Acessibilidade / Reportar erro

Atenção Nutricional à pessoa idosa na Atenção Primária à Saúde, sob a ótica de profissionais de saúde

Resumo

Objetivo:

caracterizar e analisar a Atenção Nutricional (AN) à pessoa idosa na Atenção Primária à Saúde (APS), identificando como se realiza e as concepções que permeiam as ações de alimentação e nutrição (A&N).

Método:

estudo transversal, quanti-qualitativo, realizado na APS de Santos SP, Brasil, em duas etapas. i) correspondeu a um estudo censitário das unidades de saúde, N=28 (100%), com participação de gestores de todos os serviços, mediante respostas a instrumento estruturado para diagnóstico da AN. Analisaram-se descritivamente os dados. ii) consistiu no aprofundamento desse diagnóstico, utilizando entrevista semiestruturada com informantes-chave (entrevistados) do cuidado às pessoas idosas; ser nutricionista não foi um critério, pois havia três para toda a APS e uma das regiões de saúde estudadas não contava com esse profissional. Utilizou-se o conceito de saturação teórica para o plano amostral; realizou-se análise de conteúdo e as inferências pautaram-se em referenciais teóricos de integralidade e envelhecimento.

Resultados:

A AN à pessoa idosa destacou-se pela predominância de atendimento individual nas 28 (100%) unidades estudadas; em apenas nove (32,1%) destas havia participação de nutricionista. Atingiu-se a saturação teórica temática com nove informantes-chave. As ações de AN revelaram-se genéricas, orientadas à assistência às doenças, inexistindo planejamento, segundo demandas dos territórios. Os entrevistados vincularam aspectos negativos ao envelhecimento e identificaram o seu papel como de transmissores de conhecimento, cabendo à pessoa idosa aplicá-lo.

Conclusão:

As ações de AN orientaram-se pelo paradigma biomédico, eram fragmentadas, restritas ao manejo de doenças, imputando exclusivamente ao indivíduo a responsabilidade pelo próprio cuidado. Assim, a AN afastou-se da promoção de envelhecimento saudável, enfraquecendo seu caráter estratégico para o alcance da integralidade.

Palavras-chave:
Atenção Primária à Saúde; Política Nutricional; Ciências da Nutrição; Integralidade em Saúde; Envelhecimento

Abstract

Objective:

to characterize and analyze Nutritional Care (NC) for older adults in Primary Health Care (PHC), identifying how food and nutrition actions (F&N) were performed and the conceptions that guided them.

Methods:

a cross-sectional, quantitative and qualitative study was performed in PHC in Santos, São Paulo, Brazil, in two phases: i) a census study was carried out of health units, N=28 (100%), with managers who answered a structured interview to assess NC; followed by descriptive analysis. ii) a deeper investigation of this diagnosis was performed, using semi-structured interviews with key informants (interviewees) of care for older adults; being a nutritionist was not a criteria, as there were only three such professionals throughout the entire PHC, and one of the health regions studied was not served by a nutrition professional. The concept of theoretical saturation was used for the sampling plan; content analysis was carried out and the inferences were supported by references of integrality and aging.

Results:

NC for older adults was highlighted by individual care, predominant in all the services studied (28) (100%); nutritionists participated in this activity in just nine units (32.1%). Theoretical saturation was achieved with nine interviews. According to the discourse analysis, F&N actions were generic, focused on the treatment of diseases, influenced by negative aspects attributed to aging, there was no planning based on the needs of the territory, and health professionals identified themselves as information transmitters, leaving the responsibility of acting on such information to the older adults themselves.

Conclusion:

F&N actions were guided by the biomedical paradigm, fragmented, restricted to disease management, imputing the responsibility for health to the individual themselves. Thus, NC distanced itself from the promotion of healthy aging, weakening its strategic role in the quest for integrated care.

Keywords:
Primary Health Care; Nutrition Policy; Nutritional Sciences; Integrality in Health; Aging

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é considerado um desafio mundial aos sistemas de saúde11 World Health Organization. The world report on ageing and health [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2018 Jan. 15]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
,22 Chang AY, Skirbekk VF, Tyrovolas S, Kassebaum NJ, Dieleman JL. Measuring population ageing: an analysis of the Global Burden of Diseases Sttudy 2017. Lancet Public Health [Internet]. 2019 [cited 2020 May 16];4:e159-67. Available from: https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lanpub/PIIS2468-2667(19)30019-2.pdf
https://www.thelancet.com/pdfs/journals/...
e a Organização Mundial da Saúde (OMS)11 World Health Organization. The world report on ageing and health [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2018 Jan. 15]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
recomenda o fortalecimento da Atenção Primária à Saúde (APS) para promoção de envelhecimento saudável, pela capacidade resolutiva desse ponto de atenção33 Placideli N, Castanheira ERL, Dias A, da Silva PA, Carrapato JLF, Sanine PR, et al. Avaliação da atenção integral ao idoso em serviços de atenção primária. Rev Saúde Pública [Internet]. 2020 [cited May 13];54(6):1-14. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
https://www.revistas.usp.br/rsp/article/...
.

No Brasil, a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI)44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
se propõe a efetivar uma atenção integral, coordenada pela APS, articuladamente à Rede de Atenção à Saúde55 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. 2ª ed. Brasília, DF: OPAS; 2011. Capítulo 2, As redes de atenção à saúde: revisão bibliográfica, fundamentos, conceito e elementos constitutivos; p. 61-83. (RAS). Entretanto, evidências apontam fragilidades na integralidade do cuidado, dadas por: dificuldade de acesso aos serviços, baixa qualidade na assistência e ausência de profissionais com formação em geriatria e gerontologia, prevalecendo ações pontuais, voltadas à assistência a agravos66 Nivestam A, Westergren A, Petersson P, Haak M. Factors associated with good health among older persons who received a preventive home visit: a cross-sectional study. BMC Public Health [Internet]. 2020 [cited 2020 May 16];20(688):1-7. Available from: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12889-020-08775-6
https://bmcpublichealth.biomedcentral.co...

7 da Motta LB, de Aguiar AC, Caldas CP. Estratégia Saúde da Família e atenção ao idoso: experiência em três municípios brasileiros. Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan. 15];27(4):779-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pd...
-88 da Luz LA, Futino MI, da Luz EA, Martins GM, Barbosa EPM, Rocha LM. Avaliação das ações estratégicas na atenção à saúde do idoso em Unidades Básicas de Saúde de Teresina-PI. Rev Bras Med Fam Comunidade [Internet]. 2012 [cited 2016 Jun.15];7(22):20-6. Available from: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/379/453
https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/...
.

Uma das estratégias para enfrentar tal quadro e aprimorar a resolubilidade da APS na promoção de envelhecimento saudável é a Atenção Nutricional99 Moura ALSP, Recine E. O nutricionista e o cuidado integral do indivíduo com excesso de peso na atenção básica. Rev Nutr [Internet]. 2019 [cited 2020 May 16];32:e190008. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rn/v32/1678-9865-rn-32-e190008.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rn/v32/1678-98...
(AN), orientada às especificidades deste grupo, prevista na Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN)1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
. A AN, em conjunto com outras medidas, poderia fomentar uma qualificação dos serviços agindo na prevenção de morbidades classificadas como condições sensíveis à APS1111 Carlos MJ, Cavaletti ACL, Caldas CP. Hospitalization of the aged due to stroke: An ecological perspective. Plos ONE [Internet]. 2019 [cited 2020 Sept. 23 ];14(8):e0220833. Available from: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0220833
https://journals.plos.org/plosone/articl...
, a exemplo de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) que representam importante carga de doenças na população idosa22 Chang AY, Skirbekk VF, Tyrovolas S, Kassebaum NJ, Dieleman JL. Measuring population ageing: an analysis of the Global Burden of Diseases Sttudy 2017. Lancet Public Health [Internet]. 2019 [cited 2020 May 16];4:e159-67. Available from: https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lanpub/PIIS2468-2667(19)30019-2.pdf
https://www.thelancet.com/pdfs/journals/...
.

A PNAN1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
apoia-se na melhoria das condições de alimentação e nutrição (A&N), conforme especificidades individuais e coletivas, em ações interdisciplinares e intersetoriais, para promover saúde e prevenir agravos. Um planejamento do cuidado à pessoa idosa, nessa perspectiva, tem potencial para superar fragilidades da atenção, incidir sobre a preservação e/ou recuperação funcional e favorecer um envelhecimento saudável, digno e autônomo 1212 Schenker M, da Costa DH. Avanços e desafios da atenção à saúde da população idosa com doenças crônicas na Atenção Primária à Saúde. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 15];23(4):1369-80. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413-8123-csc-24-04-1369.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413...
.

Embora reconhecida a potencialidade da AN à população idosa, registram-se poucos estudos tematizando o seu papel na APS1313 Canella DS, da Silva ACF, Jaime PC. Produção científica sobre nutrição no âmbito da Atenção Primária à Saúde no Brasil: uma revisão de literatura. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2017 Jul. 10];18(2):297-308. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.p...
. Há lacunas na identificação de fatores intervenientes nas ações de A&N, sobretudo no que concerne ao planejamento e à gestão das ações14 ou ao cotidiano dos serviços, assumindo-se que é na micropolítica dos processos de trabalho que as concepções de saúde-doença-cuidado e envelhecimento se configuram.15.

Segundo Beauvoir1616 Beauvoir S. A velhice I: a realidade incômoda. Dantas HL, tradutora. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro; 1970. 313 p. e Debert1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004., a maneira como a sociedade concebe o envelhecimento associa-se ao processo histórico-social e influencia a dinâmica da vida, inclusive a atuação dos profissionais de saúde. Por esse motivo, tais estudiosas foram escolhidas como referencial teórico deste estudo, à luz da integralidade da atenção1818 Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009., princípio presente na PNSPI44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
e na PNAN1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
.

Esta pesquisa teve por objetivos caracterizar e analisar a AN à população idosa na APS, sob a perspectiva dos profissionais de saúde, para identificar o modo como se realiza e as concepções que pautam as ações de A&N para este grupo etário.

MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal, com desenho quanti-qualitativo, conduzido na APS do município de Santos (SP), Brasil.

A abordagem quantitativa aconteceu em 2014, em estudo censitário de diagnóstico das ações de A&N na APS, mediante entrevistas a gestores da totalidade das unidades de saúde N=28 (100%) das quatro regiões de saúde do município de Santos, o qual sedia o maior porto marítimo da América Latina e se destaca como relevante polo econômico da Região da Baixada Santista, com elevado Índice de Desenvolvimento Humano (IDH=0,84). Cidade predominantemente urbana possui, aproximadamente, 433.000 habitantes, com uma população idosa de 19,2%, taxa superior à nacional 11%1919 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo: sinopse [Internet]. 2020 [cited 2020 Aug. 12]. Available from: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/santos/pesquisa/23/25207?tipo=ranking&indicador=25186
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/sa...
.

Para as entrevistas, realizadas nas unidades, selecionaram-se bolsistas de pesquisa, que receberam treinamento. O material coletado foi conferido por coordenadora de campo para eventual complementação de informações. As variáveis utilizadas para caracterizar a AN à pessoa idosa foram: tipos de ações de A&N (individual, educativas, visitas domiciliares); profissionais responsáveis pelas mesmas e inserção de nutricionistas na APS. Realizou-se análise descritiva desses dados.

A abordagem qualitativa aconteceu em 2016, a coleta de dados foi realizada pela autora deste estudo (então, aluna de mestrado), para aprofundar o exame dos achados censitários e compreender o contexto da AN à pessoa idosa. Contemplando as mesmas regiões de saúde da etapa anterior, solicitou-se aos gestores a indicação de um profissional por serviço, com experiência mínima de dois anos na atenção à pessoa idosa e que realizasse ações de A&N. Tais informantes-chave facultaram a obtenção de dados para desvendar o cotidiano dessas ações. A formação em Nutrição não foi um requisito, pois uma das regiões não era assistida por nutricionista.

Para o planejamento amostral dessa etapa, assumiu-se o conceito de saturação teórica, procedimento adotado em pesquisas qualitativas, como indicativo para a interrupção da coleta de dados, quando as informações fornecidas adquirem caráter de um corpo único com qualidade satisfatória, não aparecendo novos temas de análise para a investigação2020 Nascimento LCN, Souza TV, Oliveira ICS, Moraes JRMM, Aguiar RCB, Silva LF. Theoretical saturation in qualitative research: an experience report in interview with schoolchildren. Rev Bras Enferm [Internet]. 2018 [cited 2020 Aug. 12];71(1):228-33. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0616
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
. Entrevistas semiestruturadas foram realizadas a partir de roteiro composto por três categorias centrais na organização da AN: 1) planejamento e gestão do cuidado em saúde à pessoa idosa; 2) AN à pessoa idosa e 3) concepções sobre envelhecer e ser velho. As entrevistas foram gravadas em áudio e transcritas ipsis verbis. Para assegurar a confidencialidade, os entrevistados foram identificados com nomes de flores.

Para apoiar o trabalho, reflexões de uma das pesquisadoras sobre a experiência no campo foram registradas em diário de campo, ferramenta que permite diálogo com os referenciais da pesquisa2121 Weber F. A entrevista, a pesquisa e o íntimo, ou: por que censurar seu diário de campo? Horiz Antropol [Internet]. 2009 [cited 2020 Feb. 22];32:157-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ha/v15n32/v15n32a07.pdf
http://www.scielo.br/pdf/ha/v15n32/v15n3...
.

Os dados foram organizados em conformidade com a análise de conteúdo proposta por Bardin2222 Bardin L. Análise de conteúdo. Reto AL, Pinheiro A, tradutores. São Paulo: Edições 70; 2011.. Para cada uma das categorias do roteiro de entrevistas obtiveram-se núcleos temáticos resultantes da leitura flutuante e exaustiva das mesmas. As inferências e interpretações tiveram suporte nos referenciais de integralidade1818 Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009. e socioantropológico de envelhecimento1616 Beauvoir S. A velhice I: a realidade incômoda. Dantas HL, tradutora. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro; 1970. 313 p.,1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004., sob o espectro da PNAN1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
e PNSPI44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, parecer nº 1.517.363, e pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Santos (SP), de acordo com as resoluções 466/2012 e 510/2016. Os participantes assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Participaram do censo os gestores das 28 unidades de APS, sendo: 20 enfermeiros, três dentistas, dois assistentes sociais, dois psicólogos e um farmacêutico. Como gestores, esses profissionais tinham por responsabilidade organizar e planejar os processos de trabalho, analisar demandas e necessidades dos serviços, inclusive aqueles relacionados à Atenção Nutricional. O relato dos gestores permitiu identificar que a AN à pessoa idosa organizava-se, nas unidades de APS, em diferentes modalidades de ações (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição percentual das modalidades de ações de Atenção Nutricional à pessoa idosa no conjunto das unidades de Atenção Primária à Saúde. Santos, SP, Brasil, 2014 (N=28).

Nas unidades de saúde, as ações de A&N eram realizadas por distintos profissionais e a participação de nutricionistas ocorria em apenas nove (32,1%), conforme Tabela 2. Para toda a APS do município havia somente três nutricionistas, que se revezavam entre três das quatro regiões de saúde.

Tabela 2
Profissional de saúde responsável pela Atenção Nutricional à pessoa idosa, segundo unidades de Atenção Primária à Saúde. Santos, SP, Brasil, 2014 (N=28).

Atingiu-se a saturação teórica temática com nove entrevistas. Entre os informantes-chave entrevistados, havia cinco médicos, dois enfermeiros, uma agente comunitária de saúde (ACS) e uma técnica de enfermagem. Não houve indicação de nutricionista como referência no cuidado à pessoa idosa, embora a temática envolvesse AN. Na Tabela 3 expõe-se a configuração do processo de análise qualitativa.

Tabela 3
Categorias, núcleos temáticos e unidades de registro para análise da Atenção Nutricional à pessoa idosa na Atenção Primária à Saúde. Santos, SP, Brasil, 2016.

Planejamento e gestão do cuidado em saúde à pessoa idosa

Os entrevistados indicaram como planejamento do cuidado aspectos da prática cotidiana em saúde. Isso se deve, provavelmente, à ausência de sistema de informação, sendo o prontuário em papel a principal fonte de dados. Os dados sociodemográficos eram registrados em formulários dos ACS e enviados à SMS. Inexistia um sistema que traduzisse esses dados em perfil de saúde da população idosa no território.

“Não tem, exatamente, a organização específica. Tem o prontuário que a gente faz [...] e vai acompanhando a cada consulta [...]. Na Secretaria de Saúde não tem nada voltado, especificamente, pra isso.” [Onze-horas].

Dados sobre condições de vida e saúde, coletados pelos ACS, tinham uso restrito à atualização do sistema de cadastramento e acompanhamento de hipertensos e diabéticos (HiperDia) do Ministério da Saúde e à identificação de demandas individuais durante busca ativa.

“[...] os agentes de saúde, que percorrem a área, identificam os idosos [...]. A gente convoca eles pra consulta de acordo com a necessidade.” [Ipê].

A gestão do cuidado à pessoa idosa era pautada por demandas cotidianas dos serviços. Os achados sugeriram privilégio à assistência às doenças em detrimento de ações planejadas segundo as necessidades de saúde. Os indivíduos que não apresentavam morbidade ou queixa dispunham de acompanhamento de saúde limitado.

“[...] pacientes que são hipertenso, diabético [...] como eles pegam medicação mensalmente [...] a gente acaba sabendo que eles tão fazendo acompanhamento [...]. Mas e aqueles que não são [...]?” [Flor-de-maio].

A assistência orientada na perspectiva da doença, e realizada fragmentadamente, reflete a dinâmica da esfera organizacional. As atividades de educação permanente, promovidas pela SMS, contemplavam o cuidado à pessoa idosa a partir da atenção às DCNT, reforçando a associação entre velhice e doença. Além disso, evidenciou-se insuficiência de profissionais de diferentes áreas para compor as equipes.

“[...] a gente tem pouca capacitação relacionada à geriatria, que fale especificamente do cuidado com o idoso [...] a gente tem relacionada às doenças, não ao cuidado do idoso saudável.” [Ipê].

“[...] se tivesse um acompanhamento de psicólogos, de assistente social [...], a nutrição. Seria importante.” [Pau-brasil].

Os entrevistados expuseram dificuldades na atenção ao se depararem com indivíduos em vulnerabilidade socioeconômica e desprovidos de redes de apoio familiar ou da vizinhança. O baixo suporte social e a renda foram elencados como aspectos da vida das pessoas idosas que podem representar obstáculos à efetividade da prática profissional.

“[...] é muito difícil [...] pra esses idosos que moram sozinhos e que, muitas vezes, são acamados e que não têm ninguém pra olhar.” [Ipê].

Há limites na organização da atenção à pessoa idosa, quando esta se restringe a responder às demandas apresentadas ao serviço. Foram citadas estratégias para aprimorar a atenção, frente à necessidade de construir uma linha de cuidado para esse grupo.

A integralidade, a família e não ver só o paciente, a doença do idoso. Ver os riscos do idoso, a prevenção nele é importante.” [Jacarandá].

Atenção nutricional à pessoa idosa

Os entrevistados reconheceram o papel da alimentação no cuidado em saúde da população idosa e a importância de individualizar as ações, segundo a realidade socioeconômica dos indivíduos.

“A dieta, pra mim, é uma das coisas mais importantes.” [Jacarandá].

“[...] eu não vou indicar que ela tenha um tipo de alimentação que eu sei que ela não vai ter a possibilidade de manter financeiramente.” [Caliandra].

Embora os entrevistados tivessem apontado que a AN precisaria se ajustar ao contexto de vida das pessoas idosas, essa prática mostrou-se padronizada e genérica.

“[...] índice de massa corporal se o paciente já tem alguma doença preexistente”. [Manacá-da-Serra].

“[...] orientar uma alimentação mais saudável, mas de forma genérica”. [Onze-horas].

As ações de A&N eram direcionadas ao atendimento de DCNT, principalmente à hipertensão arterial e ao diabetes. Na concepção dos entrevistados os alimentos adquiriram a mesma funcionalidade de medicamentos e foram entendidos como bons ou ruins.

“A gente tem os grupos de hipertensão e diabetes [...] aí que a gente costuma orientar mais a parte nutricional.” [Ipê].

“Alimentação é voltada pra algum tipo de morbidade, né?!” [Caliandra].

As razões da limitação no entendimento do caráter das ações de A&N não se restringiram à atuação dos profissionais de saúde que, em geral, desprovidos de habilidade para realizar tais atividades, respondiam às demandas imediatas. Sensibilizados com as condições de saúde apresentadas pelas pessoas idosas, e com o incipiente número de nutricionistas para apoiar tais práticas, os profissionais buscavam alternativas para cuidar dos indivíduos e suprir tal lacuna.

“[...] tinha uma nutricionista [...] Mas depois ela tava grávida, saiu grávida e não voltou.” [Jacarandá].

“Eu fui atrás de umas dietas que tinha numa outra unidade que eu trabalhei e pedi pra tirar xerox! [...] Eu nem sei quem foi que fez. Em que momento elas foram feitas [...]” [Alamanda].

“A gente trabalha, pega e vai fazendo. Não há essa lógica de um exercício multiprofissional” [Onze-horas].

Concepções sobre envelhecer e ser velho

Para os entrevistados, envelhecimento saudável resulta também de bons hábitos alimentares ao longo da vida. A ideia da condicionalidade entre tempo e frequência sobressaiu e, se tais hábitos fossem cultivados desde a infância o indivíduo se tornaria saudável.

“Sua alimentação vai determinar (...) seu funcionamento orgânico”. [Onze-horas]

“Desde criança, você tem que preparar você para o envelhecimento. Um estilo de vida saudável com sessenta anos você não vai iniciar”. [Jacarandá].

Dois determinantes foram apontados pelos entrevistados para viabilizar esses bons hábitos: o conhecimento e a vontade individual. A combinação entre educação e motivação seria condição suficiente, nessa ótica, para tornar uma pessoa idosa saudável.

“[...] a educação é muito, muito, muito mais produtiva do que o investimento na saúde”. [Onze-horas].

“[...] não adianta você ter uma equipe maravilhosa de profissionais e ela (pessoa) não querer ser ajudada”. [Buganvílea].

Segundo os entrevistados, seu papel na promoção do envelhecimento saudável é transmitir conhecimento, como forma de assegurar que o usuário do serviço incorpore as orientações recebidas e as aplique em seu cotidiano.

“[...] o papel mais importante é proporcionar [...] ferramenta pra ele fazer (...). O dia que o paciente conhecer, (...) ele vai fazer.” [Jacarandá].

“Com essas palestras (...) explicar direitinho (...) as complicações de qualquer uma das doenças crônicas, né?” [Manacá-da-serra].

Para os entrevistados, envelhecer com saúde seria algo simples de equacionar e dependente do ímpeto pessoal. Contudo, as dificuldades que expuseram revelaram barreiras para tanto.

“Os idosos que moram sozinhos [...] a falta de recursos, a rede é super sobrecarregada, faltam profissionais [...]”. [Caliandra].

Outro fator que obstaculizaria um envelhecimento saudável seria a postura dos entrevistados em relação ao envelhecimento e à velhice. Os resultados demonstraram que as pessoas idosas não foram reconhecidas como sujeitos autônomos, nem a velhice como período da vida latente de vitalidade. Ao contrário, foram infantilizadas, tomadas como indivíduos passíveis de tutela.

“[...] o idoso é uma criança que já fala o que pensa”. [Jacarandá].

“Eles ficam bastante arredios, não querem obedecer”. [Pau-brasil].

Os entrevistados vincularam envelhecimento a decadência, doença, e velhice a estagnação e fragilidade.

“[...] já é uma população adoecida! [...] Você só tem que tratar, não tem mais o que fazer.” [Alamanda].

“[...] se não quer adoecer de alguma coisa, não envelheça.” [Onze-horas].

DISCUSSÃO

Poucos são os estudos que tematizam a nutrição e o envelhecimento na perspectiva da AN à pessoa idosa; registram-se evidências relativas ao perfil nutricional, ao consumo alimentar e aos agravos nutricionais, como demonstram revisões de literatura analisando as ações de alimentação e nutrição na APS brasileira1313 Canella DS, da Silva ACF, Jaime PC. Produção científica sobre nutrição no âmbito da Atenção Primária à Saúde no Brasil: uma revisão de literatura. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2017 Jul. 10];18(2):297-308. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.p...
,2323 Pereira TN, Monteiro RA, Santos LMP. Alimentación y nutrición en atención primaria en Brasil. Gac Sanit [Internet]. 2018 [cited 2020 Aug. 12];32(3):297-303. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.gaceta.2017.08.004
http://dx.doi.org/10.1016/j.gaceta.2017....
. O caráter inovador desta investigação está na abordagem interdisciplinar, amparada no conceito da integralidade da atenção, defendendo uma AN qualificada como componente estratégico para a promoção de envelhecimento saudável.

A partir da caracterização e da análise da AN à pessoa idosa, identificou-se que as ações de A&N, antes de se basearem nas diretrizes da PNSPI44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, da PNAN10 e nas recomendações internacionais11 World Health Organization. The world report on ageing and health [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2018 Jan. 15]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
, moldavam-se por concepções traduzidas em comportamentos2424 Bauman Z, May T. Aprendendo a pensar com a sociologia. Werneck A, tradutor. Rio de Janeiro: Zahar; 2010. dissonantes dos princípios das políticas públicas, desdobrando-se em problemas refletidos na organização da AN.

A carência de investimentos em infraestrutura, em educação permanente em geriatria e gerontologia e o deficitário contingente de força de trabalho33 Placideli N, Castanheira ERL, Dias A, da Silva PA, Carrapato JLF, Sanine PR, et al. Avaliação da atenção integral ao idoso em serviços de atenção primária. Rev Saúde Pública [Internet]. 2020 [cited May 13];54(6):1-14. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
https://www.revistas.usp.br/rsp/article/...
,2525 Shrimpton R, du Plessis LM, Delisle H, Blaney S, Atwood SJ, Sanders D, et al. Public health nutrition capacity: assuring the quality of workforce preparation for scaling up nutrition programmes. Public Health Nutr [Internet]. 2016 [cited 2020 May 15];19(11):2090-2100. Available from: https://doi.org/10.1017/S136898001500378X
https://doi.org/10.1017/S136898001500378...
, repercutiram no modo como as ações de A&N foram realizadas. A gestão do cuidado e a organização da AN à pessoa idosa moldaram-se pelo paradigma biomédico, eminentemente curativo e restrito às demandas de tratamento das doenças, em detrimento do atendimento às necessidades de saúde2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
.

Faz-se necessário integrar a AN ao planejamento em saúde, como ferramenta capaz de incidir sobre uma dada realidade, desde que as ações sejam direcionadas ao cerne das questões2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
. A ausência de diagnóstico situacional, apoiado em dados de vigilância em saúde, comprometeu o desenvolvimento das ações de A&N. A produção de informações baseada, unicamente, nos registros profissionais, no ato da assistência77 da Motta LB, de Aguiar AC, Caldas CP. Estratégia Saúde da Família e atenção ao idoso: experiência em três municípios brasileiros. Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan. 15];27(4):779-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pd...
,2727 Vitorino SAS, da Cruz MM, de Barros DC. Validação do modelo lógico teórico da vigilância alimentar e nutricional na atenção primária em saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 2020 May 14];33(12):e00014217. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/1678-4464-csp-33-12-e00014217.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/167...
, mostrou-se insuficiente para apontar a magnitude dos problemas existentes e elucidar estratégias correspondentes às demandas dos terrritórios2828 dos Santos CM, Barbieri AR, Gonçalves CCM, Tsuha DH. Avaliação da rede de atenção ao portador de hipertensão arterial: estudo de uma região de saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 2020 Sept. 06];33(5):e00052816. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n5/1678-4464-csp-33-05-e00052816.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n5/1678...
.

Um sistema de informações que conjugasse dados sociodemográficos e de saúde subsidiaria um diagnóstico situacional, fornecendo elementos para organizar, monitorar e avaliar a AN à pessoa idosa. Mas o alcance dessa premissa vincula-se à qualificação da força de trabalho e dos serviços2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
.

O lapso de investimentos para ampliar o repertório dos profissionais de saúde, concernentes a geriatria e gerontologia11 World Health Organization. The world report on ageing and health [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2018 Jan. 15]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
, pode limitar o manejo do envelhecimento e o desenvolvimento de potencialidades durante a velhice44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
,77 da Motta LB, de Aguiar AC, Caldas CP. Estratégia Saúde da Família e atenção ao idoso: experiência em três municípios brasileiros. Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan. 15];27(4):779-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pd...
. Tal fato pode ter contribuído para associar envelhecimento a signos negativos, trazidos pelos entrevistados, por exemplo, ao interpretar como rebeldia a reivindicação por autonomia, infantilizando a pessoa idosa e a considerando como passível de tutela, o que empobrece a ideia sobre velhice1616 Beauvoir S. A velhice I: a realidade incômoda. Dantas HL, tradutora. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro; 1970. 313 p.,2929 Damaceno DG, Chirelli MQ, Lazarini CA. A prática do cuidado em instituições de longa permanência para idosos: desafio na formação dos profissionais. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 22];22(1):e180197. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_1809-9823-rbgg-22-01-e180197.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_...
. Denota-se uma relação verticalizada, reforçada pelos informantes-chave, quando atribuíram aos profissionais de saúde o papel de transmissores de conhecimento.

Assim, as ações de A&N assumiram um caráter prescritivo, cabendo à pessoa idosa a motivação necessária para seguir as orientações recebidas1616 Beauvoir S. A velhice I: a realidade incômoda. Dantas HL, tradutora. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro; 1970. 313 p.,1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004.. Entretanto, a transmissão de orientações em si pouco interfere sobre a mudança de estilos de vida, por mais que essas se pautem em estratégias motivacionais1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
. As práticas alimentares resultam de determinantes multifatoriais1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
e, nessa teia, o ímpeto pessoal pode ser o fator com menor poder de influência na construção de práticas saudáveis, diferentemente da ótica dos informantes-chave.

A abordagem prescritiva é não dialógica3030 Botelho FC, Guerra LDS, Pava-Cárdenas A, Cervato-Mancuso AM. Estratégias pedagógicas em grupos com o tema alimentação e nutrição: os bastidores do processo de escolha. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2016 [cited 2020 May 14];21(6):1889-98. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413-8123-csc-21-06-1889.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413...
e normativa, subestimando aspectos materiais para a produção da vida e desconsiderando as subjetividades e a heterogeneidade nos modos de envelhecer, contrariamente aos princípios da integralidade88 da Luz LA, Futino MI, da Luz EA, Martins GM, Barbosa EPM, Rocha LM. Avaliação das ações estratégicas na atenção à saúde do idoso em Unidades Básicas de Saúde de Teresina-PI. Rev Bras Med Fam Comunidade [Internet]. 2012 [cited 2016 Jun.15];7(22):20-6. Available from: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/379/453
https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/...
,1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004.,1818 Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009..

Esse reconhecimento precisa se estender a todos os profissionais de saúde2727 Vitorino SAS, da Cruz MM, de Barros DC. Validação do modelo lógico teórico da vigilância alimentar e nutricional na atenção primária em saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 2020 May 14];33(12):e00014217. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/1678-4464-csp-33-12-e00014217.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/167...
. Entretanto, é impossível negar a incipiente inserção de nutricionistas, na APS em estudo, limitando o escopo da AN2525 Shrimpton R, du Plessis LM, Delisle H, Blaney S, Atwood SJ, Sanders D, et al. Public health nutrition capacity: assuring the quality of workforce preparation for scaling up nutrition programmes. Public Health Nutr [Internet]. 2016 [cited 2020 May 15];19(11):2090-2100. Available from: https://doi.org/10.1017/S136898001500378X
https://doi.org/10.1017/S136898001500378...
,2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
,3131 Neves JA, Zangirolani LTO, de Medeiros MAT. Evaluation of nutritional care of overweight adults from the perspective of comprehensive health care. Rev Nutr [Internet]. 2017 [cited 2018 Sept. 10];30(4):511-24. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-5273-rn-30-04-00511.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-...
. A despeito do caráter interdisciplinar desta, o profissional nutricionista dispõe de habilidades específicas para realizar as interlocuções entre as questões de A&N e os diversos componentes que envolvem o processo saúde-doença-cuidado3131 Neves JA, Zangirolani LTO, de Medeiros MAT. Evaluation of nutritional care of overweight adults from the perspective of comprehensive health care. Rev Nutr [Internet]. 2017 [cited 2018 Sept. 10];30(4):511-24. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-5273-rn-30-04-00511.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-...
.

AN promotora de envelhecimento saudável exige atenção aos determinantes socioculturais, respeito à subjetividade e busca de autonomia de indivíduos e da coletividade1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
,3232 Mantovani EP, de Lucca SR, Neri AL. Associações entre significados de velhice e bem-estar subjetivo indicado por satisfação em idosos. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2016 [cited 2020 Apr. 22];19(2):203-22. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/1809-9823-rbgg-19-02-00203.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/180...
. Os informantes-chave demonstraram compreensão sobre parte desses requisitos, pois reconheceram a influência do contexto de vida para envelhecer com saúde. Entretanto, suas práticas pouco incorreram sobre as necessidades de saúde relacionadas ao processo saúde-doença-cuidado da população idosa33 Placideli N, Castanheira ERL, Dias A, da Silva PA, Carrapato JLF, Sanine PR, et al. Avaliação da atenção integral ao idoso em serviços de atenção primária. Rev Saúde Pública [Internet]. 2020 [cited May 13];54(6):1-14. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
https://www.revistas.usp.br/rsp/article/...
,2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
.

Esse descompasso entre discurso e prática retrata a dificuldade de efetivar um sistema de saúde contra-hegemônico, conforme se observa na PNSPI44 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
e na PNAN1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
, defensor da saúde como um direito e da integralidade da atenção. Tal premissa se opõe à lógica estruturante do capitalismo neoliberal, cujas bases se assentam na defesa da saúde como mercadoria1818 Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009., produto de investimento individual1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004.,2424 Bauman Z, May T. Aprendendo a pensar com a sociologia. Werneck A, tradutor. Rio de Janeiro: Zahar; 2010., na negação das contradições societárias e do papel das políticas públicas.

Assim, as ações de A&N à pessoa idosa restringiram-se ao atendimento das DCNT, consideradas estigma característico de velhice33 Placideli N, Castanheira ERL, Dias A, da Silva PA, Carrapato JLF, Sanine PR, et al. Avaliação da atenção integral ao idoso em serviços de atenção primária. Rev Saúde Pública [Internet]. 2020 [cited May 13];54(6):1-14. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
https://www.revistas.usp.br/rsp/article/...
. Nessa perspectiva, o enfrentamento às DCNT pode ter assumido uma pragmática de prevenção da velhice, sobretudo porque se atribuiu aos alimentos função análoga à dos medicamentos. Os alimentos contribuiriam para combater as doenças, consequentemente, postergar a velhice. A negação do envelhecimento transforma-se em uma tentativa de desnaturalizá-lo1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004..

Esse modo de realizar AN expõe a necessidade de superar o tratamento das questões alimentares e nutricionais pela lente restritiva dos nutrientes1010 Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
, diante da complexidade que envolve o ato de comer3030 Botelho FC, Guerra LDS, Pava-Cárdenas A, Cervato-Mancuso AM. Estratégias pedagógicas em grupos com o tema alimentação e nutrição: os bastidores do processo de escolha. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2016 [cited 2020 May 14];21(6):1889-98. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413-8123-csc-21-06-1889.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413...
. A contribuição da AN para um envelhecimento saudável distingue-se da defesa de atitudes moralizantes, que enxergam os indivíduos pelos tipos de alimentos que consomem2626 Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678...
. Essa ideia reforça a culpabilização da pessoa idosa sobre suas escolhas alimentares transferindo, exclusivamente, a ela a responsabilidade pelo seu envelhecimento. A isso, Debert1717 Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004. nomeia como reprivatização da velhice; assim, possíveis limitações enfrentadas para construção de envelhecimento saudável são julgadas como descuido pessoal, minimizando a influência dos determinantes sociais de saúde.

Verificou-se que a AN à pessoa idosa, neste estudo, indispunha de ações planejadas, coordenadas e articuladas. Ações confinadas ao manejo das doenças, dificilmente, atuarão sobre o perfil de morbimortalidade da população idosa66 Nivestam A, Westergren A, Petersson P, Haak M. Factors associated with good health among older persons who received a preventive home visit: a cross-sectional study. BMC Public Health [Internet]. 2020 [cited 2020 May 16];20(688):1-7. Available from: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12889-020-08775-6
https://bmcpublichealth.biomedcentral.co...
,1212 Schenker M, da Costa DH. Avanços e desafios da atenção à saúde da população idosa com doenças crônicas na Atenção Primária à Saúde. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 15];23(4):1369-80. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413-8123-csc-24-04-1369.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413...
,3232 Mantovani EP, de Lucca SR, Neri AL. Associações entre significados de velhice e bem-estar subjetivo indicado por satisfação em idosos. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2016 [cited 2020 Apr. 22];19(2):203-22. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/1809-9823-rbgg-19-02-00203.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/180...
,3333 Veras RP, Oliveira M. Envelhecer no Brasil: a construção de um modelo de cuidado. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2018 [cited 2020 May 15];23(6):1929-36. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v23n6/1413-8123-csc-23-06-1929.pdf
https://www.scielo.br/pdf/csc/v23n6/1413...
. Consequentemente, a AN à pessoa idosa caracterizou-se por ações pontuais e fragmentadas, com pouca capacidade de proposição de estratégias cujas orientações fossem o desenvolvimento de autonomia dos indivíduos que envelhecem, comprometendo, portanto, o alcance da integralidade do cuidado1818 Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009.,2929 Damaceno DG, Chirelli MQ, Lazarini CA. A prática do cuidado em instituições de longa permanência para idosos: desafio na formação dos profissionais. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 22];22(1):e180197. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_1809-9823-rbgg-22-01-e180197.pdf
https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_...
,3434 Cervato-Mancuso AM, Vincha KRR, Santiago DA. Educação alimentar e nutricional como prática de intervenção: reflexão e possibilidades de fortalecimento. Physis [Internet]. 2016 [cited 2017 Aug. 10 2017];26(1):225-49. Available from: https://www.scielo.br/pdf/physis/v26n1/0103-7331-physis-26-01-00225.pdf
https://www.scielo.br/pdf/physis/v26n1/0...
.

Este estudo possui limitações, pela sua regionalidade e transversalidade. Contingenciamento de recursos de fomento à pesquisa e escassez de tempo foram enfrentados, em momento de ataque à ciência, impossibilitando a escolha de métodos que permitissem observação e acompanhamento das ações de A&N nos serviços, conforme motivação inicial. Todavia, o mérito central da pesquisa está em trazer à tona a emergência de fomentar uma AN promotora de envelhecimento saudável, à luz das diretrizes nacionais do Sistema Único de Saúde, segundo o princípio da integralidade do cuidado.

CONCLUSÃO

Os apontamentos dos profissionais de saúde sobre o modo como era realizada a Atenção Nutricional à pessoa idosa, no município estudado, retrataram problemas relativos à organização e à gestão do cuidado. As ações de alimentação e nutrição nortearam-se pelo paradigma biomédico, eram fragmentadas, restritas ao manejo de doenças e influenciadas por concepções negativas de envelhecimento, imputando ao indivíduo a responsabilidade exclusiva pelo cuidado com a própria saúde. Segundo tal concepção, a Atenção Nutricional distanciou-se da promoção de envelhecimento saudável, enfraquecendo seu caráter estratégico para o alcance da integralidade.

Espera-se que este estudo inspire a realização de outras investigações, aprofundando as reflexões expostas e fornecendo evidências à gestão de políticas públicas para a construção de uma Atenção Nutricional qualificada à pessoa idosa, promotora do envelhecimento saudável, inserindo-se em uma linha de cuidado pautada na integralidade do cuidado.

REFERENCES

  • 1
    World Health Organization. The world report on ageing and health [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2018 Jan. 15]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
    » http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/186463/1/9789240694811_eng.pdf
  • 2
    Chang AY, Skirbekk VF, Tyrovolas S, Kassebaum NJ, Dieleman JL. Measuring population ageing: an analysis of the Global Burden of Diseases Sttudy 2017. Lancet Public Health [Internet]. 2019 [cited 2020 May 16];4:e159-67. Available from: https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lanpub/PIIS2468-2667(19)30019-2.pdf
    » https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lanpub/PIIS2468-2667(19)30019-2.pdf
  • 3
    Placideli N, Castanheira ERL, Dias A, da Silva PA, Carrapato JLF, Sanine PR, et al. Avaliação da atenção integral ao idoso em serviços de atenção primária. Rev Saúde Pública [Internet]. 2020 [cited May 13];54(6):1-14. Available from: https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
    » https://www.revistas.usp.br/rsp/article/view/165861/158742
  • 4
    Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 2.528, de 19 de outubro de 2006. Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa. Saúde Legis. 2006. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
    » https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt2528_19_10_2006.html
  • 5
    Mendes EV. As redes de atenção à saúde. 2ª ed. Brasília, DF: OPAS; 2011. Capítulo 2, As redes de atenção à saúde: revisão bibliográfica, fundamentos, conceito e elementos constitutivos; p. 61-83.
  • 6
    Nivestam A, Westergren A, Petersson P, Haak M. Factors associated with good health among older persons who received a preventive home visit: a cross-sectional study. BMC Public Health [Internet]. 2020 [cited 2020 May 16];20(688):1-7. Available from: https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12889-020-08775-6
    » https://bmcpublichealth.biomedcentral.com/track/pdf/10.1186/s12889-020-08775-6
  • 7
    da Motta LB, de Aguiar AC, Caldas CP. Estratégia Saúde da Família e atenção ao idoso: experiência em três municípios brasileiros. Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 [cited 2015 Jan. 15];27(4):779-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/csp/v27n4/17.pdf
  • 8
    da Luz LA, Futino MI, da Luz EA, Martins GM, Barbosa EPM, Rocha LM. Avaliação das ações estratégicas na atenção à saúde do idoso em Unidades Básicas de Saúde de Teresina-PI. Rev Bras Med Fam Comunidade [Internet]. 2012 [cited 2016 Jun.15];7(22):20-6. Available from: https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/379/453
    » https://rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/379/453
  • 9
    Moura ALSP, Recine E. O nutricionista e o cuidado integral do indivíduo com excesso de peso na atenção básica. Rev Nutr [Internet]. 2019 [cited 2020 May 16];32:e190008. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rn/v32/1678-9865-rn-32-e190008.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/rn/v32/1678-9865-rn-32-e190008.pdf
  • 10
    Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição [Internet]. Brasília, DF: MS; 2013 [cited 2015 Apr. 03]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_alimentacao_nutricao.pdf
  • 11
    Carlos MJ, Cavaletti ACL, Caldas CP. Hospitalization of the aged due to stroke: An ecological perspective. Plos ONE [Internet]. 2019 [cited 2020 Sept. 23 ];14(8):e0220833. Available from: https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0220833
    » https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0220833
  • 12
    Schenker M, da Costa DH. Avanços e desafios da atenção à saúde da população idosa com doenças crônicas na Atenção Primária à Saúde. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 15];23(4):1369-80. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413-8123-csc-24-04-1369.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csc/v24n4/1413-8123-csc-24-04-1369.pdf
  • 13
    Canella DS, da Silva ACF, Jaime PC. Produção científica sobre nutrição no âmbito da Atenção Primária à Saúde no Brasil: uma revisão de literatura. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2013 [cited 2017 Jul. 10];18(2):297-308. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csc/v18n2/02.pdf
  • 14
    Pereira KCR, de Lacerda JT, Natal S. Avaliação da gestão municipal para as ações da atenção à saúde do idoso. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 28 Aug 8];33(4):e00208815. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n4/1678-4464-csp-33-04-e00208815.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n4/1678-4464-csp-33-04-e00208815.pdf
  • 15
    Franco TB, Merhy EE. Cartografias do trabalho e cuidado em saúde. Tempus [Internet]. 2012 [cited 2017 Sept. 03];6:151-63. Available from: https://app.uff.br/slab/uploads/Cartografias_do_Trabalho_e_Cuidado_em_Sa%C3%BAde.pdf
    » https://app.uff.br/slab/uploads/Cartografias_do_Trabalho_e_Cuidado_em_Sa%C3%BAde.pdf
  • 16
    Beauvoir S. A velhice I: a realidade incômoda. Dantas HL, tradutora. Vol. 1. São Paulo: Difusão Europeia do Livro; 1970. 313 p.
  • 17
    Debert GG. A reinvenção da velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Fapesp; 2004.
  • 18
    Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde. 8ª ed. Rio de Janeiro: UERJ/ IMS; 2009.
  • 19
    Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo: sinopse [Internet]. 2020 [cited 2020 Aug. 12]. Available from: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/santos/pesquisa/23/25207?tipo=ranking&indicador=25186
    » https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sp/santos/pesquisa/23/25207?tipo=ranking&indicador=25186
  • 20
    Nascimento LCN, Souza TV, Oliveira ICS, Moraes JRMM, Aguiar RCB, Silva LF. Theoretical saturation in qualitative research: an experience report in interview with schoolchildren. Rev Bras Enferm [Internet]. 2018 [cited 2020 Aug. 12];71(1):228-33. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0616
    » http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0616
  • 21
    Weber F. A entrevista, a pesquisa e o íntimo, ou: por que censurar seu diário de campo? Horiz Antropol [Internet]. 2009 [cited 2020 Feb. 22];32:157-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ha/v15n32/v15n32a07.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/ha/v15n32/v15n32a07.pdf
  • 22
    Bardin L. Análise de conteúdo. Reto AL, Pinheiro A, tradutores. São Paulo: Edições 70; 2011.
  • 23
    Pereira TN, Monteiro RA, Santos LMP. Alimentación y nutrición en atención primaria en Brasil. Gac Sanit [Internet]. 2018 [cited 2020 Aug. 12];32(3):297-303. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.gaceta.2017.08.004
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.gaceta.2017.08.004
  • 24
    Bauman Z, May T. Aprendendo a pensar com a sociologia. Werneck A, tradutor. Rio de Janeiro: Zahar; 2010.
  • 25
    Shrimpton R, du Plessis LM, Delisle H, Blaney S, Atwood SJ, Sanders D, et al. Public health nutrition capacity: assuring the quality of workforce preparation for scaling up nutrition programmes. Public Health Nutr [Internet]. 2016 [cited 2020 May 15];19(11):2090-2100. Available from: https://doi.org/10.1017/S136898001500378X
    » https://doi.org/10.1017/S136898001500378X
  • 26
    Rigon SA, Schmidt ST, Bógus CM. Desafios da nutrição no Sistema Único de Saúde para construção da interface entre a saúde e a segurança alimentar e nutricional. Cad Saúde Pública [Internet]. 2016 [cited 2020 May 07];32(3):e00164514. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csp/v32n3/1678-4464-csp-32-03-e00164514.pdf
  • 27
    Vitorino SAS, da Cruz MM, de Barros DC. Validação do modelo lógico teórico da vigilância alimentar e nutricional na atenção primária em saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 2020 May 14];33(12):e00014217. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/1678-4464-csp-33-12-e00014217.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n12/1678-4464-csp-33-12-e00014217.pdf
  • 28
    dos Santos CM, Barbieri AR, Gonçalves CCM, Tsuha DH. Avaliação da rede de atenção ao portador de hipertensão arterial: estudo de uma região de saúde. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017 [cited 2020 Sept. 06];33(5):e00052816. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n5/1678-4464-csp-33-05-e00052816.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csp/v33n5/1678-4464-csp-33-05-e00052816.pdf
  • 29
    Damaceno DG, Chirelli MQ, Lazarini CA. A prática do cuidado em instituições de longa permanência para idosos: desafio na formação dos profissionais. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2019 [cited 2020 Apr. 22];22(1):e180197. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_1809-9823-rbgg-22-01-e180197.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v22n1/pt_1809-9823-rbgg-22-01-e180197.pdf
  • 30
    Botelho FC, Guerra LDS, Pava-Cárdenas A, Cervato-Mancuso AM. Estratégias pedagógicas em grupos com o tema alimentação e nutrição: os bastidores do processo de escolha. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2016 [cited 2020 May 14];21(6):1889-98. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413-8123-csc-21-06-1889.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/1413-8123-csc-21-06-1889.pdf
  • 31
    Neves JA, Zangirolani LTO, de Medeiros MAT. Evaluation of nutritional care of overweight adults from the perspective of comprehensive health care. Rev Nutr [Internet]. 2017 [cited 2018 Sept. 10];30(4):511-24. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-5273-rn-30-04-00511.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/rn/v30n4/1415-5273-rn-30-04-00511.pdf
  • 32
    Mantovani EP, de Lucca SR, Neri AL. Associações entre significados de velhice e bem-estar subjetivo indicado por satisfação em idosos. Rev Bras Geriatr Gerontol [Internet]. 2016 [cited 2020 Apr. 22];19(2):203-22. Available from: https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/1809-9823-rbgg-19-02-00203.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/rbgg/v19n2/1809-9823-rbgg-19-02-00203.pdf
  • 33
    Veras RP, Oliveira M. Envelhecer no Brasil: a construção de um modelo de cuidado. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2018 [cited 2020 May 15];23(6):1929-36. Available from: https://www.scielo.br/pdf/csc/v23n6/1413-8123-csc-23-06-1929.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/csc/v23n6/1413-8123-csc-23-06-1929.pdf
  • 34
    Cervato-Mancuso AM, Vincha KRR, Santiago DA. Educação alimentar e nutricional como prática de intervenção: reflexão e possibilidades de fortalecimento. Physis [Internet]. 2016 [cited 2017 Aug. 10 2017];26(1):225-49. Available from: https://www.scielo.br/pdf/physis/v26n1/0103-7331-physis-26-01-00225.pdf
    » https://www.scielo.br/pdf/physis/v26n1/0103-7331-physis-26-01-00225.pdf
  • Não houve financiamento para a execução deste trabalho.

Editado por

Editado por:

Ana Carolina Lima Cavaletti

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2020
  • Aceito
    05 Out 2020
Universidade do Estado do Rio Janeiro Rua São Francisco Xavier, 524 - Bloco F, 20559-900 Rio de Janeiro - RJ Brasil, Tel.: (55 21) 2334-0168 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: revistabgg@gmail.com