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A experiência da segunda vítima: adaptação transcultural de um instrumento para o contexto brasileiro

RESUMO

Objetivo

Adaptar transculturalmente e analisar as evidências de validade de conteúdo do Second Victim Experience and Support Tool para a língua portuguesa falada no Brasil.

Método

Estudo psicométrico de adaptação transcultural, seguindo as etapas do Patient-Reported Outcome Measurement Information System. Foram avaliadas as equivalências semântica, idiomática, experimental e conceitual. A validade de conteúdo foi verificada, com base no Content Validity Ratio. Participaram do pré-teste 31 profissionais de saúde da cidade de São Paulo.

Resultados

A análise das equivalências apresentou uma taxa de concordância de 88,7%. A validade de conteúdo apresentou 86% dos itens com valores de Content Validity Ratio acima do estipulado. No pré-teste, os participantes reportaram terem entendido os itens do instrumento e apenas 10% dos participantes relataram dificuldade para entender algum item.

Conclusão

A versão brasileira do Questionário de Experiência e Apoio à Segunda Vítima apresentou boa qualidade de tradução e boas evidências de validade de conteúdo.

Palavras-chave
Saúde do trabalhador; Segurança do paciente; Estudo de validação; Psicometria; Pessoal de saúde; Enfermagem

ABSTRACT

Objective

To cross-culturally adapt and analyze the evidence of content validity of the Second Victim Experience and Support Tool for the Portuguese language spoken in Brazil.

Method

Psychometric study of cross-cultural adaptation following the steps of the Patient-Reported Outcome Measurement Information System. Semantic, idiomatic, experimental, and conceptual equivalences were evaluated. The content validity was verified using the Content Validity Ratio. 31 health professionals from the city of São Paulo participated in the pre-test.

Results

The equivalence analysis showed an agreement rate was 88.7%. The content validity presented 86% of the items with Content Validity Ratio values ​​above the stipulated. In the pre-test, the participants reported that they understood the items of the instrument and only 10% of the participants reported difficulty in understanding any item.

Conclusion

The Brazilian version of the Second Victim Experience and Support Tool presented a good translation quality and good evidence of content validity.

Keywords
Occupational health; Patient safety; Validation study; Psychometrics; Health Personnel; Nursing

RESUMEN

Objetivo

Adaptar y analizar transculturalmente la evidencia de validez de contenido de la Second Victim Experience and Support Tool para el idioma portugués hablado en Brasil.

Método

Estudio psicométrico de adaptación transcultural siguiendo los pasos del Patient-Reported Outcome Measurement Information System. Se evaluaron equivalencias semánticas, idiomáticas, experimentales y conceptuales. La validez de contenido se verificó mediante el índice de validez de contenido. 31 profesionales de la salud de la ciudad de São Paulo participaron en la prueba preliminar.

Resultados

El análisis de equivalencias mostró una tasa de acuerdo del 88,7%. La validez de contenido presentó 86% de los ítems con valores de Tasa de Validez de Contenido por encima de lo estipulado. En la prueba previa, los participantes informaron que entendieron los ítems del instrumento y solo el 10% de los participantes dijeron que tenían dificultades para entender algún ítem.

Conclusión

La versión brasileña del Cuestionario de Experiencia y Apoyo a Segundas Víctimas mostró una buena calidad de traducción y buena evidencia de validez de contenido.

Palabras clave
Salud laboral; Seguridad del paciente; Estudio de validación; Psicometría; Personal de salud; Enfermería

INTRODUÇÃO

A interface entre a saúde do trabalhador e a segurança do paciente tem sido foco de pesquisadores recentemente. Evidencia uma série de aspectos relevantes, especialmente na área da enfermagem, uma vez que as condições de trabalho dos profissionais de saúde impactam diretamente a qualidade e a segurança do paciente11. World Health Organization. Charter health worker safety: a priority for patient safety. [Internet]. Geneva: WHO; 2020. [cited 2021 Mai 15]. Available from: Available from: https://www.who.int/docs/default-source/world-patient-safety-day/health-worker-safety-charter-wpsd-17-september-2020-3-1.pdf?sfvrsn=2cb6752d_2
https://www.who.int/docs/default-source/...
.

A partir das pesquisas já realizadas, hoje existem dados suficientes que permitem argumentar em favor da necessidade de recursos humanos em saúde adequados para a manutenção da qualidade nos serviços. Isso implica formação, capacitação, distribuição adequada e manutenção da saúde desses profissionais. Por outro lado, tratando-se da enfermagem, também sobram dados quantitativos e qualitativos que expressam o adoecimento em profissionais da categoria e a ausência de políticas institucionais nos serviços de saúde que assegurem esse binômio: trabalhador seguro e paciente seguro22. Baldonedo-Mosteiro M, Almeida MCS, Baptista PCP, Sánchez-Zaballos M, Rodriguez-Diaz FJ, Mosteiro-Diaz MP. Síndrome de burnout em trabalhadores de enfermagem brasileiros e espanhóis. Rev Latino-Am Enfermagem. 2019;27:e3192. doi: http://doi.org/10.1590/1518-8345.2818.3192
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O pesquisador Albert Wu utilizou pela primeira vez, em 20003. Wu AW. Medical error: the second victim. The doctor who makes the mistake needs help too [Editorial]. BMJ. 2000;320(7237):726-7. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.320.7237.726
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, o termo “segunda vítima”, ao apontar que profissionais médicos que cometem um erro acabam por se tornar a segunda vítima do incidente33. Wu AW. Medical error: the second victim. The doctor who makes the mistake needs help too [Editorial]. BMJ. 2000;320(7237):726-7. doi: http://doi.org/10.1136/bmj.320.7237.726
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. A primeira vítima é o paciente que sofreu com os danos causados e a segunda vítima é o profissional de saúde que, após ser culpabilizado pela falha acaba traumatizado, podendo até desenvolver transtornos mentais em decorrência do acontecido44. Wu AW, Shapiro J, Harrison R, Scott SD, Connors C, Kenney L, et al. The impact of adverse events on clinicians: what's in a name? J Patient Saf. 2020;16(1):65-72. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000256
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. O trauma pode ser causado pelo próprio profissional que sente medo, vergonha, insegurança; ou, também, pelos colegas de trabalho, pacientes, familiares e lideranças que julgam e culpam o profissional pelo erro, e eventualmente interpretam o profissional como alguém incompetente, negligente e antiético44. Wu AW, Shapiro J, Harrison R, Scott SD, Connors C, Kenney L, et al. The impact of adverse events on clinicians: what's in a name? J Patient Saf. 2020;16(1):65-72. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000256
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- 55. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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Em 2009, o conceito de segunda vítima foi ampliado para descrever não só médicos, mas todos os prestadores de cuidado que estivessem envolvidos em um evento adverso, um erro médico ou uma lesão imprevista causada ao paciente e, por isso, foram traumatizados pelo evento. Esses profissionais se sentem unicamente responsáveis pelos resultados do incidente55. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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Um estudo desenvolvido com profissionais de saúde descreveu seis etapas características durante a trajetória de recuperação da segunda vítima. A primeira etapa ocorre imediatamente após o incidente, sendo necessária uma maior atenção ao paciente que sofreu o dano. Naquela etapa, o profissional fica desatento, iniciando uma autorreflexão. A segunda etapa é caracterizada por períodos de isolamento, reflexões sobre possíveis hipóteses “e se...”, refletindo sobre o que poderia ter feito para ter evitado o incidente. Na terceira etapa o profissional busca apoio de alguém de confiança, um colega de trabalho, supervisor ou mesmo colegas pessoais. Nesta etapa também ocorre a insegurança e medo de como o profissional será visto pela equipe de trabalho. Após esta fase, na quarta etapa, a segunda vítima começa a refletir sobre como será a repercussão do incidente perante a instituição, cogita a possibilidade de ser demitido, as punições que poderá sofrer e o impacto em sua carreira. A quinta etapa é caracterizada pela busca de suporte emocional em que possa confiar. A sexta e última etapa é sobre o desfecho do profissional. Esse desfecho pode ocorrer pela desistência, com mudança de profissão por exemplo; ou pela sobrevivência, quando o indivíduo segue na área, porém ainda com receio pelos efeitos do ocorrido; uma outra possibilidade de desfecho é quando o profissional prospera e avalia a situação e a utiliza como possibilidade de aprendizado e desenvolvimento55. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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No âmbito internacional, foi desenvolvido um instrumento que avalia a experiência de segundas vítimas e de adequação de recursos de apoio a esses profissionais: o Second Victim Experience and Support Tool (SVEST), desenvolvido em 2013 em um hospital pediátrico dos Estados Unidos e que envolveu 303 profissionais66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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. O SVEST é um instrumento que propõe medir o sofrimento relacionado à segunda vítima, as percepções de apoio organizacional, apoio de colegas e da supervisão, intenção de mudar de emprego, o absenteísmo relacionado a experiência de segunda vítima e as formas desejadas de apoio77. Burlison JD, Quillivan RR, Scott SD, Johnson S, Hoffman JM. The effects of the second victim phenomenon on work-related outcomes: connecting self-reported caregiver distress to turnover intentions and absenteeism. J Patient Saf. 2021;17(3):195-9. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000301
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Por meio do uso de uma escala que mensura a experiência de segunda vítima nos profissionais de saúde, é possível direcionar ações com o objetivo de reduzir e prevenir os efeitos negativos frente à segunda vítima66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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. Além disso, o instrumento aponta algumas oportunidades de melhoria na instituição, colaborando para uma melhor cultura de segurança do paciente, visto que se uma intuição possui um alto índice de experiências de segunda vítima, as chances dos profissionais de saúde se envolverem em novos incidentes são maiores66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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No cenário nacional, destaca-se a carência de instrumento validado que avalie o fenômeno da experiência de segunda vítima entre profissionais da saúde. Nesse aspecto, ponderando sobre o contexto apresentado, o presente estudo propôs-se a adaptar transculturalmente e analisar as evidências de validade de conteúdo do Second Victim Experience and Support Tool para a língua portuguesa falada no Brasil.

MÉTODO

Trata-se de um estudo psicométrico de adaptação transcultural de um instrumento que avalia a experiência de profissionais considerados segunda vítima. Foram seguidas as etapas do guia de recomendações proposto pela Patient-Reported Outcome Measurement Information System (PROMIS®), com algumas adaptações propostas por Beaton et al. (20029. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002.)88. Correia H. Translation and cultural adaptation. Appendix 14. In: PROMIS Instrument development and validation scientific standards. Version 2.0. 2013 [cited 2020 May 15]. p. 66-72. Available from: https://www.mcgill.ca/can-pro-network/files/can-pro-network/promisstandards_vers2.0_final.pdf
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- 99. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002.. Primeiramente foi realizado contato com o autor principal do instrumento original, que conferiu a devida autorização para sua adaptação à cultura brasileira. A partir de então foram cumpridas as 11 etapas, a saber: 1) Tradução, 2) Reconciliação, 3) Retrotradução, 4) Revisão da retrotradução, 5) Revisão do comitê de especialistas, 6) Pré-finalização, 7) Finalização, 8) Harmonização, 9) Formatação, 10) Pré-teste e 11) Análise dos comentários e finalização da tradução.

O SVEST é composto por 36 itens que compões 10 dimensões. As primeiras sete dimensões medem as respostas das segundas vítimas e as características de apoio, que são, em sua língua original: “psychological distress”, “physical distress”, “colleague support”, “supervisor support”, “institutional support”, “non-work-related support”, “professional self-efficacy”. Posteriormente, apresentam-se duas dimensões que abordam o desfecho, que são: “turnover intentions” e “absenteeism”. As respostas aos itens dessas dimensões são medidas por meio de escala do tipo Likert, variando de 1 (discordo fortemente) a 5 (concordo fortemente). O instrumento também mensura o desejo de apoio das segundas vítimas, completando assim, a última dimensão, que é avaliada também por uma escala do tipo Likert, variando de 1 (não desejo fortemente) e 5 (desejo fortemente), tendo em contas que há itens indicados que possuem a pontuação invertida66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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As etapas de tradução e reconciliação foram realizadas por três tradutores independentes, bilíngues e que possuíam como língua materna o português. Como formação, dois tradutores eram doutores na área de Letras (literatura e linguística) e o terceiro era doutor em enfermagem, com conhecimento na área da saúde. A partir das traduções foi elaborada a síntese das traduções pelo terceiro tradutor, posteriormente validada pelas pesquisadoras.

Os tradutores foram selecionados por sua expertise em traduções e adaptações transculturais de instrumentos. Eles receberam, via correio eletrônico, uma carta convite com as orientações do trabalho e o instrumento original (exceto o retrotradutor).

A etapa de retrotradução foi realizada por outro tradutor independente, fluente em português brasileiro e que possuía como língua materna o idioma de origem do instrumento (inglês estadunidense). Este tradutor recebeu síntese das traduções e, então, elaborou a retrotradução para o idioma de origem do instrumento. A revisão da retrotradução foi feita pelas próprias pesquisadoras e todas as etapas (Tradução 1, Tradução 2, Tradução 3, Síntese das Traduções e a Retrotradução) foram enviadas ao autor original.

Os produtos de cada etapa foram consolidados em planilhas do Excel® para melhor estruturação.

A etapa de revisão pelo comitê de especialistas foi dividida em dois momentos. O primeiro momento incluiu a análise da qualidade das traduções, por meio da avaliação das equivalências, e o segundo de avaliação das evidências da validação de conteúdo.

Foram avaliadas as equivalências: semântica, idiomática, experimental e conceitual, levando em consideração as seguintes definições: equivalência semântica - refere-se à equivalência de sentido, está relacionada ao sentido gramatical e de vocabulário; equivalência idiomática - refere-se às expressões coloquiais (expressões informais ou populares); equivalência experimental - atribui-se a coerência entre os termos utilizados e as experiências de vida que podem ser diferentes entre culturas e; equivalência conceitual - refere-se à equivalência de conceito, ou seja, uma palavra pode ter o mesmo sentido, porém com conceito diferente por ser culturas distintas88. Correia H. Translation and cultural adaptation. Appendix 14. In: PROMIS Instrument development and validation scientific standards. Version 2.0. 2013 [cited 2020 May 15]. p. 66-72. Available from: https://www.mcgill.ca/can-pro-network/files/can-pro-network/promisstandards_vers2.0_final.pdf
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- 99. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002..

Para análise das equivalências participaram sete especialistas, sendo quatro enfermeiros, um médico, um psicólogo e um bacharel em Letras. A equipe de especialistas foi multidisciplinar, de acordo com a recomendação de Beaton et al (20029. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002.), sendo eles: especialista com expertise em psicometria; profissional da saúde com expertise no tema estudado; linguista com expertise na língua portuguesa falada no Brasil, e os tradutores envolvidos na fase de tradução99. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002.. Os especialistas possuíam título de Doutor, sendo que três deles eram pós-doutores.

Os especialistas receberam, via correio eletrônico, uma carta convite com as orientações e conceitos a serem utilizados, e uma planilha em Excel® com todas as etapas anteriores e a síntese das traduções para julgamento das equivalências em “equivale totalmente” ou “não equivale”. Foi calculada a Taxa de Concordância e considerado a taxa mínima de 80%1010. Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8. doi: http://doi.org/10.1590/S1413-81232011000800006
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A validade de conteúdo foi avaliada por sete especialistas que possuíam expertise na área de segurança do paciente e saúde do trabalhador, tendo cinco deles também participado da análise de equivalências. Foram avaliadas: clareza - se os itens estavam redigidos de forma compreensível e se expressavam de forma clara aquilo a que se propunha medir; pertinência - se os itens refletiam os conceitos propostos e se eram relevantes e adequados para atingir os objetivos esperados do instrumento e; relevância - se o conteúdo do item é ou não relevante à cultura em que será inserido1010. Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8. doi: http://doi.org/10.1590/S1413-81232011000800006
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A análise ocorreu por meio do cálculo do Content Validity Ratio (CVR), variando entre a concordância perfeita (+1) e a discordância perfeita (-1). Para garantir que a concordância entre os especialistas não fosse devido ao acaso, foi utilizado o valor crítico de CVR. No caso deste estudo, foi adotado um nível de significância de 0,05, resultando então o valor mínimo de CVR crítico de 0,7411111. Lawshe CH. A quantitative approach to content validity. Pers. Psychol. 1975;28(4):563-75. doi: https://doi.org/10.1111/j.1744-6570.1975.tb01393.x
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- 1313. Wilson FR, Pan W, Schumsky DA. Recalculation of the critical values for Lawshe’s content validity ratio. Meas Eval Couns Dev. 2012;45(3):197-210. doi: http://doi.org/10.1177/0748175612440286
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. O cálculo do CVR foi feito por meio da fórmula a seguir1313. Wilson FR, Pan W, Schumsky DA. Recalculation of the critical values for Lawshe’s content validity ratio. Meas Eval Couns Dev. 2012;45(3):197-210. doi: http://doi.org/10.1177/0748175612440286
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C R V c r i t i c o = n c r i t i c o - ( N / 2 ) ( N / 2 )

Os especialistas receberam uma carta convite com orientações e o instrumento para avaliação que foi disponibilizado pelo Google Forms®. No formulário eletrônico, cada item poderia ser avaliado em “sim” e “não”, considerados os conceitos de clareza, pertinência e relevância. Posteriormente, as repostas foram analisadas em planilhas do Excel®.

Na etapa de pré-finalização, as pesquisadoras revisaram e avaliaram as sugestões feitas pelos especialistas. A finalização, harmonização e formatação foram feitas com a conferência de todas as etapas anteriores, em busca de discrepâncias ou falhas.

A etapa de pré-teste ocorreu no mês de novembro de 2020, no município de São Paulo, com a participação de 31 profissionais de saúde de diferentes instituições de saúde do município. Os participantes eram enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, farmacêuticos e nutricionistas, que, como critério de inclusão, possuíam ou já haviam tido algum vínculo empregatício e cuja língua materna fosse o português falado no Brasil. O convite aos profissionais se deu por meio digital, contendo um texto com o endereço eletrônico do formulário de coleta de dados, divulgado em grupos de contatos. A partir da análise das respostas, considerando os critérios de inclusão, foi-se formando uma amostra de conveniência, seguindo a recomendação proposta por Beaton et. al., de no mínimo 30 participantes 99. Beaton D, Bombardier C, Guillemin F, Ferraz BM. Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons. Institute for Work & Health; 2002..

Na primeira parte, os participantes responderam, por meio de questionário online, às questões sociodemográficas e características do trabalho, em seguida a versão pré-final do Questionário de Experiência e Apoio à Segunda Vítima (BR-SVEST) e perguntas abertas e fechadas avaliando a clareza de entendimento, dificuldade para entender e sugestões.

Os participantes foram convidados a participar desta fase por amostra de conveniência, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Ao final, na etapa de análise dos comentários e finalização da tradução, as pesquisadoras analisaram os comentários dos participantes do pré-teste e finalizou-se a tradução do instrumento.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, recebendo o número CAAE 19827019.9.0000.5392 e foi iniciado após autorização dos autores do instrumento original.

RESULTADOS

Os resultados das etapas iniciais de tradução, a síntese das traduções e a retrotradução foram estruturados em planilhas e encaminhada ao autor original do instrumento que sugeriu apenas um ajuste no título do instrumento, que na retrotradução constava como “Second Victim Experience and Supporting Tool” diferente do instrumento original que é “Second Victim Experience and Support Tool”. O instrumento Second Victim Experience and Support Tool pode ser conferido na íntegra no estudo original(6).

Como resultado da análise das equivalências, o instrumento obteve uma taxa de concordância global de 88,7%, acima do valor mínimo estipulado. Dos 57 itens que foram avaliados (título, instruções de preenchimentos, instruções de pontuação, título dos domínios e itens de avaliação), dez tiveram a equivalência universal abaixo do estipulado, variando entre 60,7% e 78,6%. Devido a isso, em relação aos itens que tiveram menor equivalência universal foram acatadas as sugestões dos especialistas, com o objetivo de melhorar a clareza destes itens.

As instruções de preenchimento também receberam alterações, uma delas em relação ao termo “near miss”. Este aspecto já havia sido identificado nas etapas de tradução e retrotradução. Por sugestão de dois especialistas foi acrescentado o termo em inglês ficando: “...ou que quase atingiram o paciente (circunstância que aconteceu o erro, mas não chegou a atingir o paciente, os chamados near miss ou quase erro)”. A maioria das sugestões dos especialistas foi acatada, mesmo nos itens que tiveram taxa de equivalência maior que 80%.

Após a análise das equivalências, foi verificado a validade de conteúdo. Nesta etapa foram convidados os mesmos especialistas da etapa anterior (exceto os especialistas em línguas), havendo também a substituição de um deles em virtude de indisponibilidade. Totalizaram sete especialistas, sendo seis enfermeiros e um médico, todos com título de doutor, sendo três pós-doutores e um com livre-docência.

A análise foi realizada por meio do cálculo do CVR crítico, e dos 36 itens avaliados, 31 itens (86%) apresentaram CVR acima do valor estipulado de 0,741; cinco itens (14%) apresentaram CVR médio abaixo do valor estipulado, sendo necessária a revisão de acordo com as sugestões feitas pelos especialistas. Para os demais itens, mesmo apresentando CVR médio acima de 0,741, também foram consideradas as sugestões. Os resultados estão descritos na Tabela 1:

Tabela 1-
Content Validity Ratio (Razão de Validade de Conteúdo) - CVR dos itens da versão brasileira pré final do Second Victim Experience and Support Tool (SVEST), São Paulo, 2020.

Optou-se pela manutenção dos cinco itens que obtiveram CVR abaixo do valor estipulado pela sua importância no contexto do questionário e para isso, foram acatadas as sugestões dos especialistas, para melhoria da clareza dos itens.

A maior parte das sugestões dos especialistas foi em relação à inclusão de informações sobre a quais situações ou a quais eventos a frase se aplicava, como por exemplo no item 15. Neste item, a afirmação “Meu supervisor culpa os indivíduos” foi substituída por “Meu/minha supervisor/a culpa os indivíduos que estiveram envolvidos em evento adverso”.

Foi acrescentado no título do instrumento a sigla BR-SVEST. A versão final, com as sugestões dos especialistas pode ser visualizada no instrumento final.

Na etapa do pré-teste participaram 31 profissionais de saúde, todos da região sudeste do Brasil, cujas características sociodemográfica e de trabalho estão apresentadas na tabela abaixo (Tabela 2).

Tabela 2 -
Características sociodemográfica e de trabalho dos participantes do pré-teste. São Paulo, 2020.

Em relação aos resultados da avaliação de clareza de entendimento da versão final do instrumento traduzido, todos os participantes mencionaram entender os itens; quando questionado se houve alguma dificuldade para entender, 28 profissionais (90%) relataram não ter dificuldade em entender os itens e três profissionais (10%) relataram que tiveram dificuldades para entendê-los. Entre os profissionais que relataram dificuldade, não foi observada semelhança de profissão, sendo um médico, um fisioterapeuta e um enfermeiro. As dificuldades relatadas referiam-se ao domínio Apoio dos Colegas de Trabalho - “Aprecio as tentativas de consolo dos meus colegas de trabalho, mas sua ajuda pode vir na hora errada”. Nos comentários, os profissionais questionaram qual seria a hora errada para ajuda. Os demais profissionais não apresentaram sugestões para modificação no instrumento.

Após a análise dos comentários do pré-teste, obteve-se o instrumento final do processo de adaptação transcultural. Foi adequada a formatação para permitir maior facilidade de preenchimento do Questionário de Experiência e Apoio à Segunda Vítima (BR-SVEST).

DISCUSSÃO

O termo “segunda vítima” tem apresentado controvérsias sobre o sentido de “vítima” e sua conotação de passividade sobre o profissional de saúde, conforme a análise de alguns autores44. Wu AW, Shapiro J, Harrison R, Scott SD, Connors C, Kenney L, et al. The impact of adverse events on clinicians: what's in a name? J Patient Saf. 2020;16(1):65-72. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000256
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. O envolvimento dos profissionais de saúde em eventos adversos impacta a saúde do profissional que, a partir do sofrimento de ter vivenciado essa experiência, se torna uma “segunda vítima”55. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870 ...
.

O sofrimento do profissional de saúde advém não só do seu envolvimento no evento adverso, ele pode ter repercussões posteriores também. Tais efeitos podem se dar na instituição de trabalho e no modo como ela e a liderança lidarão com o evento adverso, ou também nas formas de apoio a que o profissional teve acesso e como elas se manifestarão na hora de lidar com a experiência de segunda vítima.66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000...
.

Instrumentos de medida permitem avaliar e apresentar resultados quantitativos sobre um mesmo constructo em diversas populações, viabilizando comparações e uma análise sobre o tema1414. Echevarría-Guanilo ME, Gonçalves N, Romanoski PJ. Psychometric properties of measurement instruments: conceptual bases and evaluation methods - Part I. Texto Contexto Enferm. 2017;26(4):e1600017. doi: http://doi.org/10.1590/0104-07072017001600017
http://doi.org/10.1590/0104-070720170016...
. O instrumento foco deste estudo tem o objetivo de medir o impacto do fenômeno da segunda vítima nos profissionais de saúde66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000...
.

O processo de adaptação transcultural ocorreu de forma mista, seguindo a metodologia do guideline PROMIS®88. Correia H. Translation and cultural adaptation. Appendix 14. In: PROMIS Instrument development and validation scientific standards. Version 2.0. 2013 [cited 2020 May 15]. p. 66-72. Available from: https://www.mcgill.ca/can-pro-network/files/can-pro-network/promisstandards_vers2.0_final.pdf
https://www.mcgill.ca/can-pro-network/fi...
. Nas primeiras etapas de tradução e retrotradução o destaque foi para os termos de língua inglesa que já estão presentes nas práticas linguísticas dos profissionais de saúde no Brasil, como “near miss” e “turnover”. Esses termos também voltaram a ser discutidos nas etapas de revisão do comitê de especialistas e na validade de conteúdo. Mesmo já estando incorporados à cultura brasileira, inclusive com instrumento validado utilizando o termo “turnover”, optou-se pela tradução do mesmo por “intenções de deixar o trabalho”, ficando de fácil entendimento para o público-alvo1515. Silva AA, Machado WL, Souza LAS, Barbosa NMS, Assis RS, Oliveira MZ. Adaptação e propriedades psicométricas da escala de intenção de turnover e busca de emprego. Aval Psicol. 2018;17(4):462-72. doi: http://doi.org/10.15689/ap.2018.1704.6.06
http://doi.org/10.15689/ap.2018.1704.6.0...
. Em relação ao termo “near miss”, optou-se por manter os dois termos, “near miss e quase erro” por sugestão dos especialistas e, também, por já ser conhecido entre os profissionais que trabalham com segurança do paciente, como “near miss”. Porém, por ser um instrumento que será aplicado para profissionais da saúde desde o nível técnico, manteve-se também a palavra traduzida para “quase erro”.

Na análise das equivalências, o instrumento obteve taxa de concordância universal de 88,7%, o que indica um bom valor de concordância nas equivalências dos itens, tendo como referências valores aceitáveis acima de 80%1010. Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-8. doi: http://doi.org/10.1590/S1413-81232011000800006
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. Os itens que tiveram equivalência universal abaixo do estipulado foram reformulados e, ainda assim, podem apresentar como limitação alguma dificuldade de entendimento, porém isto não foi observado nas etapas seguintes, como no pré-teste.

Em relação à validade de conteúdo, 86% dos itens apresentaram CVR médio acima de 0,741, valor de referência de acordo com a quantidade de especialistas. Diante deste resultado, considera-se que o instrumento apresentou bons resultados de CVR, demonstrando uma boa validade de conteúdo1111. Lawshe CH. A quantitative approach to content validity. Pers. Psychol. 1975;28(4):563-75. doi: https://doi.org/10.1111/j.1744-6570.1975.tb01393.x
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, 1313. Wilson FR, Pan W, Schumsky DA. Recalculation of the critical values for Lawshe’s content validity ratio. Meas Eval Couns Dev. 2012;45(3):197-210. doi: http://doi.org/10.1177/0748175612440286
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.

No instrumento original, foi verificado a validade de construto por meio da análise fatorial confirmatória e testado a confiabilidade do instrumento utilizando o coeficiente de alfa de Cronbach (α), que obteve valores acima de 0,70 em sete domínios e apenas dois domínios apresentaram valores de 0,61 e 0,64 66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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. Estas propriedades psicométricas não foram verificadas no presente estudo, portanto, ressalta-se a importância dessas análises em estudos futuros.

A versão coreana do instrumento Second Victim Experience and Support Tool (K-SVEST) teve a validade de conteúdo avaliada por meio do Índice de Validade de Conteúdo (IVC) que resultou em 0,95, considerado um bom resultado para validade 1616. Kim EM, Kim SA, Lee JR, Burlison JD, Oh EG. Psychometric properties of Korean version of the Second Victim Experience and Support Tool (K-SVEST). J Patient Saf. 2020;16(3):179-86. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000466
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. Nesse sentido, a versão chinesa Second Victim Experience and Support Tool (C-SVEST) também utilizou o cálculo do IVC e obteve como resultado 0,99 para o instrumento e 0,89 para a validade do nível do item1717. Chen J, Yang Q, Zhao Q, Zheng S, Xiao M. Psychometric validations of the Chinese version of the Second Victim Experience and Support Tool (C-SVEST). J Nurs Manag. 2019;27(7):1416-22. doi: http://doi.org/10.1111/jonm.12824
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. E, ainda, a versão argentina calculou a confiabilidade do instrumento, que obteve valor de alfa de Cronbach global de 0,8051818. Brunelli MV, Estrada S, Celano C. Cross-cultural adaptation and psychometric evaluation of a Second Victim Experience and Support Tool (SVEST). J Patient Saf. 2021;17(8):e1401-e1405. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000497
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.

Optou-se por incluir no título do instrumento a sigla BR-SVEST, de acordo com os padrões utilizados nas traduções e adaptações do instrumento em outros idiomas1616. Kim EM, Kim SA, Lee JR, Burlison JD, Oh EG. Psychometric properties of Korean version of the Second Victim Experience and Support Tool (K-SVEST). J Patient Saf. 2020;16(3):179-86. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000466
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- 1717. Chen J, Yang Q, Zhao Q, Zheng S, Xiao M. Psychometric validations of the Chinese version of the Second Victim Experience and Support Tool (C-SVEST). J Nurs Manag. 2019;27(7):1416-22. doi: http://doi.org/10.1111/jonm.12824
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.

Após verificação da validade de conteúdo, o instrumento foi submetido a um pré-teste, cujo objetivo foi verificar o entendimento dos itens pelo público alvo, ou seja, os profissionais de saúde.

Os estudos citados anteriormente validaram esse mesmo instrumento apenas na área da enfermagem da população chinesa, argentina e coreana1616. Kim EM, Kim SA, Lee JR, Burlison JD, Oh EG. Psychometric properties of Korean version of the Second Victim Experience and Support Tool (K-SVEST). J Patient Saf. 2020;16(3):179-86. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000466
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, 1717. Chen J, Yang Q, Zhao Q, Zheng S, Xiao M. Psychometric validations of the Chinese version of the Second Victim Experience and Support Tool (C-SVEST). J Nurs Manag. 2019;27(7):1416-22. doi: http://doi.org/10.1111/jonm.12824
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, 1818. Brunelli MV, Estrada S, Celano C. Cross-cultural adaptation and psychometric evaluation of a Second Victim Experience and Support Tool (SVEST). J Patient Saf. 2021;17(8):e1401-e1405. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000497
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. Neste estudo, optou-se por aplicar o pré-teste para toda equipe multiprofissional, assim como no estudo de origem do instrumento66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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.

Participaram do pré-teste 31 profissionais de saúde, distribuídos entre as seguintes profissões: medicina, enfermagem (bacharel e nível técnico), nutrição, fisioterapia, farmácia, psicologia e fonoaudiologia. Seguindo a definição de Scott et al (20095. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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), o termo segunda vítima refere-se a profissionais de saúde que estiveram envolvidos em evento adverso, considerando todos da equipe multiprofissional, por isso a importância da sua validação em profissionais de distintas especialidades55. Scott SD, Hirschinger LE, Cox KR, McCoig M, Brandt J, Hall LW. The natural history of recovery for the healthcare provider ‘‘second victim’’ after adverse patient events. Qual Saf Health Care. 2009;18(5):325-30. doi: http://doi.org/10.1136/qshc.2009.032870
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.

O resultado do pré-teste mostrou-se satisfatório, visto que os 31 participantes afirmaram ter entendido os itens do instrumento, 28 relataram não ter tido dificuldades e apenas três tiveram dificuldade para entender. Dois participantes reportaram dificuldade sobre o item “Aprecio as tentativas de consolo dos meus colegas de trabalho, mas sua ajuda pode vir na hora errada”, e os comentários sobre esse item questionaram qual seria a “hora errada” para ter ajuda.

Estudo conduzido na Espanha, que avaliou a experiência de segunda vítima em profissionais de saúde (médico e enfermeiros), observou que seis em cada 10 profissionais tiveram experiência de segunda vítima e que raramente recebem algum tipo de treinamento ou ensino sobre estratégias de enfrentamento relacionado ao envolvimento em eventos adversos1919. Mira JJ, Carrillo I, Lorenzo S, Ferrús L, Silvestre C, Pérez-Pérez P, et al. The aftermath of adverse events in Spanish primary care and hospital health professionals. BMC Health Serv Res. 2015;15:151. doi: http://doi.org/10.1186/s12913-015-0790-7
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. Os profissionais relataram sentimento de culpa, ansiedade, medo de consequências, todos os quais também evidenciados em outros trabalhos sobre o tema1919. Mira JJ, Carrillo I, Lorenzo S, Ferrús L, Silvestre C, Pérez-Pérez P, et al. The aftermath of adverse events in Spanish primary care and hospital health professionals. BMC Health Serv Res. 2015;15:151. doi: http://doi.org/10.1186/s12913-015-0790-7
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.

Profissionais de saúde em sofrimento, com desgaste emocional e físico relacionado ao trabalho também podem afetar a segurança do paciente. Estes profissionais não estão com sua capacidade total para o trabalho, colocando em risco a segurança do paciente ou também aumentando o absenteísmo e a rotatividade, gerando sobrecarga de trabalho, quadro este que se aplica aos profissionais segunda vítima2020. World Health Organization. World patient safety day goals 2020 [Internet]. 2020 [cited 2020 Dec 6]. Available from: Available from: https://www.who.int/campaigns/world-patient-safety-day/2020
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.

O uso do Questionário de Experiência e Apoio à Segunda Vítima (BR-SVEST) permite avaliar, nos profissionais de saúde, a experiência como segunda vítima e direcionar formas de apoio. O estudo de criação deste instrumento sugere seu uso por líderes de saúde, antes ou depois da implementação de programas de apoio à segunda vítima, permitindo a avaliação da qualidade e desempenho dos recursos oferecidos66. Burlison JD, Scott SD, Browne EK, Thompson SG, Hoffman JM. The second victim experience and support tool: validation of an organizational resource for assessing second victim effects and the quality of support resources. J Patient Saf. 2017;13(2):93-102. doi: http://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000129
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.

A aplicação do instrumento, em serviços de saúde, poderá apresentar, em porcentagem, os efeitos negativos das experiências de segunda vítimas dos profissionais de saúde, assim como as oportunidades para melhorar os recursos de apoio disponíveis nas instituições, mostrando quais são as formas de apoio desejadas pelos profissionais.

Destaca-se a importância do uso deste instrumento pelas organizações de saúde como parte da avaliação de cultura de segurança institucional, uma vez que a ocorrência de eventos adversos não atinge exclusivamente o paciente, mas também os profissionais envolvidos no evento e, mais tardiamente, a instituição de saúde. A análise sobre a ocorrência das segundas vítimas pela instituição de saúde possibilita direcionar ações de melhoria de processos com foco na cultura de segurança do paciente.

CONCLUSÃO

O instrumento Questionário de Experiência e Apoio à Segunda Vítima (BR-SVEST) foi traduzido para a língua portuguesa falada no Brasil, sendo realizada a adaptação transcultural para a cultura brasileira. Em relação às equivalências semântica, idiomática, experimental e conceitual, o instrumento apresentou taxa de concordância universal do instrumento de 88,7%, considerada satisfatória. Os itens que tiveram equivalência universal abaixo do estipulado, foram reformulados de acordo com as sugestões dos especialistas e não foi observada dificuldade de entendimento pelos participantes no pré-teste, porém pode-se ter como limitação alguma dificuldade de entendimento em uma amostra maior.

O BR-SVEST apresentou uma boa evidência na validade de conteúdo, sendo verificada clareza, pertinência e relevância dos itens. Ao todo, o instrumento apresentou resultados de CVR médio variando de 0,429 a 1,00. Apenas cinco itens apresentaram CVR médio abaixo do valor estipulado, sendo necessária a readequação dos itens de acordo com as sugestões dos especialistas.

O estudo apresentou como limitação a não avaliação das evidências de estrutura interna, assim, justifica-se a aplicação do instrumento em novos estudos para análise deste aspecto e sugere-se também a aplicação do instrumento em profissionais de diferentes regiões do Brasil.

Dessa forma, o estudo disponibilizou uma ferramenta, o BR-SVEST, que pode ser empregado nos serviços de saúde para avaliar a experiência de segunda vítima em seus profissionais de saúde e, assim, desenvolver ações e programas de suporte para esses profissionais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    12 Fev 2021
  • Aceito
    08 Out 2021
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