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Glioblastoma: enfoque no tratamento de pacientes idosos

Resumos

O tratamento de idosos com câncer é um desafio para a prática oncológica, especialmente no que se refere à terapêutica multimodal do glioblastoma. Nessa população, a ressecção ampla do tumor oferece a melhor chance de controle local e, naqueles pacientes que mantenham um bom performance status, a radioterapia complementar deve sempre ser levada em consideração. A quimioterapia também tem um papel no tratamento, sendo a temozolomida a droga de eleição. Frente à heterogeneidade desses pacientes, uma avaliação geriátrica ampla é um instrumento valioso no auxílio da decisão terapêutica em idosos com glioblastoma.

Glioblastoma; Idoso; Avaliação geriátrica; Radioterapia; Antineoplásicos alquilantes


Treating elderly cancer patients is a challenge for oncologists, especially considering the several therapeutic modalities in glioblastoma. Extensive tumor resection offers the best chance of local control. Adequate radiotherapy should always be given to elderly patients if they have undergone gross total resection and have maintained a good performance status. Rather than being ruled out, chemotherapy should be considered, and temozolomide is the chosen drug. A comprehensive geriatric assessment is a valuable tool to help guiding treatment decisions in elderly patients with glioblastoma.

Glioblastoma; Aged; Geriatric assessment; Radiotherapy; Antineoplasic agents, alkylating


REVISÃO

IDepartamento de Oncologia Clínica, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP) Brasil

IIDepartamento de Oncogeriatria, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP) Brasil

IIIDepartamento de Neuro-oncologia, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP) Brasil

IVDepartamento de Radioterapia, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP) Brasil

VDepartamento de Neurocirurgia, Hospital Israelita Albert Einstein - HIAE, São Paulo (SP) Brasil

Autor correspondente

RESUMO

O tratamento de idosos com câncer é um desafio para a prática oncológica, especialmente no que se refere à terapêutica multimodal do glioblastoma. Nessa população, a ressecção ampla do tumor oferece a melhor chance de controle local e, naqueles pacientes que mantenham um bom performance status, a radioterapia complementar deve sempre ser levada em consideração. A quimioterapia também tem um papel no tratamento, sendo a temozolomida a droga de eleição. Frente à heterogeneidade desses pacientes, uma avaliação geriátrica ampla é um instrumento valioso no auxílio da decisão terapêutica em idosos com glioblastoma.

Descritores: Glioblastoma/terapia; Idoso; Avaliação geriátrica; Radioterapia; Antineoplásicos alquilantes/uso terapêutico

INTRODUÇÃO

A população está envelhecendo no mundo inteiro e, consequentemente, o diagnóstico do câncer está aumentando. A incidência de câncer é 11 vezes maior em pessoas com mais de 65 anos do que em pessoas mais jovens. Dentre as mortes por câncer, 70% ocorrem em pacientes com mais de 70 anos de idade.(1) Nos Estados Unidos, aproximadamente 50% dos novos casos de glioblastoma (GBM) ocorrem em pacientes com idade superior a 65, e nessa população de pacientes a incidência de GBM é de cerca de 13/100 mil por ano(2,3).

O tratamento de pacientes idosos é um grande desafio para a maioria dos tipos de câncer, e diferentes modalidades de tratamento são controversas no cenário de um paciente idoso com GBM. Poucos dados foram publicados a respeito do tratamento do GBM em uma população de pacientes idosos, e é bastante comum poupar os idosos de modalidades de tratamento do GBM como cirurgia, radioterapia (RT) e terapia sistêmica, sem uma avaliação adequada de seus riscos e benefícios reais.

Neste artigo, realizamos uma revisão não sistemática do GBM em pacientes idosos, discutindo terapia, prognóstico e ferramentas disponíveis e que poderiam ajudar a selecionar pacientes para a intervenção mais adequada.

Fatores prognósticos e preditivos

A idade avançada é o fator mais importante de prognóstico para pacientes idosos com GBM. Para todos os pacientes com GBM, independentemente da idade, mesmo quando tratados agressivamente com cirurgia, radiação e quimioterapia, a sobrevida média é de cerca de apenas 15 meses(4). Em um estudo que avaliou pacientes com mais de 70 anos, a sobrevida média entre 3.298 pacientes foi de apenas 4 a 5 meses(5). As razões desse curso aparentemente mais agressivo da doença não são bem compreendidas. Em um estudo retrospectivo de 2.836 pacientes com mais de 70 anos, apenas 46% receberam o que era visto como a terapia padrão, ou seja, cirurgia, seguida de RT, o que sugere que o tratamento heterogêneo seja um grande componente para explicar esse pior prognóstico(6). Outros prováveis responsáveis pelo prognóstico pior observado incluem maior número de comorbidades e, consequentemente, uso de diversos medicamentos, interações medicamentosas e alta toxicidade da terapia sistêmica, como mielossupressão, mucosite e cardiotoxicidade, tudo levando a maior mortalidade(7).

A metilação do gene O6-metilguanina-DNA metiltransferase (MGMT) é reconhecidamente associada a uma melhor resposta à temozolomida (TMZ); indiscutivelmente, é a quimioterapia mais comum utilizada em GBM(8). A MGMT é uma importante enzima responsável pela reparação do DNA, tal como a induzida por TMZ e outros agentes de alquilação. O silenciamento epigenético da MGMT por meio da metilação de seu promotor resulta em uma reparação reduzida do DNA e uma melhor eficácia da quimioterapia(9). A metilação do promotor de MGMT está presente em cerca de 40% dos pacientes idosos com GBM, semelhante à percentagem encontrada em pacientes mais jovens(10). Alguns dados sugerem que o valor preditivo da metilação também está presente nos idosos. Minniti et al.(11) identificaram 83 pacientes de mais de 70 anos com GBM, com metilação do promotor MGMT em 50% e uma sobrevida mediana de 15,3 meses versus 10,3 meses naqueles sem metilação (p=0,0001). Apesar de alguns autores sugerirem usar sistematicamente a metilação do promotor da MGMT como preditor de benefício da quimioterapia, a avaliação dessa metilação não está bem padronizada. Além disso, existe considerável evidência de variabilidade intratumoral na metilação do promotor, bem como uma alteração no estado de metilação induzida pela RT, o que exige certo cuidado em sua utilização como um marcador preditivo(12,13).

Dados recentes apontaram que o prognóstico de pacientes com GBM também é determinado por uma interação complexa entre idade e várias alterações genéticas, tal como mostrado na tabela 1. Batchelor et al.(14) demonstraram que as alterações genéticas variam em diferentes grupos etários. Para os pacientes com mais de 70 anos, a mutação no gene TP53 foi associada a uma menor sobrevida (HR=7,54; intervalo de confiança de 95% - IC95%: 2,38-23,87), enquanto que, para os pacientes com menos de 70 anos, essa associação com a sobrevida não estava presente (HR=0,84; IC95%: 0,49-1,42). Da mesma forma, a deleção do CDKN2A/ p16 foi associada a um pior prognóstico em pacientes com mais de 70 anos (HR=11,48; IC95%:1,97-66,78). Por outro lado, o valor prognóstico positivo da perda do cromossomo 1p36 foi mais pronunciado em pacientes com mais de 60 anos de idade (HR=0,1; IC95%: 0,01-0,78).

A expressão do gene do receptor do fator de crescimento epidérmico (EGFR) está frequentemente aumentada no GBM, e sua amplificação está associada à progressão da doença. Existem resultados controversos em relação à implicação prognóstica da amplificação do EGFR. Ao contrário da implicação prognóstica negativa observada em indivíduos jovens, em pacientes com mais de 75 anos de idade, Kleinschmidt et al.(15) demonstraram que as pessoas com EGFR amplificado tinham uma sobrevida mais prolongada do que aquelas sem a amplificação (mediana de 10,5 versus 2 meses). Quan et al.(16) não conseguiram encontrar qualquer implicação prognóstica na amplificação do EGFR, independentemente da idade.

Bredel et al.(17) identificaram que a deleção do NFKBIA, um gene responsável por inibir a sinalização por meio do EGFR, é bastante comum em algumas formas de GBM. Essa deleção está associada a maior agressividade do tumor, menor resposta à TMZ e pior prognóstico. Não há dados específicos sobre a deleção do NFKBIA em pacientes idosos.

Outras alterações genéticas foram estudadas, como o índice MIB-1 e a expressão da proteína YKL-4, com resultados contraditórios(18). Apesar de todas essas correlações genéticas com GBM e idade, ainda não está claro se a idade avançada tem um pior prognóstico em relação a determinadas características genéticas do tumor, ou se o prognóstico é bastante restrito principalmente devido a outras comorbidades clinicamente relevantes.

Peculiaridades do tratamento cirúrgico em idosos

Em pacientes com idade inferior a 65 anos, a evidência clínica favorece a ressecção cirúrgica mais ampla possível com preservação da função(20). Nos idosos, a cirurgia agressiva é realizada com menos frequência, com base principalmente em uma reserva fisiológica menor e no risco de complicações perioperatórias.

A ressecção total ou mesmo parcial confere um prognóstico melhor do que somente a biópsia. A ressecção ampla confere uma sobrevida de até 12 meses, ao passo que, com apenas biópsia, raramente chega a 6 meses(21). Ewelt et al.(22) analisaram, retrospectivamente, os dados de 103 pacientes com mais de 65 anos com GBM. Nesse grupo de pacientes, a sobrevida estava intimamente relacionada à extensão da ressecção: apenas biópsia, ressecção parcial, ou ressecção total resultaram em uma sobrevida de 2,2 meses, 7 meses e 13,9 meses, respectivamente. Mesmo quando o tratamento adicional com radiação e quimioterapia foram levados em consideração, a diferença de prognóstico relacionada à extensão da cirurgia permaneceu significativa. Assim, até que dados randomizados prospectivos estejam disponíveis, deve ser evitado o uso da idade, por si só, como contraindicação para uma ressecção mais extensa.

Os avanços na técnica neurocirúrgica, menor duração da cirurgia e melhores cuidados perioperatórios tornaram uma ressecção mais ampla possível na maioria dos pacientes. Para os pacientes candidatos à cirurgia, os seguintes achados pré-operatórios foram identificados como preditores de sobrevida mais curta: performance status de Karnofsky (PSK) <80, doença pulmonar obstrutiva crônica, tumor >4cm, associação a sintomas como déficit motor, de linguagem ou cognitivo(20).

Peculiaridades da RT

A RT pós-operatória é o tratamento padrão para o GBM, tanto após citorredução máxima quanto após a biópsia limitada, conferindo maior sobrevida quando comparada com apenas os cuidados de suporte(18). RT não só melhora a sobrevida, mas também ajuda no controle dos sintomas relacionados ao tumor. O tratamento mais comum de RT consiste em 54 a 60Gy, divididos em frações de 2Gy, ao longo de 5 a 6 semanas de tratamento.

A eficácia da RT foi sugerida pela primeira vez em dados retrospectivos a partir dos resultados do banco de dados Surveillance, Epidemiology and End Results (SEER) envolvendo 2.836 pacientes com GBM e mais de 70 anos, diagnosticados entre 1993 e 2005. Os dados mostraram que os pacientes que receberam RT tiveram uma sobrevida geral e específica para câncer em comparação com aqueles que não receberam RT (HR=0,43; IC95%: 0,38-0,49). A sobrevida mediana foi de 8 e 3 meses, respectivamente(6). Esses resultados foram posteriormente confirmados em estudo multicêntrico prospectivo, publicado em 2007, por Keime-Guibert et al.(23), envolvendo 85 pacientes tratados em 10 diferentes centros médicos na França. Os pacientes foram operados e, então, randomizados para receber RT (frações diárias de 1,8Gy de um total de 50Gy) ou as melhores medidas de suporte. Os resultados favoreceram a RT, com sobrevida mediana de 29,1 versus 16,9 semanas (HR=0,47 para morte; IC95%: 0,29-0,76; p=0,002). Apesar do fato de que os idosos são mais suscetíveis aos efeitos adversos da RT para o tecido cerebral, nesse estudo não houve diferença em termos de função cognitiva ou de qualidade de vida entre os dois grupos de tratamento. É possível que a sobrevida curta tenha impedido a documentação dos efeitos prejudiciais da RT. Na prática da maioria dos neuro-oncologistas, o declínio cognitivo é aparentemente causado pela progressão da doença na maioria dos casos(24).

Avaliou-se o fracionamento alternativo, para se obter um curso mais curto de RT e facilitar a adesão e a comodidade para esses pacientes frequentemente debilitados. Roa et al.(25) randomizaram 100 pacientes com GBM e mais de 60 anos para receber RT padrão (60Gy em 30 frações, ao longo de 6 semanas) ou um curso abreviado (40Gy em 15 frações, ao longo de 3 semanas), sem quimioterapia concomitante. A sobrevida global mediana foi de 5,1 e 5,6 meses, respectivamente, para a RT padrão e curta. Esses resultados foram apoiados por dados retrospectivos de Lutterbach e Ostertag(26), que descreveram o tratamento hipofracionado de 42Gy, em 12 frações, durante 2,5 semanas, tendo por resultado uma sobrevida global semelhante à do tratamento tradicional de RT (7,3 versus 5,6 meses, respectivamente, p=0,2). A tabela 2 resume as publicações que analisaram uma população de pacientes geriátricos com GBM e tratados com RT.

Peculiaridades do tratamento sistêmico

O tratamento de pacientes idosos com quimioterapia, muitas vezes, é controverso na maioria dos tipos de câncer, e o GBM não é exceção. A farmacocinética e a farmacodinâmica dos medicamentos são alteradas em idosos, por diversas razões. Alterações da motilidade intestinal, a vascularização esplênica, a secreção de enzimas digestivas e a atrofia da mucosa podem interferir na absorção de medicamentos administrados por via oral, como a TMZ e a lomustina, alguns dos quimioterápicos utilizados com mais frequência no GBM(27). A atividade do citocromo P450 diminuiu em 20 a 25% nos idosos, levando à metabolização inadequada de drogas antiepilépticas, que, por outro lado, podem interferir no metabolismo de quimioterápicos, como irinotecano e procarbazina(28). A reserva diminuída da medula óssea também predispõe os idosos a um efeito mielossupressivo mais grave dos medicamentos quimioterápicos, favorecendo infecções.

Os resultados de uma meta-análise com 12 ensaios clínicos randomizados(29) demonstraram que a quimioterapia adjuvante melhora a sobrevida global em pacientes com gliomas de alto grau. Entre os 3.004 pacientes incluídos nessa análise, 28% tinham mais de 60 anos. Essa população de pacientes teve o mesmo benefício estatisticamente significativo com quimioterapia que a população em geral.

Embora esquemas terapêuticos que incluem carmustina (BCNU), ou a combinação PCV (procarbazina, lomustina e vincristina), tenham resultado em uma sobrevida global um pouco mais longa em pacientes com GBM, tendo em vista sua significativa mielotoxicidade, eles devem provavelmente ser evitados na população idosa(30).

TMZ é um agente alquilante, com um perfil de toxicidade bastante seguro. Na maioria dos estudos clínicos com o medicamento, menos de 10% dos pacientes desenvolveram toxicidade hematológica 3 ou 4 pelos Critérios Comuns de Toxicidade (CTC), e menos de 2% dos pacientes tiveram que suspender o medicamento devido aos efeitos secundários(31). A apresentação oral e a tolerabilidade, além de um clearance independente da função renal ou hepática, fizeram da TMZ uma droga muito aceitável para os pacientes idosos.

O tratamento padrão para o GBM, com base em ensaios, incluindo sempre pacientes com menos de 70 anos, é a cirurgia, seguida de RT concomitante com 75mg/m2 por dia de TMZ, seguida de 12 ciclos de 150 a 200 mg/m2 de TMZ, durante 5 dias, a cada 28 dias, por 6 a 12 meses(4). Embora haja uma falta de dados reais randomizados para o tratamento em idosos, a maioria dos especialistas concorda que a TMZ associada à RT seja bem tolerada em idosos, com PSK>80(32,33). Fiorica et al.(32) publicaram os dados de 42 pacientes com GBM e mais de 65 anos, que receberam RT+TMZ, seguidas de TMZ. Com uma sobrevida mediana de 10,2 meses, o tratamento foi bem tolerado. A maioria (69%) não apresentou nenhuma toxicidade relacionada à droga; 23,8% apresentaram mielotoxicidade (apenas 7% de grau 3); e 16,7% apresentaram toxicidade neurológica, que foi revertida com o uso de esteroides. Não houve relatos de morte relacionada ao tratamento.

Minniti et al.(34) avaliaram o uso concomitante de TMZ com um tratamento de RT curta. Nesse estudo de fase II, 71 pacientes com idade superior a 70 anos, com diagnóstico recente de GBM e PSK>60, foram tratados com RT de curta duração (40Gy em 15 frações, durante 3 semanas) com TMZ concomitante, seguido de 12 meses de TMZ adjuvante. A sobrevida global foi de 12,4 meses; apenas um paciente interrompeu a TMZ durante a RT devido à trombocitopenia grau 2, e 8% descontinuaram o tratamento adjuvante devido à mielotoxicidade. Os sintomas mais comuns de toxicidade não hematológica foram fadiga (10% durante RT, 17% durante TMZ adjuvante) e náuseas (11%).

Um ensaio de fase III (EORTC 26.062-22.061) está analisando a TMZ concomitantemente a um tratamento curto de RT em comparação à RT isolada, em pacientes com mais de 65 anos(35).

A questão de saber se o estado de metilação do promotor de MGMT deve ser utilizado como um meio para selecionar pacientes para o tratamento com TMZ foi discutida anteriormente nesta análise e não existem dados específicos disponíveis para pacientes idosos.

Para os pacientes que não são candidatos a RT devido a condições preexistentes, como demência ou acidentes vasculares cerebrais, a TMZ isolada pode ser levada em consideração. Gállego Pérez-Larraya et al.(36) selecionaram pacientes com mais de 70 anos e com PSK<70 e administraram somente TMZ na dose de 150 a 200mg/m2 por dia, durante 5 dias, a cada 28 dias, num total de 12 ciclos, até apresentar progressão da doença. Entre os pacientes, 91,4% não foram tratados cirurgicamente, e 62,9% tinham um PSK de 60. Embora a sobrevida global mediana tenha sido de apenas 25 semanas (IC95%: 19 a 28 semanas), 51,5% alcançaram estabilização da doença e, mais importante, 32,9% tiveram uma melhora no PSK de, pelo menos, 20 pontos; 25% foram capazes de exercer autocuidado. A mediana de sobrevida livre de progressão foi de 16,1 semanas (IC95%: 10,2 a 20 semanas).

Não existem dados publicados sobre o tratamento de segunda linha para pacientes idosos com GBM. Os estudos sobre a combinação de irinotecano e bevacizumabe, que se tornou um esquema terapêutico frequente para GBM recorrente, não incluiu pacientes com idade acima de 70 anos. Assim, qualquer decisão sobre o tratamento de GBM recidivante em idosos deve ser cuidadosamente discutida, com atenção às comorbidades (em especial aquelas que predispõem a eventos cardiovasculares, um risco bem conhecido associado ao uso de bevacizumabe), à capacidade funcional, à localização da recorrência e à preferência do paciente.

O bevacizumabe está sendo estudado nessa população de pacientes. Um estudo de fase II (NCT 01149850) analisará a combinação de bevacizumabe e TMZ em pacientes idosos recentemente diagnosticados com GBM e com um PSK>60(37). O estudo ARTE (NCT01443676) verificará a combinação de bevacizumabe e RT em pacientes idosos recentemente diagnosticados com GBM(38).

A tabela 3 resume os dados publicados de TMZ concomitante com RT em pacientes idosos.

Avaliação geriátrica ampla como parte do atendimento ao paciente

O desafio mais marcante no tratamento de pacientes idosos com câncer reside na heterogeneidade significativa dessa população. Enquanto alguns pacientes toleram um tratamento padrão e se beneficiam dele, tal como os pacientes mais jovens, outros exigem a redução da dose, atrasos e interrupções de diferentes modalidades terapêuticas. A identificação de qual e como o paciente deve ser tratado pode ser facilitada pelo uso de uma avaliação geriátrica ampla (AGA). A AGA pode discriminar, melhor do que a idade cronológica ou o performance status, quais pacientes são candidatos a uma terapia mais agressiva(40). Há escassa literatura sobre a AGA em pacientes idosos com GBM, quer como estratificação para ensaios clínicos, quer como ferramenta para ajudar a prática clínica.

A AGA consiste em uma avaliação completa de comorbidades, estado funcional, estado nutricional, apoio social, polifarmácia e cognição, como descrito na tabela 4(41,42).

Os resultados da AGA estão intimamente relacionados ao prognóstico de pacientes idosos em geral, e também foram considerados benéficos para a avaliação da expectativa de vida, predição de tolerância do tratamento e determinação da fragilidade em pacientes idosos com câncer. A mortalidade em 2 anos aumenta com menor estado funcional(43), demência e depressão(44).

A dependência para as atividades da vida diária, medida pela escala de Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD), foi associada a uma pior tolerância à quimioterapia, o mesmo tendo sido demonstrado em relação ao estado nutricional e de apoio social(45). A European Organization for Research and Treatment of Cancer (EORTC) recomenda classificar os pacientes como frágil, vulnerável ou saudável, com base na AGA(40). Essa classificação pode ajudar na decisão sobre seleção do tratamento, ajustes de dose e medidas de suporte. Como os resultados da AGA são baseados em escalas dinâmicas, uma nova avaliação deve ser realizada no momento de cada decisão de novo tratamento.

A principal limitação da AGA é o tempo necessário para sua administração, não apenas para o clínico, mas também para o paciente e os cuidadores. Isso levou ao desenvolvimento de triagens menores, que ajudam o clínico a dirigir o trabalho de seleção abrangente para os idosos mais suscetíveis, que exigem uma avaliação mais aprofundada.

CONCLUSÃO

Os pacientes idosos parecem se beneficiar e tolerar o mesmo tratamento que os pacientes mais jovens, se tiverem um bom performance status e poucas doenças associadas. Para pacientes com PSK>70, a RT pós-operatória melhora a sobrevida sem causar declínio cognitivo. Para os pacientes com estado funcional reduzido, um tratamento curto de RT parece ser equivalente à RT tradicional. Embora a TMZ não tenha sido estudada prospectivamente em estudos randomizados em idosos, a análise de subgrupo de uma meta-análise sugere boa tolerância e benefício clínico, especialmente para pacientes com metilação do promotor da MGMT. Fatores moleculares, como mutações do EGFR ou NFKBIA, e até mesmo a metilação do promotor da MGMT, parecem ser capazes de caracterizar melhor o prognóstico de tumores individuais; contudo, nesse momento, as decisões de tratamento parecem ainda estar mais dependentes de uma avaliação completa do caso de pacientes idosos. A AGA parece ser uma ferramenta valiosa na determinação das melhores opções de tratamento para um dado paciente.

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  • Glioblastoma: enfoque no tratamento de pacientes idosos

    Luciola de Barros PontesI; Theodora KarnakisII; Suzana Maria Fleury MalheirosIII; Eduardo WeltmanIV; Reynaldo André BrandtV; Rafael Aliosha Kaliks GuendelmannI
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      22 Jan 2012
    • Aceito
      30 Jul 2012
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