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Ocorrência de alguns endo e ectoparasitos no serpentário da UNIFENAS - Universidade de Alfenas - MG

Occurrence of some endo and ectoparasites in the serpentarium of UNIFENAS - Universidade de Unifenas - MG

Resumos

Com o objetivo de estudar a fauna parasitológica dos ofídios do serpentário da UNIFENAS - Universidade de Alfenas, MG, foram necropsiados alguns espécimes de cascavéis (Crotalus durissus terrificus) e urutus (Bothrops alternatus), mantidos em cativeiro. Esses animais apresentavam anorexia, desidratação, diarréia, anemia e morte em torno de dois meses após o início dos sinais clínicos. Foram identificados helmintos dos gêneros Kalicephalus, Ophidascaris, Rhabdias e Oxyuris; protozoários do gênero Haemogregarina e acarinos do gênero Ophionysus. Aos sobreviventes foi administrado tratamento específico com Ivermectin, bem como terapia auxiliar à base de vitamina A e complexo B.

Crotalus durissus terrificus; Nematoda; Protozoários; Ácaro


Specimens of Crotalus durissus terrificus and Bothrops alternatus held in captivity by University of Alfenas- MG were examined with the aim of studying the parasitological fauna of the snakes. These animals showed anorexia, dehydration, diarrhea and anemia. Three rattlesnakes and two Bothrops alternatus died about two months after the beginning of the clinical signs. It were identified helmints of the genus Kalicephalus, Ophidascaris, Rhabdias and Oxyuris; protozoans of the genus Haemogregarina and mites of the genus Ophionysus. Ivermectin was administrated to the survivors.

Crotalus durissus terrificus; Nematoda; Protozoa; Mites


Ocorrência de alguns endo e ectoparasitos no serpentário da UNIFENAS - Universidade de Alfenas - MG

Occurrence of some endo and ectoparasites in the serpentarium of UNIFENAS – Universidade de Unifenas – MG

Terezinha ARAÚJO1 * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA. ; Luciana MORO; Maria LÚCIA1 * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA. ; Bárbara GOLLOUBEFF3 * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA. ; Anilton César VASCONCELOS2 * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA.

Correspondência para:

Anilton César Vasconcelos

Departamento de Patologia Geral

Instituto de Ciências Biológicas

Universidade Federal de Minas Gerais

31270-010 – Belo Horizonte – MG

anilton@icb.ufmg.br

RESUMO

Com o objetivo de estudar a fauna parasitológica dos ofídios do serpentário da UNIFENAS - Universidade de Alfenas, MG, foram necropsiados alguns espécimes de cascavéis (Crotalus durissus terrificus) e urutus (Bothrops alternatus), mantidos em cativeiro. Esses animais apresentavam anorexia, desidratação, diarréia, anemia e morte em torno de dois meses após o início dos sinais clínicos. Foram identificados helmintos dos gêneros Kalicephalus, Ophidascaris, Rhabdias e Oxyuris; protozoários do gênero Haemogregarina e acarinos do gênero Ophionysus. Aos sobreviventes foi administrado tratamento específico com Ivermectin, bem como terapia auxiliar à base de vitamina A e complexo B.

UNITERMOS: Crotalus durissus terrificus; Nematoda; Protozoários; Ácaro.

INTRODUÇÃO

Os parasitos internos e externos dos ofídios têm sido pouco estudados em nosso meio. Muitas espécies de endo e ectoparasitos foram descritas em outras regiões do mundo; sendo a maior parte delas considerada patogênica2. Os mecanismos de lesão e os efeitos deletérios não são bem conhecidos, mas sabe-se que algumas espécies são hematófagas, outras podem causar obstrução do trato digestivo e competir com o organismo por nutrientes, além de favorecerem infecções bacterianas10. Considerando o incentivo à criação de serpentes visando à produção de soro antiofídico e à utilização do veneno das cobras na terapia dos infartos e aproveitando-se da mortalidade observada no serpentário da UNIFENAS – Universidade de Alfenas – MG, buscou-se identificar alguns endo e ectoparasitos e assim oferecer uma contribuição ao estudo da fauna parasitológica dessas espécies no Brasil.

MATERIAL E MÉTODO

1. Histórico e necropsia das serpentes:

O material estudado é oriundo do serpentário da UNIFENAS – Universidade de Alfenas, em MG – cujo plantel compunha-se de 150 animais. Entre os exemplares enfermos, observavam-se sinais de anorexia, desidratação, diarréia, anemia e a morte sobrevinha, em média, dois meses após o início dos sinais clínicos. As serpentes eram da família Viperidae, sendo três cascavéis (Crotalus durissus terrificus) e dois urutus (Bothrops alternatus) e foram necropsiadas após morte natural. Na ocasião, foram colhidas amostras de fezes, ectoparasitos, raspados de mucosa intestinal e sangue (através de punção cardíaca) para exames laboratoriais.

2. Exames laboratoriais

2.1. Exames parasitológicos de fezes: Foram utilizados o método de flutuação em solução saturada de NaCl e o de sedimentação em água destilada, de acordo com o descrito por Matos; Matos8.

2.2. Esfregaços sangüíneos: Foram fixados e corados pelo método de May Grünwald & Giemsa, segundo o descrito por Hoffmann6 para pesquisa e identificação de hematozoários.

2.3. Raspados de mucosa intestinal: Para a pesquisa de ovos, larvas e parasitos adultos (helmintos), bem como para a detecção de oocistos e formas imaturas de protozoários, raspados de mucosa foram processados conforme descrito por Georgi5.

2.4. Identificação de ectoparasitos: Após colhidos, os parasitos foram diafanizados e posteriormente examinados ao microscópio, de acordo com Hoffmann6.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

1. Necrópsias

As cinco serpentes necropsiadas encontravam-se parasitadas por pelo menos uma espécie de helminto, enquadrada na classe Nematoda e nos gêneros Ophidascaris e Rhabdias.

Os Ophidascaris sp foram os nematelmintos mais freqüentes (sendo encontrados em todos os espécimes necropsiados) do trato digestivo das cobras (Fig. 1a e 1b), fato também observado por outros autores4,9,10. A infestação era severa, com lesões macroscópicas sugestivas de gastroenterite, tais como espessamento da parede do estômago e intestino, hiperemia e hemorragia de mucosa. Esse nematelminto freqüentemente é encontrado parasitando o esôfago, estômago e intestino delgado. As formas adultas do Ophidascaris mediam cerca de 10 cm de comprimento. De acordo com Jones7, o tamanho desses parasitos varia conforme a posição geográfica, espécie hospedeira e parece estar relacionado com a umidade e temperatura ambiente. Os sinais clínicos observados em cobras parasitadas pelo Ophidascaris, no presente trabalho, foram: anorexia e/ou regurgitação. Segundo Telford9, a causa dessas alterações gástricas está associada à obstrução e irritação da mucosa do estômago pela presença dos parasitos adultos.

Figura 1

Os Rhabdias sp foram encontrados na traquéia de um exemplar de Bothrops alternatus (urutu) necropsiado (Fig. 1c). Para Wallach; Boever10, o Rhabdias sp induz, com freqüência, uma pneumonia de caráter exsudativo. Entre os sinais clínicos observados no exemplar acometido destacavam-se: dificuldade respiratória e presença de exsudato na glote.

2. Exames laboratoriais

2.1. Exames coproscópicos:

Os exames de fezes realizados evidenciaram ovos pertencentes aos seguintes gêneros da classe Nematoda: Ophidascaris, Kalicephalus e Oxyuris.

Os ovos redondos com casca espessa dos Ophidascaris foram os mais evidentes e facilmente identificados (Fig. 1d, seta curta e cheia).

As fêmeas do gênero Kalicephalus põem ovos de casca relativamente fina, que foram evidenciados nos exames (Fig. 1d, seta curta e vazia). O Kalicephalus parasita o esôfago, estômago e duodeno das cobras. As infecções produzidas pelo gênero Kalicephalus não são tão evidentes nas serpentes quando comparados com a ancilostomíase dos mamíferos9. Em infecções severas por Kalicephalus sp podem ser evidenciados os seguintes sinais clínicos: perda de peso, anorexia e fezes sanguinolentas e/ou mucóides. Podem-se observar hemorragias da mucosa do esôfago, estômago e duodeno das serpentes2. Apesar de terem sido efetuados raspados das mucosas do esôfago, estômago e intestino delgado dos espécimes necropsiados, não foram visualizados parasitos adultos do gênero Kalicephalus, muito embora tenham sido observadas hemorragias ao longo do trato digestivo e a presença de ovos pertencentes a esse gênero.

Ovos de Oxyuris sp também foram encontrados nos exames coproscópicos (Fig. 1d, seta longa). Segundo Telford9 e Gabrisch; Zwart4, os Oxyuris são encontrados parasitando o intestino grosso das serpentes, que se infectam através da ingestão de ovos infectantes (contaminação fecal), muito comum no cativeiro.

Gabrisch; Zwart4 e Wallach; Boever10 relatam que o diagnóstico parasitológico é feito a partir da visualização de ovos ou formas larvárias em coproscopia pelos métodos de flutuação em solução saturada de NaCl e de sedimentação. Pode ocorrer que nas fezes das serpentes sejam encontrados ovos dos parasitos dos animais que lhes servem de alimento1,4,10. A presença dos parasitos adultos ou de lesões macroscópicas compatíveis com a infecção parasitária assume importância na distinção entre infecção da serpente ou dos animais que lhe serviram de alimento.

2.2. Esfregaços sangüíneos:

Nos esfregaços sangüíneos foram visualizados protozoários do gênero Haemogregarina. Esse hematozoário foi observado parasitando as hemácias do sangue circulante de todas as cobras (Fig. 2a). A Haemogregarina é pouco patogênica; é normalmente encontrada em animais sadios e só causa alterações (principalmente anemia) quando em infecções severas. Muitas espécies de hematozoários podem ser encontradas no sangue dos répteis. Esses hemoparasitos são visualizados, ora livremente no plasma, ora parasitando as células sangüíneas. Segundo Wallach; Boever10, os gêneros que parasitam o sangue dos répteis são: Schellackia, Lankesterella, Haemogregarina, Hepatozoan, Kariolysus, Plasmodium, Haemoproteus, Babesioma e Dactilosoma. Esses protozoários possuem ciclo evolutivo indireto e, de acordo com os mesmos autores, os hospedeiros intermediários podem ser as moscas, sanguessugas e pequenos ácaros.

Figura 2

Haemogregarina parasitando as hemácias do sangue circulante (coloração de May Grünwald Giemsa; aumento de 1.200 X); b) Ophionysus natricis, ácaro vetor da Haemogregarina, encontrados na pele de espécimes de Bothrops alternatus; c) Lesões brancacentas na cabeça de um urutu, causadas pelos ácaros Ophionysus natricis.

2.3. Ectoparasitos:

Vários ectoparasitos identificados como pertencentes à ordem Acari, espécie Ophionysus natricis, foram encontrados em todos os espécimes necropsiados, mas principalmente nos urutus (Bothrops alternatus) (Fig. 2b). Nessa espécie, os ácaros causavam lesões brancacentas na pele, principalmente na região da cabeça (.Fig 2c). Os critérios utilizados para a classificação morfológica dos ectoparasitos foram os descritos por Flechtmann3.

De acordo com Wallach; Boever10 e Gabrisch; Zwart4, os acarinos mais comuns e mais patogênicos para as cobras pertencem ao gênero Ophionysus. Esse acarino causa severa anemia e é também responsável pela transmissão de protozoários (Haemogregarina sp) e de bactérias causadoras de septicemia.

2.4. Considerações finais:

Todas as cobras do serpentário da UNIFENAS foram posteriormente submetidas ao tratamento com Ivermectin* * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA. na dosagem de 0,2 mg/kg de peso vivo por via subcutânea, para combate aos helmintos e acarinos. Esse tratamento foi preconizado por Gabrisch; Zwart4. Em substituição ao Ivermectin, também é indicada a base fenbendazole** * 1 Universidade de Alfenas – MG 2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG 3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda. ** Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA. , na dosagem de 10 a 20 mg/kg de peso vivo, via oral, durante cinco dias, para combate aos nematelmintos4. Para facilitar o manejo (considerando-se o odor e o sabor na água de bebida) e evitar maior estresse no manuseio dos animais, a base Ivermectin foi a escolhida no serpentário em questão. Os animais, em geral, responderam bem ao tratamento. Porém, aqueles que apresentavam severa infestação por Ophidascaris não resistiram e vieram a óbito.

CONCLUSÕES

Pelas condições em que o trabalho foi realizado, pode-se concluir que, no serpentário da Universidade de Alfenas – MG, as serpentes podem ser parasitadas por várias espécies de endo e ectoparasitos em infecções mistas. Neste estudo, baseado em necrópsias, foram encontrados helmintos e/ou ovos dos gêneros Ophidascaris, Kalicephalus, Rhabdias e Oxyuris; protozoários do gênero Haemogregarina e acarinos da espécie Ophionysus natricis.

SUMMARY

Specimens of Crotalus durissus terrificus and Bothrops alternatus held in captivity by University of Alfenas- MG were examined with the aim of studying the parasitological fauna of the snakes. These animals showed anorexia, dehydration, diarrhea and anemia. Three rattlesnakes and two Bothrops alternatus died about two months after the beginning of the clinical signs. It were identified helmints of the genus Kalicephalus, Ophidascaris, Rhabdias and Oxyuris; protozoans of the genus Haemogregarina and mites of the genus Ophionysus. Ivermectin was administrated to the survivors.

UNITERMS: Crotalus durissus terrificus; Nematoda; Protozoa; Mites.

Recebido para publicação: 16/05/1997

Aprovado para publicação: 18/06/1998

  • 1
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  • 2
    - COOPER, J.E. Disease in east African snakes associated with Kalicephalus worms (Nematoda: Dianocephalidae). Veterinary Record, v.89, n.14, p.385-8, 1971.
  • 3
    - FLECHTMANN, C.H.W. Ácaros de importância médico-veterinária 2.ed. São Paulo : Nobel, 1977. p.24-44.
  • 4
    - GABRISCH, K.; ZWART, P. Schlangen. In: Kraukheiten der heimtiere Hannover : Schlütersche, 1985. p.287-312.
  • 5
    - GEORGI, J.R. Parasitologia veterinária Rio de Janeiro : Interamericana, 1982. p.170-1.
  • 6
    - HOFFMANN, R.P. Diagnóstico de parasitismo veterinário Porto Alegre : Sulina, 1987. p.105-26.
  • 7
    - JONES, H.I. Observations on nematodes from west and central Australian snakes. Australian Journal of Zoology, v.28, p.423-33, 1980.
  • 8
    - MATOS, M.S.; MATOS, P.F. Laboratório clínico veterinário Salvador : Arco-Íris. 1981. p.190-207.
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    - TELFORD, S.R. Parasitic diseases of the reptiles. Journal of American Veterinary Medical Association, v.159, n.11, p.1644-52, 1971.
  • 10
    - WALLACH, J.D.; BOEVER, W.S. Diseases of exotic animals, medical and surgical management Philadelphia : W.B. Saunders, 1983. p.979-1008: Reptiles and amphibians.
  • *
    1 Universidade de Alfenas – MG
    2 Departamento de Patologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG – MG
    3 Polícia Militar de Minas Gerais – MG
    Ivomec; Merck, Sharp & Dohme Ltda.
    **
    Panacur; Quimio Produtos Químicos Com. e Indústria SA.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Set 2000
    • Data do Fascículo
      1999

    Histórico

    • Recebido
      16 Maio 1997
    • Aceito
      18 Jun 1998
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