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O CURRÍCULO NA FORMAÇÃO DOS ESTUDANTES DE EDUCAÇÃO FÍSICA NA ALEMANHA- O EXEMPLO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA UNIVERSIDADE TÉCNICA DE BRAUNSCHWEIG

CURRICULUM IN GERMANY PHYSICAL EDUCATION PROFESSIONAL QUALIFICATION - PHYSICAL EDUCATION DEPARTMENT AT BRAUNSCHWEIG TECNICAL UNIVERSITY

RESUMO

Este artigo tem o objetivo de oferecer uma visão atual sobre o desenvolvimento curricular na Alemanha. O artigo esta estruturado em três passos: No primeiro passo é dada a descrição do desenvolvimento da disciplina Educação Física como uma disciplina acadêmica nas universidades alemãs depois da segunda guerra mundial. No segundo passo esclarece a compreensão básica da formação universitária em Educação Física: A formação universitária tem dois pontos de referência superior: 1. A Educação Física na escolar; 2. Movimento no âmbito escolar, entendido como integração de movimento, jogo e esporte em toda a escola. No terceiro passo apresenta um exemplo do currículo da Universidade de Braunschweig, no qual o aspecto fundamental é sua estruturação em módulos.

Palavras-chave:
Formação Profissional; Currículo; Educação Física; Alemanha.

ABSTRACT

This paper aims to provide a current view on curriculum development in Germany. The article is structured in three steps: In the first step is given a description of the development of the discipline Physical Education as an academic discipline in German universities after the Second World War. The second step is explaining the basic understanding of university education in Physical Education: The university training of students has two points of superior reference: 1. Physical Education in school; 2. Movement in the school environment, understood as integration of movement, play and sport throughout the school. In the third step is presented as an example the curriculum in the training of students at the University of Braunschweig. The fundamental aspect of this curriculum is its structuring in modules.

Keywords:
Professional qualification; Curriculum; Physical Education; Germany.

Introdução

1- O desenvolvimeto histórico

Exercícios físicos têm uma tradição de séculos em universidades alemãs. Nos séculos 17 e 18 foram empregados nas antigas universidades mestres de equitação, de esgrima e de jogos de bola, alguns dos quais possuíam escolas de bale, instalações em sítios para trabalhos equestres de formação e torneios. Na esteira do movimento ginástico de Jahn a linha elitista foi substituída ou completada no início da década de 20 do século 19 pelas “praças de ginastica” (Turnplätze), que eram ocupadas pelos estudantes. Na década de 30 foram fundados centros de ginástica ou centros universitários de ginastica. Uma intenção foi - entre outras - controlar melhor os estudantes rebeldes. Nesta época também foram empregados os primeiros mestres universitários de ginástica. Mas uma formação acadêmica tanto para mestres na universidade quando para professores nas escolas não existiu, nem mesmo durante o regime nazista. Com a fundação da Universidade do esporte alemão em Colônia, na Alemanha, começou a institucionalização da ciência do esporte, e com ela a institucionalização da formação dos estudantes de Educação Física. O reconhecimento da ciência do esporte como disciplina acadêmica e com ela o reconhecimento da formação dos estudantes de Educação Física como formação acadêmica só ocorreu no final dos anos sessenta do século passado.

Isso mudou na década de 60. Começou a expansão das universidades e com ela o restabelecimento dos institutos de ciência do esporte. Houve duas razões principais para o fato: 1. O esporte se tornou um fenômeno de massa. 2. A instrumentalização política do esporte como resultado do conflito Leste-Oeste levou à promoção de esporte de rendimento usando praticamente todos os recursos, incluindo os de ciência do esporte. O fornecimento de instalações de pesquisa científica desportiva foi, portanto, acima de tudo, uma questão política. O resultado da criação de instituições e instalações de pesquisa em ciências do esporte nas universidades era uma profissionalização cada vez maior de ensino, de formação e de treino no desporto. Assim, foi preciso de profissionais qualificados, especialmente os graduados. Um grupo de professores de Educação Física especialistas foi formado para as escolas, assim como para o esporte extracurricular.

Desde o final dos anos 60 do século passado, a formação de professores de Educação Física tornou-se parte integrante de qualquer universidade que forma professores na Alemanha.

2- O desenvolvimento estrutural da formação dos professores de Educação Física

Após a Segunda Guerra Mundial, as forças de ocupação da Alemanha tinham imposto uma estrutura federal. Essa foi dirigida contra uma educação da juventude alemã orientada centralmente, como ocorreu no Terceiro Reich. Foram constituídos 11 estados (depois da reunificação o numero dos estados aumentou para 16). Uma consequência dessa estrutura politica foi e é, que cada estado é responsável, entre outros aspectos, pela politica educacional, isto é, cada estado tem autonomia na configuração do sistema escolar e universitário. Isso significa que em cada estado existe uma estrutura escolar e uma estrutura universitária diferente. Cada estado tem sua própria estrutura de formação universitária de professores. E, em cada estado, as universidades têm certa autonomia na configuração dos seus currículos. Isso vale também para a formação dos estudantes de Educação Física. No estado da Baixa Saxônia por exemplo, existem oito universidades que formam professores da Educação Física. Para todas as universidades há uma estrutura formal pré-organizada com campos teóricos pelo governo federal que determina a carga horaria dos cursos e um quadro para os conteúdos. Mas, e isso é importante, cada universidade, cada curso como p. ex. o da Educação Física tem a liberdade de preencher esses campos com dois ou mais seminários em cada um deles de acordo com a proposta que elaborarem.

Na Alemanha vale o seguinte:

  1. Os estudantes, que no futuro querem ser professores nas escolas, têm que cursar duas áreas de formação: Por exemplo, Educação Física e Matemática, Língua Alemã e Biologia, Educação Física e Inglês etc.

  2. Os estudos são organizados em duas etapas: uma etapa de seis semestres, que termina com a qualificação do “Bachelor” (bacharelado) e uma segunda etapa de quatro semestres, que termina com a qualificação de “Master of Education” (Mestrado). Isso significa que os estudantes terminam seus estudos na Alemanha com duas qualificações de Mestrado. Só se pode ensinar na escola quando a pessoa adquiriu estas duas qualificações.

  3. O ensino universitário é seguido por mais uma etapa da formação de dois anos sob a supervisão do governo estadual. Esta formação termina com um exame que é um pré-requisito para conseguir um emprego como professor em uma escola. Sem os dois exames (o Master da universidade e o do estado) ninguém pode ter uma varga na escola.

A seguir apresento o currículo de formação dos estudantes de Educação Física da Universidade de Braunschweig no estado de Baixa Saxônia. Nos departamentos da Educação Física das universidades do estado de Baixa Saxônia são formados somente estudantes que no futuro serão professores nas escolas públicas.

3- O currículo do curso de Educação Física da Universidade de Braunschweig

A formação universitária de estudantes tem dois pontos de referência superior:

  1. A Educação Física na escola

  2. Movimento no âmbito escolar, entendido como integração de movimento, jogo e esporte em toda a escola.

Para que os professores de Educação Física possam agir profissionalmente em ambas as áreas, eles necessitam das devidas qualificações e competências, que devem adquirir no âmbito da formação universitária.

3.1- Competências gerais

O currículo define qualificações e competências com o conceito da “competência de ação pedagógica de movimento”11. Hildebrandt-Stramann R, Taffarel C. Currículo e Educação Física. Formação de Professores e Práticas nas Escolas. Injui: Editora Uniijui; 2007.. Sob a “competência de ação pedagógica de movimento” é entendida a capacidade de poder analisar, refletir teoricamente e ensinar de maneira educativa e pedagógica de movimento a Educação Física, o esporte escolar e o mundo da vida das crianças e adolecentes alemãos. Seguindo essa determinação conceitual, durante o estudo trata-se, então, de desenvolver a competência de ação pedagógica de movimento do futuro professor de Educação Física referente a cinco dimensões de ação:

  1. a competência de ação pedagógica de movimento,

  2. a competência de ação de ensino,

  3. a competência de ação esportiva critica,

  4. a competência de ação científica e,

  5. a competência de ação política.

Figura 1
Dimensões da competência de ação pedagógica de movimento.

Essas dimensões apresentam coincidências e interdependências. Como central, é evidenciada a capacidade da ação pedagógica de movimento. A Figura 1 demonstra essa importância central.

Tais dimensões de ação não são livres de valor, isto é, sob diversas ideias diretivas, elas podem ser interpretadas diferentemente. Eu relaciono essa dimensão de ação às concepções didáticas de um “ensino aberto baseado na experiência”22. Hildebrandt-Stramann R. Concepções abertas no ensino da Educação Física. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio; 2011. e de uma “transformação didático-pedagógica do esporte”33. Kunz E. Transformação Didático-Pedagógica do Esporte. Ijui: Editora Unijui; 1994.. A ideia diretiva dos dois conceitos é a emancipação, isto é, a libertação do sujeito da timidez, que limita sua racionalidade e seu desenvolvimento de movimento. Livrar-se da timidez, ou seja, conscientizar-se dela é, um processo de desenvolvimento, que, em última análise, é, também, um processo de formação44. Habermas J. Erkenntnis and Interesse. Frankfurt am Main: Suhrkamp; 1968.):261.

Minhas demais considerações referem-se às seguintes questões:

  1. O que se entende com as dimensões de ação, acima mencionadas,

  2. com referência à ideia diretiva “emancipação”?

  3. Quais as competências ligadas a isso?

  4. Quais as consequências resultantes dela para um currículo?

3.1.1- A dimensão da competência de ação pedagógica de movimento

A ideia central concentra-se na “qualificação do aluno para a autodeterminação e maturidade”55. Deutscher S. Sportlehrerausbildung. Analyse and Reform. Frankfurt am Main: Hassmüller; 1997.):38. O movimento é, aqui, o meio de qualificação. Isto significa que os jovens devem ter, por princípio, a possibilidade de desenvolver uma variedade de modalidades de movimento em relação ao mundo. Na Educação Física e no esporte escolar trata-se de tematizar e influenciar pedagogicamente essa possibilidade da variedade de relações de movimento. O esporte escolar tem, no caso, uma dupla função: Ele deve educar por meio do movimento e educar para o “movimentar-se”66. Dieckert J, Hildebrandt-Stramann R. Perspectivas para o Desenvolvimento da ciência do Esporte no Brasil com enfoque na formação de professores de Educação Física escolar: ponto de vista alemão. In: Kunz, E, Hildebrandt-Stramann, R, editores. Intercâmbios Científicos Internacionais em Educação Física e Esportes. Iujui: Ed. Unijui; 2004, p. 15-32.. A competência de ação pedagógica de um professor de Educação Física centra-se em cumprir essa dupla missão. Educar por meio do movimento compreende a tarefa de contribuir para a formação da maturidade através dos estímulos autoeducativos. Educação para o movimentar-se compreende a tarefa de enriquecer o desenvolvimento do movimento de crianças e jovens. Segundo Funke-Wieneke77. Funke-Wieneke J. Bewegungs-und Sportpädagogik. Baltmannsweiler: Schneider; 2004.):192, o desenvolvimento do movimento das crianças e jovens pode ser fomentado em quatro áreas do movimentar-se:

  • na função instrumental (por exemplo, poder movimentar-se adequadamente/

  • habilidosamente)

  • na função social (poder relacionar-se com outros por meio do movimento)

  • na função simbólica (poder expressar-se por meio do movimento ou representar algo

  • com o movimento)

  • na função sensível (poder perceber-se e sentir-se pelo movimento).

O “movimentar-se” significa para o adolescente uma forma de conhecer o mundo, que por nada é substituível. Através do “movimentar-se” ele deduz o significado do movimento do mundo. “A isso está ligada a ideia de emancipação. A formação de movimento liberta o homem da timidez devido ao seu corpo emperrado e desajeitado e do aperto de um mundo insuficiente e oculto à vontade. O incremento da liberdade de movimento abre esse mundo”77. Funke-Wieneke J. Bewegungs-und Sportpädagogik. Baltmannsweiler: Schneider; 2004.):243.

3.1.2- A dimensão da competência de ação de ensino

Estreitamente ligada à competência de ação pedagógica está a competência de ação de ensino. Com a competência de ação de ensino o professor tem condições de combinar a estruturação de processos de ensino-aprendizagem entre orientação-aprendiz (orientado nas necessidades da criança = orientação subjetiva) e a orientação-conteúdo (orientado no valor do conteúdo = orientação objetiva), isto é, intermediar ações entre a criança e o objeto. Emancipação significa, aqui, livrar os alunos parcialmente da dependência do professor por meio do envolvimento em nos processos de estruturação e desenvolvimento do ensino22. Hildebrandt-Stramann R. Concepções abertas no ensino da Educação Física. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio; 2011..

3.1.3- A dimensão da competência de ação esportiva crítica

Um aspecto essencial da competência pedagógica de movimento é a competência de ação esportiva. Com isso, entende-se a capacidade de poder examinar as próprias experiências feitas e as experiências a fazer na Educação Física sob o ponto de vista de sua validade e condições de realização na Educação Física. Blotzheim88. Blotzheim D. "Überlegungen zur Vermittlung und zum Erwerb biografischer Kompetenz in der Sportlehrerausbildung." In: Bildungsforschung, 2 (2), 2005. [acesso em 23 mar 2016]. Disponível em: Disponível em: http://www.bildungsforschung.org/Archiv/2005-02/sportlehrer/ .
http://www.bildungsforschung.org/Archiv/...
denomina essa aptidão, de forma mais precisa, como competência biográfica99. Maraun HK. Erfahrung als didaktische Kategorie. Sonderheft sportpädagogik. Annäherungen, Versuche, Betrachtungen. Bewegung zwischen Erfahrung und Erkenntnis; 1983, p. 26-31.. Com isso se entende a aptidão de poder distanciar-se, por exemplo, da própria biografia esportiva, para romper com a própria compreensão, muitas vezes estreita, do esporte e assim poder estudar, pessoalmente, aberto às novas experiências1010. Klinge A. Zur Notwendigkeit biografischer Selbstreflexion in der Sportlehrer(aus)bildung. Sportwissenschaft 2000;30(4):443-453.. Essa aptidão de controle e autorreflexão é, muitas vezes, o pressuposto para o ensino aberto à experiência.

3.1.4- A dimensão da competência da ação científica

O desenvolvimento da aptidão de controle e autorreflexão, porém, é apoiado pela constituição de uma competência de ação científica. O professor de Educação Física deve adquirir competência científica para poder examinar criticamente os resultados científicos relativos à aplicação na Educação Física. Com isso, se entende, entre outras, o seguinte: O professor deve, de um lado, adquirir a aptidão de questionar o programa dos tipos de esporte, referente à sua base teórica educativa e de movimento com sua imagem humana. De outro lado ele deve ter condições de desenvolver estratégias didáticas contrárias na teoria e na prática, cientificamente fundadas (em teoria educativa, de movimento e de ensino) e prestar auxílio prático de orientação baseado na Pedagogia do Movimento para a transformação pedagógica do esporte no âmbito da Educação Física. Para isso, o professor necessita de conhecimentos de Pedagogia do Movimento sobre o ensino e a aprendizagem do movimento com base nas relações de movimento entre o homem e o mundo e sobre conceitos de mediação genética e de baseado em problemas1111. Hildebrandt-Stramann R. Configuração Pedagógica do Movimento Esportivo no Ensino de Aulas de Educação Física. In R. Hildebrandt-Stramann, Textos pedagógicos sobre ensino da Educação Física. 4.ed. Brasilien: Ijui/RS: Editora Uniijui; 2013..

3.1.5- A dimensão da competência da ação política

Sob a competência de ação política entende-se a capacidade de poder assumir responsabilidade política em sua área profissional e, com referência à própria competência pedagógica e científica, impor-se contra exigências e expectativas irresponsáveis desenvolvendo alternativas próprias1212. Hildebrandt-Stramann R. O esporte como Fenômeno Social e sua Análise Crítica. In R. Hildebrandt-Stramann, Textos pedagógicos sobre ensino da Educação Física . 4. ed. Brasilien: Ijui/RS : Editora Uniijui; 2013.. Esta competência tem um significado especial. Trata-se de, basicamente, como responsável por crianças, lutar por elas e seus direitos por uma vida humana digna. Isso significa, por exemplo, lutar por espaço de movimento tanto na escola quanto na vida diária.

3.2- Módulos no currículo na formação dos estudantes no curso da Educação Física

O cerne do currículo no Departamento da Educação Física da Universidade Técnica de Braunschweig é a organização do currículo em módulos, tanto no Bacharelado quanto no Mestrado. Cada módulo contêm diferentes seminários com carga horária definida. Cada módulo tem um predeterminado valor de créditos que se forma com a soma dos créditos para cada seminário. Um módulo pode ser aprovado somente quando todos os seminários, que pertencem ao módulo, são realizados de maneira sequencial.

A base teórica para a configuração de conteúdo dos módulos é a teoria dialógica de movimento que entende o movimento como um diálogo entre o homem e o mundo1111. Hildebrandt-Stramann R. Configuração Pedagógica do Movimento Esportivo no Ensino de Aulas de Educação Física. In R. Hildebrandt-Stramann, Textos pedagógicos sobre ensino da Educação Física. 4.ed. Brasilien: Ijui/RS: Editora Uniijui; 2013.),(1313. Trebels AH. Plaidoyer para um diálogo entre teorias do movimento humano e teorias do movimento no esporte. RBCE 1992;13(3):338-344.),(1414. Trebels AH. A Concepção Dialógica do Movimento Humano ; uma Teoria do “Se-movimentar”. In Kunz E, Trebels AH, editores. Educação Física Crítico Emancipatória. Iujui: Ed. Unijui ; 2010, p.23-48.),(1515. Tamboer J. "Sich-Bewegen: ein Dialog zwischen Mensch und Welt." sportpädagogik, Hamburg 1979;3(2):14-19.. A seguir apresento os módulos do Bacharelado e do Mestrado.

3.2.1- Os módulos do Curso do Bacharelado

O Curso do Bacharelado contem quatro módulos “teóricos” e três módulos “práticos”. Contudo, em ambos há interface entre teoria e prática, não há exclusividade de um ou outro. Com isso tentamos ligar teoria e prática e vice versa, isto é, tentamos ligar o pensar e o fazer”1616. Hildebrandt-Stramann R. Fazer e Pensar no Processo de Ensino. Aprendizagem. Journal of Sport Pedagogy & Research 2016;2(1):4-10..

3.2.1.1- Módulos “teóricos” na pedagogia de movimento

Os módulos teóricos buscam ensinar as competências científicas de ação e se constituem em quatro módulos:

Módulo 1: Movimento e educação I

Módulo 2: Movimento e desenvolvimento da criança e do jovem/ Movimento e aprendizagem

Módulo 3: Movimento e saúde

Módulo 4: Movimento e sociedade.

Figura 2
Módulos “teóricos” no Curso de Mestrado

A seguir descrevo brevemente os conteúdos dos módulos 1 e 2 do Curso de Mestrado e os campos de experiência e de aprendizagem “(correr, saltar, lançar).

4- Os conteúdos do módulo 1 do Curso de Mestrado: Movimento, aula, escola

Os estudantes devem apreender neste módulo, que movimento não pode ser restringido somente para o ensino da educação física, mas também que o movimento é parte imanente da configuração da escola e do ensino. Na teoria estas concepções são chamadas como concepções das escolas moveis1717. Hildebrandt-Stramann R. Educação Física aberta à experiência. Uma concepção didática em discussão. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio ; 2009.. Na escola móvel o movimento tem papel significativo na aprendizagem interdisciplinar como por exemplo nas disciplinas de matemática, de língua, de filosofia ou de física são combinadas com movimento. Na teoria este tipo de aprendizagem é denominado também como “aprendizagem por meio do movimento”. O Movimento também ganha importância em relação à configuração dos espaços escolares como espaços de movimento. Isso atinge a sala de aula1717. Hildebrandt-Stramann R. Educação Física aberta à experiência. Uma concepção didática em discussão. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio ; 2009., os corredores até a área do pátio e do ginásio. Neste sentido a função central deste módulo é aperfeiçoar o entendimento e a compreensão de movimento dos estudantes1818. Hildebrandt-Stramann R, Laging R, Teubner J. Bewegung und Sport in der Ganztagsschule. Baltamannsweiler: Schneider; 2014.);1919. Hildebrandt-Stramann R, Faustino A. Um retrato de movimento do agrupamento de escolas Joâo Roiz. Castelo Branco: Edicões IPCB; 2013..

Quais as capacidades que os estudantes de educação física necessitam para participar na configuração de uma escola móvel?

  1. Capacidade de adquirir conhecimentos por meio da literatura científica/ pedagógica. Para legitimar uma reforma escolar por meio do movimento, o professor de educação física necessita de conhecimentos fundamentais sobre teorias antropológicas, fenomenológicas e pedagógicas de movimento e conhecimentos sobre a relação entre movimento e aprendizagem. Estes conhecimentos ele adquire com estudos da literatura científica na área da educação física, e também nas áreas acima denominadas.

  2. Capacidade de inovação ligada a um conhecimento específico. Exemplo: Para uma escola móvel existe uma “sala de aula móvel”. Para construir, por exemplo, móveis removíveis ou aparelhos de movimento, os estudantes devem ter a capacidade de construir uma conexão entre pensar e fazer1616. Hildebrandt-Stramann R. Fazer e Pensar no Processo de Ensino. Aprendizagem. Journal of Sport Pedagogy & Research 2016;2(1):4-10.. Pensar significa: Partindo de um conhecimento profundo da anatomia e ergonomia de sentar e sobre a configuração da organização de sentar e suas consequências didáticas, os estudantes têm que pensar no modo da construção de móveis que correspondam às exigências teóricas e didáticas. Além disso, necessitam da capacidade de construir os móveis (fazer). Na introdução dos móveis na aula, compete aos estudantes/os professores a capacidade didática de relacionar esta introdução com temas do corpo e da postura (a capacidade da transformação didática) (Fotos 1 e 2). No plano da formação, isso é considerado nas disciplinas chamadas “oficinas de movimento”. Ligada a elas está a oficina de pesquisa, na qual os estudantes aprendem métodos de avaliação.

Figuras 3 e 4.
Móveis - “meia luas”

  1. Capacidade de cooperação: Tanto a aprendizagem interdisciplinar, quanto o desenvolvimento de um programa escolar são caracterizados pela necessidade de cooperação entre os professores das diferentes áreas. Isso diz respeito à cooperação dos professores de educação física entre si, como também à cooperação desses com os professores de outras disciplinas e de outras áreas de aprendizagem. Os professores de educação física devem procurar superar seu isolamento, causado muitas vezes por eles mesmos, e procurar uma participação ativa num consenso abrangente de educação.

  2. Capacidade de avaliação: Processos de inovação têm que ser avaliados. São necessárias informações sobre o efeito das inovações, se foi alcançado o que se imaginou. Para isto é necessário formular claramente as expectativas, ou seja, o problema, constatar o estado atual e escolher métodos correspondentes por meio dos quais se obtém conhecimentos sobre o processo. É de considerar, que tais processos de avaliação devem ser realizados como processos autônomos de avaliação, baseados no conceito teórico da pesquisa-ação2020. Altrichter H, Peter P. Lehrer erforschen ihren Unterricht. Bad Heilbrunn: Klinkhard; 1994. (Neste aspecto existe também uma ligação com o módulo número. 5).

5- Os conteúdos e qualificações do módulo 2 do Curso de Mestrado: Oficina de movimento

A oficina de movimento é entendida como um laboratório pedagógico. Destaco três aspectos de trabalho pedagógico nas oficinas de movimento:

  1. Alunos, estudantes e professores de Educação Física experimentam movimentos em situações autoconstruídas.

  2. Alunos, estudantes e professores de Educação Física inventam aparelhos e materiais de movimento e constroem os mesmos.

  3. Para os alunos, estudantes e professores de Educação Física a oficina de movimento pode ter a função de ser um lugar de aprendizagem didática ou uma instituição de aperfeiçoamento profissional na área da didática. A oficina de movimento recebe estas funções quando os professores e os estudantes têm a possibilidade de experimentar com experiências e com diferentes tipos de aprendizagem. Um exemplo para os professores podem ser as aulas livres durante o dia escolar, nas quais eles podem observar alunos, podem planejar junto com colegas projetos coletivos, etc. Para os estudantes a práxis com crianças pode ter o significado de um laboratório pedagógico, na qual eles podem treinar relações pedagógicas. Numa oficina de movimento assim, os estudantes devem ter a possibilidade de apreender de maneira diferente, isto é, ativa, pesquisando, descobrindo, de forma criativa e aberta (livre). Os estudantes, futuros professores, devem apreender esta atitude com a intenção de ensinar na escola, nas aulas de Educação Física dessa maneira1616. Hildebrandt-Stramann R. Fazer e Pensar no Processo de Ensino. Aprendizagem. Journal of Sport Pedagogy & Research 2016;2(1):4-10..

Quais capacidades os estudantes de Educação Física podem conseguir num seminário “Oficina de Movimento”? Com base em minhas experiências os estudantes ganham quatro competências centrais, quando eles participam deste módulo:

  1. A capacidade de experimentar: Alunos, estudantes e professores de Educação Física experimentam o movimento em situações autoconstruídas de movimento.

  2. A capacidade de construir: Alunos, estudantes e professores de Educação Física inventam aparelhos e materiais de movimento e os constroem. Com isso eles refletem de maneira crítica a atitude de consumo, o que é particularmente prevalecente em crianças e adolescentes no desporto.

  3. A capacidade de ensinar e cooperar: Para os alunos, estudantes e professores da Educação Física a oficina de movimento pode ter a função de um lugar de aprendizagem didática ou uma instituição de aperfeiçoamento profissional na área da didática. A oficina de movimento assume estas funções, quando os professores e estudantes têm a possibilidade de experimentar com a encenação do ensino e com diferentes tipos de aprendizagem. Capacidade de refletir teoricamente: Alunos, estudantes e professores de Educação Física refletem sobre uma oficina de movimento com base nas diferentes teorias de movimento (p. ex. das teorias da fenomenologia e do Gestalt - conexão entre movimento e percepção), teorias de desenvolvimento infantil e adolescente, teorias didáticas como a teoria da aprendizagem aberta a experiência e teorias sociais ecológicas.

6- Campus de experiência e de aprendizagem

Além das competências especiais de cada campo de experiência e aprendizagem, os estudantes ganham também competências gerais neste módulo de campos de experiência e aprendizagem.

Os campos de experiência e aprendizagem tratam de um confronto prático e teórico com temas básicos do se-movimentar e, com isso de uma estreita ligação de teoria-prática. A isto estão ligados em primeira linha quatro objetivos:

  1. Os estudantes devem ser capacitados para refletir teoricamente seu próprio movimentar e o de outras pessoas.

  2. Os estudantes devem adquirir competências básicas de movimento e da demonstração no confronto com os temas básicos do se-movimentar. Esta capacidade só é alcançada por meio do movimentar ativo nas correspondentes promoções de ensino.

  3. Os estudantes devem adquirir competências básicas de ensino e poder refletir teoricamente suas ações de ensino.

  4. Além disso, trata-se de superar as restrições habituais da teoria em metodologia e didática das disciplinas esportivas na prática do movimento da formação de professores de Educação Física e recorrer aos campos teóricos.

Estes objetivos são ligados com o objetivo geral de “Competência de ação esportiva crítica”. Ao lado destas competências gerais os estudantes ganham competências especiais em cada campo de experiência e de aprendizagem. A seguir isso é esclarecido com o exemplo do campo de “correr, saltar, lançar”.

Saltar, correr e lançar são possibilidades elementares de movimento de homem e são a base de muitas disciplinas esportivas e da cultura diária de movimento e de jogo. Neste sentido as diferentes formas de correr, saltar e lançar não devem ser ensinadas somente como disciplinas esportivas de atletismo, mas sim, em suas múltiplas possibilidades para um se-movimentar orientado na saúde, em comum e também relacionada para o rendimento. Correr, saltar e lançar devem serem ensinados na formação universitária com as seguintes perspectivas:

  1. Perspectivas históricas e diferentes perspectivas culturais.

  2. As técnicas com suas possibilidades de soluções funcionais, por exemplo para o saltar mais longe sob a consideração dos diferentes pressupostos coordenativos e condições físicas dos aprendizes.

  • Correr, saltar e lançar sob a perspectiva histórica: Os estudantes devem reconhecer e entender que as formas de movimento de correr, saltar e lançar, assim como a disciplina esportiva de atletismo no seu desenvolvimento histórico tiveram diferentes sentidos e foram realizadas em diferentes tipos de movimento. A reflexão sobre estes processos históricos devem elucidar a compreensão para os desenvolvimentos culturais e, assim para a complexidade das possíveis definições de sentido - também para atuais habilidades de movimento/movimentos técnicas2121. Coletivo de Autores. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo: Cortez; 1992..Correr, saltar e lançar sob a perspectiva de um movimento técnico: Os estudantes devem reconhecer e entender que os diferentes movimentos técnicos de correr, saltar e lançar são soluções funcionais para determinados objetivos. A funcionalidade de um movimento técnico depende, de um lado, do objetivo (que não tem que ser automaticamente o objetivo de ser mais rápido, mais alto, mais longe) e do outro lado, dos pressupostos fisiológicos, condicionais e coordenativos.

  • Correr, saltar e lançar sob a perspectiva orientada ao espaço de movimento: Os estudantes devem reconhecer e entender que os diferentes movimentos técnicos de correr, saltar e lançar não são fixadas para espaços/áreas esportivas, mas sim podem ser realizados no mundo de movimento do dia a dia.

  1. Correr - Os estudantes devem:

  • conhecer os diferentes sentidos de correr, do sentido orientado à saúde até o sentido orientado ao rendimento. Eles devem reconhecer e entender, como os diferentes sentidos são ligados por diferentes concepções de ensino e de treinamento.

  • saber praticar diferentes tipos de corridas (corrida de obstáculo, de diferentes distâncias etc.).

  • conhecer e entender que com os diferentes tipos de corrida são ligados diferentes adaptações fisiológicas e, com isso, diferentes possibilidades de treinamento.

  • devem ter a capacidade demonstrar os diferentes tipos de corrida.

  1. Saltar- Os estudantes devem:

  • conhecer e praticar diferentes possibilidades de saltar (alto, longe, com diferentes varas etc.).

  • conhecer e praticar diferentes concepções de ensino e de treinamento.

  • devem ter a capacidade de mostrar os diferentes tipos de saltar.

  1. Lançar - Os estudantes devem:

  • saber manejar os diferentes equipamentos (aparelhos) de lançar.

  • ter a capacidade de ensinar o manejo com os diferentes equipamentos (aparelhos) de lançar.

  • entender e demonstrar os diferentes princípios de aceleração nos diferentes equipamentos (aparelhos) de lançar (aceleração giratória e retilínea).

  • devem ter a capacidade de mostrar os diferentes tipos de lançar.

  • devem ter a capacidade de construir diferentes aparelhos/equipamentos de lançar.

Conclusão

Um currículo é sempre reflexo da sociedade em que vivemos. Da mesma forma que as condições sociais da vida se mudam continuamente, também os currículos precisam ser mudados e adaptados. A este respeito um currículo não é um currículo fixo, estático, mas sim uma proposta de ensino flexível, que deve ser redesenhada e sempre com a participação dos estudantes.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2017
  • Revisado
    20 Nov 2017
  • Aceito
    10 Dez 2017
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