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Análise da perda de vacinas por alteração de temperatura

RESUMO

Objetivos:

analisar as perdas de vacinas em uma Região de Saúde do Noroeste paulista.

Métodos:

estudo transversal retrospectivo, com dados secundários obtidos das fichas de notificação de alteração de temperatura utilizadas pelo Grupo de Vigilância Epidemiológica XXIX de São José do Rio Preto, entre 2010 e 2017. Foi realizada análise descritiva e inferencial, utilizando regressão linear múltipla e nível de significância de 95%.

Resultados:

foram analisadas 341 notificações de alteração de temperatura, sendo 70,1% causadas por motivos estruturais, 57,8% em refrigeradores industriais e 91,2% em serviços de atenção básica. Das doses que sofreram alteração de temperatura, 41,4% foram perdidas e 58,6% foram administradas na população. O maior percentual de doses perdidas em relação às aplicadas ocorreu em municípios menores, apesar de eles notificarem menos

Conclusões: os trabalhadores de enfermagem que atuam em salas de vacinação devem se empenhar para prevenir alterações de temperatura, evitando perdas e aumento dos gastos públicos.

Descritores:
Refrigeração; Vacinas; Imunização; Prevenção de Doenças; Atenção à Saúde

ABSTRACT

Objectives:

to analyze vaccine losses in a Health Region in the Northwest of São Paulo.

Methods:

retrospective cross-sectional study with secondary data obtained from Temperature Change Notification Forms used by the Epidemiological Surveillance Group XXIX of São José do Rio Preto between 2010 and 2017. Descriptive and inferential analysis were performed using multiple linear regression and significance level of 95%.

Results:

in total, 341 notifications of temperature changes were analyzed, of which 70.1% were caused by structural reasons, 57.8% in industrial refrigerators and 91.2% in primary care services. Of the doses that suffered a change in temperature, 41.4% were lost and 58.6% were administered to the population. The highest percentage of lost doses compared to those applied occurred in smaller municipalities, although they reported less.

Conclusions:

nursing workers who work in vaccination rooms should make efforts to prevent temperature changes and avoid losses and higher public expenses.

Descriptors:
Refrigeration; Vaccines; Immunization; Disease Prevention; Health Care

RESUMEN

Objetivos:

analizar las pérdidas de vacunas en una Región de Salud del Noroeste de São Paulo.

Métodos:

estudio transversal retrospectivo, con datos secundarios obtenidos de los formularios de notificación de cambios de temperatura utilizados por el Grupo XXIX de Vigilancia Epidemiológica de São José do Rio Preto entre 2010 y 2017. Se realizó el análisis descriptivo e inferencial y se utilizó la regresión lineal múltiple y nivel de significancia del 95%.

Resultados:

se analizaron 341 notificaciones de cambios de temperatura, de las cuales el 70,1% fueron por motivos estructurales, el 57,8% en frigoríficos industriales y el 91,2% en los servicios de atención primaria. De las dosis que sufrieron un cambio de temperatura, el 41,4% se perdieron y el 58,6% se administraron a la población. El mayor porcentaje de dosis perdidas en comparación con las aplicadas se produjo en los municipios más pequeños, aunque informaron menos.

Conclusiones:

los trabajadores de enfermería que laboran en las salas de vacunación deben esforzarse por prevenir cambios de temperatura, evitando pérdidas y aumento de los gastos públicos.

Descriptores:
Refrigeración; Vacunas; Inmunización; Prevención de Enfermedades; Atención a la Salud

INTRODUÇÃO

A vacinação é um método de proteção específico com excelente relação custo-benefício e constitui ação prioritária de prevenção pela atenção primária à saúde, com elevado impacto na saúde da população. Nas últimas décadas, as vacinas alteraram o perfil epidemiológico das doenças imunopreveníveis, reduzindo o número de casos e os custos com hospitalização e tratamento(11 Crosewski F, Larocca LM, Chaves MMN. [Avoidable losses of immunobiologicals in the local instance: reflections on the nursing work process]. Saúde Debate. 2018;42(116):203-13. doi: 10.1590/0103-1104201811616 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/0103-11042018116...
-22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
).

Por serem produtos termolábeis, as vacinas precisam ser mantidas em temperaturas controladas e ideais para manter sua imunogenicidade e eficácia. Isso exige cuidados de conservação, realizados pela equipe de enfermagem, sob gerência do enfermeiro. A temperatura ideal para evitar deterioração é especificada pelo fabricante, mas a estabilidade dos imunobiológicos também pode ser alterada pela luminosidade, umidade e tipo de cepa vacinal(33 Simões NCS, Santos IF, Oliveira VC, Guimarães EAA, Andrade HS. Analysis of vaccine losses by temperature changes in a Health Region from Minas Gerais State, Brazil. ABCS Health Sci[Internet]. 2020 [cited 2020 Jun 14];45:1261. Available from: https://www.portalnepas.org.br/abcshs/article/view/1261
https://www.portalnepas.org.br/abcshs/ar...
-44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_procedimentos_vacinacao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Visando a conservação adequada dos imunobiológicos, em 1973 o Ministério da Saúde instituiu o Programa Nacional de Imunizações (PNI), responsável pela coordenação nacional das ações de imunização, de forma sincronizada e racional, a partir de um sistema logístico denominado Rede de Frio, que conta com profissionais qualificados, equipamentos e protocolos para o recebimento, armazenamento, conservação, manipulação, distribuição e transporte dos imunobiológicos, de maneira adequada(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_procedimentos_vacinacao.pdf
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-55 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual de Rede de Frio do Programa Nacional de Imunizações [Internet]. 5. ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/rede_frio_2017_web_VF.pdf
http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File...
).

A Rede de Frio assegura que as características imunogênicas dos imunobiológicos sejam mantidas, ao longo do percurso entre o laboratório produtor e a administração. Portanto, é necessário que os imunobiológicos sejam adequadamente refrigerados, em todas as instâncias de armazenamento(55 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual de Rede de Frio do Programa Nacional de Imunizações [Internet]. 5. ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/rede_frio_2017_web_VF.pdf
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).

A fim de garantir a capacidade imunogênica dos imunobiológicos, os mesmos devem estar conservados, no nível local, em temperatura entre +2°C e +8 °C e dentro do prazo de validade especificado no frasco, conforme preconiza o PNI. Para tanto, o controle, registro e monitoramento diário da temperatura são imprescindíveis nos equipamentos das instâncias de armazenamento. Em caso de alterações da temperatura, leva-se em conta as temperaturas máxima, mínima e do momento que foram atingidas e o tempo que o imunobiológico permaneceu nestas temperaturas(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_procedimentos_vacinacao.pdf
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5 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual de Rede de Frio do Programa Nacional de Imunizações [Internet]. 5. ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/rede_frio_2017_web_VF.pdf
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6 Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica "Prof. Alexandre Vranjac". Norma técnica do programa de imunização [Internet]. São Paulo: SESP; 2016 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de-vigilancia-epidemiologica-prof.-alexandre-vranjac/publicacoes/norma-tecnica-do-programa-de-imunizacao
http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de...
-77 Raglione D, Bezerra GAM, Lopes MH, Nerger MLBR, Guimarães TC, Sartori AMC. [Evaluation of the cold chain for vaccine conservation in primary healthcare centers in the South and Midwest regions of São Paulo city, Brazil, in 2011-2012]. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(1):65-74. doi: 10.5123/S1679-49742016000100007 Portuguese.
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).

Fragilidades relacionadas ao processo de refrigeração como manuseio inadequado e defeito no equipamento ou a falta de energia elétrica, podem comprometer a potência e eficácia dos imunobiológicos. Diante disso, os mesmos são colocados sob suspeita e submetidos a processos de análise e/ou reteste, a partir da orientação da coordenação geral do PNI. Após tais procedimentos, os desfechos consequentes à alteração da temperatura serão a utilização ou o descarte do imunobiológico(55 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Manual de Rede de Frio do Programa Nacional de Imunizações [Internet]. 5. ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.pr.gov.br/arquivos/File/rede_frio_2017_web_VF.pdf
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).

No estado de São Paulo, quando um imunobiológico sofre alteração de temperatura na instância local/municipal, é necessário preencher a Ficha de Notificação de Alteração de Temperatura e enviá-la à instância regional (Grupo de Vigilância Epidemiológica - GVE), que a encaminhará ao nível estadual (Centro de Vigilância Epidemiológica - CVE), onde será analisada para definir a conduta a ser adotada.

Estudos demonstram que o descumprimento das normas de conservação das vacinas por erros ou falhas, em nível local, é comum, gera inutilizações e perdas de doses, e ocasiona prejuízos financeiros e de processos de trabalho, que afetam a qualidade dos serviços de saúde(77 Raglione D, Bezerra GAM, Lopes MH, Nerger MLBR, Guimarães TC, Sartori AMC. [Evaluation of the cold chain for vaccine conservation in primary healthcare centers in the South and Midwest regions of São Paulo city, Brazil, in 2011-2012]. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(1):65-74. doi: 10.5123/S1679-49742016000100007 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201600...

8 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Cavalcante RB, Arcêncio RA, Pinto IC. Weaknesses of vaccine storage in Primary Healthcare Centers. Rev Bras Enferm. 2015;68(2):291-6. doi: 10.1590/0034-7167.2015680215i
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-99 Samad SA. Perdas de vacinas: razões e prevalência em quatro unidades federadas do Brasil [Dissertação] [Internet]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2011 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://repositorio.unifesp.br/handle/11600/9923
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). Portanto, estudar a perda de vacinas por alteração de temperatura contribuirá para identificar os determinantes do problema e definir medidas de prevenção das perdas, subsidiando a atuação da equipe de Enfermagem nas salas de vacinação e proporcionando maior segurança no armazenamento dos imunobiológicos.

OBJETIVOS

Analisar as perdas de vacinas em uma Região de Saúde do Noroeste paulista.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Antecedendo a coleta dos dados, o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.

Desenho, período e local do estudo

Estudo observacional, transversal retrospectivo, norteado pela ferramenta STROBE.

Foram utilizadas as notificações de alteração de temperatura de vacinas recebidas pelo Grupo de Vigilância Epidemiológica XXIX de São José do Rio Preto (GVE 29), no período de 2010 a 2017.

O GVE 29 integra um dos 28 núcleos regionais do Centro de Vigilância Epidemiológica "Prof Alexandre Vranjac" (CVE), responsável pela coordenação e normatização do Sistema de Vigilância Epidemiológica no Estado de São Paulo, planejando, executando, gerenciando e monitorando, no nível estadual, as medidas preventivas e de controle de doenças e agravos, capacitando recursos humanose desenvolvendo pesquisas de interesse para o sistema público de saúde(1010 Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica "Prof. Alexandre Vranjac". Imunização [Internet]. 2019 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de-vigilancia-epidemiologica-prof.-alexandre-vranjac/areas-de-vigilancia/imunizacao/
http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de...
).

Este grupo está inserido na Divisão Administrativa da Regional de Saúde XV (DRS XV), considerada uma das maiores regionais do Estado de São Paulo. Abrange 67 municípios pertencentes aos Colegiados Intergestores Regionais (CIR) de Catanduva, José Bonifácio, Votuporanga e São José do Rio Preto, possuindo 192 salas públicas de vacina em funcionamento(1010 Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica "Prof. Alexandre Vranjac". Imunização [Internet]. 2019 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de-vigilancia-epidemiologica-prof.-alexandre-vranjac/areas-de-vigilancia/imunizacao/
http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de...
).

População ou amostra; critérios de inclusão e exclusão

No estudo, foram incluídas todas fichas de notificação de alteração de temperatura enviadas ao GVE 29 pelas 192 salas de vacinação dos seus 67 municípios adscritos no período de 2010 a 2017. Foram excluídas do estudo as fichas de notificação de alteração de temperatura que não foram encontradas, ou faltavam cópias com os pareceres da Divisão de Imunização; as que continham imunobiológicos para animais, como vacinas contra a raiva canina e felina, que organizacionalmente são de responsabilidade do setor de Zoonose dos municípios; que continham soros homólogos e heterólogos, cuja dose depende do peso do indivíduo e da situação do acidente, não tendo como mensurar o número de doses alteradas e perdidas por alteração de temperatura; as que continham o Palivizumabe (anticorpo monoclonal humanizado), imunobiológico administrado para a prevenção da infecção pelo vírus sincicial respiratório em prematuros(1111 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria SAS/MS nº 522, de 13 de maio de 2013. Aprova o protocolo de uso do Palivizumabe [Internet]. 2013 [cited 2020 Jun 14]. Avaiable from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/sas/2013/prt0522_13_05_2013.html
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); que possuíam o campo "conduta recomendada" em branco, sem resposta quanto à avaliação realizada pela Divisão de Imunização do CVE; e as que continham apenas diluentes, uma vez que os mesmos não necessitam de refrigeração e, portanto, não alteram sua potência e eficácia com a alteração de temperatura.

Assim, a amostra foi constituída por 341 notificações de alteração de temperatura, conforme mostra a Figura 1.

Figura 1
Fluxograma de inclusão das fichas de notificação de alteração de temperatura do Grupo de Vigilância Epidemiológica 29, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, 2018

Protocolo do estudo

Os dados foram coletados utilizando instrumento elaborado pelos autores, contendo variáveis da Ficha de Notificação de Alteração de Temperatura, como: município da notificação, perda de vacinas (sim, não), período de ocorrência da notificação (janeiro a março, abril a junho, julho a setembro, outubro a dezembro), motivos das alterações de temperatura (estruturais - falta de energia elétrica, problemas de instalação elétrica na unidade de saúde, alteração na regulagem do termostato; profissionais - problemas no transporte, equipamento desligado acidentalmente da rede elétrica ou porta do refrigerador aberta; não informado); tipo de equipamento (refrigerador industrial, refrigerador doméstico, caixa térmica de polipropileno ou caixa de isopor com bobinas de gelo); serviço notificador (Atenção Primária: Unidade Básica de Saúde, Unidade Básica de Saúde da Família, Centro de Saúde, Vigilância Epidemiológica; Atenção Especializada: ambulatório, hospital, centro de especialidades; Unidade de Urgência/Emergência; Unidade Prisional); dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE(1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População [Internet]. 2018 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://ww2.ibge.gov.br/home/mapa_site/mapa_site.php#populacao
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) (classificação dos municípios por número de habitantes) e do Portal de Informações de Saúde do Ministério da Saúde - DATASUS(1313 Ministério da Saúde (BR). DATASUS. Informações de Saúde [Internet]. 2018 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?pni/cnv/dpnisp.def
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) (número de salas de vacinação por município; serviços de atenção à saúde).

Análise dos resultados e estatística

Para caracterizar a perda de vacinas por alteração de temperatura, foram utilizadas técnicas de estatística descritiva e inferencial, a partir do cruzamento da variável dependente "perda de vacinas" com as variáveis independentes: período de ocorrência das notificações; motivos das alterações de temperatura; tipo de equipamento; classificação dos municípios por número de habitantes; número de salas de vacinação por município; e serviços de atenção à saúde, aplicando o teste de Regressão Linear Múltipla.

Considerou-se como desfecho das análises das fichas de notificação: doses de vacinas expostas a temperaturas inadequadas, doses perdidas (desprezadas após a alteração de temperatura) e doses utilizadas (administradas após a alteração de temperatura).

Para a análise do percentual de doses alteradas, doses perdidas e doses utilizadas após a alteração de temperatura, em relação às doses aplicadas, considerou-se: o número total de doses alteradas no período do estudo; número total de doses perdidas e número total de doses utilizadas após alteração no período do estudo; total de doses aplicadas no período, por município, que foram agrupados em até 10.000 habitantes, 10.001 a 50.000 habitantes, 50.001 a 500.000 habitantes.

Os resultados de independência entre as variáveis se deram através de análise entre os valores de p (zero a um), com erro padrão de 5% (p≤0,05).

Embora a ficha de notificação solicite a quantidade dos imunobiológicos em número de doses, foram encontradas notificações com a quantidade em número de frascos. Nestes casos, o número de frascos foi transformado em número de doses, considerando a apresentação dos frascos, que varia ao longo do tempo e conforme o laboratório fabricante. Para tanto, considerou-se: Vacina BCG: 10 doses; Vacina hepatite B (recombinante): 10 doses; Vacina Hepatite A: uma dose; Vacina poliomielite 1 e 3 (atenuada) - VOP: 25 doses; Vacina poliomielite 1, 2 e 3 (inativada) - VIP: 10 doses; Vacina rotavírus humano G1P1[8] (atenuada) - VORH: uma dose; Vacina febre amarela (atenuada): 10 doses; Vacina influenza (fracionada, inativada): 10 doses; Vacina pneumocócica 23-valente (polissacarídica): uma dose; Vacina pneumocócica conjugada 10 valente - Pneumo 10: uma dose; Vacina meningocócica C (conjugada): uma dose; Vacina Haemophilus influenzae B (conjugada): uma dose; Vacina raiva (inativada): uma dose; Vacina varicela: uma dose; Vacina adsorvida difteria e tétano adulto - dT: 10 doses; Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis, hepatite B (recombinante) e Haemophilus influenzae B (conjugada) - DTP/HB/Hib (Penta): uma dose; Vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis - DTP: 10 doses; Vacina sarampo, caxumba, rubéola (atenuada) - SCR (Tríplice viral): 10 doses; Vacina sarampo, caxumba, rubéola e varicela (atenuada) - Tetra Viral: uma dose; Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis (acelular) adulto - dTPa: uma dose; Vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis (acelular) infantil - dTPa: uma dose; Vacina papilomavírus humano 6, 11, 16, 18 (recombinante) - HPV quadri: uma dose.

RESULTADOS

Conforme observado na Tabela 1, das 341 notificações de alteração de temperatura recebidas pelo GVE 29 durante o período do estudo, 239 (70,1%) foram por motivos estruturais, como falta de energia elétrica, problemas de instalação elétrica na unidade de saúde, alteração na regulagem do termostato; 76 (22,3%) ocorreram por motivos profissionais (problemas no transporte, equipamento desligado acidentalmente da rede elétrica ou porta do refrigerador aberta); 197 (57,8%) ocorreram em refrigeradores industriais; 146 (42,8%) foram notificadas por municípios com mais de 50 mil habitantes; e 311 (91,2%) ocorreram em serviços de atenção básica.

Tabela 1
Caracterização das notificações de alteração de temperatura segundo o ano de notificação, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, 2018

As notificações de perdas de vacinas foram significativamente maiores em municípios com mais de 50.000 habitantes (p=0,020); municípios com mais de cinco salas de vacinação (p=0,039); e em serviços de Atenção Primária à Saúde (p<0,001) (Tabela 1).

O maior número de notificações de alteração de temperatura ocorreu nos anos de 2015 (55 ocorrências - 16,1%) e 2016 (53 ocorrências - 15,5%). Duzentas e oitenta e cinco (83,6%) notificações desencadearam perda de imunobiológicos (Tabela 2).

Tabela 2
Descrição das perdas de vacinas segundo o ano de notificação, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, 2018

As notificações de alteração de temperatura englobaram 398.336 doses de vacinas em todo o período, com maior concentração de doses nos anos de 2015 (21,3%), 2016 (15,6%), 2017 (13,3%) e 2010 (13,1%). Desse total, 20.608 (41,4%) doses foram perdidas/inutilizadas (Tabela 3).

Tabela 3
Descrição das doses perdidas e utilizadas em relação às alteradas segundo o ano de realização da notificação, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, 2018

Conforme observado na Tabela 4, a perda de doses de vacinas por alteração de temperatura nos municípios do GVE 29 representa 2,1% do total das doses aplicadas em toda a região. Além disso, 3,0% das doses utilizadas sofreram alteração de temperatura antes da administração. O percentual de doses perdidas em relação às aplicadas foi maior nos municípios menores (até 10.000 habitantes), apesar de eles notificarem menos.

Tabela 4
Descrição das doses alteradas, perdidas e utilizadas em relação às doses aplicadas segundo a classificação dos municípios e notificação, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, 2018

Nove municípios, que representam 13,4% do total de municípios do GVE 29, não realizaram notificação de alteração de temperatura no período do estudo e foram considerados municípios "silenciosos", ou seja, municípios que possuem salas de vacinação, mas não notificaram ocorrência de alteração de temperatura e cujos motivos são desconhecidos. A maioria desses municípios (77,8%) possui até 10.000 habitantes, conta com apenas uma sala de vacinação e, juntos, somaram 214.668 doses de vacinas aplicadas no período de 2010 a 2017. Dois municípios possuem de 10.001 a 50.000 habitantes, três salas de vacinação e realizaram a aplicação de 165.342 doses de vacinas no período.

DISCUSSÃO

A Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) e Organização Mundial da Saúde (OMS) têm demonstrado preocupação com o sistema de armazenamento de vacinas, em todos os países(99 Samad SA. Perdas de vacinas: razões e prevalência em quatro unidades federadas do Brasil [Dissertação] [Internet]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2011 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://repositorio.unifesp.br/handle/11600/9923
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,1414 Organização Mundial da Saúde (OMS). Termoestabilidade das vacinas. Programa Global para vacinas e imunizações. Genebra: OMS; 1998.). Embora a perda de vacinas seja esperada em toda a Rede de Frio, é importante saber se a perda pode ser prevenida e como evitá-la(11 Crosewski F, Larocca LM, Chaves MMN. [Avoidable losses of immunobiologicals in the local instance: reflections on the nursing work process]. Saúde Debate. 2018;42(116):203-13. doi: 10.1590/0103-1104201811616 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/0103-11042018116...
,99 Samad SA. Perdas de vacinas: razões e prevalência em quatro unidades federadas do Brasil [Dissertação] [Internet]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2011 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://repositorio.unifesp.br/handle/11600/9923
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).

O aumento das perdas de doses ocorrido entre outubro e março, nos anos de 2011 a 2014 e 2017 pode estar relacionado às condições climáticas, com aumento de chuvas e frequentes episódios de queda de energia(1515 Centro integrado de informações agrometeorológicas de São Paulo (CIIAGRO). Monitoramento Climatológico: Início da Estação EMA: 08/03/2008 até 26/11/2018. Município: São José do Rio Preto (EMA) - SP [Internet]. 2018 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.udop.com.br/download/estatistica/economia_chuvas/2008a2018_historico_sjose_rio_preto.pdf
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). Esta hipótese é reforçada pela alta frequência de perdas por motivos estruturais, como falta de energia elétrica sem comunicação prévia ocorrida após chuvas, quedas de raios e tempestades, desligamento do disjuntor na caixa de distribuição elétrica ou por causas desconhecidas.

O desligamento do disjuntor das salas de vacinação pode acontecer devido à falta de alerta de não desligá-lo(1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...
-1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
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), contrapondo o recomendado pelo PNI, que orienta destacar o aviso "Não Desligar" nos quadros de energia elétrica e nas chaves de energia que abastecem os refrigeradores das salas de vacinação e/ou da Rede de Frio, a fim de evitar a perda de imunobiológicos(44 Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de normas e procedimentos para vacinação [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_procedimentos_vacinacao.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
).

Adversidades relacionadas à energia elétrica e refrigeração são frequentes em países em desenvolvimento. Diante disso, monitorar o armazenamento, manuseio e a temperatura de estabilidade de vacinas é importante e pode contribuir para a busca de soluções de baixo custo, que atendam às necessidades desses países e/ou favoreçam o desenvolvimento de imunobiológicos mais estáveis(11 Crosewski F, Larocca LM, Chaves MMN. [Avoidable losses of immunobiologicals in the local instance: reflections on the nursing work process]. Saúde Debate. 2018;42(116):203-13. doi: 10.1590/0103-1104201811616 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/0103-11042018116...
,99 Samad SA. Perdas de vacinas: razões e prevalência em quatro unidades federadas do Brasil [Dissertação] [Internet]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2011 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://repositorio.unifesp.br/handle/11600/9923
http://repositorio.unifesp.br/handle/116...
,1414 Organização Mundial da Saúde (OMS). Termoestabilidade das vacinas. Programa Global para vacinas e imunizações. Genebra: OMS; 1998.,1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...
).

Outros motivos estruturais como problemas de instalação elétrica nas unidades e defeitos nos aparelhos de refrigeração são relatados na literatura e evidenciam as condições precárias das unidades básicas de saúde (UBS) e a falta de manutenção preventiva dos equipamentos, necessária para a estabilidade da Rede de Frio(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,77 Raglione D, Bezerra GAM, Lopes MH, Nerger MLBR, Guimarães TC, Sartori AMC. [Evaluation of the cold chain for vaccine conservation in primary healthcare centers in the South and Midwest regions of São Paulo city, Brazil, in 2011-2012]. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(1):65-74. doi: 10.5123/S1679-49742016000100007 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201600...
,1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede...
-1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
).

Dentre os motivos profissionais que levam à perda de vacinas, estão a falta de energia elétrica com comunicação prévia; a alteração na regulagem do termostato do equipamento; alterações durante o transporte; equipamento desligado da rede elétrica por acidente; e porta do refrigerador aberta. As falhas humanas comprometem a qualidade do serviço, assim como a conservação das vacinas, mesmo com equipamentos modernos e de boa qualidade(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...
,1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede...

18 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
-1919 Siqueira LG, Martins AMEBL, Versiani CMC, Almeida LAV, Oliveira CS, Nascimento JE, et al. [Assessment of the organization and operation of vaccine rooms in primary health care in Montes Claros, Minas Gerais, Brazil, 2015]. Epidemiol Serv Saúde. 2017;26(3):557-68. doi: 10.5123/S1679-49742017000300013 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201700...
).

Estudos realizados no nordeste brasileiro evidenciaram várias falhas na prática dos profissionais das salas de vacinação, que contribuem para a exposição dos imunobiológicos a variações de temperatura, como a falta de termômetros para o monitoramento da temperatura das caixas térmicas; não substituir o gelo reutilizável no final da manhã/início da tarde, aliada à não realização da ambientação das bobinas de gelo; e erros referentes à organização interna das geladeiras domésticas, que podem contribuir para o aumento da temperatura, caso haja cortes de energia elétrica ou defeito nos refrigerados(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
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,1919 Siqueira LG, Martins AMEBL, Versiani CMC, Almeida LAV, Oliveira CS, Nascimento JE, et al. [Assessment of the organization and operation of vaccine rooms in primary health care in Montes Claros, Minas Gerais, Brazil, 2015]. Epidemiol Serv Saúde. 2017;26(3):557-68. doi: 10.5123/S1679-49742017000300013 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201700...
). Para minimizar estas falhas, a partir do segundo semestre de 2010, o GVE 29 aumentou a oferta de capacitações para os profissionais das salas de vacinação.

Por outro lado, estudo realizado em unidades básicas de saúde do município de São Paulo sugere que a Rede de Frio está sendo totalmente utilizada, não sendo possível acomodar novas vacinas incorporadas ao PNI, situação que se agrava durante as campanhas de vacinação; e detecta outras situações que comprometem a qualidade dos imunobiológicos, como a manutenção da temperatura fora das recomendações do fabricante e a limpeza inadequada dos refrigeradores e caixas térmicas. Para os autores, apesar de implicar custos adicionais, houve aumento da frequência de transporte da grade de vacinas de rotina para as UBS nos últimos anos, a fim de evitar superlotação da Rede de Frio, quando da introdução de novas vacinas, e perdas de imunobiológicos por queda de energia, frequentes em algumas unidades(1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...
).

A literatura também relata outras situações comprometedoras em relação ao processo de trabalho na Rede de Frio, como não disponibilizar refrigeradores exclusivos para o armazenamento de vacinas; ausência de termômetros para registro das temperaturas mínima e máxima; equipamentos desgastados; salas de vacinação e refrigeradores expostos à alta incidência do sol; ausência de controle e registro da temperatura dos equipamentos; distância inadequada entre os refrigeradores e a parede; atuação de profissionais sem capacitação e conhecimentos adequados nas salas de vacinação(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...

17 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede...
-1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
).

Todavia, estudo realizado na Espanha revela que os problemas na conservação de vacinas não são exclusividade do Brasil. Em Madrid, 23,3% de unidades públicas de saúde não realizavam controle diário da temperatura(2020 Arbiza PA, Vicente RA, Rábago MLG, Rojas VD, Molina PO, Pardo JRJ. Cadena del frío para la conservación de las vacunas en los centros de atención primaria de un area de Madrid: mantenimiento y nível de conocimientos. Rev Esp Salud Pública. 2002 [cited 2020 Jun 14];76(4):333-46. Available from: http://scielo.isciii.es/pdf/resp/v76n4/original6.pdf
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). Em Valência, 75,0% dos centros de saúde não registravam diariamente o controle de temperatura; em 33,8% das geladeiras havia presença de alimentos e em 39,7% dos refrigeradores, as vacinas não estavam dispostas corretamente(2121 Hueso BC, Sánchez OR, Pérez IC, Peiró S. La cadena de frío vacunal en un departamento de salud de la Comunidad Valenciana. Gac Sanit. 2009;23(2):139-43. doi: 10.1016/j.gaceta.2008.03.003
https://doi.org/10.1016/j.gaceta.2008.03...
).

A alteração de temperatura não implica necessariamente em mudanças nas características físicas do produto, e por vezes, não se identifica a perda da sua capacidade de proteger contra a doença(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,2020 Arbiza PA, Vicente RA, Rábago MLG, Rojas VD, Molina PO, Pardo JRJ. Cadena del frío para la conservación de las vacunas en los centros de atención primaria de un area de Madrid: mantenimiento y nível de conocimientos. Rev Esp Salud Pública. 2002 [cited 2020 Jun 14];76(4):333-46. Available from: http://scielo.isciii.es/pdf/resp/v76n4/original6.pdf
http://scielo.isciii.es/pdf/resp/v76n4/o...
). Porém, em caso de alterações nas propriedades das vacinas, pode ocorrer aumento da morbimortalidade por doenças imunopreveníveis, como ocorrido nos Estados Unidos em 2011, com as taxas de coqueluche(2222 Parmar D, Baruwa EM, Zuber P, Kone S. Impact of wastage on single and multi-dose vaccine vials: Implications for introducing pneumococcal vaccines in developing countries. Hum Vaccin. 2010;6(3):pii: 10397. doi: 10.4161/hv.6.3.10397
https://doi.org/10.4161/hv.6.3.10397...
).

Acredita-se que o maior número de notificações por municípios mais populosos está relacionado à melhor estrutura do sistema de vigilância, pois estes municípios geralmente contam com equipes exclusivas para as ações de vigilância epidemiológica, apresentam maior investimento financeiro na Rede de Frio e na capacitação dos profissionais, organizando-se melhor quanto ao monitoramento e supervisão da conservação dos imunobiológicos. Já os municípios menores, por contarem com menor número de profissionais, notificam menos ou, muitas vezes, não notificam, levantando a suspeita de que a falta de notificação pode ser decorrente da subnotificação e não da inexistência de casos de alteração de temperatura.

A literatura aponta que os municípios de pequeno porte possuem maior número de salas de vacinação em situações críticas e relaciona este fato às dificuldades de alocação e capacitação dos profissionais, que muitas vezes possuem vínculo temporário, gerando alta rotatividade e dificultando o engajamento necessário nas atividades das salas de vacinação. Além disso, nestes municípios é comum que o enfermeiro assuma diversas responsabilidades na unidade de saúde, acumulando funções que podem prejudicar a atuação nas salas de vacinação, comprometer o controle da conservação dos imunobiológicos e gerar falhas no processo de notificação dos casos de alteração de temperatura(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,2323 Ribeiro AB, Melo CTP, Tavares DRS. [The importance of the nurse role in the vaccination room: an integrative review]. Rev Enferm UFJF. 2018;3(1):37-44. doi: 10.34019/2446-5739.2017.v3.3914 Portuguese.
https://doi.org/10.34019/2446-5739.2017....
).

Possíveis subnotificações são abordadas em estudos que apontam maior ocorrência de erros no manuseio das vacinas do que os registros, apesar da refrigeração adequada ser sempre oferecida como garantia. Nesse contexto, há preocupação com relação à subnotificação de episódios de alteração de temperatura, pois se os imunobiológicos foram expostos a temperaturas fora dos padrões e não houve notificação, eles foram utilizados na população(77 Raglione D, Bezerra GAM, Lopes MH, Nerger MLBR, Guimarães TC, Sartori AMC. [Evaluation of the cold chain for vaccine conservation in primary healthcare centers in the South and Midwest regions of São Paulo city, Brazil, in 2011-2012]. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(1):65-74. doi: 10.5123/S1679-49742016000100007 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201600...
,1414 Organização Mundial da Saúde (OMS). Termoestabilidade das vacinas. Programa Global para vacinas e imunizações. Genebra: OMS; 1998.).

Estudos brasileiros realizados em estados do Sudeste e do Nordeste obtiveram os piores percentuais de avaliação em relação às condutas dos profissionais frente à alteração de temperatura, mostrando falta de comunicação das ocorrências à instância superior, sob alegação de desconhecimento da ficha de registro de imunobiológicos sob suspeita. Estes resultados evidenciam que as subnotificações comprometem o funcionamento da Rede de Frio. Além disso, apontam os estudos, as vacinas não são preservadas em temperatura ideal (+2 C a +8ºC) até que a instância superior se pronuncie, sendo desprezadas sem qualquer avaliação(22 Oliveira VC, Gallardo MDPS, Arcêncio RA, Gontijo TL, Pinto IC. [Assessment of quality of vaccine storage and conservation in primary health care centers]. Ciên Saúde Coletiva. 2014;19(9):3889-98. doi: 10.1590/1413-81232014199.12252013 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/1413-81232014199...
,77 Raglione D, Bezerra GAM, Lopes MH, Nerger MLBR, Guimarães TC, Sartori AMC. [Evaluation of the cold chain for vaccine conservation in primary healthcare centers in the South and Midwest regions of São Paulo city, Brazil, in 2011-2012]. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(1):65-74. doi: 10.5123/S1679-49742016000100007 Portuguese.
https://doi.org/10.5123/S1679-4974201600...
,1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede...
).

Nesse contexto, cabe destacar que possíveis casos de subnotificação podem causar vieses nos resultados deste estudo, uma vez que o preenchimento das fichas de notificação é realizado por profissionais dos municípios notificantes que, por motivos diversos (desconhecimento, medo de punição, constrangimento, imperícia, negligência, entre outros), podem distorcer ou emitir fatos. Nesse caso, é fundamental o treinamento e a supervisão adequada dos funcionários que atuam nas salas de vacinação da unidades de saúde(2323 Ribeiro AB, Melo CTP, Tavares DRS. [The importance of the nurse role in the vaccination room: an integrative review]. Rev Enferm UFJF. 2018;3(1):37-44. doi: 10.34019/2446-5739.2017.v3.3914 Portuguese.
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).

Nos anos de 2010 e 2012, municípios com mais de cinco salas de vacinação apresentaram número significativo de notificações, com perda de doses. Com o passar dos anos, municípios com menor número de salas passaram a notificar mais. Este fato pode estar relacionado às capacitações, orientações e estímulos frequentes do GVE 29, objetivando conscientizar os profissionais sobre a necessidade e importância da notificação de alteração de temperatura, sem punições.

Ainda, o predomínio de ocorrências de alteração de temperatura e perda de vacinas em serviços de atenção primária é fato esperado e confirma a necessidade de reorganização destes serviços, conforme proposto pelo Ministério da Saúde, que prevê o gerenciamento da vacinação em nível local por unidades básicas de saúde, incluindo a Estratégia Saúde da Família, centros de saúde e a vigilância epidemiológica, onde são administradas todas as vacinas do calendário(66 Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Centro de Vigilância Epidemiológica "Prof. Alexandre Vranjac". Norma técnica do programa de imunização [Internet]. São Paulo: SESP; 2016 [cited 2020 Jun 14]. Available from: http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de-vigilancia-epidemiologica-prof.-alexandre-vranjac/publicacoes/norma-tecnica-do-programa-de-imunizacao
http://www.saude.sp.gov.br/cve-centro-de...
,1717 Santana RS. Avaliação da qualidade de conservação das vacinas da rede básica de saúde de um município do nordeste brasileiro [Dissertação]. São Luís: Universidade Federal do Maranhão; 2015 [cited 2020 Jun 14]. Available from: https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/1024
https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede...
-1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
).

Apesar do número de notificações em serviços da atenção primária ter sido maior em todo o período do estudo, especificamente nos anos de 2014 e 2017 houve significância em relação à perda vacinal nestes serviços. Estes resultados podem estar relacionados à introdução, em 2014, da vacina papilomavírus humano 6, 11, 16, 18 (recombinante) para os adolescentes, e da vacina adsorvida difteria, tétano, pertussis (acelular) adulto para gestantes e profissionais de saúde que atuam diretamente com recém-nascidos nos hospitais. Nestes casos, as UBS realizaram vacinação extramuros nas escolas e hospitais, com o aumento do número de doses vacinais. Em 2017, ocorreram epizootias positivas na região, com risco de transmissão da febre amarela para humanos, fazendo com que os municípios passassem a realizar vacinação em domicílios e áreas rurais, urbanas e de fronteiras, com participação de estagiários e funcionários de outros setores.

A autorização para utilizar mais da metade das doses de vacina alteradas, ocorrida sem a realização de retestes que comprovem sua potência, pode ser justificada pelo alto custo desta prática ao PNI, associada ao tempo necessário para esta verificação, motivos pelos quais os retestes somente são realizados em casos de notificações de alterações envolvendo grande número de doses(1616 Pereira DDS, Neves EB, Gemelli M, Ulbricht L. [Analysis of the utilization rate and loss of vaccines in the national immunization program]. Cad Saúde Colet. 2013;21(4):420-4. doi: 10.1590/S1414-462X2013000400010 Portuguese.
https://doi.org/10.1590/S1414-462X201300...
,1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
). Caso contrário, a Divisão de Imunização do Centro de Vigilância Epidemiológica do estado de São Paulo analisa a situação com base nos dados da notificação e emite parecer sobre o uso ou não dos imunobiológicos. Para tanto, leva-se em conta o conhecimento sobre a estabilidade de cada vacina, como a taxa de declínio da potência em uma temperatura, seguindo os requisitos exigidos pela OMS para o armazenamento(1414 Organização Mundial da Saúde (OMS). Termoestabilidade das vacinas. Programa Global para vacinas e imunizações. Genebra: OMS; 1998.).

Para evitar as condições que afetam a eficácia de uma vacina, é necessário que se desenvolvam imunobiológicos resistentes às condições adversas ou que sejam criados dispositivos de baixo custo, que registrem a exposição, evitando o longo e caro processo de reteste(1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
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).

Na China, estudo revelou que o armazenamento da vacina contra a hepatite B fora da Rede de Frio, por até três meses, não alterou a sua eficácia. As taxas de soroconversão ao anti-HbsAg das crianças vacinadas ao nascer com vacinas armazenadas sem e com refrigeração foram 81,6% e 81,9%, respectivamente(1414 Organização Mundial da Saúde (OMS). Termoestabilidade das vacinas. Programa Global para vacinas e imunizações. Genebra: OMS; 1998.).

Como não há um nível aceitável de perda vacinal, não se pode afirmar se a perda de vacinas por alteração de temperatura observada neste estudo foi grande ou não. Contudo, foi uma perda significativa quando comparada ao número de doses que sofreram alteração e às doses aplicadas, além do seu alto custo estimado.

De acordo com a literatura, o Brasil tem um custo anual de cerca de um milhão de reais com perda de vacinas, incluindo perdas técnicas e físicas(1818 Ribeiro DO, Castro F, Ferreira GC, Santos JC, Coutinho RMC. [The equipment maintenance and storage of vaccines in the Basic Health Units of the Southern District of Campinas]. J Health Sci Inst [Internet]. 2010 [cited 2020 Jun 14];28(1):21-8. Available from: https://www.unip.br/presencial/comunicacao/publicacoes/ics/edicoes/2010/01_jan-mar/V28_n1_2010_p21-28.pdf Portuguese.
https://www.unip.br/presencial/comunicac...
). No Canadá, há uma estimativa de perda de três milhões de dólares ao ano decorrente de alterações no armazenamento dos imunobiológicos, sendo que um quinto dos serviços de saúde canadenses não atendem as normatizações para o armazenamento e a manipulação adequada das vacinas(2222 Parmar D, Baruwa EM, Zuber P, Kone S. Impact of wastage on single and multi-dose vaccine vials: Implications for introducing pneumococcal vaccines in developing countries. Hum Vaccin. 2010;6(3):pii: 10397. doi: 10.4161/hv.6.3.10397
https://doi.org/10.4161/hv.6.3.10397...
).

Estes valores apontam para a necessidade de investimentos na produção de vacinas menos termolábeis, treinamento de profissionais envolvidos com a Rede de Frio e adequação do armazenamento de vacinas. A economia gerada com a diminuição das perdas justifica o subsídio para investimentos em novas tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS), atualmente tão onerado.

Não obstante, é imprescindível que os níveis locais definam, junto às Secretarias Estaduais de Saúde, a logística da Rede de Frio, de modo a garantir a adequação dos equipamentos e espaços físicos, as necessidades de armazenamento, estocagem e distribuição, com manutenção preventiva e corretiva de equipamentos e da energia elétrica, por meio da utilização de geradores e o aproveitamento da energia solar. A análise e identificação de erros a serem corrigidos são fundamentais para que os serviços garantam a segurança das vacinas e a manutenção das coberturas vacinais, imprescindíveis para a prevenção de doenças na população.

Limitações do estudo

O estudo apresenta como limitação o delineamento. Por tratar-se de avaliação de serviços de saúde, a discussão dos resultados deve considerar a realidade local. Além disso, as fragilidades no preenchimento das fichas de notificação de alteração de temperatura, como a falta de informação sobre os motivos da alteração de temperatura e da conduta da Divisão de Imunização, comprometem a qualidade da informação e a definição de ações adequadas de intervenção. Há ainda, escassez de trabalhos recentes discutindo a perda de doses de vacinas por alteração de temperatura, o que dificulta uma discussão mais aprofundada dos resultados. A realização de estudos mais abrangentes, com bases de dados nacionais, pode contribuir para aprofundar a discussão sobre o tema.

Contribuições para a área da enfermagem e saúde pública

O estudo contribui com a saúde pública ao produzir informações importantes sobre falhas no processo de armazenamento e conservação dos imunobiológicos na Rede de Frio, permitindo o direcionamento de ações que minimizem perdas por alteração de temperatura, reduzam possíveis riscos à saúde da população e evitem desperdício de recursos financeiros do SUS. Além disso, contribui com a equipe de Enfermagem ao apontar as principais causas das perdas de vacinas, favorecendo a gestão dos cuidados de conservação dos imunobiológicos. Os resultados podem fortalecer o monitoramento e favorecer a formulação de intervenções que melhorem a eficácia, eficiência e efetividade na conservação de vacinas, contribuindo para a atuação da enfermagem nas salas de vacinação.

CONCLUSÕES

A perda de vacinas por alteração de temperatura foi significativa quando comparada ao número de doses que sofreram alteração e às doses aplicadas, representando um custo elevado, tanto operacional quanto financeiro. Apesar das fragilidades inerentes ao processo de notificação, especialmente relacionadas ao adequado preenchimento das fichas de notificação de alteração de temperatura, o sistema de monitoramento se mostrou importante para assegurar a qualidade e a segurança dos imunobiológicos disponibilizados para a população.

Conclui-se que prevenir as alterações de temperatura dos imunobiológicos é fundamental para reduzir gastos financeiros e para garantir a utilização segura dos imunobiológicos, sua potência e eficácia na prevenção de morbimortalidade da população por doenças imunopreveníveis.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Hugo Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    20 Jan 2020
  • Aceito
    13 Set 2020
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