Há incoordenação motora, dilatação e redução de sua capacidade de contração. Admitem-se outras causas para o megaesôfago, nesses casos, chamando-o de acalásia idiopática do esôfago 11. Andreollo NA, Lopes LR, Brandalise NA, Leonardi LS. Acalasia idiopática do esôfago: análise de 25 casos. GED. 1996; 15: 151-155.,1010. Dantas RO. Comparação entre acalásia idiopática e acalásia conseqüente à doença de Chagas: revisão. Arq Gastroenterol. 2003;40: 126-130.,1111. Herbella FAM, Oliveira DRCF, Del Grande JC. Are idiopathic and chagasic achalasia two different Diseases? Dig Dis Sci. 2004; 49: 353-360.,1313. Oliveira GC, Lopes LR, Coelho-Neto JS. Acalásia idiopática do esôfago: análise da história clínica e antecedentes na etiologia e perfil dos pacientes. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2010;23(1):11-15,1414. Oliveira GC, Lopes LR., Andreollo NA, Coelho Neto JS. O megaesôfago tratado cirurgicamente: perfil epidemiológico dos pacientes operados no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas entre 1989 e 2005. Rev Soc Bras Med Trop. 2008; 41: 183-188.,1515. Park W, Vaezi MF. Etiology and pathogenesis of achalasia: the current understanding. American Journal of Gastroenterology. 2005; 100: 1404-1414..

A disfagia é a manifestação que leva o doente a procurar o médico, sendo geralmente progressiva1212. Oliveira GC, Lopes LR, Andreollo NA, Braga NS, Coelho Neto, JS. Tratamento cirúrgico do megaesôfago no Hospital de Clínicas da UNICAMP - fatores associados a melhores ou a piores resultados. Rev Col Bras Cir. 2009; 36: 300-306.,1414. Oliveira GC, Lopes LR., Andreollo NA, Coelho Neto JS. O megaesôfago tratado cirurgicamente: perfil epidemiológico dos pacientes operados no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas entre 1989 e 2005. Rev Soc Bras Med Trop. 2008; 41: 183-188.. O megaesôfago é graduado de acordo com o diâmetro transverso do órgão, variando de 1 a 4 (classificação de Mascarenhas). Seu tratamento é cirúrgico e essa classificação auxilia a escolha da operação88. Ceneviva R, Ferreira-Santos R, Santos JS, Mente ED, Sankarankutty AK. Alterações cronológicas do perfil dos pacientes e da modalidade de tratamento cirúrgico do megaesôfago chagásico. Acta Cir Bras 2002; 17: 125-128.,1212. Oliveira GC, Lopes LR, Andreollo NA, Braga NS, Coelho Neto, JS. Tratamento cirúrgico do megaesôfago no Hospital de Clínicas da UNICAMP - fatores associados a melhores ou a piores resultados. Rev Col Bras Cir. 2009; 36: 300-306.,1414. Oliveira GC, Lopes LR., Andreollo NA, Coelho Neto JS. O megaesôfago tratado cirurgicamente: perfil epidemiológico dos pacientes operados no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas entre 1989 e 2005. Rev Soc Bras Med Trop. 2008; 41: 183-188..

Nos casos de megaesôfago grau 4 ou forma avançada, a operação preferencial é a esofagectomia subtotal, utilizando-se o estômago para a reconstrução do trânsito. Outra proposta para o tratamento do megaesôfago avançado, é a operação de Serra-Dória, que consiste em uma cardioplastia e gastrectomia parcial em Y-de-Roux.

Foram encontrados bons resultados para essa operação em pacientes reoperados de megaesôfago (15 casos de forma não avançada e cinco de forma avançada) por Ponciano et al., em 20041616. Ponciano H, Cecconello I, Alves L, Ferreira BD, Gama-Rodrigues J. Cardioplastia e gastrectomia parcial em Y-de-Roux (operação de Serra-Dória) para reoperações no megaesôfago. Arq Gastroenterol. 2004; 41: 155-161.. No início da década de 90, Aquino et al.33. Aquino JLB, Said M, Pereira EVA, Vernaschi B, Oliveira MB. Tratamento cirúrgico do megaesôfago recidivado. Rev. Col. Bras. Cir. 2007; 34: 310-313.,44. Aquino JLB, Said MM, Fernandes PR. Avaliação tardia da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular em pacientes com megaesôfago avançado. Rev Col Bras Cir 2007; 34: 9-15.,55. Aquino JLB, Said MM, Maziero D, Pliveira JMP, Leando-Merhi VA. Reconstrução esofágica pela esofagocoloplastia no megaesôfago avançado em pacientes gastrectomizados. ABCD Arq Bras Cir Dig 2009;22(4):197-200,66. Aquino JLB. Avaliação da anastomose esofagogástrica cervical com sutura mecânica em pacientes com megaesôfago avançado. Rev. Col. Bras. Cir. 2005, vol. 32, no. 3, pp. 143-146., após estudos preliminares em cães e, posteriormente, em cadáveres para verificação de sua exequibilidade passaram a realizar uma nova modalidade terapêutica para o megaesôfago avançado, a mucosectomia esofágica. É método em que se retiram a mucosa e a submucosa do esôfago, por meio da sua invaginação completa, através de via cervicoabdominal combinada, sem toracotomia e conservando por inteiro a túnica muscular esofágica. Desse modo, é realizada profilaxia de lesões mucosas pré-neoplásicas e se evitam as complicações da dissecção e do descolamento do esôfago no mediastino.

A equipe da disciplina de Moléstias do Aparelho Digestivo no Hospital de Clínicas da Unicamp, há cerca de 15 anos, passou a tratar alguns casos de megaesôfago avançado com a mucosectomia esofágica1212. Oliveira GC, Lopes LR, Andreollo NA, Braga NS, Coelho Neto, JS. Tratamento cirúrgico do megaesôfago no Hospital de Clínicas da UNICAMP - fatores associados a melhores ou a piores resultados. Rev Col Bras Cir. 2009; 36: 300-306.,1414. Oliveira GC, Lopes LR., Andreollo NA, Coelho Neto JS. O megaesôfago tratado cirurgicamente: perfil epidemiológico dos pacientes operados no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas entre 1989 e 2005. Rev Soc Bras Med Trop. 2008; 41: 183-188.. Contudo, a esofagectomia subtotal não foi abandonada e seus resultados ainda não foram diretamente comparados aos da mucosectomia esofágica.

O objetivo deste trabalho foi comparar os resultados cirúrgicos das duas modalidades, utilizadas no tratamento do megaesôfago avançado nos últimos 15 anos. Foram usados parâmetros que levaram em conta resultados cirúrgicos imediatos e tardios.

MÉTODO

Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, Parecer nº 323/2008.

Foi realizado levantamento retrospectivo dos prontuários dos pacientes portadores de megaesôfago avançado operados nos últimos 15 anos constituindo um grupo estudado de 40 pacientes, sendo 23 submetidos à esofagectomia e 17 à mucosectomia esofágica.

Os dados observados foram: tempos de operação, de internação na unidade de terapia intensiva e de internação pós-operatório total; índice de SIRS - síndrome de resposta inflamatória sistêmica; infecção; transfusão de sangue; complicações pulmonares (hemotórax, lesão de pleura, empiema, pneumonia); lesões de ducto torácico; complicações abdominais; e complicações da anastomose esofagogástrica.

Quanto à avaliação do pós-operatório tardio em entrevista clínica, foi utilizado um escore já aplicado anteriormente por Aquino et al. em 200744. Aquino JLB, Said MM, Fernandes PR. Avaliação tardia da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular em pacientes com megaesôfago avançado. Rev Col Bras Cir 2007; 34: 9-15.. Esse escore e sua pontuação englobam: 1) qualidade da deglutição (normal=2 pontos, disfagia ocasional=1 ponto, disfagia frequente=0 ponto); 2) ocorrência de regurgitação gastroesofágica pós-prandial e em decúbito (ausente=2 pontos, ocasional=1 ponto, frequente=1 ponto); 3) alteração do hábito intestinal (inalterado=2 pontos, diarréia ou constipação ocasional=1 ponto, diarréia ou constipação frequente=0 ponto); 4) evolução ponderal (aumentada=2 pontos, inalterada=1 ponto, diminuída=0 ponto); 5)

satisfação com a intervenção (satisfeito=1 ponto, insatisfeito=0 ponto); 6) retorno às atividades profissionais (sim=1 ponto, não=0 ponto).

Em respeito à resolução 196/96, que dispõe sobre as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos do Conselho Nacional de Saúde, todos os pacientes entrevistados foram esclarecidos dos objetivos do trabalho e de que não existia risco físico ou psíquico ao fornecer esses poucos dados para os pesquisadores, sem qualquer forma de identificação dos entrevistados.

Os métodos estatísticos utilizados para testar os dados coletados foram o qui-quadrado (comparação de presença de complicações) e o teste t de student na comparação de médias com erro máximo admitido de 5%.

RESULTADOS

A avaliação dos dados e as comparações percentuais, não mostraram diferenças relevantes entre homens e mulheres, nem de suas médias de idade, sendo assim agrupados conjuntamente.

Houve complicações intra-operatórias em 15 esofagectomias (65%) e em três mucosectomias (18%). Nas esofagectomias, as principais complicações foram as pleurais (lesões e derrames), que ocorreram em 12 operações (52%). A seguir, ocorreram pneumotórax em quatro (17%), prováveis lesões do nervo laríngeo recorrente em duas (9%) e lesões no ducto torácico em duas (9%).

Nas mucosectomias, houve três tipos de complicações intra-operatórias, presentes em uma operação cada, que foram: provável lesão do nervo laríngeo recorrente, lesão de cápsula hepática e trauma esplênico. O qui-quadrado aplicado entre as duas modalidades e complicações teve resultado de 8,937. Para um nível de significância p=0,002 e um grau de liberdade, o valor esperado para variáveis independentes seria de até 3,841. Assim, o resultado indica que há relação entre os procedimentos cirúrgicos e as complicações. Logo, a mucosectomia esofágica é de modo significativo, modalidade cirúrgica com menores riscos de complicações intra-operatórias (Figura 1).

Figura 1 -
Complicações intra-operatórias em percentagem (n=40)

Com relação às complicações no pós-operatório, ocorreram em 15 esofagectomias (65%) e em seis mucosectomias (35%). Nas esofagectomias, houve quatro casos de fístula da anastomose cervical (17%), três deles com estenose da anastomose esofagogástrica (13%), três casos de bacteremia (13%) sendo que em dois (9%) houve sepse, dois casos de fístula linfática (9%) e casos isolados de insuficiência respiratória grave, empiema pleural e abscesso mediastinal. Nas mucosectomias, houve cinco casos de fístula cervical (29%), sendo que uma evoluiu no pós-operatório tardio com estenose, e casos isolados de abscesso abdominal, derrame pleural e abscesso pulmonar e mediastinal (Figura 2). O qui-quadrado, ao se comparar as complicações no pós-operatório entre as duas operações foi de 3,509 (p=0,06). Assim, os valores encontrados não foram suficientes para afirmar que há diferenças significantes entre as operações com relação à prevalência de complicações no pós-operatório, com valor p limiar ao admitido (<0,05).

Figura 2 -
Complicações pós-operatórias em percentagem (n=40)

Não ocorreram óbitos nas operações.

Levando-se em conta os tempos cirúrgicos médio, tempo médio de internação em UTI, tempo médio de internação total e tempo de internação após a operação, o registro do prontuário nesses aspectos permitiu avaliação de 33 operações (12 mucosectomias e 21 esofagectomias) e foram: 1) tempo cirúrgico médio: esofagectomia de 310,2 min e mucosectomia de 279,7 min (n total=37 e p=0,149, não significativo, Figura 3); 2) tempo médio de internação em UTI: esofagectomia de 5 dias e mucosectomia de 2,53 dias (n total=33 e p=0,046, com diferença estatisticamente relevante, Figura 4); 3) tempo médio de internação total: esofagectomia de 24,25 dias e mucosectomia de 20,76 dias (n total=33, p=0,119 não significativo, Figura 5); 4) tempo médio de internação após a operação: esofagectomia de 19,05 dias e mucosectomia de 14,94 dias (n total=33, p=0,144 sem significância estatística, Figura 6).

Figura 3 -
Tempo cirúrgico médio (n=40)

Figura 4 -
Tempo médio de internação em UTI em dias (n=40)

Figura 5 -
Tempo médio de internação total em dias (n=40)

Figura 6 -
Tempo médio de internação após a operação em dias (n=40)

Na avaliação pós-operatória com pelo menos um ano de seguimento (média de 5,36 anos), dez pacientes foram entrevistados, obtendo-se escores excelentes, com média de 8,8 pontos (máximo de dez pontos) na esofagectomia (n=5) e 8,8 pontos na mucosectomia (n=5), mostrando-se excelente resultado cirúrgico tardio.

DISCUSSÃO

A comparação das duas modalidades cirúrgicas no tratamento do megaesôfago avançado demonstrou que a mucosectomia possui resultados melhores em relação à esofagectomia, com menor índice de complicações, menor tempo cirúrgico e menores tempos de internação total, em UTI e após o procedimento, sendo as complicações intra-operatórias e o tempo de internação em UTI significativamente relevantes. Para avaliar se uma amostra maior que a utilizada (n=33 e n=37) nos itens de tempos médios seria estatisticamente significante foi feito o simples experimento de dobrar as amostras, fazendo-se uma duplicata de todos os valores, alcançando-se hipotéticos valores de n=66 e n=74 operações. Com esses números, os itens, antes sem significado estatístico, passaram a ter p<0,05 ou limiar (0,06) ao ser refeito o teste t de student. Isso faz acreditar que com número maior de operações, a mucosectomia esofágica seja estatisticamente melhor que a esofagectomia em todos os itens avaliados neste trabalho.

Outros estudos mostraram índices de complicações inferiores àqueles usualmente encontrados nas esofagectomias. Aquino et al.22. Aquino JLB, Neto JAR, Muraro CLPM, Camargo JGT. Mucosectomia esofágica no tratamento do megaesôfago avançado: análise de 60 casos. Rev Col Bras Cir. 2000; 27:109-116.,44. Aquino JLB, Said MM, Fernandes PR. Avaliação tardia da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular em pacientes com megaesôfago avançado. Rev Col Bras Cir 2007; 34: 9-15. mostraram bons resultados com a mucosectomia. Em 60 operações avaliadas, foram 18,3% de complicações registradas, além de dois óbitos (3,3%)44. Aquino JLB, Said MM, Fernandes PR. Avaliação tardia da mucosectomia esofágica com conservação da túnica muscular em pacientes com megaesôfago avançado. Rev Col Bras Cir 2007; 34: 9-15.. A complicação mais frequentemente encontrada nas mucosectomias foi localizada na anastomose esofagogástrica, ocorrendo em cinco casos (29%), até mais do que nas esofagectomias (n=4, 17%), contudo com p>0,05. Trata-se de anastomose sabidamente de difícil confecção, nas duas modalidades cirúrgicas e, embora não haja diferença estatisticamente relevante entre os resultados nas duas modalidades, há discreta tendência de que a não retirada do esôfago, se relacione com percentual um pouco maior de fístulas e alguns casos de estenose.

Porém, como já demonstrado, o resultado pós-cirúrgico é semelhante nas duas operações. A avaliação tardia das mucosectomias também já foi avaliada por Aquino et al.2,4,6 e, inclusive, a anastomose cervical já foi comparada com relação à sutura mecânica ou manual. Também sem significado estatístico, a técnica mecânica teve menor relação com deiscência de anastomoses (20% contra 33% no total de 30 pacientes avaliados e pareados). Na avaliação tardia em si, os resultados também foram ótimos, com 92% dos pacientes relatando grande melhora na sintomatologia a exemplo do que foi descrito no presente trabalho22. Aquino JLB, Neto JAR, Muraro CLPM, Camargo JGT. Mucosectomia esofágica no tratamento do megaesôfago avançado: análise de 60 casos. Rev Col Bras Cir. 2000; 27:109-116..

As esofagectomias tiveram índice significativamente maior de complicações cirúrgicas, conforme já demonstrado nos resultados, além de maiores médias de tempo cirúrgico, tempos de internação total, em UTI e após a operação. As complicações mais frequentes foram as pleurais (lesões e derrames), ocorrendo em 52%. O maior tempo operatório em decorrência da maior manipulação toracoabdominal para sua realização explica o elevado índice de complicações, se comparada à mucosectomia esofágica. Contudo, o pós-cirúrgico, apesar da maior permanência hospitalar, é satisfatório e tão bom quanto o da mucosectomia, como já mostrado.

Tomashich et al.1818. Tomasich FDS, Valladares GCG, Demarchi VCA, Augusto VC, Gagliardi D. Complicações e letalidade hospitalar da esofagectomia com linfadenectomia em dois campos: estudo de 132 casos. Acta Oncol Bras. 2003; 23: 375-387., encontraram complicações no pós-operatório de 39,3% e letalidade de 13,7%. Braghetto et al.77. Braghetto IM, Gonzalo CH, Patricio BP, Korn B, Ramirez C. Esofagectomía por cirugía mini-invasiva vía toracoscópica o laparoscópica: indicaciones y resultados. Rev Chil Cir. 2005; 57: 118-126., obtiveram 33,3% de complicações precoces no pós-operatório e 22% de complicações tardias. Tinoco et al.17 17. Tinoco RC, Tinoco AC, El-Kadre LJ, Rios RA, Sueth DM, Pena FM. Esofagectomia laparocópica transhiatal: resultados imediatos. Arq Gastroenterol. 2007; 44: 141-144.avaliaram a técnica da esofagectomia, obtendo tempo médio de permanência hospitalar de 6,9 dias, mortalidade em 30 dias de 5,6% e 11 casos de lesões pleurais, nas 64 operações realizadas; ainda, os autores avaliaram a incidência de fístulas cervicais, que foi de 14%, demonstrando que a anastomose esofagogástrica apresenta elevado índice de complicações nos diversos serviços médicos.

Crema et al.99. Crema E, Ribeiro LBP, Sousa RC, Terra Júnior JA, Silva BF, Silva AA, et al. Esofagectomia transhiatal laparoscópica para o tratamento do megaesôfago avançado: análise de 60 casos. Rev. Col. Bras. Cir. 2009; 36: 118-122. demonstraram excelentes resultados cirúrgicos no tratamento de 60 casos de megaesôfago avançado por esofagectomia via laparoscópica. O tempo médio de operação relatado foi de 160 min, sem mortalidade e total de 20% de complicações, sendo as mais frequentes hemopneumotórax, disfonia e fístulas cervicais. Aquino et al.33. Aquino JLB, Said M, Pereira EVA, Vernaschi B, Oliveira MB. Tratamento cirúrgico do megaesôfago recidivado. Rev. Col. Bras. Cir. 2007; 34: 310-313., avaliaram o tratamento do megaesôfago recidivado, por técnicas diversas, obtendo na esofagectomia, morbidade de 50% (n=4) e dois óbitos (25%). Comparando-se com a mucosectomia, os resultados foram inferiores neste trabalho.

Como se percebe, a esofagectomia é procedimento com nível de morbidade normalmente superior a 20%, e em alguns casos, com mortalidade. Alternativas têm sido tentadas recentemente como a mucosectomia esofágica e a esofagectomia por videolaparoscopia. Os resultados mostram-se melhores, embora o tratamento do megaesôfago avançado seja sempre não consensual. O resultado final, quando avaliado clinicamente, parece muito bom tanto na esofagectomia quanto na mucosectomia. As grandes vantagens para o doente e para o serviço de saúde são o menor índice de complicações, menor tempo cirúrgico e menores tempos de internação em UTI e hospitalar total. O uso dessa técnica requer bom treinamento e em alguns pacientes, ela se mostrou de difícil execução, especialmente se havia operação anterior e/ou muitas aderências no órgão.

A mucosectomia esofágica mostrou-se vantajosa com relação ao pós-operatório imediato, com menor média de tempo cirúrgico, de internação total, em UTI e após a operação; e menor índice de complicações. As complicações no intra-operatório e o tempo de internação em UTI foram significativamente menores (p<0,05). No pós-operatório tardio, o resultado foi muito bom nas duas operações.

CONCLUSÃO

A mucosectomia esofágica mostrou-se boa alternativa no tratamento cirúrgico do megaesôfago avançado. Foi vantajosa no pós-operatório imediato por apresentar menor média de tempo na operação, na internação total, na UTI; e no índice de complicações. No pós-operatório tardio, o resultado foi excelente e bom nas duas operações.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2015

Histórico

  • Recebido
    12 Ago 2014
  • Aceito
    25 Nov 2014
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