Acessibilidade / Reportar erro

O mito da ineficiência alocativa das emendas parlamentares2 2 O autor agradece pelos valiosos comentários e sugestões feitos por Júlia Rodrigues, Paulo Bijos e três pareceristas anônimos da Revista Brasileira de Ciência Política.

The myth of the allocative inefficiency of parliamentary amendments

Resumo:

Emendas parlamentares ao orçamento são geralmente associadas à aplicação ineficiente de recursos públicos, pois possibilitam concentração de benefícios e socialização de custos. O presente estudo aduz que as escolhas dos legisladores e as consequências delas resultantes podem ser bem representadas pelas alegorias do dilema do prisioneiro e da tragédia dos comuns. Em outro sentido, parte da literatura destaca que referidas proposições servem-se à qualificação do sistema democrático, mencionando benefícios como responsividade à demanda local, transparência e accountability. Na tentativa de reconciliar as visões em comento, o trabalho apresenta um modelo que internaliza as características da processualística legislativa no país e se vale das contribuições da teoria do federalismo fiscal para demonstrar que a descentralização de recursos viabilizada por tais instrumentos é capaz de promover ganhos de bem-estar. Particularmente, em ambiente caracterizado por incertezas e assimetria de informação, a destinação de recursos via emenda parlamentar promove maior bem-estar social, comparativamente à decisão alocativa do governo central.

Palavras-chave:
Emendas individuais; Eficiência; Responsividade; Bem-estar social

Abstract:

Parliamentary amendment appropriations are usually associated with inefficient use of public resources, as they allow for targeted benefits while the costs are dispersed throughout society. This essay adds that the legislator’s choices and its consequences can be depicted by the prisoner’s dilemma and the tragedy of commons. Conversely, some studies highlight that these initiatives improve the democratic system, mentioning benefits such as responsiveness to local demand, transparency, and accountability. To reconcile both perspectives, drawing on the contributions from fiscal federalism theory, the paper presents a model which incorporates the rigidities inherent to legislative procedures aiming to demonstrate that budgetary decentralization can spur social welfare gains. Notably, in an environment characterized by uncertainty and asymmetric information, the practice promotes higher levels of social welfare in comparison to allocative decision-making by central government.

Keywords:
Parliamentary amendments; Efficiency; Responsiveness; Social welfare

Introdução

Mitos são valiosas narrativas que, por representarem verdades profundas da mente coletiva, possuem eficácia social, apresentando-se como interpretações da realidade e mecanismos unificadores de grupos e indivíduos (ROCHA, 1996ROCHA, Everardo. O que é mito. São Paulo: Editora Brasiliense, 1996.; CHAUÍ, 2000CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000.).

De seu lado, emendas parlamentares ao orçamento público - proposições legislativas que tencionam modificar o projeto de lei orçamentária anual - são geralmente identificadas como iniciativas paroquiais e fisiológicas, convertendo-se em objeto de tradicional desconfiança diante da opinião pública. A visão comum é que tais despesas têm motivação puramente política e não são justificáveis sob a ótica econômica. Em torno delas, construiu-se o mito da ineficiência alocativa.

A ineficiência em comento surge da oportunidade de concentrar benefícios e socializar custos via intervenção estatal; o sistema de incentivos posto - especialmente o fenômeno do universalismo e o papel exercido pela conexão eleitoral no ambiente político - condiciona e encoraja o comportamento dos patrocinadores de projetos ineficientes. Argumenta-se, nesse contexto, que as escolhas dos legisladores, bem como as consequências delas resultantes, podem ser bem representadas pelas alegorias do dilema do prisioneiro e da tragédia dos comuns.

De outra parte, parcela do corpo de pesquisa ressalta que emendas parlamentares promovem responsividade, accountability e transparência e, portanto, instrumentalizam e qualificam o funcionamento das instituições democráticas.

É possível harmonizar referidas visões antagônicas? Este artigo oferece resposta positiva ao questionamento em tela: à luz das contribuições da teoria do federalismo fiscal, afirma-se que emendas parlamentares individuais ao orçamento são um mecanismo eficiente na promoção do bem-estar social. Referida constatação, deveras negligenciada pela literatura pertinente, é central ao esforço de reconciliação entre preocupações externadas por um e outro lado do debate.

O argumento ora esposado recebe sentido preciso mediante solução de modelo que, a partir das contribuições da teoria sobre descentralização fiscal, internaliza as características da processualística legislativa no país para examinar o benefício social da alocação de recursos via emendas parlamentares individuais. Os resultados formalizam a tese de que, em um ambiente caracterizado por incertezas e assimetria de informação, a destinação de recursos via emenda parlamentar promove maior bem-estar, comparativamente à decisão alocativa do governo central. Regulado o fundo comum, desfaz-se o mito e afasta-se a pecha de ineficiência que acompanha emendas parlamentares individuais ao orçamento público.

Além desta introdução, o texto está organizado como se segue: o capítulo 2 aborda as distorções e o sistema de incentivos que moldam o comportamento parlamentar diante de emendas ao orçamento, tidas por intrinsicamente ineficientes. No capítulo 3, apresenta-se o caso a favor de tais instrumentos, sublinhando os benefícios que advêm de descentralizações de recursos do governo central para aplicação segundo interesses locais. Modelo formal, análises e resultados pertinentes são objeto do capítulo 4. Por fim, o capítulo 5 traz as considerações finais.

Emendas parlamentares: distorções e sistema de incentivos

Emendas parlamentares ao orçamento da União são proposições legislativas que tencionam modificar o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) apresentado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional, de modo a influir na alocação de recursos públicos (BRASIL, 2014BRASIL. Câmara dos Deputados. Glossário do Portal da Câmara dos Deputados. Brasília-DF, 2014. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/glossario/arquivos/glossario-em-formato-pdf . Acesso em: 13 jun. 2020.
https://www2.camara.leg.br/glossario/arq...
). Interessam ao presente estudo, especialmente, as emendas parlamentares na modalidade individual, de autoria de deputados e senadores, em que cada parlamentar aponta objeto e beneficiário do gasto público por ele especificado na LOA.

A literatura categoriza tais instrumentos como pork barrel spending, expressão em inglês que designa políticas distributivas cujos benefícios (e beneficiários) do gasto concentram-se em uma localidade ou reduto eleitoral específico, enquanto os custos delas derivados são dispersos, via tributação, para uma base geográfica mais ampla (LANCASTER, 1986LANCASTER, Thomas D. Electoral structures and pork barrel politics. International Political Science Review, London, v. 7, n. 1, p. 67-81, 1986.; LAZARUS, 2010LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010.; BAIÃO; COUTO, 2017BAIÃO, Alexandre. Lima; COUTO, Cláudio Gonçalves. A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados. Opinião Pública, [Online] v. 23, n. 3, p. 714-753, set/dez. 2017.).

Uma investigação sobre a origem norte-americana do termo pork barrel (barril de carne de porco) revela que o uso da metáfora em questão atribui, de partida, juízo inerentemente depreciativo a gastos dessa natureza:

Nas plantações dos Estados sulistas, na época da escravidão, havia o costume de distribuir entre os escravos, periodicamente, rações de carne de porco salgada. Como a carne de porco era geralmente acondicionada em grandes barris, o método de distribuição envolvia destampar o barril e exigir que cada escravo viesse até o local receber sua porção. Muitas vezes, a ânsia dos escravos resultava em uma corrida ao barril, onde cada um deles se esforçava para conseguir o máximo de carne possível para si. Membros do Congresso, na sua corrida para incluir dotações locais em leis genéricas [...], se comportam tais quais escravos se lançando sobre o barril de carne de porco (MAXEY, 1919MAXEY, Chester C. A little history of pork. National Municipal Review, [Online], v. 8, n. 10, p. 691-705, Dec. 1919. , p. 693).

Políticas do tipo pork são, portanto, associadas a práticas clientelistas e paroquialistas; emendas individuais - que representariam “a institucionalização do patrimonialismo” (MENDONÇA, 2015MENDONÇA, Eduardo. O falso orçamento impositivo: A institucionalização do patrimonialismo. JOTA, [Online], fev. 2015. Coluna Constituição e Sociedade. Disponível em: Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/constituicao-e-sociedade-o-falso-orcamento-impositivo-18022015 . Acesso em: 31 ago. 2020.
https://www.jota.info/opiniao-e-analise/...
, p. 1) - são vistas como alternativa inferior a programas universais ou políticas definidas por critérios objetivos de elegibilidade (BERTHOLINI; PEREIRA; RENNÓ, 2018BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018.). Ecoando a avaliação em comento, parcela da opinião pública avalia que esse tipo de emenda parlamentar “resulta normalmente em pulverização de recursos e, portanto, em aplicações ineficientes do ponto de vista das políticas nacionais. A maior parte dessas transferências representa desperdício”. (A BARGANHA..., 2012A BARGANHA das emendas. O Estado de São Paulo, São Paulo, 23 nov. 2012. Disponível em: https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-barganha-das-emendas-imp-,963972.
https://opiniao.estadao.com.br/noticias/...
).

A ineficiência acima referida deriva da crença de que emendas individuais impõem à sociedade custos que excedem os benefícios sociais delas derivados. O problema ganharia ainda maior escala diante da constatação de que tais gastos são governados por uma norma de universalismo, quando a grande maioria - se não o total - dos parlamentares, e seus respectivos redutos eleitorais, são aquinhoados com a benesse (BARON, 1991BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991.).

Ademais, para além do rótulo de ineficiência, emendas parlamentares são marcadas pelo estigma da corrupção; escândalos associados a tais instrumentos, como os casos dos anões do orçamento e da máfia das sanguessugas (GONÇALVES, 2010GONÇALVES, André. Dinheiro público: orçamento da União é foco constante de casos de corrupção. Gazeta do Povo, 11 dez. 2010. Vida Pública. Disponível em: Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/orcamento-da-uniao-e-foco-constante-de-casos-de-corrupcao-15rxkk18d78tyngm5jn6n7nta/ . Acesso em: 29 ago. 2020.
https://www.gazetadopovo.com.br/vida-pub...
) acabam por reforçar, no imaginário público, a citada associação. Também a pesquisa empírica aponta conclusões nesse sentido: utilizando dados do Programa de Fiscalização a partir de Sorteios Públicos da Controladoria-Geral da União, produzidos entre os anos de 2006 e 2007, Sodré e Alves (2010)SODRÉ, Antônio Carlos de Azevedo; ALVES, Maria Fernanda Colaço. Relação entre emendas parlamentares e corrupção municipal no Brasil: estudo dos relatórios do programa de fiscalização da Controladoria-Geral da União. Revista de Administração Contemporânea, [Online], v. 14, n. 3, p. 414-433, maio-jun. 2010. defendem que a transferência de recursos mediante emendas parlamentares contribui para o aumento da corrupção. Segundo os autores, municípios que receberam recursos dessa natureza apresentaram, em média, 25% mais episódios de corrupção.

De modo a melhor situar o leitor no contexto em debate, as subseções seguintes oferecem breve revisão sobre ineficiência e universalismo, bem como acerca do sistema de incentivos institucionais que condiciona a alocação de recursos via emendas parlamentares individuais.

Ineficiência e universalismo

Políticas distributivas, como visto, permitem concentração de benefícios e socialização de custos (LOWI, 1972LOWI, Theodore J. Four systems of policy, politics, and choice. Public Administration Review, Washington, D. C., v. 32, n. 4, p. 298-310, July-Aug. 1972. ; BARON, 1991BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991.). É justamente tal descasamento - entre os grupos interessados na entrega e financiamento do bem público provido pela iniciativa governamental - que está na origem da ineficiência na alocação de recursos via emendas individuais.

Com efeito, considere a existência de N distritos (N > 1) em um país, cada um deles representado por um parlamentar em uma assembleia nacional (por simplicidade, todos os distritos contam com a mesma população, cujos integrantes arcam com carga tributária uniforme e possuem idênticas preferências). Deseja-se, então, destinar determinado projeto, de custo C, a um dos distritos do país, d; o benefício derivado do projeto, B (B > 0), será totalmente absorvido pelo distrito destinatário do gasto. Note que, nessa situação, o custo imposto à população do distrito d será de C/N, enquanto o benefício auferido será B; os demais distritos suportarão idêntico custo, porém, não colherão benefícios do projeto. Para um planejador central, a implementação do projeto somente se justifica, do ponto de vista econômico, se há superávit agregado na iniciativa, isto é, se B > C; por outro lado, sob a perspectiva do distrito d (ou de um legislador que busque maximizar o superávit local, como assumido neste exemplo), é suficiente que B > C/N, ou seja, o limiar paradigma da análise custo-benefício, critério decisório de interesse, é bem menos exigente, o que pode levar à realização de projetos indesejados para a sociedade como um todo (precisamente, projetos tais que C/N < B < C). Assim, o conjunto de projetos, que será implementado mediante escolha local, admite subconjunto de projetos ineficientes, tal subconjunto cresce à medida que aumenta o número de distritos do país. Em síntese:

[...] modelos de políticas distributivas preveem que legisladores demandarão projetos ineficientes, com grau de ineficiência crescente no número de distritos, o que ocasionará maiores gastos públicos. O relacionamento entre eficiência e tamanho da legislatura é frequentemente referido como a “lei de 1/N” (PRIMO; SNYDER JR., 2008PRIMO, David M.; SNYDER JR., James M. Distributive politics and the Law of 1/n. Journal of Politics, Chicago, v. 70, n. 2, p. 477-486, Apr. 2008., p. 477).

No exemplo anterior, é natural questionar a probabilidade de aprovação de um tal projeto ineficiente pela assembleia nacional, em um sistema de votação majoritária. Em princípio, uma vez que os distritos não beneficiados por referido projeto acabariam liquidamente em pior situação, a iniciativa não alcançaria a maioria de votos necessária para seu prosseguimento (KREHBIEL,1991KREHBIEL, Keith. Information and legislative organization. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1991.).

Ocorre, contudo, que parlamentares interessados em projetos do tipo pork podem compor uma coalização mínima vencedora, a qual garantiria a aprovação de iniciativas dessa natureza. Nesse sentido, o patrocínio e a implementação de projetos ineficientes seriam inerentes a um sistema que prevê a regra da maioria como mecanismo de decisão (BARON, 1991BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991.).

Shepsle e Weingast (1981)SHEPSLE, Kenneth A.; WEINGAST, Barry R. Political preferences for the pork barrel: a generalization. American Journal of Political Science, Madison, v. 25, n. 1, p. 96-111, Feb. 1981. vão além e afirmam que os atores políticos optam pelo estabelecimento de quase-unanimidades com respeito a políticas distributivas submetidas a exame parlamentar. Referida preferência decorre da “instabilidade das coalizões mínimas vencedoras, incerteza prévia acerca da composição dessas coalizões e do custo de organização e monitoramento dos demais componentes do grupo” (WEINGAST; SHEPSLE; JOHNSEN, 1981WEINGAST, Barry. R.; SHEPSLE, Kenneth A.; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: a neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, [Chicago], v. 89, n. 4, p. 642-664, Aug. 1981., p. 651). A norma do universalismo funciona, por conseguinte, como um seguro contra tais incertezas e suprime os custos supracitados. Os autores registram, adicionalmente, a prática da reciprocidade como relevante instrumento que facilita o processo de negociação e troca de votos (logrolling) no parlamento. No contexto do trâmite legislativo pertinente ao projeto de lei do orçamento, a literatura assinala a observância do universalismo no Brasil: “os parlamentares brasileiros aprovam praticamente todas as suas emendas [...]. As normas de universalismo, portanto, garantem que todo deputado tenha a oportunidade de ter seus projetos inscritos na lei orçamentária” (BAIÃO; COUTO, 2017BAIÃO, Alexandre. Lima; COUTO, Cláudio Gonçalves. A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados. Opinião Pública, [Online] v. 23, n. 3, p. 714-753, set/dez. 2017., p. 718).

Além dos já mencionados interesse parlamentar e equilíbrio que deriva do processo de barganha legislativa, estudos apontam o fenômeno da ilusão fiscal como parte da explicação para a permanência de gastos ineficientes no menu de intervenções governamentais. Como explica Baron (1991, p. 61)BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991., cuida-se de uma ilusão que acomete os eleitores locais, no sentido de que “eles conseguem distinguir os benefícios oriundos dos projetos de seu interesse, mas falham em reconhecer os custos que lhe são impostos, pois os projetos são financiados por outros distritos”. Essa espécie de miopia favorece, então, a realização de despesas com custos difusos e benefícios concentrados.

Niou e Ordeshook (1985)NIOU, Emerson M. S.; ORDESHOOK, Peter C. Universalism in Congress. American Journal of Political Science, Madison, v. 29, n. 2, p. 246-258, May 1985. formalizam essas ideias, demonstrando a convergência entre universalismo e ineficiência mesmo na ausência de cooperação parlamentar: legisladores buscam maximizar a sua probabilidade de reeleição, que, por seu turno, é função crescente do benefício por eles destinados a seus respectivos distritos eleitorais; os eleitores, de seu lado, podem escolher na urna entre representantes que somente votarão a favor de projetos eficientes, ou parlamentares que buscarão servir aos interesses do eleitorado, mediante a canalização de benefícios locais, assumindo como dado o comportamento dos demais legisladores. Nesse cenário, o universalismo exsurge como escolha ótima, acomodando diretamente a presença de despesas ineficientes.

Conclusão análoga é oferecida por Schwartz (1994)SCHWARTZ, Thomas. Representation as agency and the pork barrel paradox. Public Choice, Dordrecht, v. 78, n. 1, p. 3-21, Jan. 1994.: em um framework que atribui a cada legislador o direito de determinar a alocação de seu respectivo distrito, sem interferência de seus pares - justo o que se observa na prática brasileira -, o abandono da coalização vencedora (no caso, uma unanimidade) deixa o distrito do legislador abdicante em pior situação, uma vez que é positivo o produto marginal para os eleitores, ou seja, a diferença entre permanecer ou deixar a coalizão.

Conforme se verá, na subseção adiante, as interpretações e os resultados pertinentes à ineficiência na alocação de recursos via emendas individuais podem ser relacionados a duas alegorias fartamente presentes na literatura: o dilema do prisioneiro e a tragédia dos comuns.

Dilema do prisioneiro e tragédia dos comuns

As explicações ofertadas acima remetem naturalmente a um conhecido problema na teoria dos jogos: trata-se do “dilema do prisioneiro”, em que a estratégia dominante é não cooperar, embora a cooperação trouxesse maiores benefícios aos jogadores.

De fato, sejam D1 e D2 distritos de um país e R1 e R2, seus respectivos representantes (pode-se considerar que D2 representa, por exemplo, a agregação de todos os demais distritos do país, à exceção de D1). Admita-se, ademais, a seguinte matriz de payoffs, que ilustra ganhos e perdas relacionados à atitude dos representantes em patrocinar, ou não, projetos - ineficientes, por premissa - para seus respectivos distritos:

Tabela 1.
Matriz de payoffs para jogo de patrocínio de projetos ineficientes

O jogo possui como estratégia ótima, no sentido de Pareto, a rejeição ao pork por ambos os representantes, i.e., (0,0): nessa situação, atinge-se o maior nível de utilidade agregada (0, ante -2 quando apenas um representante avaliza o pork, e -4 quando ambos o fazem) e, além disso, somente é possível elevar a utilidade de um indivíduo ao custo da imposição de perdas a terceiros (por exemplo, quando se passa ao ponto (-3,1), R1 patrocina o projeto e isto incrementaria seu benefício em uma unidade, porém R2 suportaria agora uma desutilidade de -3). Entretanto, tendo em vista que, partindo de (0,0), qualquer dos representantes pode auferir maior benefício caso decida unilateralmente por patrocinar o pork, a solução Pareto-ótima não configura um equilíbrio de Nash, uma vez que este só ocorre quando nenhum jogador pode obter maior payoff ao mudar sua estratégia de modo unilateral. Com efeito, a estratégia dominante, que determina o equilíbrio do jogo, é o patrocínio de projetos ineficientes por R1 e R2. Isso ocorre porque ambos os representantes buscam evitar a situação em que seus distritos pagarão por projetos ineficientes, mas não auferirão quaisquer benefícios (isto é, quando o representante abre mão do projeto local e sua contraparte escolhe patrocinar a despesa ineficiente em benefício próprio). É racional, portanto, a escolha do representante pela implementação de um projeto local ineficiente, ainda que essa não seja a solução desejável do ponto de vista do bem-estar social agregado.

Um outro paralelo que pode ser traçado para melhor compreender a persistência de alocações ineficientes de despesas públicas federais na esfera local, via emendas parlamentares, advém da situação designada por tragédia dos comuns, quando incentivos individuais acarretam o uso excessivo e a depleção dos recursos de uso público (HARDIN, 1968HARDIN, Garrett. The tragedy of the commons. Science, [Online], v. 162, n. 3859, p. 1243-1248, Dec. 1968.).

De acordo com Martinez-Vazquez, (2011, p. 9)MARTINEZ-VAZQUEZ, Jorge. The impact of fiscal decentralization: issues in theory and challenges in practice. Mandaluyong: Asian Development Bank, 2011. Disponível em: Disponível em: https://www.adb.org/publications/impact-fiscal-decentralization-issues-theory-and-challenges-practice . Acesso em: 13 jun. 2020.
https://www.adb.org/publications/impact-...
, “certos arranjos institucionais permitem a exploração local do patrimônio fiscal comum (conjunto das receitas tributárias da nação), exportando-se a carga tributária para outras regiões”. A descentralização de recursos federais com vistas à oferta de bens públicos locais, tal como ocorre no caso de emendas individuais ao orçamento, ilustra o ponto do autor. Efetivamente, cada parlamentar enxerga o montante de receitas arrecadadas como patrimônio fiscal comum; havendo possibilidade de explorar tal fundo público, a destinação de receitas nacionais para benfeitorias locais lhe proporciona ganhos superiores às perdas individuais, dado que o bônus é concentrado, mas a redução patrimonial do fundo será um custo compartilhado com todos os demais parlamentares. Diante de tal constatação, todo parlamentar racional buscaria, sempre e mais, aumentar a parcela extraída do fundo comum em benefício próprio, de modo que o crescimento contínuo das apropriações individuais levaria à ruína do fundo público. Daí a tragédia antevista por Hardin, em uma adaptação de seu conto original, que conclui: “liberdade de uso de bens comuns arruína a todos” (HARDIN, 1968HARDIN, Garrett. The tragedy of the commons. Science, [Online], v. 162, n. 3859, p. 1243-1248, Dec. 1968., p. 1244).

Em certa medida, os resultados e incentivos evidenciados no “dilema do prisioneiro” e na “tragédia dos comuns” estão presentes e orientam, ainda que de maneira implícita, boa parte da literatura que busca ofertar explicações para a (talvez contraintuitiva) manutenção, ao longo do tempo, de políticas do tipo pork. Weingast, Shepsle e Johnsen (1981)WEINGAST, Barry. R.; SHEPSLE, Kenneth A.; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: a neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, [Chicago], v. 89, n. 4, p. 642-664, Aug. 1981., por exemplo, em ensaio que modela o comportamento parlamentar diante de projetos ineficientes, identificam dois importantes vieses na decisão política pertinente:

Primeiro, despesas focalizadas em um local são vistas pelos eleitores da região como benefícios. Segundo, a divisão política em distritos, em conjunto com o sistema de tributação, oferece incentivos para aumentar o tamanho do projeto além do ponto eficiente (WEINGAST; SHEPSLE; JOHNSEN, 1981WEINGAST, Barry. R.; SHEPSLE, Kenneth A.; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: a neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, [Chicago], v. 89, n. 4, p. 642-664, Aug. 1981., p. 658).

Vale, aqui, breve e oportuna digressão: a existência de determinados arranjos institucionais, tais como um conjunto de regras procedimentais pertinentes à produção legislativa, tem o condão de induzir um equilíbrio distinto do previsto pelas alegorias acima - esse é o conceito de structure-induced equilibrium (SHEPSLE, 1979SHEPSLE, Kenneth A. Institutional arrangements and equilibrium in multidimensional voting models. American Journal of Political Science, Madison, v. 23, n. 1, p. 27-59, Feb. 1979.), ao qual se recorrerá oportunamente na formalização do argumento central deste trabalho.

Retomando a exposição, cabe mencionar a existência de diversas pesquisas que apontam motivações adicionais, de natureza complementar, às questões até aqui apresentadas, as quais justificariam a perpetuação dos projetos em comento. Essa discussão é aprofundada no tópico seguinte.

Outros incentivos institucionais

Em primeiro lugar, e na raiz do comportamento parlamentar que busca maximizar o superávit local, dando azo à sobredita ineficiência, está o relevante papel exercido pela conexão eleitoral no ambiente político. No dizer de Monteiro, (2010, p. 535)MONTEIRO, Jorge Vianna. Elementos da conexão eleitoral. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 44, n. 2, p. 533-544, mar-abr. 2010., conexão eleitoral “refere-se à habilidade de os eleitores se disporem a não renovar o mandato eletivo do político [...], caso o eleitor não apoie o desempenho pregresso desse político”.

Lazarus (2010, p. 339)LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010. afirma que “a conexão eleitoral influencia praticamente tudo o que os membros fazem”. O autor, discorrendo sobre o caso estadunidense, enumera três razões para elucidar a popularidade do pork barrel spending entre parlamentares:

Primeiro, esses projetos demonstram que o congressista é um legislador efetivo e pode fazer coisas pelo eleitorado em Washington. Segundo, depois de projetos do gênero garantirem sua segurança eleitoral, o parlamentar tem maior liberdade para dedicar-se a outras questões. Terceiro, pork spending demonstra segurança eleitoral e, assim, inibe oposição política (LAZARUS, 2010LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010., p. 339).

Na mesma linha, Evans (2011, p. 1)EVANS, Diana. Pork barrel politics. In: SCHICKLER, Eric; LEE, Frances (orgs.). The Oxford Handbook of the American Congress. [Online]: Oxford University Press, 2011. sublinha “o papel central do pork na conexão entre políticos e seus eleitores, demonstrando que o desejo de atender aos interesses materiais dos votantes é um fato fundamental da vida legislativa”.

Ao tratarem especificamente da realidade brasileira, Ames, Pereira e Rennó (2011)AMES, Barry; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Famintos por pork: uma análise da demanda e oferta por políticas localistas e suas implicações para a representação política. In: POWER, Timothy; ZUCCO JR., Cesar (orgs.). O Congresso por ele mesmo: autopercepções da classe política brasileira. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 239-272. enfatizam que o interesse por questões locais é naturalmente mais pronunciado entre os eleitores - pesquisa conduzida pelos autores revelou que a maioria (64%) dos entrevistados prefere que o deputado auxilie seu município, ante 31% que anseiam por uma atuação mais centrada em projetos de interesse nacional e 4% que esperam ajuda pessoal. Ao mesmo tempo, a destinação de recursos federais via emendas parlamentares individuais é uma das principais maneiras de abordar tais problemas e, na percepção da maior parte dos congressistas (60%), tais emendas orçamentárias proporcionam elevado dividendo eleitoral, pelo que consistem em elemento central para suas respectivas estratégias políticas. No mesmo sentido, pesquisa de opinião junto aos gabinetes parlamentares da Câmara dos Deputados concluiu que a apresentação e a execução de emendas individuais são vistas como atividades políticas importantes para o mandato parlamentar (GREGGIANIN, 2014GREGGIANIN, Eugênio. Estudo Técnico nº 16, de 2014. Pesquisa de opinião junto aos gabinetes parlamentares da Câmara dos Deputados: Emendas orçamentárias: importância para os municípios, execução das emendas, orçamento impositivo, orçamento participativo. Brasília: Câmara dos Deputados - Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira, 2014. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2014/et16.pdf . Acesso em: 12 jun. 2020.
https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-...
).

Assim, a conexão eleitoral relaciona-se consideravelmente à teoria do voto retrospectivo, baseada em ganhos materiais já realizados (SINGER, 1998SINGER, André. Ideologia e economia na decisão de 1994. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 22., 1998, Caxambu. Anais eletrônicos [...]. Caxambu: ANPOCS, 1998. p. 1-58. Disponível em: Disponível em: https://www.anpocs.com/index.php/encontros/papers/22-encontro-anual-da-anpocs/gt-20/gt08-16/5094-andresinger-ideologia/file . Acesso em: 13 jun. 2020.
https://www.anpocs.com/index.php/encontr...
). Nesse contexto, a possibilidade de reeleição, enquanto vetor de ineficiência na alocação da despesa pública, é outro elemento que tem recebido atenção da doutrina (LANCASTER, 1986LANCASTER, Thomas D. Electoral structures and pork barrel politics. International Political Science Review, London, v. 7, n. 1, p. 67-81, 1986.). A esse exemplo, Weingast, Shepsle e Johnsen (1981)WEINGAST, Barry. R.; SHEPSLE, Kenneth A.; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: a neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, [Chicago], v. 89, n. 4, p. 642-664, Aug. 1981. apontam que o mecanismo de reeleição, aliado à diluição dos custos tributários, explica a ineficiência da escolha alocativa da classe política.

As regras que definem a estrutura eleitoral do país também podem contribuir para a proliferação de políticas distributivas de cunho local. Lancaster (1986)LANCASTER, Thomas D. Electoral structures and pork barrel politics. International Political Science Review, London, v. 7, n. 1, p. 67-81, 1986. enuncia diversas características interrelacionadas, que, se presentes no sistema eleitoral, favorecem a criação de um ambiente político inclinado a tal prática: identificação do político com uma base territorial específica (quanto maior o vínculo, maior a motivação parlamentar para patrocinar projetos locais); baixa disciplina partidária; voto preferencial, ou em lista aberta, que aumenta os incentivos para que políticos se tornem mais visíveis perante seus eleitores; baixo número de representantes por distrito eleitoral; sistema de governo não-parlamentarista.

Examinando-se o caso do Brasil, percebe-se que tais particularidades estão, em larga medida, contempladas pelas instituições políticas do país. Baião e Couto (2017)BAIÃO, Alexandre. Lima; COUTO, Cláudio Gonçalves. A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados. Opinião Pública, [Online] v. 23, n. 3, p. 714-753, set/dez. 2017. ressaltam, em revisão de literatura, que boa parte das análises sobre o sistema brasileiro fundam-se na ideia de que o voto pessoal, favorecido por distritos grandes e lista aberta, torna o país “um caso extremo de sistema candidate-centered, em que a elevada competição intrapartidária estimularia deputados a fortalecer suas reputações pessoais em detrimento dos objetivos do partido” (BAIÃO; COUTO, 2017BAIÃO, Alexandre. Lima; COUTO, Cláudio Gonçalves. A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados. Opinião Pública, [Online] v. 23, n. 3, p. 714-753, set/dez. 2017., p. 716).

Por fim, há de se mencionar o potencial deletério sobre o resultado alocativo de regras regimentais que coíbem a atuação parlamentar. Especificamente, no que concerne à possibilidade de alteração, por parlamentares de outras bases eleitorais, de projetos cujo interesse na aprovação é geograficamente concentrado, “quanto mais restritivo o processo de emendamento, mais ineficiente o conjunto de programas que pode ser aprovado. Se há incentivo ao uso de regras limitadoras [...] a teoria prevê que políticas pork barrel podem ser um custo associado a tais restrições” (BARON, 1991BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991., p. 85).

Novamente, voltando-se o olhar para a prática brasileira, nota-se que as regras que norteiam o processo legislativo orçamentário, com destaque para a Resolução 1/2006 do Congresso Nacional (BRASIL, 2006BRASIL. Câmara dos Deputados. Resolução n. 1, de 2006-CN. Dispõe sobre a Comissão Mista Permanente a que se refere o § 1º do art. 166 da Constituição, bem como a tramitação das matérias a que se refere o mesmo artigo. Brasília: Câmara dos Deputados, 2006. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/rescon/2006/resolucao-1-22-dezembro-2006-548706-normaatualizada-pl.html . Acesso em: 06 jun. 2020.
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/res...
), contemplam uma série de restrições à modificação da proposta de orçamento encaminhada pelo Poder Executivo. Individualmente considerado, o parlamentar possui larga margem de liberdade para definir o destino da parcela de recursos que lhe foi previamente reservada; além de referido domínio, contudo, pouco pode fazer. Mesmo os legisladores designados para examinar e apresentar o orçamento das áreas temáticas, (i.e. saúde, educação e cultura, defesa e justiça etc.), chamados relatores setoriais, não podem tomar iniciativa que promova mudanças mais profundas no projeto orçamentário submetido à discussão do Congresso. Assim, a discussão sobre grandes temas e prioridades nacionais passa ao largo da deliberação legislativa. Nesse sentido, pode-se argumentar que a dita atuação paroquial da classe parlamentar, com a aprovação de despesas locais ineficientes no contexto do orçamento público, é reforçada pelo conjunto de restrições regimentais que impõem miopia ao legislador.

As razões acima explicitadas compõem o argumento que ressalta as características e os efeitos negativos associados a emendas parlamentares ao orçamento público. A bem do debate, é preciso, então, abrir espaço para a narrativa que, em outro sentido, destaca pontos favoráveis ao instrumento. De fato, nessa perspectiva, emendas parlamentares promovem responsividade, accountability e transparência e, portanto, instrumentalizam e qualificam o funcionamento das instituições democráticas. O capítulo 3 detalha tais considerações.

O outro lado: em defesa do instrumento

Distanciando-se da visão até aqui exposta, parcela relevante da literatura nacional aponta que a execução de emendas parlamentares individuais compõe o conjunto de bens de troca de que dispõe o presidente da república para a gerência da coalizão de governo (BERTHOLINI; PEREIRA, 2017BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos. Pagando o preço de governar: custos de gerência de coalizão no presidencialismo brasileiro. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 51, n. 4, p. 528-550, jul/ago. 2017.); uma vez que referida coalizão é requisito de governabilidade imposto pelo sistema político brasileiro (ABRANCHES, 1988ABRANCHES, Sérgio Henrique Hudson de. Presidencialismo de coalizão: o dilema institucional brasileiro. Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 31, n. 1, p. 5-34, 1988.), as emendas individuais representam um instrumento de baixo custo utilizado pelo Poder Executivo para implementar sua agenda, que, em geral, engloba bens públicos de interesse nacional, voltados ao alcance de objetivos, tais como promoção do crescimento econômico e redução de desigualdades (ALSTON; MUELLER, 2005ALSTON, Lee; MUELLER, Bernardo. Pork for policy: executive and legislative exchange in Brazil. Journal of Law, Economics and Organization, Oxford, v. 22, n. 1, p. 87-114, Nov. 2005.). É possível que a promulgação da Emenda Constitucional 86/2015 - que tornou obrigatória a execução das programações incluídas na LOA por emendas individuais - tenha perturbado, em alguma medida, a dinâmica em questão. Santos e Gasparini (2020)SANTOS, Núbia Cristina Barbosa; GASPARINI, Carlos Eduardo. Orçamento impositivo e relação entre poderes no Brasil. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 31, p. 339-396, jan.-abr. 2020., porém, apontam que o novo regramento constitucional não alterou de maneira significativa as relações entre os poderes: diante da possibilidade de indicar impedimentos técnicos ou de promover limitação de empenho e movimentação financeira (contingenciamento), o Executivo ainda conserva certo grau de discricionariedade na decisão de executar, ou não, referidas programações.

Ademais, parte do corpo de pesquisa dedicado ao estudo do sistema democrático e do federalismo fiscal sublinha os benefícios que advêm de descentralizações de recursos do governo central para aplicação segundo interesses locais - gênero que abarca emendas individuais apresentadas ao orçamento federal. As subseções adiante dedicam-se ao tema.

Responsividade e transparência

Inicialmente, cumpre destacar a centralidade do conceito de representação política para a tese defendida. Para Pitkin (1967, p. 209)PITKIN, Hanna F. The concept of representation. London: University of California Press, 1967., “representação significa agir no interesse dos representados, de maneira responsiva a eles”. A autora argumenta:

[n]a extensão em que o teórico enxerga representante e eleitores como relativamente iguais em capacidade, sabedoria e informação, é provável que, para ele, a visão dos eleitores deva ser levada em consideração. Se o representante é um indivíduo comum e falível, sem nenhuma habilidade ou conhecimento especial, ignorar seus eleitores parecerá, a ele próprio, opressor e injustificável (PITKIN, 1967PITKIN, Hanna F. The concept of representation. London: University of California Press, 1967., p. 211).

No mesmo sentido, lembram Tromborg e Schwindt-Bayer: “[...] a democracia representativa está enraizada na relação entre eleitores e seus representantes. De acordo com a visão mais comum sobre o assunto, aqueles eleitos devem ser responsivos aos anseios e preferências dos votantes” (2019, p. 35).

É interessante notar, então, a conotação positiva atribuída à conexão eleitoral mencionada em tópico anterior. Em particular, se a demanda dos eleitores está voltada a projetos locais e estes são entregues via emendas parlamentares ao orçamento, referidas proposições instrumentalizam o regular funcionamento das instituições democráticas, indicando que o sistema de representação é responsivo aos anseios dos cidadãos (BERTHOLINI; PEREIRA; RENNÓ, 2018BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018.).

Adicionalmente, ao destinar recursos para seus respectivos redutos eleitorais, legisladores inclinam-se a projetos cujos atributos refletem, em alguma medida, o interesse público local, uma vez que a maioria de tais iniciativas se originam de pedidos para o financiamento de ações específicas, vindos diretamente da base eleitoral do parlamentar (HIRD, 1990HIRD, John A. Superfund expenditures and cleanup priorities: distributive politics or the public interest? Journal of Policy Analysis and Management, Hoboken, v. 9, n. 4, p. 455-483, 1990.; LAZARUS, 2010LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010.). Tal conclusão tem recebido suporte empírico na literatura: Lazarus (2010)LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010., ao examinar a alocação focalizada de recursos por congressistas norte-americanos, conclui que a maioria dos projetos por eles patrocinados, nas diversas categorias da despesa pública, está significativamente relacionada a indicadores de demanda local, ou seja, os bens financiados pelos repasses são aqueles, de fato, necessários à melhoria das condições da região beneficiada. Os resultados confirmam o funcionamento de um sistema de incentivos que estimula legisladores a customizar projetos de sua autoria de acordo com as preferências de seus eleitores. Del Rossi (1995)ROSSI, Alison F. del. The politics and economics of pork barrel spending: the case of federal financing of water resources development. Public Choice, Dordrecht, v. 85, n. 3/4, p. 285-305, 1995. faz uso de um modelo de decisão legislativa voltado a investigar os elementos que influenciaram a destinação de recursos para projetos de desenvolvimento hídrico, tipicamente associados à prática de pork barrel spending nos EUA; o autor arremata que, a despeito da percepção comum, fatores econômicos desempenham um importante papel na determinação do gasto associado a tais projetos. Tromborg e Schwindt-Bayer (2019)TROMBORG, Mathias W.; SCHWINDT-BAYER, Leslie A. Constituent demand and district-focused legislative representation. Legislative Studies Quarterly, Iowa City, v. 44, n. 1, p. 35-64, Feb. 2019. testam, para a América Latina, a teoria de que legisladores exibem comportamento responsivo às necessidades locais por meio da destinação de bens e recursos aos seus respectivos distritos eleitorais. A pesquisa indica que parlamentares que representam regiões menos urbanizadas - onde residem eleitores mais insatisfeitos com o nível de bens públicos ofertados pelo Estado - são mais inclinados a priorizar o provimento de tais benfeitorias de uso local.

De modo a avaliar o impacto da destinação de emendas individuais ao orçamento federal, Bertholini, Pereira e Rennó (2018)BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018. utilizam técnicas quase-experimentais para perquirir, inicialmente, as razões pelas quais determinadas localidades recebem repasses mediante referida intervenção parlamentar. O estudo conclui:

Municípios mais pobres, de acordo com o PIB per capita, têm maior probabilidade de receber recursos, assim como aqueles com maiores taxas de mortalidade infantil no ano base da amostra (2002), menor índice de emprego e menor renda média. Portanto, características socioeconômicas dos municípios, que indicam a necessidade de transferências, afetam a alocação dos recursos de emendas orçamentárias (BERTHOLINI; PEREIRA; RENNÓ, 2018BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018., p. 709).

Em síntese, emendas parlamentares são bem-sucedidas em destinar recursos aos municípios mais necessitados. Em verdade, a pesquisa evidencia mais do que isso: para além de aderir às demandas locais, a alocação de recursos advindos de emendas individuais promove desenvolvimento e inclusão social. É dizer, também a dimensão do impacto da intervenção estatal, quando mediada por representantes locais, foi positivamente avaliada.

No mesmo sentido, em monografia que propôs averiguar eventuais efeitos das emendas parlamentares no contexto das desigualdades entre regiões, Carvalho (2007, p. 44)CARVALHO, Marcelo de. Efeitos das emendas parlamentares ao orçamento na redução das desigualdades regionais. 2007. Monografia (Especialização em Orçamento Público) - Câmara dos Deputados, Brasília, 2007. indica que tais proposições “têm propensão de reduzir as desigualdades regionais, refletida na melhoria dos indicadores de saúde dos Estados”.

Referidos achados empíricos fragilizam avaliações que associam projetos de interesse local à falta de razoabilidade econômica, que seria, por seu turno, derivada de motivações unidimensionais, políticas. Minimamente, emendas parlamentares individuais não devem ser tratadas como outliers no processo de alocação do universo de despesas públicas:

Em certa medida, esses resultados colocam tais repasses em linha com outros mecanismos usados pelo Congresso para distribuir fundos a diferentes localidades. Pesquisas anteriores demonstram que todos esses mecanismos, mesmo aqueles especificamente desenhados para remover a influência política das decisões de gasto, estão sujeitos à manipulação. Isso vale para repasses obrigatórios definidos por critérios estatísticos [...], bem como para programas em que decisões alocativas são tomadas por burocratas (LAZARUS, 2010LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010., p. 351).

Por extensão, também não são adequadas opiniões que lhe atribuem o monopólio na satisfação de interesses concentrados com custos difusos. Como explica Pennock:

Se examinarmos mais amplamente o uso de fundos públicos para o benefício de grupos identificáveis (agricultores, aposentados, beneficiários de assistência pública em geral, empresários e similares), rapidamente notam-se semelhanças com o fenômeno do pork barrel. [...] [todos] concedem benefícios a grupos especiais e impõem custos que se estendem a todos os contribuintes (PENNOCK, 1970PENNOCK, J. Roland. The “pork barrel” and majority rule: a note. Journal of Politics, [Online], v. 32, n. 3, p. 709-716, Aug. 1970., p. 714).

Os argumentos acima indicam, portanto, que os aspectos negativos então atribuídos à alocação de recursos mediante emendas parlamentares estão potencialmente presentes, de maneira generalizada, na atuação do Poder Executivo ou do Congresso, podendo se materializar via processo legislativo ordinário ou orçamentário, ou mesmo por meio de atuação infralegal da máquina administrativa. O governo central é, basicamente, “um grande redistribuidor de recursos, para Estados, Municípios e pessoas” (SILVA, 2005SILVA, Vera Martins. Regulando o regulador: considerações sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal no federalismo brasileiro. In: CICLO DE DEBATES EM ECONOMIA INDUSTRIAL, TRABALHO E TECNOLOGIA, 3., 2005, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: PUCSP/PEPGEP/EITT, 2005. p. 1-20. Disponível em: Disponível em: https://www5.pucsp.br/eitt/downloads/III_Ciclo_Vera_Martins_Regulando_o_Regulador.pdf . Acesso em: 15 set. 2020.
https://www5.pucsp.br/eitt/downloads/III...
).

Sob essa ótica, rejeita-se também a crítica que antagoniza governos (e representantes) centrais e locais no que concerne aos efeitos da atuação dessas diferentes esferas de poder sobre o bem-estar agregado. Defende-se, nessa linha, que a promoção da convergência de interesses em um contexto federativo é um dos atributos do sistema representativo:

Se um homem representa um certo distrito, então, de acordo com o argumentado anteriormente, sua obrigação é para com o interesse desse distrito. E, em um sentido prático, é política e socialmente importante que interesses locais não sejam impiedosamente desconsiderados e sacrificados em nome da nação. Por outro lado, alguém tem que governar, e o governo nacional deve perseguir os interesses da nação. Se essa tarefa é dada aos legisladores, como um grupo, eles também devem, portanto, cuidar dos interesses nacionais. E, do ponto de vista prático, é política e socialmente importante que não se permita, a interesses locais, prevalecer sobre as necessidades e interesses da nação como um todo [...].

Se assumirmos que a nação e suas partes confrontam-se como países hostis, o problema é, de fato, insolúvel. Com efeito, admitir que o bem estar nacional é soberano impossibilita a representação local. E, do contrário, governos locais não podem ser culpados de objetar os interesses nacionais, se estes forem hostis aos seus próprios. Porém, uma das mais importantes características do governo representativo é sua capacidade de resolver pretensões conflitantes entre as partes, tendo como base o interesse comum no bem estar geral [...].

Um pequeno benefício à nação, às custas de severos prejuízos à uma localidade, pode não ser justificável. Um pequeno benefício a uma localidade que tem como preço sérios danos à nação provavelmente não se justifica. (PITKIN, 1967PITKIN, Hanna F. The concept of representation. London: University of California Press, 1967., p. 216-218).

Nesse diapasão, considerando: (i) que o desenho constitucional confia aos representantes do povo sopesar, na atividade legislativa, interesses de seus respectivos distritos eleitorais e da nação como um todo; (ii) que o próprio resultado do processo legislativo experimentou um processo de depuração inclinado à conciliação das diferentes reinvindicações, analogamente ao que ocorre nos mercados econômicos com sua mão invisível - aqui, a (talvez imperfeita) mão invisível da representação política, resultando na eficiência do sistema democrático (WITTMAN, 1989WITTMAN, Donald. Why democracies produce efficient results. The Journal of Political Economy, Chicago, v. 97, n. 6, p. 1395-1424, Dec. 1989.; FRISCH; KELLY, 2011FRISCH, Sean A.; KELLY, Scott Q. Cheese factories on the moon: why earmarks are good for American democracy. Boulder: Paradigm Publishers, 2011.); e (iii) que a mesma Constituição Federal, aliada a normas de menor estatura, estabelece sistema de repartição de competências materiais cujo financiamento compete às respectivas esferas de poder, conclui-se que emendas parlamentares individuais ao orçamento materializam projetos cujo valor é de interesse nacional, pois complementam e integram a agenda do governo central.

Para ver isso com maior clareza, basta rememorar que a Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO da União traz, tradicionalmente, dispositivo que veda a destinação de recursos orçamentários para ações que desbordem dos limites constitucionais pertinentes às competências dos entes federados - em 2020, por exemplo, trata-se do inc. V do art. 18 da Lei nº 13.898 (BRASIL, 2019aBRASIL. Presidência da República. Lei n. 13.898, de 11 de novembro de 2019. Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e a execução da Lei Orçamentária de 2020 e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2019a. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13898.htm . Acesso em: 07 jun. 2020.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
). Não fosse de interesse da União, portanto, o bem público local objeto de emenda parlamentar sequer poderia receber financiamento federal.

Ademais, na prática legislativa orçamentária, é comum que os diversos ministérios do Poder Executivo elaborem e disponibilizem aos parlamentares cartilhas ou guias para auxiliar na elaboração de emendas, nas quais são explicitadas as políticas públicas, com as respectivas programações orçamentárias, que podem ser apoiadas pela iniciativa do parlamentar. Desta feita, a emenda individual amolda-se a uma intervenção desenhada e gerida pelo governo central, não havendo como disputar a existência de interesse nacional na ocasião.

Vale mencionar, ainda nesse campo semântico, que emendas individuais cultivam bens de elevado interesse social, a saber, transparência e accountability (OATES, 2008OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.; SMART; BIRD, 2009SMART, Michael; BIRD, Richard. Earmarked grants and accountability in government. Rotman School of Management, Toronto, Working Paper n. 1498775, p. 1-26, 2009.). A alocação de recursos por indicação parlamentar está sujeita a intenso escrutínio da coletividade e, atualmente, soluções tecnológicas disponíveis ao público permitem rastrear o objeto das emendas individuais, desde o seu patrocinador até o beneficiário final, incluindo eventuais intermediários que tomaram parte no processo de execução da despesa. Por outro lado, decisões orçamentárias do Poder Executivo - tradicionalmente opaco e povoado por uma burocracia (permanente ou com vínculos políticos) não sujeita ao teste das urnas - são tomadas em gabinetes, mais longe do público e, portanto, de uma forma menos transparente (FRISCH; KELLY, 2011FRISCH, Sean A.; KELLY, Scott Q. Cheese factories on the moon: why earmarks are good for American democracy. Boulder: Paradigm Publishers, 2011.).

Menos expostas à luz solar, não é raro que decisões de gasto do Poder Executivo frustrem a expectativa (implícita na crítica feita a emendas parlamentares individuais) de que a burocracia, no ato de alocar recursos públicos, é superior a membros eleitos do Congresso Nacional. A título de exemplo, auditoria do Tribunal de Contas da União no Programa de Prevenção e Preparação de Desastres do governo federal concluiu que

[...] há falta de critérios técnicos para distribuição de recursos relativos às obras [...], gerando concentração em poucas unidades da federação e que não há correlação entre os municípios que mais recebem recursos e aqueles onde há maiores riscos de ocorrência de desastres. Além disso, a falta de integração entre órgãos do Governo Federal impossibilita que informações a respeito de riscos de ocorrência de desastres sejam utilizadas para subsidiar a alocação de recursos (BRASIL, 2010BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Acórdão 729/2010-TCU-Plenário. Relator: Min. Benjamin Zymler, 7 de abril de 2010. Brasília: TCU, 2010. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/*/KEY%253AACORDAO-COMPLETO-1147771/DTRELEVANCIA%2520desc/0/sinonimos%253Dfalse.
https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/docum...
).

Ainda sobre transparência, controle e respectivos ganhos sobre o fenômeno da corrupção, estudos contraditam teses que pura e simplesmente vinculam emendas parlamentares a desvios de recursos públicos, como se estes fossem resultado inescapável daquelas. Por exemplo, rememore-se o já referido trabalho de Sodré e Alves (2010)SODRÉ, Antônio Carlos de Azevedo; ALVES, Maria Fernanda Colaço. Relação entre emendas parlamentares e corrupção municipal no Brasil: estudo dos relatórios do programa de fiscalização da Controladoria-Geral da União. Revista de Administração Contemporânea, [Online], v. 14, n. 3, p. 414-433, maio-jun. 2010., de onde se extrai que emendas parlamentares contribuem para o aumento da corrupção. Ao mencionar a citada pesquisa, Piola e Vieira apontam fragilidades que podem infirmar as conclusões do artigo: “a medida de corrupção [...] é bastante elástica, pois consideraram-se como evidências de corrupção desde as constatações de irregularidades decorrentes de problemas administrativos até problemas graves apontados pela Controladoria-Geral da União (CGU)” (PIOLA; VIEIRA, 2019PIOLA, Sérgio Francisco; VIEIRA, Fabíola Sulpino. As emendas parlamentares e a alocação de recursos federais no Sistema Único de Saúde. Texto para Discussão 2497. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, jul. 2019., p. 11-12). Na mesma linha, Rennó e Pereira (2013, p. 17)RENNÓ, Lúcio Remuzat; PEREIRA, Carlos Eduardo Ferreira. Gastos públicos, emendas orçamentárias do Legislativo e inclusão dissipativa nos municípios brasileiros: 1998 a 2010. [S. l.: S. n.], 2013. (Monografia submetida ao XVIII Prêmio Tesouro Nacional). Disponível em: https://www.camara.leg.br/internet/agencia/pdf/EmendasOr%C3%A7amentoEfeitoPositivo.pdf.
https://www.camara.leg.br/internet/agenc...
reputam os achados desse mesmo artigo como “pouco convincentes e contraditórios, já que os autores se limitam a uma amostra pequena de municípios em um único período do tempo e deparam-se com resultados contraditórios”.

Ademais, em trabalho que buscou avaliar a relação entre descentralização e corrupção no Brasil entre os anos de 2007 e 2010, e também usando dados extraídos dos relatórios produzidos pela CGU após a realização de fiscalizações em municípios, Nishijima, Postali e Rocha (2017, p. 138)NISHIJIMA, Marislei; POSTALI, Fernando Antonio Slaibe; ROCHA, Fabiana Fontes. Efeitos da descentralização da saúde básica no Brasil sobre o nível de corrupção em municípios investigados pelo governo central. Nova Economia, São Paulo, v. 27, n. 1, p. 117-141, jan-abr. 2017. asseveram: “Os resultados sugerem que a descentralização administrativa reduz o número de ocorrências de irregularidades, enquanto descentralização financeira não afeta significativamente o nível de corrupção”. Dado que as transferências financeiras de recursos aos entes subnacionais são, em boa medida, viabilizadas por emendas parlamentares, a evidência indica, minimamente, que não se deve tomar pelo valor de face resultados que vinculem emendas à prática de corrupção.

Por fim, assinale-se que a literatura registra preocupações acerca da capacidade do governo central em enxergar e atender a demandas locais: Bertholini, Pereira e Rennó (2018)BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018. destacam que, para pequenos municípios brasileiros, a única maneira de obter recursos federais é via emendas parlamentares. Segundo Chiavegati (2006, p. 51)CHIAVEGATI, Luís Fernando. Emendas parlamentares e federalismo brasileiro: entre os comportamentos local e nacional dos parlamentares. 2006. Monografia (Especialização em Pensamento Político Brasileiro) - Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2006., para tais municípios, sujeitos a intensas e constantes restrições orçamentárias, “faz uma grande diferença receber o montante destinado pelas emendas. É a chance de ter alguma de suas demandas de alto custo atendida, como por exemplo, a construção de hospitais, postos de saúde e redes de esgoto”. Em analogia, negar à população de um tal município a possibilidade de ser beneficiada por emendas parlamentares individuais equivaleria, portanto, a negar amparo a um indigente às portas de um hospital público. O excerto adiante resume o ponto:

membros do Congresso prestam valioso serviço a seus eleitorados ao responder a demandas locais de uma maneira que burocratas anônimos são incapazes de fazer; eles levam à atenção do governo problemas locais que podem ser remediados pelo governo federal. Nesse sentido, o Congresso permite que o governo se adapte à realidade local [...], superando soluções padronizadas que são convenientes para a burocracia do Poder Executivo, mas pouco sensíveis às condições locais (FRISCH; KELLY, 2011FRISCH, Sean A.; KELLY, Scott Q. Cheese factories on the moon: why earmarks are good for American democracy. Boulder: Paradigm Publishers, 2011., p. 49).

Essa linha argumentativa abre espaço para o corpo de pesquisa econômica, que aponta o potencial da descentralização fiscal como valioso mecanismo na promoção de bem-estar social, conforme exposto na subseção a seguir.

Descentralização e demanda local

A teoria do federalismo fiscal, em sua abordagem normativa, estabelece diretrizes que orientam a divisão de responsabilidades entre os distintos níveis de governo na prestação de bens e serviços públicos: enquanto ao governo central competem questões como estabilização macroeconômica e redistribuição de renda - que naturalmente escapam da ingerência de entes subnacionais -, aos governos locais é dada a atribuição de ofertar bens públicos locais, cujo consumo é geograficamente limitado à determinada jurisdição (OATES, 1999OATES, Wallace E. An essay on fiscal federalism. Journal of Economic Literature, [Online], v. 37, n. 3, p. 1120-1149, Sept. 1999.). Nesse framework, a incumbência deferida a governos locais tem justificativa econômica clara:

A ideia básica é simplesmente que o nível eficiente de produção de um bem público local (i.e., quando a soma do benefício marginal usufruído pelos indivíduos iguala o custo marginal que lhes é imposto) provavelmente varia em cada localidade, como resultado de diferentes preferências e custos de oferta. Maximizar o bem-estar social agregado requer que a produção varie de maneira correspondente (OATES,1999OATES, Wallace E. An essay on fiscal federalism. Journal of Economic Literature, [Online], v. 37, n. 3, p. 1120-1149, Sept. 1999., p. 1122).

Mais próximas da população, as esferas de poder local estão naturalmente mais bem posicionadas para capturar preferências da população em seus respectivos limites administrativos, podendo, então, adequar a quantidade e o tipo de bem público ofertado a citadas predileções. Conforme se verá adiante, quando aplicada à análise de emendas parlamentares individuais, referida vantagem comparativa põe em dúvida a narrativa tradicional, que, em epílogo, associa o caráter de ineficiência a citadas proposições legislativas.

“Em um mundo de informação perfeita, um planejador central benevolente poderia, presumivelmente, introduzir a requerida diferenciação em bens locais de para maximizar o bem-estar social” (OATES, 1997OATES, Wallace E. On the welfare gains from fiscal decentralization. Journal of Public Finance and Public Choice, [Online], v. 15, n 2-3, p. 83-92, 1997., p. 83). Na prática, contudo, a definição por parte do governo central de bens públicos ajustados às preferências locais esbarra na dificuldade (ou custo) de obtenção das informações relevantes, além de enfrentar resistências políticas: o tratamento diferenciado entre jurisdições - na forma de distinção entre os bens alocados em cada distrito - pode não ser socialmente aceito, demandando uma espécie de uniformidade na atuação do poder central, a qual nem sempre considera peculiaridades locais (OATES, 2008OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.). Nessas circunstâncias, o resultado da produção econômica pública se distancia do objetivo da atuação do governo, isto, é, que os bens públicos sejam determinados de maneira a maximizar o bem-estar dos cidadãos. Configura-se, assim, um típico caso de misallocation, ou má alocação de recursos, que deixam de ser destinados ao seu uso mais efetivo (FEIDLER; STAAL, 2008FEIDLER, Janos; STAAL, Klaas. Centralized and decentralized of provision of public goods. Governance and Efficiency of Economics Systems, Discussion Paper n. 241, p. 1-26, July 2008. Disponível em: Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/12173738.pdf . Acesso em: 13 jun. 2020. (Discussion Paper Series of SFB/TR 15).
https://core.ac.uk/download/pdf/12173738...
). Em um cenário de grande heterogeneidade entre indivíduos e jurisdições, comumente verificado em países como o Brasil, as perdas de bem-estar decorrentes de tal arranjo são especialmente notáveis.

A presença de grande heterogeneidade restringe, assim, o conjunto de circunstâncias em que a decisão alocativa centralizada é superior ao resultado obtido via descentralização. É que, de fato, quando há externalidades na provisão de um bem público local, e desde que os benefícios advindos de tais externalidades superem os custos de uniformização na produção pública, a decisão tomada pelo poder central maximiza o superávit social (BESLEY; COATE, 1999BESLEY, Timothy; COATE, Stephen. Centralized versus descentralized provision of local public goods: a political economy analysis. National Bureau of Economic Research, Working Paper 7084, Apr. 1999.). Entretanto, quanto mais heterogêneo o ambiente, maiores devem ser os ganhos com externalidades para que se justifique a intervenção centralizada. Conforme aponta Lockwood (2002)LOCKWOOD, Ben. Distributive politics and the costs of centralization. Review of Economic Studies, Oxford, v. 69, n. 2, p. 313-337, Apr. 2002. , centralização somente é preferível à descentralização se o efeito líquido das externalidades sobre todas as regiões for positivo e houver ínfima diferenciação entre as regiões. Diante disso, a descentralização fiscal (administrativa e financeira) surge como artifício capaz de promover substanciais ganhos de bem-estar social. É essa a lição do Teorema da Descentralização, que estatui: na ausência de economias de escala, a oferta descentralizada de bens públicos proporcionará bem-estar superior ao advindo da provisão centralizada desses bens (OATES, 2008OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.).

Estudos empíricos apresentam conclusões alinhadas ao teorema em comento. Faguet (2001)FAGUET, Jean-Paul. Does decentralization increase responsiveness to local needs? Evidence from Bolivia. World Bank Policy Research, Washington, D. C., Working Paper n. 2516, p. 1-50, 2001. Disponível em: Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/en/618611468743958100/Does-decentralization-increase-responsiveness-to-local-needs-evidence-from-Bolivia . Acesso em: 13 jun. 2020.
http://documents.worldbank.org/curated/e...
examina o ocorrido na Bolívia em meados dos anos 1990, quando o governo central promoveu substancial devolução, aos municípios, da autoridade para decidir sobre gastos públicos locais. A pesquisa demonstra que o nível e a categoria de gasto escolhidos pelos governos locais diferem sensivelmente dos padrões preferidos pela esfera central de poder: após a descentralização, houve uma reorientação - inteiramente explicada pela adequação da oferta às necessidades locais - dos investimentos para as áreas de saúde, educação, recursos hídricos e desenvolvimento urbano, em detrimento de despesas com o setor agrícola. Os achados são consistentes, portanto, com o modelo em que a superioridade informacional do governo local domina a eventual capacidade técnica e organizacional do centro na provisão de serviços públicos.

Bradford e Oates (1974 apudOATES, 2008OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.) estudam uma consolidação hipotética dos distritos escolares da cidade de New Jersey, nos Estados Unidos, indicando que a redução de ingerência local na determinação dos níveis de gastos com escolas acarretaria grandes perdas de bem-estar à comunidade.

Assim, mecanismos voltados à descentralização de recursos mitigam as perdas de eficiência advindas da informação imperfeita e assimétrica, facilitando o alcance dos objetivos alocativos do governo (SMART; BIRD, 2009SMART, Michael; BIRD, Richard. Earmarked grants and accountability in government. Rotman School of Management, Toronto, Working Paper n. 1498775, p. 1-26, 2009.).

A essa altura, calha recordar que emendas parlamentares individuais ao orçamento federal se servem, justa e precipuamente, a viabilizar a transferência de recursos às esferas subnacionais, de maneira que as conclusões da teoria do federalismo fiscal aplicam-se, sem qualquer necessidade de adaptação, ao caso das proposições legislativas em comento. Tal constatação, de simplicidade evidente, não tem merecido a devida atenção da literatura que ressalta os ganhos advindos de referidas iniciativas parlamentares. A tese, contudo, é central ao esforço de reconciliação entre preocupações externadas por um e outro lado do debate sobre emendas individuais. Em síntese, emendas parlamentares são um mecanismo eficiente na promoção do bem-estar social - afirmação essa que será formalizada mediante modelo exposto no capítulo a seguir.

Modelo

Seja N um conjunto finito (n elementos), que compreende os municípios de determinado país. Para cada município i ∈ N, preferências e carga tributária são potencialmente heterogêneas. Como é padrão na literatura econômica, assume-se que o governo busca maximizar o bem-estar dos indivíduos sob sua jurisdição (KADIR, 2004KADIR, Isik A. Theoretical framework of public policies for welfare maximization. Munich Personal RePEc Archive, Paper 2093, p. 1-14, 2004. Disponível em: Disponível em: https://mpra.ub.uni-muenchen.de/2093/1/MPRA_paper_2093.pdf . Acesso em: 13 jun. 2020.
https://mpra.ub.uni-muenchen.de/2093/1/M...
; FEIDLER; STAAL, 2008FEIDLER, Janos; STAAL, Klaas. Centralized and decentralized of provision of public goods. Governance and Efficiency of Economics Systems, Discussion Paper n. 241, p. 1-26, July 2008. Disponível em: Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/12173738.pdf . Acesso em: 13 jun. 2020. (Discussion Paper Series of SFB/TR 15).
https://core.ac.uk/download/pdf/12173738...
), que, por sua vez, depende de benefícios e custos (tributos) - b(g) e tg, respectivamente - decorrentes da oferta de bens públicos usufruídos no local (por simplicidade, o consumo de bens privados é omitido). O nível de bem-estar de determinado local i é, então, capturado por função utilidade U(g), com g denotando o gasto público na localidade. Assume-se U(0) = 0, U’ > 0 e U’’ < 0.

Conforme discutido em subseção anterior, as contribuições da teoria do federalismo fiscal ressaltam a importância de se tomar em consideração preferências locais na provisão de bens públicos. O modelo, então, internaliza e explicita tais preferências mediante parâmetro específico, θmi, que captura a preferência mediana pelo bem público no município i - a opção pela mediana se justifica pela necessidade de operacionalizar a escolha do governo diante de um problema com um agente (representante) e vários principais (eleitores) (SCHWARTZ, 1994SCHWARTZ, Thomas. Representation as agency and the pork barrel paradox. Public Choice, Dordrecht, v. 78, n. 1, p. 3-21, Jan. 1994.), bem como pela chancela do modelo do eleitor mediano na literatura empírica voltada ao estudo da produção de bens públicos locais (OATES, 2008OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.).

Incorpora-se, também em linha com o exposto, a presença de informação imperfeita e assimétrica entre os níveis de governo. Assim, o parâmetro ρ indica a probabilidade de que o governo central apreenda corretamente a preferência local (ρ < 1). Via de consequência, requer-se parâmetro adicional, δi, que registra uma preferência local distinta da mediana (δi < θmi).

Por fim, o modelo considera a existência de uma burocracia que influi decisivamente nas escolhas alocativas do governo central. Além de suporte teórico de longa data (NISKANEN, 1994NISKANEN, William A. Bureaucracy and public economics. [S. l.]: Edward Elgar Publishing, 1994.), a premissa reconhece e homenageia a realidade prática do processo orçamentário nacional.

Com efeito, a elaboração da proposta de orçamento, no Poder Executivo, é caracterizada por um processo hierárquico, com múltiplas etapas, que compreende diversas estruturas administrativas - unidades orçamentárias, setoriais de orçamento em cada ministério, a Secretaria de Orçamento Federal na qualidade de órgão central do sistema orçamentário - cujo corpo de colaboradores é constituído principalmente por integrantes da burocracia permanente do Estado. Tais servidores, por sua vez, e naturalmente, são movidos por um sistema de incentivos próprio, o que lhes conduz a um conjunto de preferências distinto. Assim, embora as linhas gerais que balizam o desenho da proposta sejam dadas pela orientação política de alto nível, ao lado de diretrizes legalmente estabelecidas, o corpo burocrático tem considerável grau de liberdade na eleição das despesas discricionárias que comporão o orçamento, o que lhe defere, em larga medida, o controle factual do processo.

Nesse diapasão, a decisão alocativa do governo central deve sopesar as preferências manifestadas localmente e pela burocracia. No modelo, essa peculiaridade é contemplada por intermédio dos parâmetros λ (peso dado pelo governo central ao atendimento da preferência local, com 0 < λ < 1) e ε (preferência da burocracia (ε < θmi)). Do ponto de vista do município, tais parâmetros adicionam um componente de incerteza na provisão do bem público de interesse local.

Considerados os aspectos acima, a utilidade de um município i derivada da decisão alocativa adotada pelo governo central assume a seguinte forma funcional:

U i c = [ λ ( ρ θ m i + ( 1 ρ ) δ i ) + ( 1 λ ) ε ] b i c ( g ) t i g (1)

O governo central maximiza o valor agregado do bem estar no conjunto N:

U c = i = 1 n ( U i c ) , com i = 1 n ( t i ) = 1 (2)

Por outro lado, o mesmo município i aufere utilidade distinta no caso em que a decisão de gasto é tomada por um representante local: uma vez que não há assimetria de informação ou incerteza na oferta do bem público (i.e., admite-se ρ = λ = 1), a expressão (1) torna-se simplesmente:

U i l = θ m i b i l ( g ) t i g (3)

Portanto, os níveis de bem-estar proporcionados ao município i variam conforme o sujeito da decisão. Além de decorrência natural da construção do modelo, a referida distinção concede e deriva do fato de que

[...] os poderes Executivo e Legislativo representam diferentes eleitorados, são selecionados por processos distintos e usam modelos de decisão também diversos, de maneira que as demandas expressas pela legislatura serão, usualmente, diferentes daquelas inicialmente expressas pelo Executivo (NISKANEN, 1994NISKANEN, William A. Bureaucracy and public economics. [S. l.]: Edward Elgar Publishing, 1994., p. 28).

Assim, em princípio, o município não é indiferente: o ator responsável pela decisão alocativa importa para a determinação do bem-estar local.

Outro ponto que se deve sublinhar, até então implícito na exposição, é que se trata unicamente da escolha acerca da destinação a ser dada à parcela do orçamento público. A citada parcela corresponde ao valor reservado aos parlamentares para a proposição de emendas individuais - em 2020, cerca de R$ 9,5 bilhões, ou aproximadamente R$ 16 milhões por parlamentar (BRASIL, 2019bBRASIL. Congresso Nacional. Nota Técnica Conjunta n. 4, de 2019. Subsídios à apreciação do Projeto de Lei Orçamentária para 2020 (PL n. 22/2019-CN). Brasília: Congresso Nacional, 2019b. Disponível em: Disponível em: http://www.camara.leg.br/internet/comissao/index/mista/orca/orcamento/OR2020/ntc_04_19_LOA-2020.pdf . Acesso em: 13 jun. 2020.
http://www.camara.leg.br/internet/comiss...
). Ambos os pontos de rigidez são centrais e merecem maiores considerações.

Primeiro, não se discutem as fontes de financiamento de tais despesas. Nos termos do modelo, ti é fixo, ou seja, a carga tributária que pesa sobre determinado município i foi decidida previamente e não é objeto de discussão durante o processo orçamentário. Aqui, verifica-se o primeiro ponto de distanciamento entre o presente framework e o modelo tradicionalmente adotado pela literatura, cujas linhas gerais serviram de suporte ao exemplo apresentado no capítulo 2. O modelo tradicional assume, implicitamente, que a imposição de custos ocorre concomitantemente à destinação de benefícios, isto é, que decisões sobre tributação e gasto são contemporâneas: a escolha por não implementar determinada política ineficiente acarretaria, automaticamente, a desnecessidade de levantar os recursos necessários a seu financiamento (ou, por outra via, a redução da carga tributária total). Essa simplificação o afasta, de maneira relevante, da realidade legislativa, uma vez que a discussão sobre o orçamento - e, portanto, sobre emendas individuais - transcorre em um contexto de fontes de financiamento largamente pré-estabelecidas. Em outras palavras, no processo legislativo orçamentário, parlamentares discutem, essencialmente (a menos de reestimativas marginais na receita), a alocação da despesa pública, assumindo como dado o montante de recursos passível de destinação às distintas políticas governamentais. Assim, na prática, se o legislador decide não alocar os recursos que lhe foram concedidos, o mais provável é que o excedente em comento seja apropriado pelo próprio Congresso Nacional, nas etapas seguintes do processo legislativo, ou pelo Poder Executivo (governo central), que disporá, então, de maior liberdade na priorização de políticas de sua escolha, face à necessidade de administrar o fluxo de despesas e receitas ao longo da execução do orçamento; ao município de origem do parlamentar restaria apenas o ônus tributário.

O segundo ponto explicita que, na presente estrutura analítica, g é limitado. Novamente, diverge-se da modelagem tradicional que dá azo a preocupações em linha com a tragédia dos comuns. De fato, entre as limitações ao poder de modificar a proposta orçamentária apresentada pelo Poder Executivo, talvez a principal restrição dirigida ao parlamentar seja o teto monetário que lhe é imposto, conforme acima referido. O sistema de governança orçamentária contempla, portanto, o princípio primeiro voltado à regulação de uso do fundo público: “indivíduos com acesso ao bem devem ser claramente identificados, bem como os próprios limites do bem” (OSTROM, 1990OSTROM. Elinor. Governing the commons: the evolution of institutions for collective action. [S. l.]: Cambridge University Press, 1990. , p. 90).

A incorporação ao modelo de tais características da prática legislativa alberga, desse modo, interpretações no sentido de que o conjunto de regras procedimentais que orientam a aprovação das leis influencia decisivamente o resultado da decisão política (GROVES, 1994GROVES, Theodore. A theorem of voting rules and budget deficits. Economics Letters, Amsterdam, v. 45, n. 2, p. 237-243, June 1994.). É dizer, embora orientada por preferências, a construção teórica se beneficia da ideia de structure-induced equilibirum (SHEPSLE, 1979SHEPSLE, Kenneth A. Institutional arrangements and equilibrium in multidimensional voting models. American Journal of Political Science, Madison, v. 23, n. 1, p. 27-59, Feb. 1979.).

Análise e resultados: eficiência e qualidade democrática

Como visto, o nível de bem-estar proporcionado a cada município em virtude da eventual provisão de um bem público local varia conforme o responsável pela decisão alocativa. O município deverá preferir aquele que lhe traga maior utilidade. Na perspectiva do governo central, interessa a obtenção do maior nível de bem-estar agregado, considerando-se todos os municípios da nação. Conforme se verá a seguir, as preferências local e central convergem diante do principal resultado do modelo, formalizado pela proposição a seguir:

Proposição: Na presença de incertezas e assimetria de informação, a destinação de recursos via emenda parlamentar é Pareto superior à decisão alocativa do governo central.

Com efeito, sendo θmi > δi, ε, ρ < 1 e 0 < λ < 1, tem-se:

θ m i > λ ( ρ θ m i + ( 1 p ) δ i ) + ( 1 λ ) ε λ ( ρ θ m i + ( 1 ρ ) δ j ) + ( 1 λ ) ε θ m i < 1

U i l > U i c

O município prefere, assim, que a escolha sobre a destinação da parcela do orçamento reservada para emendas parlamentares seja, efetivamente, feita pelo seu representante no Poder Legislativo.

Para a solução do problema de maximização, as condições de primeira ordem são:

Para decisão local: U'il=θmib'il(g)ti=0b'il(g)=tiθmi;

Para decisão central: U'ic=[λ(ρθmi+(1ρ)δi)+(1λ)ε]b'ic(g)ti=0b'ic(g)=tiλ(ρθmi+(1ρ)δi)+(1λ)ε ;

Portanto,

b ' i l ( g ) b ' i c ( g ) = λ ( ρ θ m i + ( 1 ρ ) δ i ) + ( 1 λ ) ε θ m i < 1 b ' i l ( g ) < b ' i c ( g ) (4)

Como U’ > 0 e U’’ < 0, de (4) segue que Uil > Uic. Por fim, notando-se que a escolha do município i foi arbitrária, o demonstrado acima vale . Isso é dizer:

i=1n(Uil)>Uc=i=1n(Uic)

Portanto, também do ponto de vista do bem-estar agregado, é preferível que a destinação dos recursos em comento ocorra via emenda parlamentar.

Graficamente:

Figura 1.
Bem-estar e bens públicos locais: emenda parlamentar vs alocação centralizada

O resultado obtido revela que, refinando-se a simplificação inerente aos modelos tradicionais, ao serem incorporadas as particularidades observadas na prática do processo legislativo orçamentário, faz-se possível a aproximação à realidade, o que acarreta resultados opostos ao ofertado pela teoria prevalente: emendas parlamentares individuais são um mecanismo eficiente na promoção do bem-estar social. Restam reconciliadas, então, preocupações de cunho econômico (eficiência) com anseios de uma representação democrática qualificada, conforme exposto na literatura de referência.

Considerações finais

Perante a opinião pública, é prevalente o juízo depreciativo dirigido a emendas individuais ao orçamento público, vistas como um instrumento voltado a práticas clientelistas e paroquialistas, além de representarem uma opção de gasto inferior a projetos de autoria do Poder Executivo.

No centro da narrativa estão preocupações relativas à eficiência do gasto público: a descentralização de recursos federais visando à oferta de bens públicos locais, como ocorre no caso de emendas individuais ao orçamento, permite a exportação da carga tributária para outras regiões. Nesse cenário, os beneficiários da medida desconsideram custos globais, o que abre espaço para a consecução de projetos ineficientes do ponto de vista econômico. No limite, a sociedade se depara com o problema ilustrado pela tragédia dos comuns. O sistema de incentivos que baliza o comportamento dos agentes interessados, contudo, não parece lhes deixar outra saída: tal qual no dilema do prisioneiro, a estratégia dominante para o parlamentar é a escolha pela implementação de um projeto local julgado ineficiente, ainda que essa não seja a solução desejável do ponto de vista do bem-estar social agregado.

A despeito de tais considerações, há na literatura argumentos favoráveis à existência das emendas parlamentares em comento. Fundados especialmente no conceito de representação política, estudos apontam diversos benefícios derivados do instrumento - responsividade à demanda local, transparência, accountability, entre outros - que, em última análise, serve-se à qualificação do sistema de representação democrática.

O passo fundamental da presente pesquisa, no sentido de reconciliar preocupações de cunho econômico com anseios de uma representação democrática qualificada, é dado ao observar que as conclusões da teoria do federalismo fiscal aplicam-se ao caso das emendas individuais ao orçamento. É dizer: diante do objetivo de maximizar a utilidade agregada, a descentralização de recursos viabilizada pelas proposições em tela surge como artifício capaz de promover substanciais ganhos de bem-estar social.

Tomando como ponto de partida as contribuições da teoria sobre descentralização fiscal, e internalizando as características da processualística legislativa no país, concebeu-se um modelo que examina o benefício social da alocação de recursos via emendas parlamentares individuais. Em conclusão, arremata-se que, na presença de incertezas e assimetria de informação, a destinação de recursos via emenda parlamentar é Pareto superior à decisão alocativa do governo central. Desconstitui-se, portanto, o mito da ineficiência alocativa que assombra emendas parlamentares individuais.

Naturalmente, a tese aqui esposada - como, de resto, é salutar - deve ser submetida à depuração empírica, o que indica a agenda futura de pesquisa. Limitações pertinentes ao nível de detalhamento da despesa pública federal, especialmente com relação ao referenciamento geográfico do gasto decidido no âmbito do Poder Executivo, prenunciam desafios relevantes. De todo modo, a proposta de harmonização entre as visões de certo modo antagônicas referidas ao longo do texto colabora na tentativa de se construir um entendimento mais amplo sobre emendas parlamentares individuais ao orçamento público.

Referências

  • ABRANCHES, Sérgio Henrique Hudson de. Presidencialismo de coalizão: o dilema institucional brasileiro. Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 31, n. 1, p. 5-34, 1988.
  • ALSTON, Lee; MUELLER, Bernardo. Pork for policy: executive and legislative exchange in Brazil. Journal of Law, Economics and Organization, Oxford, v. 22, n. 1, p. 87-114, Nov. 2005.
  • AMES, Barry; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Famintos por pork: uma análise da demanda e oferta por políticas localistas e suas implicações para a representação política. In: POWER, Timothy; ZUCCO JR., Cesar (orgs.). O Congresso por ele mesmo: autopercepções da classe política brasileira. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011. p. 239-272.
  • BAIÃO, Alexandre. Lima; COUTO, Cláudio Gonçalves. A eficácia do pork barrel: a importância de emendas orçamentárias e prefeitos aliados na eleição de deputados. Opinião Pública, [Online] v. 23, n. 3, p. 714-753, set/dez. 2017.
  • A BARGANHA das emendas. O Estado de São Paulo, São Paulo, 23 nov. 2012. Disponível em: https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-barganha-das-emendas-imp-,963972
    » https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,a-barganha-das-emendas-imp-,963972
  • BARON, David P. Majoritarian incentives, pork barrel programs, and procedural control. American Journal of Political Science, Madison, v. 35, n. 1, p. 57-90, Feb. 1991.
  • BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos. Pagando o preço de governar: custos de gerência de coalizão no presidencialismo brasileiro. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 51, n. 4, p. 528-550, jul/ago. 2017.
  • BERTHOLINI, Frederico; PEREIRA, Carlos; RENNÓ, Lucio. Pork is policy: dissipative inclusion at the local level. Governance, Oxford, v. 31, p. 701-720, Oct. 2018.
  • BESLEY, Timothy; COATE, Stephen. Centralized versus descentralized provision of local public goods: a political economy analysis. National Bureau of Economic Research, Working Paper 7084, Apr. 1999.
  • BRASIL. Câmara dos Deputados. Glossário do Portal da Câmara dos Deputados. Brasília-DF, 2014. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/glossario/arquivos/glossario-em-formato-pdf Acesso em: 13 jun. 2020.
    » https://www2.camara.leg.br/glossario/arquivos/glossario-em-formato-pdf
  • BRASIL. Câmara dos Deputados. Resolução n. 1, de 2006-CN. Dispõe sobre a Comissão Mista Permanente a que se refere o § 1º do art. 166 da Constituição, bem como a tramitação das matérias a que se refere o mesmo artigo. Brasília: Câmara dos Deputados, 2006. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/rescon/2006/resolucao-1-22-dezembro-2006-548706-normaatualizada-pl.html Acesso em: 06 jun. 2020.
    » https://www2.camara.leg.br/legin/fed/rescon/2006/resolucao-1-22-dezembro-2006-548706-normaatualizada-pl.html
  • BRASIL. Congresso Nacional. Nota Técnica Conjunta n. 4, de 2019. Subsídios à apreciação do Projeto de Lei Orçamentária para 2020 (PL n. 22/2019-CN). Brasília: Congresso Nacional, 2019b. Disponível em: Disponível em: http://www.camara.leg.br/internet/comissao/index/mista/orca/orcamento/OR2020/ntc_04_19_LOA-2020.pdf Acesso em: 13 jun. 2020.
    » http://www.camara.leg.br/internet/comissao/index/mista/orca/orcamento/OR2020/ntc_04_19_LOA-2020.pdf
  • BRASIL. Presidência da República. Lei n. 13.898, de 11 de novembro de 2019. Dispõe sobre as diretrizes para a elaboração e a execução da Lei Orçamentária de 2020 e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 2019a. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13898.htm Acesso em: 07 jun. 2020.
    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13898.htm
  • BRASIL. Tribunal de Contas da União. Plenário. Acórdão 729/2010-TCU-Plenário. Relator: Min. Benjamin Zymler, 7 de abril de 2010. Brasília: TCU, 2010. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/*/KEY%253AACORDAO-COMPLETO-1147771/DTRELEVANCIA%2520desc/0/sinonimos%253Dfalse
    » https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/*/KEY%253AACORDAO-COMPLETO-1147771/DTRELEVANCIA%2520desc/0/sinonimos%253Dfalse
  • CARVALHO, Marcelo de. Efeitos das emendas parlamentares ao orçamento na redução das desigualdades regionais. 2007. Monografia (Especialização em Orçamento Público) - Câmara dos Deputados, Brasília, 2007.
  • CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2000.
  • CHIAVEGATI, Luís Fernando. Emendas parlamentares e federalismo brasileiro: entre os comportamentos local e nacional dos parlamentares. 2006. Monografia (Especialização em Pensamento Político Brasileiro) - Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2006.
  • EVANS, Diana. Pork barrel politics. In: SCHICKLER, Eric; LEE, Frances (orgs.). The Oxford Handbook of the American Congress. [Online]: Oxford University Press, 2011.
  • FAGUET, Jean-Paul. Does decentralization increase responsiveness to local needs? Evidence from Bolivia. World Bank Policy Research, Washington, D. C., Working Paper n. 2516, p. 1-50, 2001. Disponível em: Disponível em: http://documents.worldbank.org/curated/en/618611468743958100/Does-decentralization-increase-responsiveness-to-local-needs-evidence-from-Bolivia Acesso em: 13 jun. 2020.
    » http://documents.worldbank.org/curated/en/618611468743958100/Does-decentralization-increase-responsiveness-to-local-needs-evidence-from-Bolivia
  • FEIDLER, Janos; STAAL, Klaas. Centralized and decentralized of provision of public goods. Governance and Efficiency of Economics Systems, Discussion Paper n. 241, p. 1-26, July 2008. Disponível em: Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/12173738.pdf Acesso em: 13 jun. 2020. (Discussion Paper Series of SFB/TR 15).
    » https://core.ac.uk/download/pdf/12173738.pdf
  • FRISCH, Sean A.; KELLY, Scott Q. Cheese factories on the moon: why earmarks are good for American democracy. Boulder: Paradigm Publishers, 2011.
  • GONÇALVES, André. Dinheiro público: orçamento da União é foco constante de casos de corrupção. Gazeta do Povo, 11 dez. 2010. Vida Pública. Disponível em: Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/orcamento-da-uniao-e-foco-constante-de-casos-de-corrupcao-15rxkk18d78tyngm5jn6n7nta/ Acesso em: 29 ago. 2020.
    » https://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/orcamento-da-uniao-e-foco-constante-de-casos-de-corrupcao-15rxkk18d78tyngm5jn6n7nta/
  • GREGGIANIN, Eugênio. Estudo Técnico nº 16, de 2014. Pesquisa de opinião junto aos gabinetes parlamentares da Câmara dos Deputados: Emendas orçamentárias: importância para os municípios, execução das emendas, orçamento impositivo, orçamento participativo. Brasília: Câmara dos Deputados - Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira, 2014. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2014/et16.pdf Acesso em: 12 jun. 2020.
    » https://www2.camara.leg.br/orcamento-da-uniao/estudos/2014/et16.pdf
  • GROVES, Theodore. A theorem of voting rules and budget deficits. Economics Letters, Amsterdam, v. 45, n. 2, p. 237-243, June 1994.
  • HARDIN, Garrett. The tragedy of the commons. Science, [Online], v. 162, n. 3859, p. 1243-1248, Dec. 1968.
  • HIRD, John A. Superfund expenditures and cleanup priorities: distributive politics or the public interest? Journal of Policy Analysis and Management, Hoboken, v. 9, n. 4, p. 455-483, 1990.
  • KADIR, Isik A. Theoretical framework of public policies for welfare maximization. Munich Personal RePEc Archive, Paper 2093, p. 1-14, 2004. Disponível em: Disponível em: https://mpra.ub.uni-muenchen.de/2093/1/MPRA_paper_2093.pdf Acesso em: 13 jun. 2020.
    » https://mpra.ub.uni-muenchen.de/2093/1/MPRA_paper_2093.pdf
  • KREHBIEL, Keith. Information and legislative organization. Ann Arbor: University of Michigan Press, 1991.
  • LANCASTER, Thomas D. Electoral structures and pork barrel politics. International Political Science Review, London, v. 7, n. 1, p. 67-81, 1986.
  • LAZARUS, Jeffrey. Giving the people what they want? The distribution of earmarks in the U.S. House of Representatives. American Journal of Political Science, Madison, v. 54, n. 2, p. 338-353, Apr. 2010.
  • LOCKWOOD, Ben. Distributive politics and the costs of centralization. Review of Economic Studies, Oxford, v. 69, n. 2, p. 313-337, Apr. 2002.
  • LOWI, Theodore J. Four systems of policy, politics, and choice. Public Administration Review, Washington, D. C., v. 32, n. 4, p. 298-310, July-Aug. 1972.
  • MARTINEZ-VAZQUEZ, Jorge. The impact of fiscal decentralization: issues in theory and challenges in practice. Mandaluyong: Asian Development Bank, 2011. Disponível em: Disponível em: https://www.adb.org/publications/impact-fiscal-decentralization-issues-theory-and-challenges-practice Acesso em: 13 jun. 2020.
    » https://www.adb.org/publications/impact-fiscal-decentralization-issues-theory-and-challenges-practice
  • MAXEY, Chester C. A little history of pork. National Municipal Review, [Online], v. 8, n. 10, p. 691-705, Dec. 1919.
  • MENDONÇA, Eduardo. O falso orçamento impositivo: A institucionalização do patrimonialismo. JOTA, [Online], fev. 2015. Coluna Constituição e Sociedade. Disponível em: Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/constituicao-e-sociedade-o-falso-orcamento-impositivo-18022015 Acesso em: 31 ago. 2020.
    » https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/constituicao-e-sociedade-o-falso-orcamento-impositivo-18022015
  • MONTEIRO, Jorge Vianna. Elementos da conexão eleitoral. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 44, n. 2, p. 533-544, mar-abr. 2010.
  • NIOU, Emerson M. S.; ORDESHOOK, Peter C. Universalism in Congress. American Journal of Political Science, Madison, v. 29, n. 2, p. 246-258, May 1985.
  • NISHIJIMA, Marislei; POSTALI, Fernando Antonio Slaibe; ROCHA, Fabiana Fontes. Efeitos da descentralização da saúde básica no Brasil sobre o nível de corrupção em municípios investigados pelo governo central. Nova Economia, São Paulo, v. 27, n. 1, p. 117-141, jan-abr. 2017.
  • NISKANEN, William A. Bureaucracy and public economics. [S. l.]: Edward Elgar Publishing, 1994.
  • OATES, Wallace E. An essay on fiscal federalism. Journal of Economic Literature, [Online], v. 37, n. 3, p. 1120-1149, Sept. 1999.
  • OATES, Wallace E. On the evolution of fiscal federalism: theory and institutions. National Tax Journal, Washington, D. C., v. 61, n. 2, p. 313-334, June 2008.
  • OATES, Wallace E. On the welfare gains from fiscal decentralization. Journal of Public Finance and Public Choice, [Online], v. 15, n 2-3, p. 83-92, 1997.
  • OSTROM. Elinor. Governing the commons: the evolution of institutions for collective action. [S. l.]: Cambridge University Press, 1990.
  • PENNOCK, J. Roland. The “pork barrel” and majority rule: a note. Journal of Politics, [Online], v. 32, n. 3, p. 709-716, Aug. 1970.
  • PIOLA, Sérgio Francisco; VIEIRA, Fabíola Sulpino. As emendas parlamentares e a alocação de recursos federais no Sistema Único de Saúde. Texto para Discussão 2497. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, jul. 2019.
  • PITKIN, Hanna F. The concept of representation. London: University of California Press, 1967.
  • PRIMO, David M.; SNYDER JR., James M. Distributive politics and the Law of 1/n. Journal of Politics, Chicago, v. 70, n. 2, p. 477-486, Apr. 2008.
  • RENNÓ, Lúcio Remuzat; PEREIRA, Carlos Eduardo Ferreira. Gastos públicos, emendas orçamentárias do Legislativo e inclusão dissipativa nos municípios brasileiros: 1998 a 2010. [S. l.: S. n.], 2013. (Monografia submetida ao XVIII Prêmio Tesouro Nacional). Disponível em: https://www.camara.leg.br/internet/agencia/pdf/EmendasOr%C3%A7amentoEfeitoPositivo.pdf
    » https://www.camara.leg.br/internet/agencia/pdf/EmendasOr%C3%A7amentoEfeitoPositivo.pdf
  • ROCHA, Everardo. O que é mito. São Paulo: Editora Brasiliense, 1996.
  • ROSSI, Alison F. del. The politics and economics of pork barrel spending: the case of federal financing of water resources development. Public Choice, Dordrecht, v. 85, n. 3/4, p. 285-305, 1995.
  • SCHWARTZ, Thomas. Representation as agency and the pork barrel paradox. Public Choice, Dordrecht, v. 78, n. 1, p. 3-21, Jan. 1994.
  • SANTOS, Núbia Cristina Barbosa; GASPARINI, Carlos Eduardo. Orçamento impositivo e relação entre poderes no Brasil. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 31, p. 339-396, jan.-abr. 2020.
  • SHEPSLE, Kenneth A. Institutional arrangements and equilibrium in multidimensional voting models. American Journal of Political Science, Madison, v. 23, n. 1, p. 27-59, Feb. 1979.
  • SHEPSLE, Kenneth A.; WEINGAST, Barry R. Political preferences for the pork barrel: a generalization. American Journal of Political Science, Madison, v. 25, n. 1, p. 96-111, Feb. 1981.
  • SILVA, Vera Martins. Regulando o regulador: considerações sobre a Lei de Responsabilidade Fiscal no federalismo brasileiro. In: CICLO DE DEBATES EM ECONOMIA INDUSTRIAL, TRABALHO E TECNOLOGIA, 3., 2005, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: PUCSP/PEPGEP/EITT, 2005. p. 1-20. Disponível em: Disponível em: https://www5.pucsp.br/eitt/downloads/III_Ciclo_Vera_Martins_Regulando_o_Regulador.pdf Acesso em: 15 set. 2020.
    » https://www5.pucsp.br/eitt/downloads/III_Ciclo_Vera_Martins_Regulando_o_Regulador.pdf
  • SINGER, André. Ideologia e economia na decisão de 1994. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 22., 1998, Caxambu. Anais eletrônicos [...]. Caxambu: ANPOCS, 1998. p. 1-58. Disponível em: Disponível em: https://www.anpocs.com/index.php/encontros/papers/22-encontro-anual-da-anpocs/gt-20/gt08-16/5094-andresinger-ideologia/file Acesso em: 13 jun. 2020.
    » https://www.anpocs.com/index.php/encontros/papers/22-encontro-anual-da-anpocs/gt-20/gt08-16/5094-andresinger-ideologia/file
  • SMART, Michael; BIRD, Richard. Earmarked grants and accountability in government. Rotman School of Management, Toronto, Working Paper n. 1498775, p. 1-26, 2009.
  • SODRÉ, Antônio Carlos de Azevedo; ALVES, Maria Fernanda Colaço. Relação entre emendas parlamentares e corrupção municipal no Brasil: estudo dos relatórios do programa de fiscalização da Controladoria-Geral da União. Revista de Administração Contemporânea, [Online], v. 14, n. 3, p. 414-433, maio-jun. 2010.
  • TROMBORG, Mathias W.; SCHWINDT-BAYER, Leslie A. Constituent demand and district-focused legislative representation. Legislative Studies Quarterly, Iowa City, v. 44, n. 1, p. 35-64, Feb. 2019.
  • WEINGAST, Barry. R.; SHEPSLE, Kenneth A.; JOHNSEN, Christopher. The political economy of benefits and costs: a neoclassical approach to distributive politics. The Journal of Political Economy, [Chicago], v. 89, n. 4, p. 642-664, Aug. 1981.
  • WITTMAN, Donald. Why democracies produce efficient results. The Journal of Political Economy, Chicago, v. 97, n. 6, p. 1395-1424, Dec. 1989.
  • 2
    O autor agradece pelos valiosos comentários e sugestões feitos por Júlia Rodrigues, Paulo Bijos e três pareceristas anônimos da Revista Brasileira de Ciência Política.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    13 Jun 2020
  • Aceito
    15 Set 2020
Universidade de Brasília. Instituto de Ciência Política Instituto de Ciência Política, Universidade de Brasília, Campus Universitário Darcy Ribeiro - Gleba A Asa Norte, 70904-970 Brasília - DF Brasil, Tel.: (55 61) 3107-0777 , Cel.: (55 61) 3107 0780 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: rbcp@unb.br