Transição de pais para cuidadores de um filho com Diabetes Mellitus tipo 1: scoping review

RESUMO

Objetivos:

mapear e resumir a evidência científica existente sobre a experiência de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador de um filho com DM1, identificando lacunas existentes no conhecimento dessa experiência.

Métodos:

efetuada revisão scoping baseada na metodologia do JBI, em duas bases de dados, seguindo a checklist Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews.

Resultados:

foram incluídos 31 artigos. A partir dos estudos, foram encontrados elementos constitutivos da experiência de transição dos pais para o papel de cuidador de um filho com DM1, que se centraram na natureza da experiência, nos sentimentos e emoções experimentadas, nas condições dificultadoras, nas condições facilitadoras, nas estratégias utilizadas pelos pais e nos resultados ou efeitos obtidos.

Considerações finais:

identificaram-se elementos caracterizadores do processo de transição, mas não uma explicação teórica do mesmo. Investigação adicional deverá ser realizada, a fim de permitir compreender aprofundadamente este processo.

Descritores:
Diabetes Mellitus Tipo 1; Pais; Parentalidade; Cuidado da Criança; Revisão do Estado da Arte

ABSTRACT

Objectives:

to map and summarize the existing scientific evidence on parents’ transition experience to exercise the caregiver role of a child with 1DM, identifying gaps in knowledge of this experience.

Methods:

a scoping review was carried out based on JBI methodology, in two databases, following the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews checklist.

Results:

we included 31 articles. From the studies, constitutive elements of parents’ transition experience to caregiver role of a child with 1DM were found, which focused on the nature of the experience, the feelings and emotions experienced, the hindering conditions, the facilitating conditions, the strategies used by parents and the results or effects obtained.

Final considerations:

the transition process’ characterizing elements were identified, but not a theoretical explanation of it. Additional research should be carried out in order to allow a deeper understanding of this process.

Descriptors:
Diabetes Mellitus; Type 1; Parents; Parenting; Child Care; Review Literature as Topic

RESUMEN

Objetivos:

mapear y resumir la evidencia científica existente sobre la experiencia de transición de los padres para ejercer el rol de cuidador de un niño con DM1, identificando los vacíos existentes en el conocimiento de esta experiencia.

Métodos:

se realizó una revisión de alcance basada en la metodología JBI, en dos bases de datos, siguiendo la lista de verificación Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews.

Resultados:

se incluyeron 31 artículos. A partir de los estudios se encontraron elementos constitutivos de la experiencia de transición de los padres al rol de cuidador de un niño con DM1, los cuales se centraron en la naturaleza de la experiencia, los sentimientos y emociones experimentados, las condiciones obstaculizadoras, las condiciones facilitadoras, las estrategias utilizados por los padres y los resultados o efectos obtenidos

Consideraciones finales:

se identificaron elementos caracterizadores del proceso de transición, pero no una explicación teórica del mismo. Se deben realizar investigaciones adicionales para permitir una comprensión más profunda de este proceso.

Descriptores:
Diabetes Mellitus tipo 1; Padres; Responsabilidad Parental; Cuidado del Niño; Literatura de Revisión como Asunto

INTRODUÇÃO

O Diabetes Mellitus tipo 1 (DM1) é habitualmente diagnosticado durante a infância ou adolescência, assumindo-se como a doença metabólica crônica mais comum em idade pediátrica(¹-²). O número de crianças e adolescentes com diabetes aumenta todos os anos, sendo que, nas populações de origem europeia, quase todas as crianças e adolescentes com diabetes apresentam o tipo 1. Estima-se que, anualmente, sejam diagnosticadas com Diabetes Mellitus mais de 98.200 crianças e adolescentes com menos de 15 anos, sendo que esse número aumenta para 128.900 quando a faixa etária se estende até os 20 anos(³).

No DM1, devido à incapacidade das crianças e alguns adolescentes assumirem a responsabilidade pela autogestão da sua condição crônica, essa função recai sobre os pais e, em particular, sobre as mães(⁴-⁷). É socialmente esperado que o cuidar de um filho seja assumido como um exercício inerente ao papel de ser pai ou mãe de qualquer criança, isto é, algo intrínseco ao papel parental. No entanto, o exercício desse papel adquire uma responsabilidade adicional, quando a criança apresenta uma determinada condição de saúde que impõe limitações funcionais ou quando se perspetiva uma dependência a longo prazo(⁸). Assim, tornar-se um cuidador de uma criança com uma condição crônica de longo prazo introduz um papel adicional, exigindo uma reorganização de prioridades e um redirecionamento de energia por parte de quem cuida(⁸). A vivência dessa situação complexa assume consequências importantes e potencialmente negativas, se os serviços de saúde e os sistemas de suporte social não conseguirem ajudar esses cuidadores. Ser cuidador de uma criança com uma doença crônica é conotado a um processo dinâmico, em que um indivíduo passa por uma sequência de etapas, necessitando de transições consideráveis e reestruturação de responsabilidade ao longo do tempo(⁸).

No DM1, deparamo-nos com uma situação de especial complexidade, em que aos pais é exigido lidar, adicionalmente, com a transição para o exercício de papel de cuidador de um filho com uma doença crônica que exige uma resposta que não pode ser adiada e que se espera que seja adaptativa, promotora de estabilidade e bem-estar para todos os elementos da família.

Chick & Meleis definiram o conceito de transição como a passagem de uma fase da vida, condição ou estado estável para outro, sendo um processo desencadeado por uma mudança(⁹-¹⁰). A transição, enquanto processo e resultado, emerge da complexa rede de interações entre pessoa-ambiente, podendo envolver mais do que uma pessoa, e encontra-se integrada em um determinado contexto e situação, denotando uma mudança no estado de saúde ou nas relações de papéis, expectativas ou habilidades(⁹-¹⁰). Esse conceito é considerado, por Meleis, como congruente ou relacionado a outros conceitos essenciais a essa problemática, como os de adaptação, ajustamento e autocuidado(¹¹).

O diagnóstico de DM1 a um filho é uma experiência impactante capaz de alterar as dinâmicas parentais e familiares, levando à instalação de uma espécie de “caos” inicial, que emerge da vulnerabilidade sentida pelos pais relativamente à situação de saúde dos filhos, bem como pela complexidade de cuidados que têm de passar a assumir e pelas mudanças que essa situação pode desencadear nos seus próprios processos e expetativas de vida. Aos pais, apresenta-se um conjunto singular de desafios que apelam, de uma forma constante, à sua capacidade de adaptação, organização e cuidado. Conhecer como se carateriza a transição desses pais para o papel de cuidador é relevante para o cuidado de enfermagem, de modo que esse possa ser um fator facilitador de uma transição saudável.

OBJETIVOS

Mapear e resumir a evidência científica existente sobre a experiência de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador de um filho com DM1, identificando lacunas existentes no conhecimento dessa experiência.

MÉTODOS

Tipo de estudo

A revisão foi orientada pela metodologia proposta pelo JBI para a realização de scoping reviews(¹²). A opção por esse tipo de revisão se fundamentou na sua reconhecida utilidade, quando se pretende mapear e resumir evidência científica, permitindo analisar como a investigação acerca de um determinado fenômeno tem sido conduzida, bem como identificar lacunas na evidência existente, orientando para a necessidade de investigação adicional(¹³-¹⁴).

Procedimento metodológico

Foi elaborado um protocolo de revisão sistemática prévio (não publicado), adotando-se a checklist Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)(¹⁵). Para o desenvolvimento da revisão, foram seguidas as recomendações do Manual do JBI (versão 2020)(¹²), que contempla as seguintes etapas: definir título, questão e objetivos de pesquisa; definir critérios de inclusão; definir estratégia para pesquisa e de seleção de fontes de evidência, para extração de dados, análise e resumo de evidência e para apresentação de resultados.

Utilizando a estratégia Participants, Concept e Context (PCC)(¹²), foram incluídos na revisão estudos em que os participantes (P) fossem pais (mães e/ou pais) de crianças e adolescentes com diagnóstico de DM1, ou outro cuidador familiar principal da criança. Foram excluídos os estudos em que a criança com DM1 tivesse o diagnóstico de outra doença crônica, a fim de não se perder a especificidade do tópico desta revisão. Quanto ao conceito (C), foram incluídos estudos que abordassem a experiência de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador de um filho com DM1. Quanto ao contexto (C), e atendendo ao objetivo da revisão enunciado, não se identificou nenhum específico. Com base nessa estratégia, esta revisão procurou responder à seguinte questão: qual a experiência de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador de um filho com DM1?

Foram incluídos na revisão todos os estudos primários (qualitativos, quantitativos e mistos) e secundários (revisões de literatura de diferentes tipologias, incluindo meta-análises ou meta-sínteses), que se relacionassem com a questão da revisão e cumprissem os citérios de inclusão definidos. Foram também procurados estudos não publicados nos repositórios digitais de bibliotecas de instituições de ensino superior portuguesas, no banco de teses da CAPES (Brasil), no Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) e na base de dados OpenGrey.

Fonte dos dados e estratégia de pesquisa

A estratégia de pesquisa definida pretendeu identificar os estudos publicados e não publicados até fevereiro de 2020, sendo que o período de seleção dos artigos ocorreu durante os meses de fevereiro a julho de 2020. As pesquisas foram conduzidas eletrônica e manualmente, sendo que essa última foi realizada através da pesquisa de artigos relevantes nas listagens de referências bibliográficas dos artigos selecionados. Como recomendado pelo JBI(¹²), adotou-se a estratégia de pesquisa baseada em três etapas. A primeira etapa compreendeu a realização de uma pesquisa inicial efetuada na CINAHL Complete (via EBSCO) e na MEDLINE Complete (via PubMed), usando palavras-chave e expressões de pesquisa preliminares obtidas a partir da linguagem natural: “Diabetes”, “Type 1 Diabetes”, “Child*”, “Infant”, “Pediatric”, “Adolescen*”, “Parents”, “Mother*”, “Father*”, Family caregiver*”, “Transition*”, “Parent* Experience”, “Adaptation”, “Coping” e “Parent* adjustment”. Seguidamente, procedeu-se à análise das palavras utilizadas no título e no resumo dos artigos obtidos, de modo a identificar os termos adicionais relevantes, bem como os termos de indexação utilizados pelas bases de dados selecionadas (Subject Headings, no caso da CINAHL, e termos MeSH, no caso da MEDLINE), para descrição dos artigos. Foram articulados os elementos PCC, anteriormente apresentados, para definir os termos de pesquisa e as suas combinações, tendo sido realizados vários testes, no sentido de se obter um refinamento da estratégia de pesquisa.

A segunda etapa compreendeu uma nova pesquisa efetuada, separadamente, nas bases de dados CINAHL Complete (via EBSCO) e na MEDLINE Complete (via PubMed), a partir dos termos de pesquisa em linguagem natural e dos termos de indexação identificados na etapa anterior, tendo-se empregado os operadores boleanos «OR» e «AND» (Quadro 1).

Quadro 1
Termos utilizados na estratégia de pesquisa

	Linguagem natural	CINAHL complete (Subject Headings)	MEDLINE complete (MeSH)
P (população)	(Type 1 Diabetes) AND (Child* OR Infant OR Pediatric OR Adolescen*) AND (Parents OR Mother* OR Father* OR Family caregiver*)	(Diabetes Mellitus, Type 1) AND (Infant OR Child OR Adolescen* OR Pediatric) AND (Parents OR Mothers OR Fathers OR Caregivers)	(Diabetes Mellitus, Type 1) AND (Infant OR Child OR Child, preschool OR Adolescent) AND (Parents OR Mothers OR Fathers OR Caregivers)
C (conceito)	(Transition* OR Parent* Experience OR Coping OR Adaptation OR Parent* adjustment)	(Coping OR Health transition OR Adaptation psychological OR Life change events OR Parenting	(Adaptation psychological OR Emotional Adjustment OR Parenting OR Life change events)
C (contexto)	Não definido	Não definido	Não definido

Um exemplo da estratégia de pesquisa utilizada na base de dados CINAHL Complete (via EBSCO) é apresentada no Quadro 2 (pesquisa efetuada em 18/jul/2020).

Quadro 2
Estratégia de pesquisa utilizada na base de dados CINAHL Complete (via EBSCO)

Etapa	Estratégia de pesquisa	Resultados
S1	Diabetes Mellitus, Type 1	26.796
S2	Infant OR Child OR Adolescen* OR Pediatric	1.281.304
S3	Parents OR Mothers OR Fathers OR Caregivers	305.018
S4	S1 AND S2 AND S3	2.189
S5	Coping OR Health transition OR Adaptation psychological OR Life change events OR Parenting OR Parent*adjustment OR Parent* Experience OR Transition)	148.252
S6	S4 AND S5	413
S7	S4 AND S5. Limitadores - data de publicação: 20200231.	413

Na terceira etapa, as listas das referências bibliográficas dos artigos selecionados foram analisadas, sendo identificados outros estudos relevantes. O material extraído foi importado e gerido através do programa informático de gestão de referências bibliográficas Mendeley^©, sendo que as fontes duplicadas foram eliminadas. O título e o resumo de cada artigo foram lidos na totalidade, sendo selecionados os que cumpriam os critérios de inclusão definidos. Sempre que surgiam dúvidas sobre a relevância do estudo a partir do resumo, o artigo completo foi recuperado. O processo de seleção dos estudos foi realizado por dois revisores. Os casos em que se verificaram dúvidas ou divergências foram resolvidos com intervenção de um terceiro revisor.

Extração de dados

Os dados foram extraídos com recurso ao instrumento de extração elaborado e consensualizado pelos investigadores, que incluía como itens a identificação dos autores, ano e país de origem, informação sobre os participantes, metodologia utilizada e principais resultados encontrados. O processo de extração de dados foi realizado por dois revisores, e as divergências que surgiram foram resolvidas através de discussão entre esses, não tendo sido necessário recorrer ao terceiro revisor.

Considerando os objetivos e a questão de pesquisa, optou-se por realizar o resumo dos principais resultados dos estudos incluídos mediante análise de conteúdo qualitativa descritiva(¹²,¹⁶). Os resultados desta revisão são apresentados nos Quadros 3 e 4.

Quadro 3
Identificação, caracterização e apresentação dos principais resultados dos estudos incluídos

Autores	Ano/país	Metodologia	Amostra (N)	Principais resultados
Iversen, Graue, Haugstvedt & Råheim(1)	2018 Noruega	Fenomenologia	15 (8 mães e 7 pais)	Os pais demoraram muito tempo até que se convencessem que o diagnóstico da doença tinha mudado a sua vida para sempre. Familiarizar-se com a nova situação foi um desafio, sendo que tiveram de aprender rapidamente sobre a doença e o modo de geri-la. O estabelecimento de rotinas rígidas para o controle da glicêmia foi crucial. Pais e mães viveram um período de luto e tristeza. Após 6 meses a 1 ano do diagnóstico, os pais relataram estar mais familiarizados com a situação, contudo continuavam a manter uma grande preocupação com a qualidade de vida dos filhos e com a possibilidade de surgirem complicações futuras. Os pais viviam em estado de constante alerta e de prontidão física e mental, sentindo-se constantemente exaustos. Com o regresso à escola, os pais assumiram a responsabilidade de educar/formar os funcionários escolares sobre como cuidar a criança com DM1.
Holmström, Häggström & Söderberg(17)	2018 Suécia	Qualitativa	13 (10 mães e 3 pais)	O aparecimento do DM1 dos filhos foi experienciado como uma mudança de vida para os pais e família. Após o diagnóstico, os profissionais de saúde contribuíram para que os pais se sentissem seguros, cuidados e incluídos na responsabilidade de gerirem o regime terapêutico. Os pais aprenderam mais sobre a doença (através da observação e do questionamento dos profissionais), de modo a poderem controlar a mudança na sua vida diária. Foi difícil aprender a injetar insulina ou a monitorizar os níveis de glicose capilar. Com o maior conhecimento da doença, os pais perceberam que o DM1 era uma condição que implicava fazer medicação para o resto da vida e estar em constante controle. Após a alta, os pais tiveram que assumir sozinhos a responsabilidade da gestão da doença, sendo que o conhecimento básico que foi transmitido no hospital não foi suficiente para gerir a doença em casa. Os pais perceberam que uma boa comunicação com a escola era fundamental para garantir a segurança da criança durante o dia, e sentiam-se responsáveis pela gestão da doença mesmo quando deixavam os filhos na escola. A gestão do DM1 afetou as atividades profissionais dos pais e muitos tiveram de mudar de emprego, de modo a ganharem maior flexibilidade no apoio às crianças durante o dia escolar.
Khandan, Abazari, Tirgari & Cheraghi(18)	2018 Irã	Fenomenologia	11 mães	Para além do desempenho do papel maternal, as mães tiveram de assumir adicionalmente o papel de cuidadoras. Para desempenhar esse papel, tiveram de enfrentar vários desafios, adquirir conhecimentos e competências, necessitando de apoio familiar. A monitorização da glicemia capilar e a administração de insulina eram procedimentos dolorosos, e as crianças tinham dificuldade em aceitá-los, e as mães, em realizá-los. As mães recorreram a diferentes fontes de informação para aprenderam mais sobre o DM1, como associação de diabetes, bibliotecas, à internet e a outros pais de crianças com DM1. As mães experienciaram sentimentos de culpa, ansiedade e obsessão, sendo muito difícil gerir os deveres diários associados à gestão da doença e à satisfação das necessidades de cuidado das crianças. Com o diagnóstico do DM1, as mães enfrentaram uma crise emocional aguda. As mães viviam uma vida cheia de preocupações, sabendo que a doença era uma ameaça à saúde dos filhos e que os podia afetar negativamente no futuro.
Herbert, Wall, Monaghan & Streisand(19)	2017 Estados Unidos	Estudo controlado randomizado	134 (120 mães e 14 pais)	22% dos pais referiram ter cessado e/ou reduzido o tempo laboral e 15%, embora continuassem a trabalhar, solicitaram flexibilidade, de modo a assegurar a responsabilidade pela gestão terapêutica do DM1 dos filhos. 7% dos pais assumiram o impacto negativo da doença nas suas carreiras, incluindo no seu desempenho profissional e na oportunidade de progressão na carreira.
Pierce, Aroian, Caldwell, Ross, Lee, Schifano, et al.(20)	2017 Estados Unidos	Qualitativa	162 (137 mães e 25 pais)	Para os pais, foi complicado gerir o regime terapêutico do DM1 de crianças com cinco anos ou menos, por elas não compreenderem a necessidade de cumprir tal regime, nem identificarem e nem reportarem uma crise. As crianças reagiram negativamente às restrições na alimentação e na atividade e aos procedimentos dolorosos. Os pais se sentiram cansados da vigilância constante e da privação de sono, da falta de apoio social e do foco incessante na alimentação dos filhos. Lamentaram a perda de um estilo de vida mais espontâneo, sentiram-se isolados e manifestaram luto, culpa, raiva e preocupação pelo futuro da criança. Com o tempo, os pais se adaptaram, atingindo “uma nova normalidade”, um equilíbrio entre o controle “perfeito” e o viver o mais normalmente possível. Utilizaram para o coping: reconhecer que a nova tecnologia melhorou muito os cuidados e a qualidade de vida da criança, saborear momentos incomuns em que o DM1 não dominava e envolver-se em iniciativas educacionais e de defesa do DM1. O foco constante na gestão terapêutica do DM1 prejudicou a intimidade do casal, por terem dificuldade em passar tempo a sós, por o DM1 dominar as conversas e pelas interferências no sono e exaustão. Tal foco fez com que os pais dedicassem menos atenção e menos tempo de qualidade aos outros filhos. Referiram grande dificuldade em integrar os filhos nos programas de babysitting ou em creches que aceitassem a responsabilidade pela gestão terapêutica do DM1. Quase todos os pais reportaram angústia ao abrir mão do controle do regime terapêutico, mas, gradualmente, foram aprendendo a confiar nos outros. Referiram repercussões laborais, como aceitar empregos menos exigentes, recusar promoções ou optar por trabalhar em casa.
Rifshana, Breheny, Taylor & Ross(4).	2017 Nova Zelândia	Fenomenologia	17 (14 mães e 3 pais)	A experiência de cuidar do seu filho com DM1 foi governada por um processo de vigilância constante que requereu uma consciência atenta, um comprometimento ativo, tornando a experiência de cuidar um processo muito cansativo. Planear as rotinas da criança foi a estratégia mais evidente. Situar e comparar as experiências corporais dos seus filhos, em termos de outras possíveis condições infantis, permitiu que os pais gerissem alguns dos ganhos e perdas do DM1 e sentissem um maior controle face à situação, favorecendo o seu coping. Essas comparações foram usadas de duas maneiras: favorável ou desfavoravelmente relativamente a outras condições de saúde infantil. O DM1 foi descrita como uma condição crônica para a vida, sem cura, não existindo uma altura inequívoca a partir da qual os pais parem de fazer o luto pela perda da saúde do seu filho.
Pimentel, Targa & Scardoelli(21)	2017 Brasil	Qualitativa	11 (9 mães e 2 pais)	O diagnóstico de DM1 foi descrito como um dos momentos mais difíceis da vida dos pais, sendo permeado por tristeza, angústia, desespero e sofrimento. O medo do desconhecido, da gestão terapêutica/tratamento da doença e do seu prognóstico levou a dificuldades no enfrentamento de situações inesperadas decorrentes da necessidade de execução de cuidados e aplicação de competências instrumentais. Quando bem esclarecidos sobre a doença, os pais e os seus filhos acabaram por criar mecanismos de adaptação, e os sentimentos de medo, negação e desespero acabaram por se transformar em aceitação. Após o diagnóstico, os pais iniciam uma nova trajetória rumo à adaptação, incorporando novos hábitos de vida e uma nova rotina a ser seguida. A falta de apoio e de comunicação dos profissionais de saúde, em particular, dos enfermeiros, foi relatada pelos pais, que sentiram uma necessidade de maior acompanhamento e orientação clínica por parte desses profissionais.
Rankin, Harden, Waugh, Noyes, Barnard & Lawton(22)	2016 Reino Unido	Qualitativa	54 (38 mães e 16 pais)	Nos primeiros dias após o diagnóstico, todos os pais elogiaram os cuidados clínicos que foram prestados aos seus filhos e as instruções dadas pelos profissionais. Destacaram as dificuldades na compreensão e assimilação da informação fornecida e da terminologia médica desconhecida. Alguns se sentiram estressados e extremamente perturbados e, por isso, não conseguiram assimilar e reter as informações e conselhos transmitidos. Relataram que as orientações fornecidas pelos profissionais de saúde não os tinham preparado para o modo como a sua vida iria ser afetada, e vários consideraram que os profissionais não estavam na melhor condição para fornecer o apoio empático e sem julgamento. Muitos descreveram experiências traumáticas relativamente à administração das injeções de insulina, tendo chegado a perseguir e a restringir fisicamente a criança. Por recearem as hipoglicêmias noturnas, não detetadas pela criança, os pais referiram passar a noite em estado de vigilância constante, com consequente exaustão. Os pais sentiram que o contato precoce ou a visita domiciliária, pelos profissionais, teria ajudado devido às suas circunstâncias particulares. O apoio pelos pares foi experimentado de modos opostos.
Boogerd, Maas-van Schaaijk, Noordam, Marks & Verhaak(23)	2015 Holanda	Qualitativa	39 (29 mães, 10 pais)	O confronto com o diagnóstico e com as complexas competências de gestão da doença foram descritas pelos pais como avassaladoras, referindo que sentimentos de incerteza e ansiedade foram intensificados, quando passaram do treino pelos profissionais para a autogestão do regime em casa. O DM1 e a sua gestão tiveram impacto restritivo profundo na vida social e laboral dos pais e na vida das crianças. Preocupações sobre as consequências do DM1 a curto e longo prazo foram geradoras de estresse e tristeza. A adaptação à doença e seu tratamento foi difícil, e o apoio por amigos e familiares não foi sentido como adequado, tornando a equipe de saúde e pais de crianças com DM1 nas principais fontes de apoio. O apoio por professores e escolas foi variável. As competências dos pais para a gestão do regime terapêutico aumentaram com o crescimento da criança. A disponibilidade da equipe de saúde permitiu aos pais se sentirem apoiados e seguros nos cuidados aos filhos, contudo beneficiaria de ser mais individualizada, dirigida a descodificar a vária informação disponível.
Lawton, Waugh, Noyes, Barnard, Harden, Bath, et al.(24)	2015 Reino Unido	Qualitativa	54 (38 mães e 16 pais)	Alguns pais salientaram dificuldades em compreender a informação transmitida durante as consultas dos filhos. Alguns profissionais foram elogiados pela clareza na transmissão de informação, enquanto outros criticados por utilizarem terminologia médica, sentida como complexa e de difícil compreensão. Quase todos os pais consideraram que participar nas consultas dos filhos foi sentido como indutor de estresse e ansiedade, pois temiam ser julgados devido à eventual deterioração da saúde da criança, apesar dos seus esforços, condicionando a ação dos pais.
Rodrigues(25)	2015 Portugal	Qualitativa	10 (9 mães e 1 pai)	Os pais referiram insegurança nos cuidados pelos funcionários da escola, devido à falta de conhecimentos, a erros no cálculo das doses de insulina e à falta de interesse pelo tratamento. Referiram preocupação e medo de estar ausente durante uma descompensação, a insegurança nos cuidados por terceiros, o temor da descompensação noturna. Lidaram, estando em alerta permanente, alterando as rotinas familiares, privando-se do sono e ausentando-se do emprego. Referiram dificuldades na gestão de horário de refeições, contabilização de hidratos de carbono e cálculos de dose de insulina. Valorizaram o apoio da equipe de saúde e o potencial que poderia ter no acompanhamento das crianças e famílias na escola e no domicílio.
Ayala, Howe, Dumser, Buzby & Murphy(26)	2014 Estados Unidos	Estudo misto	63 pais (Fase 4)	Pais desejaram que os profissionais de saúde reconhecessem o viver com o DM1 como um processo dinâmico que evolui ao longo do tempo. Desejaram sensibilidade e reconhecimento da experiência e desafios únicos dos pais. Os pais manifestaram ansiedade sobre como incorporar as exigências básicas do diabetes no dia a dia. A aplicação das habilidades aprendidas no hospital foi um desafio. Ao regressarem em casa, os pais se sentiram novatos durante muitos meses, dependendo dos profissionais. Foram valorizados quando os profissionais os escutaram e compreenderam que as orientações dadas inicialmente, no hospital, tinham sido pouco percebidas, pela sobrecarga emocional então vivida, e quando os profissionais responderam terapeuticamente ao luto dos pais, à sua preocupação e incerteza, dedicando tempo a compreender os seus sentimentos na luta, para se adaptarem a um novo modo de vida. Os pais dependiam dos profissionais para assumirem um papel mais diretivo, aquando do descontrole do DM1, perante uma crise ou perante uma fase de sobrecarga emocional.
Forsner, Berggren, Masaba, Ekbladh & Olinder(27)	2014 Suécia	Qualitativa (longitudinal)	6 (3 mães e 3 pais)	Após o diagnóstico, os pais sentiram que sua vida tinha sido virada do avesso, levando a que sentimentos de luto, raiva e impotência se instalassem. Os pais tiveram de enfrentar os seus medos, obstáculos e dúvidas, em especial sobre a sua competência em utilizar a bomba de insulina. Referiram se sentir continuamente entre um estado de vulnerabilidade e de confiança, entre a esperança e o desespero, necessitando de apoio de profissionais de saúde. Com o passar do tempo, os pais demonstraram alívio em assumir o controle da gestão terapêutica da doença, assegurando, de uma forma mais completa, o seu papel parental, cuidando do seu filho com maior segurança e menos incerteza. Consideram terem se tornado especialistas no diabetes dos seus filhos e verbalizaram se sentir no controle da doença a maior parte do tempo. Porém, existia uma pressão contínua para estarem sempre a par dos acontecimentos, tendo um constante medo de perder o controle. Desenvolver estratégias de coping, ajustar-se e, por fim, aceitar a nova vida após o diagnóstico da doença significou para os pais reorganizar a sua vida em torno das necessidades da criança. Implicou abdicar da vida social e aceitar que não se consegue improvisar. Com o tempo, o DM1 e a bomba de insulina passaram a ser consideradas como uma parte natural da vida da família.
Silva(28)	2014 Portugal	Qualitativa (exploratório-descritivo, fenomenológico)	14 (10 mães e 4 pais)	O diagnóstico de DM1 alterou a dinâmica familiar, levando a uma restruturação da vida ao nível das rotinas, da medicação, dos cuidados noturnos à criança e ao condicionamento da vida social e laboral. O DM1 alterou os hábitos alimentares, levou a uma maior vigilância e supervisão dos filhos e à realização de cuidados específicos (pesquisar glicemia e administrar insulina). Os pais sentiram, por vezes, constantemente, medo, insegurança, preocupação, tristeza, revolta e culpa, associados à possibilidade de aparecimento de outras patologias e complicações, de hipoglicemias, da fase de adolescência e o medo de errar. Alguns irmãos de crianças com diabetes sentiram ciúme pela atenção e carinho dado a esse filho. Foi necessário o desenvolvimento de competências parentais, como aprender sobre a doença e o tratamento e lidar com as dificuldades. Os pais receberam apoios de profissionais de saúde, do próprio filho com DM1 e de familiares, da escola e da informação na internet.
Martins, Ataíde, Silva & Frota(29)	2013 Brasil	Qualitativa	12 mães	O diagnóstico de DM1 representou uma modificação do cotidiano das mães, assumido um impacto emocional negativo, sendo que o medo e a angústia sentidos permaneceram mesmo após o diagnóstico. A não aceitação da doença por parte das mães interferiu no bem-estar do filho, ocasionando estresse e sofrimento. O nível de atenção e o cuidado diferenciado demonstrado pelas mães aos filhos com diabetes provocaram nos outros filhos sentimentos de revolta e ciúme. Apesar de o DM1 afetar toda a família, a responsabilidade do cuidado/gestão do regime terapêutico da doença recaiu sobre as mães, sendo que a sua intervenção extravasou os cuidados instrumentais necessários ao tratamento.
Nurmi & Stieber-Roger(30)	2012 Estados Unidos	Qualitativa (estudo de caso coletivo)	13 (10 mães e 3 pais)	A paternidade envolveu não só ajustamentos para acomodar as tarefas relacionadas com o DM1, mas também mudanças de perspetiva e de interações com a família, comunidade e sociedade. Os pais lutaram por afirmar a criança como “normal”, com uma característica particular (ter DM1), mais do que uma doença e por descentralizar a atenção no diabetes, focando-se na criança. Participar em angariações de fundos, interagir com outras crianças e famílias que também viviam com o diabetes e partilhar conhecimento sobre a doença foi considerado importante. A necessidade de advocacia pelos filhos foi sentida, em especial, no contexto escolar, onde era necessário garantir que as escolas se encontrassem preparadas para lidar com as particularidades do cotidiano de uma criança com DM1.
Dashiff, Riley, Abdullatif & Moreland(31)	2011 Estados Unidos	Qualitativa	40 pais	Os pais consideraram a gestão do regime terapêutico difícil, com um senso de luta (com o sistema escolar e com os adolescentes) e frustração marcado pela necessidade de estar vigilante, evocando medo, tristeza e preocupação. Alguns pais reportaram exclusivamente sentimentos negativos (culpa, tristeza e medos) ou positivos (relativos à convicção de que tinham feito tudo, mesmo que não fosse perfeito), sendo que alguns reportaram ambos.
Rearick, Sullivan-Bolyai, Bova, & Knafl(32)	2011 Estados Unidos	Estudo misto	21 (14 mães e 7 pais)	Ter um pai “veterano” na gestão do DM1 a quem se podia contactar foi considerado pelos pais como o aspecto mais importante da intervenção, o que tornava as situações estressantes mais toleráveis. Os mentores partilhavam com os pais aspectos práticos relativos à gestão do DM1. Os mentores validaram, frequentemente, os sentimentos dos pais, e ajudaram-nos a desenvolver confiança na sua gestão diária do regime terapêutico da doença através da partilha das suas experiências acerca do choque do diagnóstico e das interações com os profissionais de saúde, familiares e amigos.
Smaldone & Ritholz(33)	2011 Estados Unidos	Qualitativa	14 (7 mães e 7 pais)	Os pais identificaram a disponibilidade da equipe após o diagnóstico de DM1 como um fator importante de apoio. Contudo, em casa, sentiram-se isolados no cuidar dos filhos, sobrecarregados e cheios de dúvidas. Os grupos de suporte ajudaram a diminuir esse isolamento sentido, em particular, pelas mães. A adaptação parental foi mais efetiva quando a responsabilidade pela tomada de decisão sobre a doença era partilhada pelos pais. Nenhum dos pais considerou ter conseguido dominar por completo a gestão do DM1.
Bowes, Lowes, Warner & Gregory(34)	2009 Reino Unido	Qualitativa	17 (10 mães e 7 pais)	Os pais descreveram sentimentos de luto e de culpa após o diagnóstico. Os pais consideraram a gestão prática do regime terapêutico difícil de lidar ao início, mas, com o passar do tempo, foram se acostumando às tarefas diárias que tinham de realizar e aceitaram essa rotina como parte das suas vidas. Foram identificados gatilhos que induziam sentimentos recorrentes de tristeza, como os períodos de hospitalização, a necessidade de injeções de insulina, a adolescência e a transição para os cuidados de saúde de adultos. A gestão do regime terapêutico e o conhecimento das consequências do seu fraco controle causavam estresse continuado e ansiedade, e os pais permaneciam preocupados com a saúde futura dos filhos. Os pais reconheceram a necessidade de apoio emocional, contudo a maioria não o recebeu por parte dos profissionais. Emoções e sentimentos associados ao luto (tristeza, culpa e raiva) foram expressos pelos pais.
Paterson & Brewer(35)	2009 Canadá	Qualitativa	9 (6 mães e 3 pais)	Os pais dos adolescentes com DM1 sentiram necessidade de suporte social, em especial no que concerne à assunção da responsabilidade principal pela gestão do regime terapêutico por parte dos adolescentes. O processo de transição da responsabilidade da gestão do regime terapêutico dos pais para os filhos adolescentes foi difícil, e os conflitos eram frequentes. Os pais sentiram necessidade de apoio, que devia ser fornecido por especialistas em diabetes e por pais com adolescentes com diabetes.
Athaseri, Tilokskulchai, Patoomwan, Grey, Knafl & Suprasongsin(36)	2008 Tailândia	Qualitativa	22 mães	Manter os níveis normais de glicemia capilar e promover a independência da criança eram os objetivos das mães. Relativamente à gestão do DM1, os comportamentos referidos pelas mães, a fim de promoverem a gestão da doença e as incorporarem no estilo de vida, foram administração de injeções de insulina, pesquisa de glicemia capilar, encorajar a criança a fazer exercício e levar a criança a consultas médicas de seguimento. As mães desempenharam papéis maternais, como encorajar o autocuidado, manter a identidade da criança, satisfazer as necessidades de desenvolvimento, identificar apoio social, recorrer a medicinas alternativas, aceitar a doença da criança e desenvolver estratégias de coping face ao estresse do dia a dia. As mães referiram como estratégias para promover e encorajar a independência e autonomia dos filhos o treino de competências, a supervisão apertada, bem como os conselhos maternais. Para procurar suporte e ajuda, as mães recorreram, essencialmente, aos profissionais de saúde, aos professores e aos amigos e familiares. As estratégias de coping utilizadas pelas mães para gerir os estressores diários e reduzir o estresse foram participação em cerimônias religiosas, ser paciente, seguir em frente e “parar de pensar”. As mães relataram que os maridos se tornaram mais afetuosos e próximos após o diagnóstico de DM1. Contudo, em outras situações surgiram conflitos entre os pais, devido aos desacordos sobre a forma de cuidar do filho com DM1.
Sullivan-Bolyai, Rosenberg & Bayard(37)	2006 Estados Unidos	Qualitativa	14 pais	O diagnóstico foi descrito como “choque e pavor”, contudo os pais tiveram de reagir depressa à situação, aprendendo a gerir a doença e assumindo rapidamente a responsabilidade. Usaram a “parceria no cuidado” entre os pais e as esposas, especialmente na solução de problemas e tomada de decisões relacionadas ao regime terapêutico da doença, mas também na divisão de tarefas do cuidado. Os pais utilizaram um mantra saudável para a vivência com a doença: cuidar do filho primeiro e do DM1 em segundo, assegurando que a criança com DM1 fosse tratada como qualquer criança.
Lowes, Gregory & Lyne(38)	2005 Reino Unido	Qualitativa (longitudinal)	38 pais	Doze meses após o diagnóstico, muitos pais continuaram a estar cientes da perdas do seu filho saudável, do controle, da liberdade, da espontaneidade, da confiança na sua capacidade de proteger a sua criança do perigo e da sensação de segurança. Os pais estavam conscientes do risco de complicações futuras. Inicialmente, os pais ficaram em choque e angustiados, sendo-lhes difícil assimilar a complexidade do diagnóstico. A necessidade de injeções de insulina não fazia parte da sua rotina familiar, levando a que tivessem de planear cuidadosamente atividades e rotinas familiares que antes eram realizadas espontaneamente. Após o diagnóstico, os pais experienciaram ansiedade e perda de confiança na sua capacidade de lidar com a situação. À medida que o seu conhecimento foi aumentando, foram se tornando mais confiantes na gestão do regime terapêutico do DM1, mas continuaram a se sentir inseguros sobre a sua capacidade de manter o filho seguro. Uma crise de hipoglicemia, com perda de consciência, era o maior de todos os medos. Eventos como hipoglicemias, o estar doente, uma nova escola, as férias e as saídas familiares traziam constantemente o DM1 para primeiro plano. Os pais tinham medo da possibilidade de complicações a longo prazo e equilibraram os seus medos com o otimismo sobre o desenvolvimento dos tratamentos e com uma futura cura. Depois de 4 meses, a maioria dos pais referiu se sentir adaptada às novas rotinas e ao diagnóstico. Após 12 meses, todos os pais se habituaram às mudanças implementadas, integrando o DM1 no seu dia a dia.
Mellin, Neumark-Sztainer & Patterson(39)	2004 Estados Unidos	Qualitativa	32 (24 mães, 7 pais e 1 tutor)	Os pais manifestaram preocupações relativas à doença: medo de complicações a longo prazo; quem ajudaria a filha a controlar hiper ou hipoglicemias quando ela estivesse fora de casa; a saída futura das filhas de casa; se a gestão terapêutica do DM1 seria boa o suficiente; e o surgimento de crises de hipoglicemia. O DM1 tornou mais difícil as saídas da família. Os comportamentos de coping utilizados na gestão da doença incluíram: disponibilizar apoio concreto às filhas relativamente à satisfação das necessidades alimentares e médicas; organizar a sua vida familiar e horários para facilitar gestão do regime terapêutico; monitorizar e relembrar as filhas acerca das tarefas relacionados com o diabetes; comunicar abertamente dentro e fora de casa sobre a doença das filhas; e manter a normalidade dentro da família. As estratégias de coping utilizadas na redução de preocupações foram manter uma atitude positiva, monitorizar as filhas durante a noite e mudar de estilo de vida (passar de emprego full-time para part-time, abdicar de saídas à noite).
Lowes, Lyne & Gregory(40)	2004 Estados Unidos	Qualitativa	38	O diagnóstico levou os pais a se sentiram tristes e em choque, procurando lidar inicialmente com a doença, focando-se nos aspectos práticos da sua gestão e priorizando as necessidades imediatas da criança. A informação fornecida era muita, sendo que tiveram de assimilar em pequenas quantidades. O medo das hipoglicemias era frequente e, para alguns, foi difícil permitirem aos filhos o nível de liberdade que usufruíam anteriormente. Estratégias de coping utilizadas foram “viver um dia de cada vez”, estabelecer uma rotina, “planear à frente” e falar com outras pessoas com conhecimento sobre o diabetes. A ajuda profissional foi importante para os pais. As mães, 6 a 8 semanas após o diagnóstico, experienciaram angústia aguda e uma sensação de perda contínua. As alterações das rotinas alimentares incluíram a adaptação dos horários das refeições à gestão da dieta, às refeições escolares e às festas das crianças. Os pais descreveram a doença dos filhos como “uma forma de vida”, sendo as rotinas estabelecidas integradas nos seus dias. Doze meses após, os pais passaram a considerar o diabetes parte da sua vida diária, sendo as necessidades das crianças incorporadas no seu estilo de vida. A hipoglicemia noturna foi uma preocupação dos pais, que continuaram a sentir perda de espontaneidade e necessidade de planear constantemente todos os aspectos das suas vidas.
Sullivan-Bolyai, Deatrick, Gruppuso, Tamborlane & Grey(41)	2003 Estados Unidos	Qualitativa	28 mães	As mães utilizaram um comportamento hipervigilante no dia a dia como forma de conseguirem gerir o DM1 dos seus filhos. Foram identificadas três dimensões da vigilância constante: as preocupações do dia a dia; a gestão diária do DM1; e os recursos de apoio internos e externos. Nos primeiros seis meses após o diagnóstico, as mães se sentiram isoladas e incompetentes nos cuidados que prestavam e na gestão do regime terapêutico. Com o passar do tempo, foram se sentindo mais preparadas e competentes na gestão da doença e na avaliação e interpretação dos próprios comportamentos manifestados pelos filhos face à ao DM1.
Sullivan-Bolyai S, Knafl, Deatrick & Grey(42)	2003 Estados Unidos	Estudo misto	28 mães	O comportamento-alvo focado por todas as mães foi o “controle da glicemia”, juntamente com a gestão diária do regime terapêutico da doença, que foi caraterizado como “vigilância constante”. As mães utilizaram a adesão estrita como abordagem para gerir os cuidados aos filhos, essencialmente, nos meses iniciais após o diagnóstico, o que implicou contatos telefônicos frequentes e consultas com as enfermeiras responsáveis pela educação sobre o DM1. Relativamente à adesão flexível, as mães referiram, com o tempo, sentir-se mais competentes e confiantes, sendo que demorou de 6 meses a 1 ano após o diagnóstico até que se sentissem confiantes. À medida que as mães construíram o seu nível de confiança, tendiam a adotar uma adesão ao tratamento mais flexível, adaptando o regime terapêutico no sentido de o tornar mais fácil de lidar.
Seppänen, Kyngäs & Nikkonen(43)	1999 Finlândia	Qualitativa (Estudo de caso)	4 (2 mães e 2 pais)	O processo de coping parental face à DM1 incluiu seis fases: a descrença; a falta de informação e a culpa; a aprendizagem do cuidado; a normalização; a incerteza; e a reorganização. As três primeiras fases do processo de coping tiveram lugar no hospital. A quarta fase descreveu o coping parental após a alta da criança. A quinta e a sexta fases se relacionaram com o autocuidado da criança em casa durante as primeiras 2 semanas após a alta.
Faulkner(44)	1996 Estados Unidos	Qualitativa	27 (7 mães e 7 pais)	Relativamente aos efeitos provocados pelo DM1 na família, as respostas parentais foram: relembrando o diagnóstico; alterando a dieta; prevendo/agendando as atividades diárias; coping; e gerindo o regime terapêutico. Relativamente aos papéis familiares, foi possível identificar papéis característicos assumidos pelas mães e outros pelos pais. Ensinar os próprios filhos, professores, colegas de turma e outros pais sobre o diabetes foi incorporado no papel maternal.
Hatton, Canam, Thorne & Hughes(45)	1995 Canadá	Qualitativa (interpretativo com abordagem fenomenológicA)	8 pais (8 mães e 8 pais)	Os pais identificaram os fatores responsáveis pelo estresse aumentado, como a labilidade da condição da criança, as exigências da complexa gestão do regime terapêutico, os procedimentos dolorosos, as múltiplas perdas na vida da criança e da família, o isolamento social, a incapacidade para confiar aos outros o cuidado do filho e partilhar sentimentos e a preocupação antecipada com as ameaças à segurança, sobrevivência e futuro da criança. As experiências de cuidar dos filhos com diabetes foram descritas em três fases: i) Diagnóstico e hospitalização: foram os maiores estressores para os pais, a gravidade da situação clínica, fazendo recear a morte e a hospitalização, frequentemente aterradora, pela constante monitorização e procedimentos dolorosos. A falta de suporte, associada aos múltiplos estressores, gerou respostas emocionais comuns, como choque, raiva, medo, luto, culpa, tristeza, exaustão, culpar os outros e eles próprios, sentir-se totalmente esmagados, sentir-se desesperado, sem esperança, inadequados enquanto pais e sentir-se fora de controle. Usaram estratégias de coping: ser assertivos e defender a criança; lidar com as suas necessidades; perceber que o complexo regime terapêutico tem de ser cumprido para o bem da vida da criança; procurar ajuda (profissionais hospitalares); aceitar a falta de suporte dos temerosos amigos e familiares; e agarrar-se à esperança de uma cura no futuro; ii) Cuidar da criança em casa: trazer a criança de volta à casa e enfrentar a responsabilidade pela gestão de uma doença crônica foi o maior estressor para os pais. Perder o sistema de suporte hospitalar fez se sentirem vulneráveis e com medo. A imprevisibilidade das oscilações da glicêmia e a incapacidade para as antecipar e controlar gerou estresse e frustração. A estratégia de coping utilizada foi estar totalmente vigilantes e metódicos com o regime terapêutico do DM1. Essa fase de intensa aprendizagem durou cerca de 6 a 8 meses após o diagnóstico e continuou até que um senso de adaptação fosse alcançado; iii) Adaptação a longo prazo: uma fase de maior relaxamento, levando a que os pais se sentissem com mais controle da situação, sendo capazes de incorporar a doença na vida familiar em um futuro a longo prazo. Os principais estressores identificados pelos pais estavam relacionados com o crescimento e desenvolvimento da criança. Os pais continuavam a sentir necessidade de um coping estratégico centrado no assumir o controle, no confiar nos outros e em construir sistemas de suporte.

Quadro 4
Caracterização da experiência de transição dos pais para o papel de cuidador de um filho com Diabetes Mellitus 1

Categorias	Elementos caracterizadores da experiência de transição
A natureza da experiência	Processo de coping parental em seis fases(43)
	Exeriências de cuidar em três fases(45)
	Percurso dinâmico “com o passar do tempo”(1,20,26-27,34,38,40-42)
Sentimentos e emoções experimentadas	Luto/perdas(1,4,20-21,27,31,34,38,40,45)
	Tristeza, choque, culpa, angústia, ansiedade, raiva, obsessão, impotência e medo(1,18,20-21,23-29,31,34,37-38,40,45)
	Preocupações constantes e diversas(1,18,20,22,25,28,31,34,38-40,45)
	Entre esperança e desespero, confiança e vulnerabilidade(27)
	Otimismo(38)
	Sentimentos positivos e mistos(31)
	Alívio(27)
Condições dificultadoras/estressores	Enfrentar a responsabilidade pelo tratamento após a alta hospitalar(23,45)
	Informação transmitida no hospital insuficiente(17,22) e dificuldade na sua compreensão e assimilação(22,24,26)
	Dificuldade em gerir os cuidados, em satisfazer as necessidades dos filhos em casa(17-18,21-23,25-27,31,34) e em realizar procedimentos dolorosos(18,45)
	Risco de hipoglicemias (28,38-40), em particular, as noturnas(22,25,40)
	Insegurança na sua capacidade para manter o filho seguro(38) nos cuidados por terceiros(25,45) e na escola(25)
	Apoio desadequado de amigos e familiares(23)
	Imprevisibilidade da glicemia e incapacidade de a controlar(45)
	Falta de apoio social(20), dos profissionais de saúde(21,34), dos pares(22) e das creches/escolas(20,25,31)
	Mudança de escola, férias, saídas familiares(38), festas(40) e transição de contexto de cuidados(34)
	Temer o julgamento pelos profissionais de saúde(24)
	Isolamento social(45)
	Idade precoce dos filhos(20), crescimento e desenvolvimento da criança(45), adolescência(35)
	A reação negativa da criança ao regime terapêutico(20)
Condições facilitadoras	Apoio dos profissionais de saúde (equipe)(17,22-23,25-28,33,36,40)
	Apoio familiar(18,28,36)
	Apoio fornecido por outros pais com filhos com DM1/grupos de suporte(22-23,30,32-33,40)
	Apoio fornecido por professores e amigos(36)
Estratégias utilizadas pelos pais	Aprender(1,17-18,28,40) e desenvolver competências sobre o DM1 e gestão do regime terapêutico(1,17-18,21,23,27-28,32,34,36-42,45)
	Focar-se nos aspectos práticos da gestão do DM1 e nas necessidades da criança(27,36,39,40,45)
	Vigiar intensamente a criança(20,22,28,31,36,41-42,45) e estar permanentemente alerta(1,25), mesmo à noite(22,39)
	Estabelecer rotinas para a criança e família(1,4,25,38-40,42,45)
	Ser metódico na execução do regime terapêutico(42,45) e pesquisar em fontes documentais(18,28)
	Alterar hábitos da criança e da família(20,25,28,40)
	Executar cuidados técnicos específicos no DM1(25,27-28,36,38)
	Gerir o regime terapêutico com flexibilidade progressiva(42)
	Educar os funcionários escolares(1,44), envolver-se em iniciativas educacionais e de defesa dos filhos(20,30-31,44)
	Lutar para afirmar a criança como “normal”, com uma característica particular (ter DM1)(30,37)
	Procurar o apoio de profissionais de saúde(26,36,39,42,45), de professores, amigos, familiares e outros(18,36,40) pais de crianças com DM1(18,32)
	Assumir responsabilidade e tarefas: partilha no casal(33,37,44) ou cuidado recaiu sobre as mães(29)
	Abdicar ou reduzir a vida social(27,39)
	Adaptações laborais: flexibilizar horários(23), mudar de emprego(17), reduzir tempo de trabalho(19,39), ausentar-se do emprego(25), ou trabalhar em casa(20)
	Recorrer a medicinas alternativas(36), participar em cerimônias religiosas(36)
	Reconhecer os contributos da tecnologia na gestão do regime terapêutico(20)
	Comparar o DM1 com outras condições crônicas(4), ter esperança em uma cura futura para a doença(38-39,45)
	Viver um dia de cada vez(40), manter uma atitude positiva(39), ser paciente, “seguir em frente”, “parar de pensar”(36), ser assertiva(45) e comunicar abertamente sobre a doença(39)
	Promover e encorajar a independência e autonomia dos filhos(36)
Resultados ou efeitos obtidos	Não aceitação(29) ou aceitação(21,27,34,36) da doença
	Consciencialização da mudança permanente na vida(1,4,17) e da necessidade de um coping estratégico para assumir o controle, construir sistemas de suporte e aprender confiar nos outros(45)
	Exaustão(1,20,22,45), interferências ou privação do sono(20,25)
	Conflitos e prejuízos nas relações entre os pais, por desacordo sobre a forma de cuidar(36), prejuízo na relação do casal(20) e prejuízo na relação com os outro filhos(20,28-29), conflitos com filhos adolescentes com DM1(35)
	Maior proximidade e afetuosidade dos maridos após o diagnóstico(36)
	Impacto negativo na carreira/trabalho(19-20,23,28) e na vida social(23,28)
	Não ter conseguido dominar por completo a gestão do DM1(33)
	Sentir-se mais capacitado para lidar com a doença e tratamento: sentir-se no controle da doença a maior parte do tempo(27), mais preparado para lidar/gerir a doença(41), mais competentes, confiantes e flexíveis(27, 42), ou mais seguros nos cuidados(23), integrar o DM1 na vida familiar como “nova normalidade”(20,34,38,40,45)
	Aprender a confiar nos outros(20)

RESULTADOS

Foram identificadas, através da pesquisa eletrônica em bases de dados, 413 referências na CINAHL Complete (via EBSCO), 449 na MEDLINE Complete (PubMed), 1 referência no banco de teses da CAPES (Brasil), 9 referências no RCAAP e 16 no repositório OpenGrey, perfazendo um total de 888 registros. Desses, 240 foram excluídos por serem duplicados, sendo selecionados 5 registros adicionais através de listas de referências de artigos previamente identificados. Dos restantes 653 registros, 511 foram excluídos após avaliação do título e resumo, sendo que 3 foram excluídos por não ter sido possível aceder ao seu texto integral, mesmo após se terem desenvolvido esforços neste sentido. Após a leitura do texto integral dos 139 registros, 108 foram excluídos por não cumprirem os critérios de inclusão definidos, afastando-se do tópico em estudo (não estando focados na transição), porque integraram resultados comuns aos pais e filhos (não sendo possível dissociar a experiência dos pais da dos filhos), ou porque se centraram em aspectos marginais à experiência de transição em estudo.

Por fim, foram incluídos nesta revisão um total de 31 estudos (Figura 1). Relativamente ao período de publicação dos estudos, verificou-se que o mesmo variou entre 1995 e 2018. No que concerne ao país onde foram produzidos os estudos, constatou-se ter havido uma distribuição geográfica ampla, sendo que 83,8% (N=26) foram realizados na América do Norte e Europa. Relativamente à composição da amostra, registrou-se que 27 integraram pais e mães, enquanto 3 integraram apenas mães e 1 apenas pais. Os resultados dos artigos primários foram integralmente lidos, sendo extraídos os que se relacionavam com a questão de partida formulada e os objetivos da revisão sistemática (Quadro 3).

Figura 1
Fluxograma do processo de seleção e inclusão dos estudos (PRISMA-ScR, 2018)

A experiência de transição dos pais foi resumida em seis categorias: a natureza da experiência; sentimentos e emoções experimentadas; condições dificultadoras/estressores; condições facilitadoras; estratégias utilizadas pelos pais; e resultados ou efeitos obtidos (intermédios ou finais) (Quadro 4). Apresentam-se, também, os elementos textuais caracterizadores daquela experiência.

DISCUSSÃO

A partir dos resultados, foi possível verificar a existência de diferentes estudos que se centraram na experiência dos pais no cuidar de um filho com DM1. A natureza dessa experiência implica um percurso dinâmico que “decorre com o passar do tempo”(¹,²⁰,²⁶-²⁷,³⁴,³⁸,⁴⁰-⁴²), tendente à adaptação face à situação de doença do filho e ao alcançar de “uma nova normalidade” na vida pessoal e familiar.

Apenas em dois estudos foram identificadas e nomeadas as fases no decurso da experiência de cuidar: a fase do diagnóstico e hospitalização; a do cuidar da criança em casa (após a alta hospitalar, enfrentando a responsabilidade pela gestão de uma doença crônica); e a da adaptação a longo prazo(⁴⁵). Em outro estudo, foi possível identificar que o processo de coping parental foi composto por diferentes fases, como a descrença, a falta de informação e a culpa, a aprendizagem do cuidado, a normalização, a incerteza e a reorganização(⁴³).

Os resultados dos estudos são unânimes em considerar que o diagnóstico de DM1 desencadeou nos pais fortes respostas emocionais e sentimentos de tonalidade, predominantemente negativa, como tristeza, choque, culpa, angústia, ansiedade, raiva, obsessão, impotência e medo(¹,¹⁸,²⁰-²¹,²³-²⁹,³¹,³⁴,³⁷-³⁸,⁴⁰,⁴⁵). Contudo, em momentos mais tardios, também foram referidos alguns sentimentos de tonalidade positiva ou mista(²⁷,³¹,³⁸). O diagnóstico do DM1 foi vivenciado pelos pais como um luto, associado a diferentes perdas de um filho saudável, de liberdade, da espontaneidade e da confiança no exercício do papel parental(¹,⁴,²⁰-²¹,²⁷,³¹,³⁴,³⁸,⁴⁰,⁴⁵). O medo do desconhecido, da gestão terapêutica e do prognóstico da doença levou a que os pais se sentissem esmagados pelas enormes responsabilidades e sem preparação para a gestão do complexo regime terapêutico da doença.

Foram identificadas múltiplas preocupações manifestadas pelos pais, que não se circunscreveram apenas ao período do diagnóstico, mas que os acompanham ao longo da sua vida, como a gestão do regime terapêutico(³¹,³⁴), as hipoglicêmias/descompensação(²⁵,⁴⁰), a hospitalização(⁴⁵), a saída de casa dos filhos(³⁹), a ameaça à vida(¹⁸,⁴⁵), a possibilidade de complicações futuras(¹,²²,²⁸,³⁴,³⁸-³⁹) e as relativas à qualidade de vida futura dos filhos(¹,¹⁸,²⁰).

A partir da evidência encontrada, foi possível reconhecer que a experiência de transição para o papel de cuidador de um filho com DM1 foi marcada por múltiplas condições dificultadoras ou estressores que os pais tiveram de enfrentar. Foram identificadas dificuldades na compreensão e assimilação da informação transmitida no hospital sobre a doença e a sua gestão(²²,²⁴,²⁶), sendo que, em algumas situações, essa foi considerada insuficiente(¹⁷,²²). Os sentimentos de incerteza e ansiedade foram intensificados, quando houve transição dos cuidados prestados no hospital para a autogestão do regime terapêutico, de forma independente, em casa(²³). Trazer a criança de volta a casa e enfrentar a responsabilidade pela gestão de uma doença crônica foi um estressor identificado(²³,⁴⁵), bem como a dificuldade em gerir os cuidados, em satisfazer as necessidades dos filhos em casa(¹⁷-¹⁸,²¹-²³,²⁵-²⁷,³¹,³⁴) e realizar procedimentos dolorosos(¹⁸,⁴⁵), como a avaliação da glicemia capilar e a administração de insulina. O risco de hipoglicemias(²⁸,³⁸-⁴⁰), em particular das que ocorrem durante a noite(²²,²⁵,⁴⁰), foi outro dos estressores reportados. A imprevisibilidade das oscilações dos valores da glicemia e a dificuldade em controlá-las(⁴⁵) contribuíram, também, para a insegurança sentida pelos pais, não só na sua própria capacidade de manter o filho seguro(³⁸), mas também nos cuidados prestados por terceiros(²⁵,⁴⁵) ou em contexto escolar(²⁵).

A falta de apoio sentida pelos pais foi identificada em alguns estudos pela socidade(²⁰), pelos profissionais de saúde(²¹,³⁴), pelos pares(²²) e pelas creches/escolas(²⁰,²⁵,³¹). Em outros estudos, foi reportado como dificuldade o apoio inadequado prestado por amigos e familiares(²³), reforçando a necessidade expressa de maior apoio (incluindo o emocional) pelos profissionais de saúde(²²-²³,²⁶,³⁴-³⁵), por outros pais de crianças/adolescentes com DM1(³⁵) e pelos familiares(¹⁸).

A evidência encontrada demonstra, também, que só foi possível aos pais lidar com a doença e responder às exigências do regime terapêutico mediante a presença de condições facilitadoras, isto é, a disponibilidade de diversas fontes de apoio, como os profissionais de saúde da equipe responsável pela vigilância da criança(¹⁷,²²-²³,²⁵-²⁸,³³,³⁶,⁴⁰), a família(¹⁸,²⁸,³⁶), outros pais com filhos com DM1/grupos de suporte(²²-²³,³⁰,³²-³³,⁴⁰) e os professores e amigos(³⁶).

Para enfrentar o DM1 e gerir o regime terapêutico, os pais recorreram a estratégias diversas, procurando lidar, inicialmente, com a doença, focando-se nos aspectos práticos da gestão do DM1 e priorizando as necessidades imediatas da criança(²⁷,³⁶,³⁹,⁴⁰,⁴⁵). Familiarizar-se com a nova situação foi um desafio, sendo que os pais tiveram de aprender, rapidamente, sobre a doença e desenvolver competências para a gestão do regime terapêutico(¹,¹⁷-¹⁸,²¹,²³,²⁷-²⁸,³²,³⁴,³⁶-⁴²,⁴⁵). Essas competências incluíam realizar cuidados específicos no DM1, como a avaliação da glicemia, a contabilização de hidratos de carbono, o doseamento e administração de insulina e a manipulação de bomba de insulina(²⁵,²⁷-²⁸,³⁶,³⁸). O diagnóstico de DM1 impôs aos pais realizar modificações na vida familiar e estabelecer rotinas para a criança e família(¹,⁴,²⁵,³⁸-⁴⁰,⁴²,⁴⁵). A alteração dos hábitos alimentares foi uma das mais evidentes(²⁵,²⁸,⁴⁰). Vigiar intensamente a criança(²⁰,²²,²⁸,³¹,³⁶,⁴¹-⁴²,⁴⁵) e estar permanentemente em um estado de alerta, de prontidão física e mental(¹,²⁵), mesmo durante a noite(²²,³⁹), foram outras das estratégias utilizadas. A nível do emprego, a gestão do regime terapêutico do DM1 implicou que os pais fizessem adaptações laborais, que passaram por flexibilizar horários(²³), reduzir o tempo de atividade laboral(¹⁹,³⁹), ausentar-se do emprego(²⁵), mudar de emprego(¹⁷) ou trabalhar em casa(²⁰), todas com o intuito de se ganhar maior flexibilidade e assegurar maior presença no apoio às crianças.

Por terem vivenciado experiências de insegurança relativamente aos cuidados prestados aos seus filhos durante o período escolar(²⁵), os pais assumiram a responsabilidade de assegurar a formação aos funcionários das escolas(¹,⁴⁴), envolvendo-se em múltiplas iniciativas educacionais e de defesa dos filhos(²⁰,³⁰-³¹,⁴⁴). Procurando lutar, sempre, para afirmar a criança como “normal”, com uma característica particular (ter DM1)(³⁰,³⁷), os pais procuraram o apoio de profissionais de saúde(²⁶,³⁶,³⁹,⁴²,⁴⁵), de professores, amigos e familiares(¹⁸,³⁶,⁴⁰), bem como de outros pais de crianças com DM1(¹⁸,³²).

Foram identificados na literatura resultados ou consequências constatadas pelos pais no decurso do desempenho do seu papel enquanto cuidadores de um filho com DM1, resultados esses que variam e até evoluem consoante ao dinamismo do processo de transição. Como consequências, os estudos destacaram o impacto negativo na vida social(²³,²⁸) e os prejuízos sentidos nas relações entre os pais, ao nível da intimidade do casal(²⁰), bem como a existência de conflitos devido ao desacordo sobre a forma de cuidar da criança(³⁶), ou conflitos com os filhos com DM1 na fase da adolescência(³⁵). No entanto, em outro estudo, foi constatado como resultado a maior proximidade e afetuosidade dos maridos após o diagnóstico(³⁶). O esforço e a atenção dedicados à gestão do DM1 afetaram, também, a relação do pais com os outros filhos como consequência do ciúme e revolta sentidos, pelo fato de os pais passarem mais tempo e dedicarem mais atenção ao filho com DM1(²⁰,²⁸-²⁹).

Os pais se consciencializaram da mudança permanente nas suas vidas(¹,⁴,¹⁷), passando a considerar o diabetes como parte da sua vida diária. Ter um filho com diabetes e incorporar as suas necessidades no seu estilo de vida e da família passou a ser a nova normalidade(²⁰,³⁴,³⁸,⁴⁰,⁴⁵). Os pais, embora se sentissem exaustos(¹,²⁰,²²,⁴⁵) e cansados da vigilância constante e da privação de sono(²⁰,²⁵), foram aprendendo a dominar as exigências do regime terapêutico do DM1, a compreender melhor os sintomas da doença e a forma de regular os níveis de glicemia dos seus filhos, passando de novatos a peritos, sentindo-se no controle da doença na maior parte do tempo(²⁷). Contudo, a aceitação da doença, apesar de ter sido alcançada em alguns casos (²¹,²⁷,³⁴,³⁶), em outros, nunca foi verificada(²⁹). Muitos pais procuraram alcançar um equilíbrio entre o controle “perfeito” e o viver o mais normalmente possível(²⁰). Mesmo em uma fase de maior adaptação, em que os pais se sentiam mais preparados para lidar/gerir a doença(⁴¹), mais competentes, confiantes, flexíveis(²⁷,⁴²) e mais seguros na prestação de cuidados(²³), eles continuaram a reconhecer a necessidade de um coping estratégico para assumir o controle, construir sistemas de suporte e aprender confiar nos outros(²⁰,⁴⁵).

Limitações do estudo

Como limitação, aponta-se não ter sido possível ter acesso ao texto completo de três artigos identificados. Para além desta, o fato de 83,8% dos estudos selecionados terem sido realizados na América do Norte e no norte da Europa poderá se constituir uma limitação do estudo, atendendo à disparidade e ao peso dos aspectos culturais singulares de cada país, bem como às próprias respostas fornecidas/existentes pelos sistemas sociais e pelos serviços de saúde que influenciarão, certamente, o modo como o processo de transição em estudo é vivenciado pelos pais.

Contribuições para a área da enfermagem

O mapeamento e resumo da evidência científica existente permitiu caracterizar a experiência de transição dos pais para o papel de cuidador de um filho com DM1. Embora este resumo, pela sua natureza, não permita extrair implicações para a prática, deixa, contudo, indicações para os profissionais (enfermeiros), quer sobre a experiência árdua e transformadora que o DM1 de um filho implica para os pais, quer sobre a necessidade de capacitação atempada e cuidado persistente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente revisão permitiu identificar e resumir elementos caracterizadores da experiência de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador de um filho com DM1. Apesar de os elementos constitutivos desta experiência se encontrarem, globalmente, caracterizados na literatura e do predomínio de estudos qualitativos incluídos nesta revisão, a teorização que possibilite a compreensão do processo de transição dos pais para o exercício do papel de cuidador carece de investigação específica. Logo, mais estudos precisam ser realizados, de modo a teorizar este processo de transição, possibilitando uma compreensão aprofundada do mesmo.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Fátima Helena do Espírito Santo

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  30 Jan 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  22 Abr 2022
• Aceito
  09 Nov 2022