RESUMO
Objetivo:
Avaliar a influência dos esforços musculares respiratórios e do ajuste da frequência respiratória no ventilador sobre o volume corrente e as pressões de distensão alveolar ao final da inspiração e expiração com ventilação sob os modos controle por volume e controle por pressão na síndrome do desconforto respiratório agudo.
Métodos:
Utilizou-se um simulador mecânico de pulmão (ASL 5000™) conectado a cinco tipos de ventiladores utilizados em unidade de terapia intensiva, em um modelo de síndrome do desconforto respiratório agudo. Os esforços musculares respiratórios (pressão muscular) foram configurados de três formas distintas: sem esforço (pressão muscular: 0cmH2O), apenas esforços inspiratórios (pressão muscular: - 5cmH2O, tempo inspiratório neural de 0,6 segundos) e esforços musculares inspiratórios e expiratórios (pressão muscular:-5/+5cmH2O). Foram configuradas ventilação sob os modos controle por volume e ventilação com controle por pressão para oferecer um volume corrente de 420mL e pressão positiva expiratória final de 10cmH2O. Avaliaram-se o volume corrente fornecido aos pulmões, as pressões alveolares no final da inspiração e as pressões alveolares no final da expiração.
Resultados:
Quando disparado pelo paciente simulado, o volume corrente mediano foi 27mL menor do que o volume corrente ajustado (variação-63 a +79mL), e ocorreu uma variação nas pressões alveolares com mediana de 25,4cmH2O (faixa de 20,5 a 30cmH2O). Nos cenários simulados com esforço muscular tanto inspiratório quanto expiratório e com frequência respiratória mandatória inferior à dos esforços do paciente simulado, o volume corrente mediano foi maior com ventilação controlada.
Conclusão:
O ajuste do esforço muscular respiratório e da frequência respiratória no ventilador em um valor acima da frequência respiratória do paciente nos modos de ventilação assistida/controlada gerou maiores variações no volume corrente e nas pressões pulmonares, enquanto o modo controlado não mostrou variações nesses desfechos.
Descritores:
Respiração artificial; Síndrome do desconforto respiratório; Respiração com pressão positiva intermitente; Lesão pulmonar induzida por ventilação mecânica
ABSTRACT
Objective:
To evaluate the influences of respiratory muscle efforts and respiratory rate setting in the ventilator on tidal volume and alveolar distending pressures at end inspiration and expiration in volume-controlled ventilation and pressure-controlled ventilation modes in acute respiratory distress syndrome.
Methods:
An active test lung (ASL 5000™) connected to five intensive care unit ventilators was used in a model of acute respiratory distress syndrome. Respiratory muscle efforts (muscle pressure) were configured in three different ways: no effort (muscle pressure: 0cmH2O); inspiratory efforts only (muscle pressure:-5cmH2O, neural inspiratory time of 0.6s); and both inspiratory and expiratory muscle efforts (muscle pressure:-5/+5cmH2O). Volume-controlled and pressure-controlled ventilation modes were set to deliver a target tidal volume of 420mL and positive end-expiratory pressure of 10cmH2O. The tidal volume delivered to the lungs, alveolar pressures at the end of inspiration, and alveolar pressures at end expiration were evaluated.
Results:
When triggered by the simulated patient, the median tidal volume was 27mL lower than the set tidal volume (range-63 to +79mL), and there was variation in alveolar pressures with a median of 25.4cmH2O (range 20.5 to 30cmH2O). In the simulated scenarios with both spontaneous inspiratory and expiratory muscle efforts and with a mandatory respiratory rate lower than the simulated patient's efforts, the median tidal volume was higher than controlled breathing.
Conclusion:
Adjusting respiratory muscle effort and pulmonary ventilator respiratory rate to a value above the patient’s respiratory rate in assisted/controlled modes generated large variations in tidal volume and pulmonary pressures, while the controlled mode showed no variations in these outcomes.
Keywords:
Respiration; artificial; Respiratory distress syndrome; Intermittent positive-pressure breathing; Ventilator-induced lung injury
INTRODUÇÃO
A lesão pulmonar induzida pela ventilação mecânica (LPIVM) é uma causa iatrogênica de dano pulmonar relacionado com estresse mecânico excessivo e/ou tensão imposta ao tecido pulmonar durante a ventilação mecânica (VM).(11 Fan E, Brodie D, Slutsky AS. Acute respiratory distress syndrome: advances in diagnosis and treatment. JAMA. 2018;319(7):698-710.) Trata-se de uma preocupação particularmente importante em pacientes com a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), já que se apresenta como edema pulmonar grave e inflamação. Mais ainda, as alterações mecânicas da SDRA têm distribuição heterogênea no parênquima pulmonar, o que predispõe os alvéolos e as pequenas vias aéreas à distensão ou à pressão excessivas durante a respiração corrente.(22 Thompson BT, Chambers RC, Liu KD. Acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2017;377(6):562-72.) O ajuste do volume corrente (VC) em 4 a 6mL/kg de peso corpóreo predito ou ideal e a limitação das pressões de distensão - tanto platô (< 28 - 30cmH2O) e, particularmente, driving pressure (< 15cmH2O) - durante a VM foram associados com melhora da sobrevivência na SDRA.(33 Frank AJ, Bajwa E, Brower R, Amato MB, Taylor BT, US NHLBI Severe Asthma Research Program. Inflammatory biomarkers and changes in driving pressure with positive end-expiratory pressure in acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit Care Med. 2011;183:A1156.,44 Amato MB, Meade MO, Slutsky AS, Brochard L, Costa EL, Schoenfeld DA, et al. Driving pressure and survival in the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2015;372(8):747-55.) Na verdade, as assim chamadas estratégias de ventilação protetora podem prevenir ou atenuar a LPIVM pela redução tanto do estresse quanto da tensão pulmonar causada pela VM.(55 Henderson WR, Chen L, Amato MBP, Brochard LJ. Fifty years of research in ARDS. Respiratory mechanics in acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit Care Med. 2017;196(7):822-33.,66 Gattinoni L, Protti A, Caironi P, Carlesso E. Ventilator-induced lung injury: the anatomical and physiological framework. Crit Care Med. 2010;38(10 Suppl):S539-48.) Essas estratégias são atualmente o padrão de cuidado para os pacientes com SDRA na fase inicial de VM controlada.(11 Fan E, Brodie D, Slutsky AS. Acute respiratory distress syndrome: advances in diagnosis and treatment. JAMA. 2018;319(7):698-710.) Entretanto, as taxas de mortalidade permanecem elevadas, variando entre 34% e 60%.(22 Thompson BT, Chambers RC, Liu KD. Acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2017;377(6):562-72.,77 Pan C, Liu L, Xie JF, Qiu HB. Acute respiratory distress syndrome: challenge for diagnosis and therapy. Chin Med J (Engl). 2018;131(10):1220-4
8 Writing Group for the Alveolar Recruitment for Acute Respiratory Distress Syndrome Trial (ART) Investigators, Cavalcanti AB, Suzumura EA, Laranjeira LN, Paisani DM, Damiani LP, Guimaraes HP, et al. Effect of lung recruitment and titrated positive end-expiratory pressure (PEEP) vs low PEEP on mortality in patients with acute respiratory distress syndrome: a randomized clinical trial. JAMA. 2017;318(14):1335-45.-99 Villar J, Martín-Rodríguez C, Domínguez-Berrot AM, Fernández L, Ferrando C, Soler JA, Díaz-Lamas AM, González-Higueras E, Nogales L, Ambrós A, Carriedo D, Hernández M, Martínez D, Blanco J, Belda J, Parrilla D, Suárez-Sipmann F, Tarancón C, Mora-Ordoñez JM, Blanch L, Pérez-Méndez L, Fernández RL, Kacmarek RM; Spanish Initiative for Epidemiology, Stratification and Therapies for ARDS (SIESTA) Investigators Network. A quantile analysis of plateau and driving pressures: effects on mortality in patients with acute respiratory distress syndrome receiving lung-protective ventilation. Crit Care Med. 2017;45(5):843-50.)
Não existem atualmente diretrizes relativas à forma de ventilar pacientes com SDRA com drive respiratório e esforços respiratórios preservados, isto é, VM assistida. A manutenção de respiração espontânea durante a VM pode ter efeitos benéficos, como prevenção de atrofia e disfunção diafragmática, evitando a monotonia respiratória com relação à variação do VC e recrutando alvéolos justa-diafragmáticos, que geralmente se colapsam na SDRA grave.(1010 Goligher EC, Ferguson ND, Brochard LJ. Clinical challenges in mechanical ventilation. Lancet. 2016;387(10030):1856-66.) Todos esses fatores podem contribuir para uma precoce liberação da respiração assistida para o paciente.(1111 Neumann P, Wrigge H, Zinserling J, Hinz J, Maripuu E, Andersson LG, et al. Spontaneous breathing affects the spatial ventilation and perfusion distribution during mechanical ventilatory support. Crit Care Med. 2005;33(5):1090-5.
12 Papazian L, Forel JM, Gacouin A, Penot-Ragon C, Perrin G, Loundou A, Jaber S, Arnal JM, Perez D, Seghboyan JM, Constantin JM, Courant P, Lefrant JY, Guérin C, Prat G, Morange S, Roch A; ACURASYS Study Investigators. Neuromuscular blockers in early acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2010;363(12):1107-16.-1313 Marini JJ. Spontaneously regulated vs. controlled ventilation of acute lung injury/acute respiratory distress syndrome. Curr Opin Crit Care. 2011;17(1):24-9.) Por outro lado, a respiração assistida durante a VM pode resultar em maiores VC e pressões pulmonares, especialmente em áreas fechadas de alvéolos colapsados, podendo resultar em recrutamento corrente e ventilação com pendelluft, assim amplificando as distensões heterogêneas do parênquima pulmonar.(1414 Yoshida T, Fujino Y, Amato MB, Kavanagh BP. Fifty years of research in ARDS. Spontaneous breathing during mechanical ventilation. Risks, mechanisms, and management. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(8):985-92.) Mesmo em pacientes com boa sincronia com o ventilador, o VC-alvo e os limites desejados de pressão nas vias aéreas podem ser frequentemente ultrapassados,(1515 Perinel-Ragey S, Baboi L, Guérin C. Variability of tidal volume in patient-triggered mechanical ventilation in ARDS. Respir Care. 2017;62(11):1437-46.) comprometendo a efetividade das estratégias de ventilação protetora. Ainda, assincronias paciente-ventilador, como duplo disparo, também citado como breath-stacking (literalmente empilhamento de respirações) ou esforços ineficazes, podem resultar em grandes VC e pressões transpulmonares, com aumento do risco de LPIVM.(1414 Yoshida T, Fujino Y, Amato MB, Kavanagh BP. Fifty years of research in ARDS. Spontaneous breathing during mechanical ventilation. Risks, mechanisms, and management. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(8):985-92.,1616 Richard JC, Lyazidi A, Akoumianaki E, Mortaza S, Cordioli RL, Lefebvre JC, et al. Potentially harmful effects of inspiratory synchronization during pressure preset ventilation. Intensive Care Med. 2013;39(11):2003-10.
17 Goligher EC, Fan E, Herridge MS, Murray A, Vorona S, Brace D, et al. Evolution of diaphragm thickness during mechanical ventilation. Impact of inspiratory effort. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192(9):1080-8.
18 Morais CC, Koyama Y, Yoshida T, Plens GM, Gomes S, Lima CA, et al. High positive end-expiratory pressure renders spontaneous effort noninjurious. Am J Respir Crit Care Med. 2018;197(10):1285-96.-1919 Brochard L, Slutsky A, Pesenti A. Mechanical ventilation to minimize progression of lung injury in acute respiratory failure. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(4):438-42.) Em pacientes mecanicamente ventilados, pesquisadores encontraram uma associação entre assincronias paciente-ventilador e mortalidade.(2020 Blanch L, Villagra A, Sales B, Montanya J, Lucangelo U, Luján M, et al. Asynchronies during mechanical ventilation are associated with mortality. Intensive Care Med. 2015;41(4):633-41.) Por outro lado, em estudos experimentais, a VM controlada tem sido associada com prevenção da LPIVM ou sua atenuação e, mais importante, com melhores desfechos, inclusive sobrevivência, em pacientes com SDRA moderada ou grave.(1919 Brochard L, Slutsky A, Pesenti A. Mechanical ventilation to minimize progression of lung injury in acute respiratory failure. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(4):438-42.) Três ensaios controlados randomizados demonstraram um impacto positivo do bloqueio neuromuscular precoce na SDRA nos parâmetros funcionais e na mortalidade.(1212 Papazian L, Forel JM, Gacouin A, Penot-Ragon C, Perrin G, Loundou A, Jaber S, Arnal JM, Perez D, Seghboyan JM, Constantin JM, Courant P, Lefrant JY, Guérin C, Prat G, Morange S, Roch A; ACURASYS Study Investigators. Neuromuscular blockers in early acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2010;363(12):1107-16.,2121 Forel JM, Roch A, Marin V, Michelet P, Demory D, Blache JL, et al. Neuromuscular blocking agents decrease inflammatory response in patients presenting with acute respiratory distress syndrome. Crit Care Med. 2006;34(11):2749-57.,2222 Gainnier M, Roch A, Forel JM, Thirion X, Arnal JM, Donati S, et al. Effect of neuromuscular blocking agents on gas exchange in patients presenting with acute respiratory distress syndrome. Crit Care Med. 2004;32(1):113-9.)
Pouca atenção tem sido dada às influências dos esforços musculares inspiratórios e expiratórios, modos ventilatórios - seja ventilação controlada por volume (VCV) ou ventilação controlada por pressão (VCP) - ou o número de ciclos respiratórios mandatórios (definição da frequência respiratória - FR) combinados sobre o VC e as pressões de distensão alveolar durante a VM assistida. As principais diferenças entre VCV e VCP durante VM assistida se referem à quantidade e ao tipo de fluxo fornecido aos pulmões, o que pode ser mais alto quanto maior for o esforço do paciente, com desaceleração exponencial no segundo tipo. Em ambos os modos, o ajuste da FR pode provocar assincronias paciente-ventilador quando ela é superior à FR espontânea do paciente. Assim, colocam-se as hipóteses: primeiro, que as respirações assistidas invariavelmente resultam em um VC mais alto do que ciclos respiratórios controlados, assim como pressões alveolares mais altas, mesmo com respiração sincrônicas; segundo, que assincronias de disparo e ciclagem provocadas pelo ajuste da FR acima da FR espontânea do paciente, independente do modo ventilatório (VCV ou VCP) ou dos tipos de ventiladores utilizados na unidade de terapia intensiva (UTI), provocam grandes variações do VC e das pressões de distensão alveolar.
Os objetivos principais foram testar as hipóteses acima pela avaliação das influências do esforço muscular respiratório (tanto inspiratório quanto expiratório) e do ajuste da FR no ventilador (seja acima ou abaixo da FR do paciente) sobre o VC e as pressões de distensão alveolar ao final da inspiração e da expiração, tanto com o modo VCV quanto VCP em um modelo mecânico de simulação de SDRA.
MÉTODOS
Este estudo de bancada foi realizado no Laboratório da Respiração do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.
Modelo simulado
Utilizou-se um simulador mecânico de pulmão ASL 5000™ (IngMar Medical, Pittsburgh, Estados Unidos). O modelo mecânico foi configurado para reproduzir, da forma mais realista possível, as características mecânicas de um paciente adulto com SDRA moderada a grave, com esforços respiratórios espontâneos.(2323 ASL 5000 Active Servo Lung Precision Breathing Simulator. Advancing respiratory simulation: User’s manual. Pittsbutgh, PA: IngMar Medical; c1998-2003.
24 Vasconcelos RS, Sales RP, Melo LH, Marinho LS, Bastos VP, Nogueira AD, et al. Influences of duration of inspiratory effort, respiratory mechanics, and ventilator type on asynchrony with pressure support and proportional assist ventilation. Respir Care. 2017;62(5):550-7.-2525 Vasconcelos Rdos S, Melo LH, Sales RP, Marinho LS, Deulefeu FC, Reis RC, et al. Effect of an automatic triggering and cycling system on comfort and patient-ventilator synchrony during pressure support ventilation. Respiration. 2013;86(6):497-503.) Foram utilizados os parâmetros a seguir: complacência estática de 25mL/cmH2O e resistência inspiratória das vias aéreas de 10cmH2O/segundo.(2626 Ferreira JC, Chipman DW, Hill NS, Kacmarek RM. Bilevel vs ICU ventilators providing noninvasive ventilation: effect of system leaks: a COPD lung model comparison. Chest. 2009;136(2):448-56.) O esforço muscular respiratório (pressão muscular - Pmus) foi configurado de três formas distintas: sem esforço (Pmus: 0cmH2O), apenas esforço inspiratório (Pmus:-5cmH2O, tempo inspiratório neural de 0,6s) e esforço muscular tanto inspiratório quanto expiratório (Pmus:-5/+5cmH2O, com tempos inspiratório e expiratório neurais de 0,6 segundo cada).(1515 Perinel-Ragey S, Baboi L, Guérin C. Variability of tidal volume in patient-triggered mechanical ventilation in ARDS. Respir Care. 2017;62(11):1437-46.) A FR do paciente simulado foi ajustada em 20 respirações por minuto.
Ventiladores de unidades de terapia intensiva
Utilizaram-se cinco ventiladores de UTI: Esprit V-1000 (Respironics™, Murrysville, Estados Unidos), DX 3012 (Dixtal™, Buenos Aires, Argentina), Servo I (Maquet™; Solna, Suécia), Puritan-Bennet 840 (Covidien Mansfield, MA, Estados Unidos) e Savina 300 (Drager™, Lübeck, Alemanha). Todos os ventiladores utilizados usavam circuitos duplos (ramos inspiratório e expiratório) conectados a um adaptador em Y e um tubo orotraqueal (diâmetro de 8,0mm) sem sistema de umidificação.(2626 Ferreira JC, Chipman DW, Hill NS, Kacmarek RM. Bilevel vs ICU ventilators providing noninvasive ventilation: effect of system leaks: a COPD lung model comparison. Chest. 2009;136(2):448-56.,2727 Murata S, Yokoyama K, Sakamoto Y, Yamashita K, Oto J, Imanaka H, et al. Effects of inspiratory rise time on triggering work load during pressure-support ventilation: a lung model study. Respir Care. 2010;55(7):878-84.)
Protocolo experimental
Os ventiladores de UTI foram testados e calibrados segundo as recomendações de seus fabricantes. Utilizaram-se VCV e VCP. A VCV foi ajustada para fornecer VC-alvo de 420mL (6mL/kg para um peso corpóreo ideal - PCI - de 70kg) e tempo inspiratório de 0,8 segundo com fluxo constante (formato de onda quadrada) de 31L por minuto. A VCP foi ajustada para oferecer VC de 420mL, como no modo VCV, pela titulação cuidadosa da pressão de vias aéreas acima da pressão positiva expiratória final (PEEP), com o mesmo tempo inspiratório de 0,8 segundo. Em ambos os modos, ajustou-se uma PEEP de 10cmH2O e uma sensibilidade a pressão de 2cmH2O.(1515 Perinel-Ragey S, Baboi L, Guérin C. Variability of tidal volume in patient-triggered mechanical ventilation in ARDS. Respir Care. 2017;62(11):1437-46.,2525 Vasconcelos Rdos S, Melo LH, Sales RP, Marinho LS, Deulefeu FC, Reis RC, et al. Effect of an automatic triggering and cycling system on comfort and patient-ventilator synchrony during pressure support ventilation. Respiration. 2013;86(6):497-503.) No ventilador Savina 300™, os testes foram também realizados com o sistema AutoFlow® (AF) no modo VCV (VCV-AF). Resumidamente, esse sistema calcula a complacência respiratória em cada respiração e automaticamente libera um fluxo inspiratório inicial que iguala a proporção entre o VC-alvo e a complacência respiratória.(2828 Lasocki S, Labat F, Plantefeve G, Desmard M, Mentec H. A long-term clinical evaluation of autoflow during assist-controlled ventilation: a randomized controlled trial. Anesth Analg. 2010;111(4):915-21.) Outra característica desse modo é que ele permite respiração espontânea durante o ciclo respiratório, já que as válvulas expiratórias são mantidas abertas durante ambas as fases do ciclo respiratório.(2929 Peyn T, Rutten F. AutoFlow®: Incorporates the benefits of free breathing into volume controlled ventilation. Lübeck: Dräger Medical GmbH; 2012.)
Medidas e resultados
Cada cenário simulado foi registrado após estabilização do padrão respiratório, o que, em geral, ocorreu rapidamente - menos de 3 a 5 minutos - como esperado para uma simulação mecânica. A partir de então, foram gravados continuamente 5 minutos consecutivos da simulação, e se selecionaram 20 respirações representativas para análise off-line, utilizando o programa ASL 5000™ (LabVIEW, National Instruments, Austin, Texas, Estados Unidos). O total analisado foi de 1.100 respirações (três cenários, dois modos, duas regulagens de frequência respiratória, cinco ventiladores, AF, 20 respirações para cada). As análises envolveram as variáveis VC fornecido aos pulmões, pressões alveolares ao final da inspiração, pressões alveolares ao final da expiração (PEEP efetiva ou total) e a diferença entre a pressão alveolar e a Pmus (considerada um substituto para a pressão transpulmonar, já que no modelo mecânico não existe pressão pleural).
A figura 1 mostra os cenários simulados. Foram estudados dez cenários para cada ventilador. Para o ventilador Savina 300™, testou-se um cenário adicional com AF.
Cenários simulados segundo os modos ventilatórios e ajustes de frequência respiratória mandatória e a presença e tipos de esforços de respiração espontânea.
A figura 2 mostra curvas representativas que demonstram como as variáveis respiratórias foram medidas.
As variáveis são descritas como medianas e valores mínimo e máximo. Considerando-se a estabilidade do modelo mecânico e a variabilidade quase insignificante, escolhemos fazer comparações nominais entre os valores obtidos sem realizar testes estatísticos comparativos.(2424 Vasconcelos RS, Sales RP, Melo LH, Marinho LS, Bastos VP, Nogueira AD, et al. Influences of duration of inspiratory effort, respiratory mechanics, and ventilator type on asynchrony with pressure support and proportional assist ventilation. Respir Care. 2017;62(5):550-7.,2626 Ferreira JC, Chipman DW, Hill NS, Kacmarek RM. Bilevel vs ICU ventilators providing noninvasive ventilation: effect of system leaks: a COPD lung model comparison. Chest. 2009;136(2):448-56.) Discutiram-se as diferenças consideradas potencialmente relevantes do ponto de vista clínico. Valores de VC > 560mL (8mL/kg) e de pressão alveolar inspiratória final (Palv) > 28cmH2O foram predefinidos como clinicamente relevantes.
RESULTADOS
As tabelas 1 and 4 mostram os resultados de VC, Palv, PEEP total e pressão inspiratória final transpulmonar para os cinco ventiladores em todos os cenários simulados, e a figura 3 mostra a diferença entre o VC programado (420mL) e o observado nos modos VCV e VCP. Como previsto, o VC permaneceu constante, sem variações durante a VM controlada (sem esforço, Pmus = 0). Em geral, durante a VM assistida, o VC e as pressões alveolares aumentaram em todos os cenários com os modos VCV e VCP.
Dois ciclos respiratórios representativos mostrando o volume corrente, a pressão alveolar e a pressão muscular no mesmo gráfico.
Valores de volume corrente nos modos ventilação controlada por volume e ventilação controlada por pressão para todos os ventiladores e cenários simulados
Pressão alveolar no final da inspiração nos modos de ventilação controlada por volume e ventilação controlada por pressão para todos os ventiladores e cenários simulados
Pressão alveolar expiratória final ou pressão positiva expiratória final efetiva nos modos de ventilação controlada por volume e ventilação controlada por pressão para todos os ventiladores e cenários simulados
Pressão transpulmonar no final da inspiração nos modos de ventilação controlada por volume e ventilação controlada por pressão para todos os ventiladores e cenários simulados
Diferença entre o volume corrente programado e observado com os modos ventilação controlada por volume e controlada por pressão para cinco ventiladores em todos os cenários simulados. O volume corrente programado foi de 420mL.
Respiração assistida apenas com esforço inspiratório
Não ocorreram assincronias de disparo quando só estavam presentes esforços inspiratórios (Pmus =-5cmH2O), e a FR foi ajustada em um valor mais baixo (15 rpm) do que a FR do paciente (20 rpm). Quando disparado pelo paciente simulado, o VC mediano foi 27mL mais baixo do que o VC ajustado (faixa de - 63 a +79mL), quando se consideram os cinco ventiladores, e ocorreu uma variação na pressão alveolar ao final da inspiração, com mediana de 25,4cmH2O (faixa entre 20,5 e 30cmH2O). A pressão transpulmonar ao final da inspiração aumentou com a variação do VC (24,3 a 29). A variação do VC, neste caso, foi devida a eventos de assincronia.
Respirações assistidas com esforços inspiratórios e expiratórios
Os resultados dos cenários simulados em respiração espontânea com esforço muscular tanto inspiratório quanto expiratório (Pmus =-5cmH2O seguida por +5cmH2O) foram os seguintes: primeiro, com FR mandatória inferior à do paciente simulado, o VC mediano foi maior do que com respiração controlada, porém mais baixo do que o observado na VM assistida quando só estavam presentes esforços musculares inspiratórios em seis dos 11 ajustes de ventilador. Por outro lado, a Palv aumentou significantemente acima de 28cmH2O e os valores da pressão transpulmonar no final da inspiração foram similares aos obtidos quando só estava presente esforço muscular inspiratório. Segundo, o VC aumentou significantemente em sete dos 11 ajustes (valor mediano de 429, máximo 546 e mínimo 367) com FR mandatória maior do que a espontânea, enquanto os valores de Palv, PEEP total e Palv-Pmus mostraram a maior variação entre os cenários simulados, porém com valores medianos ainda mais baixos ou similares aos obtidos na situação de FR mais baixa com respiração assistida sincronizada.
Essas alterações foram relacionadas a dois fatores. No caso com menor FR mandatória, a presença de esforço muscular expiratório reduziu ou atenuou o aumento do VC em relação ao esforço inspiratório. No segundo caso, a presença de um esforço expiratório combinado com maior FR mandatória resultou em assincronias paciente-ventilador.
No cenário com a função AF ativa no modo VCV do ventilador Savina 300, o VC foi significantemente mais alto do que o VC medido quando essa função estava inativa.
Observaram-se valores similares de VC, Palv, PEEP e Palv-Pmus quando os modos VCV e VCP foram comparados no mesmo ventilador.
É interessante que a PEEP efetiva permaneceu em torno de 10cmH2O na maioria dos cenários, exceto quando a FR mandatória foi ajustada em valor mais alto e quando estavam presentes tanto esforço inspiratório quanto expiratório. Isso resultou tanto em aumentos quanto em diminuições (sub pressurização). Apenas o ventilador Savina 300 com a função AF ativa no modo VCV (VCV-AF) não mostrou reduções da PEEP abaixo do valor ajustado.
DISCUSSÃO
Os principais achados deste estudo podem ser resumidos como segue: ciclos de respiração assistida resultaram em VC mais alto do que o obtido em ciclos de respiração controlada, além de pressões alveolares mais altas, mesmo com respirações sincronizadas; assincronias de disparo causadas pelo ajuste de FR em nível mais alto do que a FR espontânea do paciente, independentemente do modo de ventilação - VCV ou VCP - ou do tipo de ventilador de UTI, provocaram grandes variações do VC e das pressões alveolares no final da inspiração; esforço expiratório precoce ativo durante a inspiração mecânica pode limitar o incremento do VC e o aumento correspondente das pressões de distensão alveolar na ausência de assincronias de disparo. Por outro lado, quando estavam presentes assincronias no disparo, a combinação dos esforços inspiratórios e expiratórios provocou grandes variações do VC, das pressões de distensão alveolar e da PEEP, inclusive super e subpressurização do último parâmetro. O sistema AF do modo VCV se associou com níveis mais altos de VC e pressão alveolar.
Estes resultados confirmam achados prévios que demonstraram os efeitos da respiração assistida no VC e na pressão aplicada aos pulmões.
Morais et al.(1818 Morais CC, Koyama Y, Yoshida T, Plens GM, Gomes S, Lima CA, et al. High positive end-expiratory pressure renders spontaneous effort noninjurious. Am J Respir Crit Care Med. 2018;197(10):1285-96.) estudaram um modelo experimental de SDRA utilizando coelhos e porcos sob VM e observaram que o esforço muscular aumentava a lesão pulmonar, especialmente no pulmão dependente, no qual foram gerados maior estresse e estiramento pulmonar local. Esse fenômeno foi minimizado pela utilização de PEEP elevada, que pode obscurecer a necessidade de uma paralisia muscular. Moraes et al.(3030 Moraes L, Silva PL, Thompson A, Santos CL, Santos RS, Fernandes MV, et al. Impact of different tidal volume levels at low mechanical power on ventilator-induced lung injury in rats. Front Physiol. 2018;9:318.) estudaram um modelo experimental de SDRA leve a moderada e identificaram que um VC alto se associou com LPIVM, e o controle do VC pareceu ser mais importante do que o controle da FR para aliviar a LPIVM. No presente estudo, em situações de esforço muscular inspiratório e expiratório, o VC esteve acima de 6mL/kg apenas em situações com FR ajustada acima de 25 respirações por minuto. Contudo, quando a FR foi ajustada em 15 respirações por minuto para o mesmo padrão de esforço, ocorreu aumento na pressão alveolar sem aumento do VC. A hipótese para este resultado é que a presença de esforço muscular respiratório teve efeito limitante no VC, impedindo que seu valor excedesse 6mL/kg. Biehl et al.(3131 Biehl M, Kashiouris MG, Gajic O. Ventilator-induced lung injury: minimizing its impact in patients with or at risk for ARDS. Respir Care. 2013;58(6):927-37.) enfatizam que a assincronia entre paciente e ventilador frequentemente limita o uso de baixo VC em pacientes com SDRA com necessidade de ventilação minuto elevada, enquanto ajustes dos parâmetros do ventilador e agentes sedativos têm efeito mais modesto na limitação da assincronia, em geral com necessidade de utilizar bloqueio neuromuscular. O presente estudo mostrou que, no modelo mecânico, bloqueio neuromuscular simulado, esforço muscular inspiratório e esforço muscular inspiratório/expiratório tiveram efeitos similares na variação do VC quando o modelo utilizou uma FR mais baixa (15 respirações por minuto) do que a do ventilador (FR de 25 respirações por minuto). Além disso, diferentes padrões de variação do VC e das pressões pulmonares só foram encontrados em condições em que o esforço muscular estava associado com FR mais alta (25 respirações por minuto) do que a do ventilador (FR de 20 respirações por minuto). Assim, é razoável considerar que a presença de esforço muscular não necessariamente potencializa as lesões pulmonares por VC excessivo.
O ajuste da FR é um parâmetro-chave para o controle da VM, especialmente em pacientes que desenvolvem SDRA. Alguns estudos relataram que, em sua maioria, os pacientes com insuficiência respiratória demandam frequência entre 20 e 30 ciclos por minuto, segundo suas necessidades.(88 Writing Group for the Alveolar Recruitment for Acute Respiratory Distress Syndrome Trial (ART) Investigators, Cavalcanti AB, Suzumura EA, Laranjeira LN, Paisani DM, Damiani LP, Guimaraes HP, et al. Effect of lung recruitment and titrated positive end-expiratory pressure (PEEP) vs low PEEP on mortality in patients with acute respiratory distress syndrome: a randomized clinical trial. JAMA. 2017;318(14):1335-45.,3131 Biehl M, Kashiouris MG, Gajic O. Ventilator-induced lung injury: minimizing its impact in patients with or at risk for ARDS. Respir Care. 2013;58(6):927-37.
32 Bellani G, Laffey JG, Pham T, Fan E, Brochard L, Esteban A, Gattinoni L, van Haren F, Larsson A, McAuley DF, Ranieri M, Rubenfeld G, Thompson BT, Wrigge H, Slutsky AS, Pesenti A; LUNG SAFE Investigators; ESICM Trials Group. Epidemiology, patterns of care, and mortality for patients with acute respiratory distress syndrome in intensive care units in 50 countries. JAMA. 2016;315(8):788-800.-3333 Sahetya SK, Mancebo J, Brower RG. Fifty years of research in ARDS. Vt selection in acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit Care Med. 2017;196(12):1519-25.) Entretanto, estudos experimentais com animais demonstraram que FR mais alta pode intensificar a LPIVM, e pulmões ventilados com FR mais baixa produziram menor edema e hemorragia perivascular do que os ventilados com FR mais alta.(3434 Hartmann EK, Boehme S, Bentley A, Duenges B, Klein KU, Elsaesser A, et al. Influence of respiratory rate and end-expiratory pressure variation on cyclic alveolar recruitment in an experimental lung injury model. Crit Care. 2012;16(1):R8.) Os resultados do presente estudo corroboram estes achados, já que o ajuste da FR no ventilador em um valor acima da FR do paciente gerou variações no VC e pressões pulmonares, incluindo valores acima de limites considerados seguros para a estratégia de ventilação protetora. Deve-se observar, contudo, que o estudo utilizou um modelo mecânico, no qual a FR do paciente foi um padrão fixo e não variou segundo as necessidades metabólicas. Richard et al.(1616 Richard JC, Lyazidi A, Akoumianaki E, Mortaza S, Cordioli RL, Lefebvre JC, et al. Potentially harmful effects of inspiratory synchronization during pressure preset ventilation. Intensive Care Med. 2013;39(11):2003-10.) compararam um estudo de bancada com um in vivo, e mostraram que tanto no modelo mecânico quanto em pacientes, o VC e sua variabilidade pareceram ser influenciados pelo relacionamento entre a FR do paciente e o ajuste de FR no ventilador - ou seja, quanto maior a FR, menor a possibilidade de sincronia dos ciclos respiratórios. Além de salientar a importância de ajustar o VC, esses achados também demonstram a influência da FR na variabilidade desse parâmetro ventilatório, pois o ajuste da FR no ventilador para um valor acima da FR do paciente gera variações do VC e das pressões, já que existe um esforço respiratório do paciente.
A pressão platô ou a pressão alveolar não podem e nem devem ser consideradas como um substituto para o estresse pulmonar, já que há evidência de valores similares de estresse para distintos níveis de VC.(3535 de Matos GF, Stanzani F, Passos RH, Fontana MF, Albaladejo R, Caserta RE, et al. How large is the lung recruitability in early acute respiratory distress syndrome: a prospective case series of patients monitored by computed tomography. Crit Care. 2012;16(1):R4.,3636 Talmor D, Sarge T, Malhotra A, O’Donnell CR, Ritz R, Lisbon A, et al. Mechanical ventilation guided by esophageal pressure in acute lung injury. N Engl J Med. 2008;359(20):2095-104.) No presente estudo, os valores de pressão alveolar ao final da inspiração, até recentemente descritos na literatura como preditores de lesão pulmonar quando acima de 30cmH2O, só aumentaram até esse limite quando havia Pmus-5/+5cmH2O com FR ajustada para 15 respirações por minto e 25 respirações por minuto, especialmente no modo VCP.
Briel et al.(3737 Briel M, Meade M, Mercat A, Brower RG, Talmor D, Walter SD, et al. Higher vs lower positive end-expiratory pressure in patients with acute lung injury and acute respiratory distress syndrome: systematic review and meta-analysis. JAMA. 2010;303(9):865-73.) identificaram que a redução do atelectrauma relacionado à LPIVM se associa com valores ideais de PEEP. Entretanto, o nível apropriado de PEEP ainda é assunto controvertido. Ensaios clínicos randomizados, estudos multicêntricos e metanálises não confirmaram que PEEP acima de 12cmH2O reduz a mortalidade em pacientes com SDRA.(3838 Meade MO, Cook DJ, Guyatt GH, Slutsky AS, Arabi YM, Cooper DJ, Davies AR, Hand LE, Zhou Q, Thabane L, Austin P, Lapinsky S, Baxter A, Russell J, Skrobik Y, Ronco JJ, Stewart TE; Lung Open Ventilation Study Investigators. Ventilation strategy using low tidal volumes, recruitment maneuvers, and high positive end-expiratory pressure for acute lung injury and acute respiratory distress syndrome: a randomized controlled trial. JAMA. 2008;299(6):637-45.
39 Brower RG, Lanken PN, MacIntyre N, Matthay MA, Morris A, Ancukiewicz M, Schoenfeld D, Thompson BT; National Heart, Lung, and Blood Institute ARDS Clinical Trials Network. Higher versus lower positive end-expiratory pressures in patients with the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2004;351(4):327-36.-4040 Mercat A, Richard JC, Vielle B, Jaber S, Osman D, Diehl JL, Lefrant JY, Prat G, Richecoeur J, Nieszkowska A, Gervais C, Baudot J, Bouadma L, Brochard L; Expiratory Pressure (Express) Study Group. Positive end-expiratory pressure setting in adults with acute lung injury and acute respiratory distress syndrome: a randomized controlled trial. JAMA. 2008;299(6):646-55.) Contudo, sabe-se que um volume expiratório final muito baixo pode estar relacionado à cíclica abertura e ao colapso de unidades alveolares instáveis. Nesse contexto, os efeitos deletérios da ventilação podem ser aliviados pela aplicação de PEEP para prevenir o desrecrutamento cíclico de alvéolos. Porém, a PEEP não deve ser alta o suficiente para levar à insuflação excessiva. No presente estudo, os níveis de PEEP permaneceram próximos ao valor de 10cmH2O em ambos os modos, exceto nas condições de assincronia, nas quais a PEEP atingiu valores acima desse nível quando configurou-se Pmus-5cmH2O, sugerindo hiperinsuflação devida à presença de auto-PEEP, e valores menores do que quando foi configurada Pmus-5/+5cmH2O, sugerindo despressurização do sistema.
Segundo Lasocki et al.,(2828 Lasocki S, Labat F, Plantefeve G, Desmard M, Mentec H. A long-term clinical evaluation of autoflow during assist-controlled ventilation: a randomized controlled trial. Anesth Analg. 2010;111(4):915-21.) o sistema AF se baseia em um princípio atraente: busca assegurar um VC ajustado enquanto mantém as vantagens da VCP. Apesar de essa potencial vantagem, não foram realizados ensaios clínicos e a sua eficácia clínica, em comparação com a VCV convencional, não foi formalmente demonstrada.
No presente estudo, o uso do sistema AF não mostrou vantagens com relação à assincronia paciente-ventilador em comparação com os modos convencionais VCV e VCP. Em situações de assincronia, o modo VCV-AF forneceu volumes correntes maiores, gerando maiores pressões pulmonares, que potencialmente poderiam agravar o desenvolvimento de LPIVM. O fornecimento de VC maior pode ser explicado pelo fato de que o fluxo inspiratório gerado em todas as condições experimentais no modo VCV-AF foi relativamente alto, quando comparado com o observado em outros modos de ventilação.
À vista da complexidade do estudo de pacientes críticos com SDRA, o presente estudo de bancada utilizou um modelo experimental que agregou variações nos padrões de esforço respiratório, modos ventilatórios e FR do ventilador, permitindo avaliar seu impacto no VC e nas pressões pulmonares durante a VM assistida em um modelo mecânico de SDRA. Considerando-se as dificuldades para condução de estudos junto ao leito, o simulador pulmonar ASL 5000™ permite o desenvolvimento de estudos com uso de uma simulação muito realista, com boa reprodutibilidade e confiabilidade, sem riscos para pacientes.
As implicações clínicas deste estudo incluem a reafirmação do impacto da influência do esforço muscular nas variações do VC e pressões pulmonares em pacientes com SDRA, salientar a importância do ajuste da FR do ventilador, o que é frequentemente negligenciado na prática levando à assincronia paciente-ventilador, e enfatizar a importância de uma escolha cuidadosa do modo ventilatório, assim como seu controle.
Este estudo teve algumas limitações. Ele utilizou um modelo mecânico do sistema respiratório. As condições de bancada não são equivalentes às de pacientes cujos esforços, complacência pulmonar e resistência do sistema respiratório podem ser altamente variáveis, enquanto o modelo teve Pmus inspiratória e expiratória e FR fixas, ou seja, o modelo mecânico não reage à demanda ventilatória, o que nos impediu de avaliar a resposta fisiológica do paciente às demandas metabólicas. Assim, os resultados precisam ser confirmados em pacientes. Outras limitações do estudo se referem ao fato de que as assincronias paciente-ventilador não foram avaliadas e a complacência dos circuitos do ventilador não foi medida, o que pode justificar as diferenças em termos de VC entre eles.
CONCLUSÃO
O ajuste de esforço muscular e frequência respiratória do ventilador pulmonar para um nível acima da frequência respiratória do paciente nos modos de ventilação assistida/ controlada produziu grandes variações no volume corrente e pressões pulmonares, enquanto o modo controlado não mostrou variações nesses parâmetros. Por outro lado, a presença de esforço muscular expiratório teve efeito limitante no volume corrente e impediu que o valor excedesse 6mL/kg. O modelo de ventilador pulmonar influencia na ventilação, mesmo com ajustes similares, o que reforça a necessidade de padronizar o modelo de ventilador pulmonar nos estudos multicêntricos. Os modos de ventilação controlada por volume, ventilação controlada por volume com o sistema AutoFlow® e controlada por pressão demonstraram comportamento ventilatório similar. Entretanto, o volume corrente e as pressões pulmonares foram ligeiramente mais altos nos modos de ventilação controlada por pressão e ventilação controlada por volume com sistema AutoFlow®, sugerindo que esses modos exigem um manejo mais cuidadoso durante a utilização de ventilação mecânica protetora com baixo volume corrente.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
24 Jan 2022 -
Data do Fascículo
2021
Histórico
-
Recebido
21 Dez 2020 -
Aceito
06 Jun 2021