Recomendações de enfermeiros às dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia

RESUMO

Objetivos:

analisar as recomendações de enfermeiros sobre as dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia.

Métodos:

estudo qualitativo, exploratório e descritivo, realizado mediante aplicação de questionário sociodemográfico e de formação, leitura de caso clínico e realização de entrevista semiestruturada. Participaram 14 enfermeiros de hospital referência em nefrologia da Região Sudeste. No aporte técnico de tratamento dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo temática.

Resultados:

as recomendações contemplaram o exercício da empatia; monitoramento das emoções a partir da implementação da consulta de enfermagem; compartilhamento contínuo das tensões, anseios e desejos; conhecimento da própria emoção; ampliação da disponibilidade para ouvir; efetivação da abordagem em equipe e grupos de convivência.

Conclusões:

o reconhecimento das dimensões psicoafetivas de pacientes, no contexto da atuação do enfermeiro, favorece a ampliação dos espaços de escuta terapêutica, acolhimento e convivência interpessoal na nefrologia, essenciais na produção do cuidado em saúde integral.

Descritores:
Cuidados de Enfermagem; Afeto; Pacientes; Hospitalização; Nefrologia

ABSTRACT

Objectives:

to analyze nurses’ recommendations on the psycho-affective dimensions of patients hospitalized in nephrology.

Methods:

a qualitative, exploratory and descriptive study, carried out by applying a sociodemographic and training questionnaire, reading a clinical case and conducting a semi-structured interview. Fourteen nurses from a reference hospital in nephrology in the Southeast participated. In the technical input of data treatment, thematic content analysis was used.

Results:

the recommendations included the exercise of empathy; monitoring of emotions from the implementation of the nursing consultation; continuous sharing of tensions, anxieties and desires; knowledge of one’s emotion; increased availability to listen; effectiveness of the approach in teams and social groups.

Conclusions:

recognizing patients’ psycho-affective dimensions, in the context of nurses’ performance, favors the expansion of therapeutic listening spaces, welcoming and interpersonal coexistence in nephrology, essential in the production of comprehensive health care.

Descriptors:
Nursing Care; Affect; Patients; Hospitalization; Nephrology

RESUMEN

Objetivos:

analizar las recomendaciones de enfermeras sobre las dimensiones psicoafectivas de los pacientes hospitalizados en nefrología.

Métodos:

estudio cualitativo, exploratorio y descriptivo, realizado mediante la aplicación de un cuestionario sociodemográfico y formativo, la lectura de un caso clínico y la realización de una entrevista semiestructurada. Participaron 14 enfermeras de un hospital de referencia en nefrología de la Región Sureste. En el insumo técnico de tratamiento de datos se utilizó el análisis de contenido temático.

Resultados:

las recomendaciones incluyeron el ejercicio de la empatía; seguimiento de las emociones desde la implementación de la consulta de enfermería; compartir continuamente tensiones, ansiedades y deseos; conocimiento de la propia emoción; mayor disponibilidad para escuchar; efectividad del enfoque en equipos y grupos sociales.

Conclusiones:

el reconocimiento de las dimensiones psicoafectivas de los pacientes, en el contexto de la actuación del enfermero, favorece la ampliación de espacios de escucha terapéutica, recepción y convivencia interpersonal en nefrología, imprescindibles en la producción de una atención integral de salud.

Descriptores:
Atención de Enfermería; Afecto; Pacientes; Hospitalización; Nefrología

INTRODUÇÃO

O cuidado de enfermagem em nefrologia incide em um complexo universo de significados implícitos em seu agir e fazer cotidiano, seja no vínculo terapêutico estabelecido com paciente, no atendimento prestado, na interação junto à equipe e família, ou mesmo na elaboração e uso de estratégias educativas em saúde⁽¹⁾. Neste cenário, estabelece-se, entre as distintas pessoas envolvidas nesse processo, enfermagem, paciente e família, as emoções, sensações e afetos imbricadas entre si, por vezes, em uma tríade em que permeiam elementos externos ligados aos comportamentos e às demandas específicas de cuidado⁽²⁾.

Sabe-se que a doença renal crônica (DRC) altera significativamente o contexto de vida dos pacientes e de sua família, considerando-se os efeitos e respostas comportamentais gerados pelo diagnóstico e tratamento^(3-4). Durante a hospitalização, desafios como a formação de vínculo com a equipe e paciente, os mecanismos de aceitação experenciados, a relação entre família, ciclo de amigos e comunidade, entre outros, em conjunto, sinalizam a amplitude e abrangência da atuação da enfermagem em nefrologia⁽⁵⁾.

Pensar as dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados nesse contexto exige do enfermeiro a utilização de ferramentas como a comunicação, a interação, o diálogo, a escuta e a disponibilidade, por se tratar de um mecanismo de interlocução essencial para o cuidado de enfermagem capaz de fortalecer o processo de adesão, adaptação e recuperação em meio às limitações impostas pela doença^(2,6).

Entende-se que o cuidar do enfermeiro engloba um complexo arsenal de técnicas e tecnologias integradas no pensar, fazer e assistir o ser humano desenvolvido pelo profissional, com vistas a melhoria da qualidade de vida do paciente e família⁽¹⁾. Neste processo, torna-se fundamental o desenvolvimento de ferramentas e habilidades ligadas à capacidade técnica e humanística no lidar com os aspectos emocionais e intersubjetivos na nefrologia, favorecendo a escuta terapêutica no âmbito do cuidado de enfermagem^(5-6).

Em ambiente hospitalares como a nefrologia, o enfermeiro passa a conviver com a dualidade de percepções e sentimentos do paciente, e que podem revelar, em alguns casos, problemas de baixa autoestima, ansiedade, instabilidade emocional, perda ou diminuição das atividades cotidianas, sofrimentos e medo da morte^(1,4,7). Tais aspectos podem estar associados ao não entendimento sobre o processo saúde-doença, fatores ambientais e insegurança por não saber como se comportar e se adaptar diante de situações adversas⁽²⁾.

Neste contexto, ainda se observam entraves na prática do enfermeiro centrada em aspectos biológicos ou técnicos dos pacientes, o que contribui significativamente para o aumento do estresse e medo comumente identificados no tratamento da DRC⁽⁷⁾. Em alguns casos, lidar com as emoções e afetos acaba sendo negligenciado pelo profissional, dificultando o estabelecimento do vínculo, diálogo, além da própria adesão ao tratamento⁽⁵⁾.

A atenção às dimensões psicoafetivas do paciente hospitalizado em nefrologia por parte do enfermeiro favorece a criação do espaço de acolhimento, empatia e confiança para compreensão do outro e de si, bem como, em alguns momentos, fortalece apoio espiritual e emocional durante a internação^(2,6). Dito isso, delineou-se para este estudo a seguinte questão norteadora: quais recomendações são feitas por enfermeiros para atender às dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia?

Reconhece-se que a atenção às dimensões psicoafetivas no âmbito da nefrologia potencializa a produção intersubjetiva do cuidado integral da enfermagem, ampliando as bases terapêuticas da interação, do respeito e da ética^(2-3).

OBJETIVOS

Analisar as recomendações de enfermeiros sobre as dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Este estudo se atentou às normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa. O anonimato dos participantes foi assegurado e seus depoimentos identificados com a letra inicial E para palavra “Enfermeiro”, seguindo-se da ordem alfanumérica (1, 2, 3, até 14) conforme o código final apresentado (E1, E2, E3, até E14).

Tipo de estudo

Qualitativo, exploratório e descritivo.

Procedimentos metodológicos

Inicialmente, realizou-se uma visita ao serviço e contato com a Chefia de Enfermagem, momento no qual foi esclarecido que a condução da pesquisa manteria assegurada e ininterrupta a assistência ao paciente. Isto posto, deu-se a inserção e familiarização do pesquisador no serviço mediante o encontro com os enfermeiros para esclarecimento sobre o estudo, esclarecer eventuais dúvidas e efetuar o agendamento da coleta. O contato com esses profissionais se deu de forma privativa, e as entrevistas aconteceram conforme o cronograma estabelecido, em sistema de rodízio, geralmente entre os horários de 15h às 17h e de 19h às 21h.

Participaram do estudo 14 enfermeiros, na faixa etária entre 30 e 55 anos, selecionados conforme os critérios: ser enfermeiro responsável pelo cuidado de paciente no plantão diurno e noturno e ter, no mínimo, seis meses de experiência no setor de nefrologia. Como critérios de exclusão: não ter participado de algum momento da coleta de dados e estar de licença médica. Para a saturação dos dados, foi considerada a repetição das respostas no tempo dispensado por cada enfermeiro durante as etapas de produção resultante da leitura do caso clínico, das respostas individuais no questionário impresso para identificação dos diagnósticos e pelas informações e recomendações sugeridas na entrevista semiestruturada.

Cenário do estudo

Foi uma antessala de um hospital universitário de grande porte, referência em nefrologia, localizado na região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, Brasil. A escolha se deu porque esse é um espaço possível de ser ocupado para pesquisar e por ser familiar para os enfermeiros, que comumente utilizam para a realização de reuniões, rodas de conversas, debates, palestras, treinamentos, capacitações e atualizações com outros profissionais de enfermagem.

Coleta e organização dos dados

A produção dos dados aconteceu no período de novembro de 2017 a abril de 2018. Inicialmente, realizou-se o convite aos enfermeiros para participarem da pesquisa, seguindo-se da leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após o aceite, foi entregue o instrumento contendo texto digitado e impresso em folha A4 sobre o caso clínico, confeccionado a partir das evidências científicas e diagnósticas identificadas na especialidade clínica. Após a leitura do caso, os participantes elencaram os principais diagnósticos de enfermagem e as recomendações para cada um deles.

No segundo momento, procedeu-se com a aplicação do questionário contemplando dados sociodemográficos e de formação dos profissionais; em seguida, realizou-se a entrevista semiestruturada, gravada em aparelho digital (formato MP3), tendo como pergunta norteadora central: quais suas recomendações para atender às dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia? Após transcrição dos depoimentos, a leitura e releitura do material produzido possibilitou conhecer as respostas emocionais e afetivas percebidas pelos profissionais sobre os pacientes com DRC.

Ressalta-se que cada enfermeiro compartilhou suas impressões sobre os elementos relevantes a partir do instrumento, descrevendo recomendações consoantes ao atendimento às dimensões psicoafetivas de pacientes na hospitalização em nefrologia mediante uma reflexão e crítica sobre o cuidado prestado. Para manter o rigor do processo de organização dos dados, foram considerados os critérios estabelecidos no Consolidated criteria for REporting Qualitative research (COREQ)⁽⁸⁾.

Análise dos dados

A análise de conteúdo temática foi empregada como aporte técnico, uma vez que sua utilização pressupõe o seguimento de etapas distintas, a saber: pré-análise; exploração do material ou codificação; tratamento dos resultados; inferência; interpretação⁽⁹⁾. Realizaram-se as transcrições dos depoimentos gravados na integra, a leitura flutuante e a releitura exaustiva do material produzido.

A análise temática do corpus considerou os registros de maior frequência⁽⁹⁾. Ao final, uma grande categoria foi identificada, intitulada “Recomendações às dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia” a partir de suas unidades de registro.

RESULTADOS

Os participantes do estudo foram todos enfermeiros atuantes no serviço de nefrologia (n=14), em sua maioria mulheres (n=10), casadas (n=10), na faixa etária entre 30 a 45 anos (n=10) e entre 45 e 55 anos (n=4).

Considerando-se o aporte técnico adotado e o processo de análise dos depoimentos, identificaram-se as principais recomendações dos enfermeiros sobre as dimensões psicoafetivas dos pacientes e suas respectivas definições. Elaborou-se o Quadro 1 sistematizando a categoria temática principal, contemplando as setes unidades de registro e os respectivos depoimentos ilustrando cada uma delas.

Quadro 1
Recomendações de enfermeiros sobre as dimensões psicoafetivas de pacientes hospitalizados em nefrologia

Unidades de Registro	Depoimentos
Exercício da empatia	[...] o primeiro exercício é o da empatia. É o de olhar o paciente não a partir da sua patologia, mas para muito além dela. (E3) [...] eu preciso saber se ele está receptivo, pois muitas das vezes ele pode se sentir agredido. Se ele estiver receptivo, vou segurar na mão dele, olhar para ele, nos seus olhos, falar calmamente do que precisa ser modificado. (E8) [...] às vezes a gente acha que o paciente com doença renal crônica é igual a todos. Não. Ele é individualizado! [...] quando o enfermeiro identifica o que ele precisa, sabe o que fazer para melhorar a vida dele. (E1)
Monitoramento das emoções, a partir de consultas de Enfermagem	A consulta de enfermagem, a avaliação de enfermagem em si. Só que é muito difícil você conseguir conversar com todos os pacientes diariamente. Você acaba conversando mais com aqueles que estão entrando, que estão iniciando o tratamento, porque vem com mais dúvidas, com maior necessidade de cuidado. (E7) [...] que fosse feito um atendimento, uma consulta de enfermagem, inicial, principalmente com os pacientes de hemodiálise. (E10) Através de uma entrevista, uma anamnese que poderia ser feita a cada mês, a cada semana. [...] para visualizar os problemas que ele vai apresentar; e o enfermeiro interferir conforme a necessidade. (E4)
Compartilhamento contínuo das tensões, dos anseios e dos desejos	A gente tem muita atenção ao gerenciamento, muita atenção à escala, muita atenção a máquina de hemodiálise, porque a máquina até hoje ela é considerada o diferencial dentro da hemodiálise. A máquina é a que assusta, a máquina é a que dá problema, a máquina é a grande estrela da situação, quando na verdade a grande estrela deveria ser o paciente que está sendo tratado. (E5) [...] eu acho que essa questão de individualizar o paciente, ver ele como um todo, isso ajuda muito. (E1)
Reconhecimento da própria emoção	[...]que o enfermeiro esteja aberto, que ele se permita estar atento para as dimensões psicoafetivas, que nem sempre são contempladas nas suas ações. (E2)
Ampliação da disponibilidade para ouvir	[...] o enfermeiro só vai conseguir alcançar essas dimensões psicoafetivas [...] se ele estiver disposto a ouvir [...] e ainda [...] estabelecer o diálogo; criar um vínculo com o paciente; se mostrar disposto a ouvir. (E6) O enfermeiro orienta, orienta, orienta, e não ouve [...] muitas das vezes, o paciente quer falar, mas o enfermeiro está mais preocupado em passar as informações. (E8) [...] eu observaria. E para atender eu conversaria sempre com esse paciente, manteria proximidade, faria algumas perguntas simples, como: como foi seu dia? Como o senhor está? Como foi a semana? Como você está se sentindo? buscando abrir um diálogo, e a partir dessa abertura ir me aprofundando. (E13) [...] ouvir bastante, estar apto a ouvir, observando, usar da comunicação, principalmente, para entender esse paciente como um todo. (E14) [...] é muito complicado você falar com o paciente dentro da sala de diálise, porque? Porque o amigo fica escutando o que você fala. (E7)
Efetivação da abordagem em equipe	Se for um enfermeiro líder de plantão, vai envolver a equipe, vai fazer a supervisão, vai ver se a equipe está lidando com o paciente de forma acolhedora, de forma amena, se está sendo cordial, e se está sendo capaz de ouvir os pacientes. [...] às vezes, o enfermeiro incentiva a equipe, mas a própria dinâmica do centro de diálise não possibilita que isso aconteça. O direcionamento de enfermagem acaba sendo inferior, de acordo com a portaria, com a RDC, que fala que pode ser um enfermeiro a cada 75 pacientes, mas não dá não. (E2) Primeiramente estudar. Estar sempre observando, lendo artigos de outros enfermeiros [...] buscando trazer para mim a experiência dos outros, ler artigos sobre saúde mental, ler livros e ouvir. (E14) Acho que ter recursos para acolher e incentivar o paciente é tão importante quanto saber fazer uma punção bemfeita, manusear um equipamento da hemodiálise com segurança. [...] ter um enfermeiro instrumentalizado no atendimento das dimensões psicoafetivas é tão importante quanto dominar a técnica, manusear a máquina, realizar o curativo do cateter. Ao meu ver são dois aspectos que se complementam: a realização segura da técnica e o atendimento dessas dimensões psicoafetivas dos pacientes. (E11)
Efetivação de grupos de convivência	[...] que o enfermeiro negocie com a direção do centro de diálise, e que ele [...] tente instituir grupos de convivência, onde as pessoas possam conversar na presença de psicólogos ou que os enfermeiros possam ser os facilitadores desses encontros. (E2)

As recomendações contemplaram o exercício da empatia, a capacidade do profissional olhar além da doença, respeitando a individualidade do paciente; monitoramento das emoções, a partir da implementação da consulta de enfermagem e suas principais etapas; a necessidade do compartilhamento contínuo das tensões, anseios e desejos; ter um olhar além da máquina; atentar para o reconhecimento da própria emoção e aos aspectos psicoafetivos do cuidar propriamente ditos; ampliação da disponibilidade para ouvir; fortalecendo o vínculo; efetivação da abordagem em equipe, integrando especialmente a enfermagem; efetivação da criação de grupos de convivência no serviço.

DISCUSSÃO

A enfermagem em nefrologia lida diariamente com diversos pacientes e com as respectivas modalidades de tratamento. Desses, exige-se um olhar centrado para as dimensões psicoafetivas, ou seja, que vá além dos aspectos fisiológicos da DRC, imbricado, por vezes, em uma relação terapêutica e com o reconhecimento da autoestima, das emoções e dos afetos^(2-3).

Os participantes do estudo consideram que a atuação do enfermeiro no cenário da nefrologia implica, sobretudo, no exercício da empatia, que reflete no agir ético do profissional e na capacidade em se colocar no lugar do outro ou vice-versa⁽¹⁰⁾. O exercício da empatia requer atitudes que transformem as relações entre as pessoas, fortalecendo o vínculo entre quem cuida e quem está sendo cuidado, tornando-o benéfico e positivo.

Nesse cenário, situações como alterações fisiológicas e clínicas dos pacientes podem demandar do enfermeiro a adequação de sua abordagem, a fim de mantê-la terapêutica. Comportamentos de hostilidade e agressividade podem ser ocasionados pela elevação de ureia e creatinina, indicando possíveis manifestações neuropsiquiátricas como a ansiedade e depressão, decorrentes, por vezes, da diminuição da imunidade, insegurança, perdas, angústia e medo do desconhecido⁽⁷⁾.

Os enfermeiros destacam que o cuidado de enfermagem sensível e empático melhora a adesão terapêutica, especialmente na internação, considerando aspectos ligados à entrada, permanência e saída dos pacientes no hospital^(1-3). Geralmente, a rotina de cuidados envolve o uso regular das medicações, a monitorização dos sinais vitais, a realização de testes diagnósticos, após protocolos dietéticos e de exercícios, abstinência de abuso de substâncias e acompanhamento regular por especialistas⁽¹¹⁾.

Entende-se que a maneira como o paciente vivencia o tratamento é pessoal, ou seja, cada um desenvolve mecanismos próprios, que podem ser de tolerância, frustrações, manutenção de relações, ou mesmo de projetos futuros. Alguns lidam melhor com a doença, procurando se informar e motivar, outros apresentam maiores dificuldades e buscam alternativas para se adequar ao novo estilo de vida^(12-13).

A iniciativa é instrumentalizá-los todos os dias sobre esse processo, para que aprendam a lidar com os próprios comportamentos e, também, com as emoções⁽¹²⁾. Manter uma escuta atenta e qualificada, um diálogo efetivo e olhar ampliado são ações que podem favorecer o autocuidado, melhorar a adesão ao tratamento e, também, fortalecer o vínculo entre que cuida e é cuidado, tornando-o, além de instrumental-técnico, terapêutico^(3,13).

Nessa experiência, os enfermeiros perceberam que os comportamentos são produtores de atenção à saúde. Todos reconheceram que precisam perceber mais o paciente durante sua permanência no hospital, olhar por inteiro para ele, sabendo acolhê-lo e incentivá-lo ao autocuidado^(11,14). Aquele quem ajuda, que percebe no outro as dimensões psicoafetivas, exerce com naturalidade a empatia. É a empatia quem dá vez e voz às várias nuances do cuidado humano, tornando-o seguro, integral, sensível e acolhedor^(3,15).

Reconheceram ainda que precisam adotar uma postura mais aberta na interação com o paciente, desenvolver a autopercepção, tornando hábito a escuta sensível e o olhar ampliado^(3,15). Por serem ações de cunho terapêutico, encontram-se voltadas para repensar a abordagem, o fornecimento de orientações e esclarecimento de dúvidas, e o cuidado técnico, como manusear a máquina, puncionar a fistula arteriovenosa, fazer o curativo, até mesmo realizar uma consulta de enfermagem^(1,16).

Inúmeras foram as questões gerenciais apontadas pelos enfermeiros, e que, se não consideradas como fundamentais, podem alterar significativamente o padrão de autocuidado diário do paciente^(4,6). Dentre elas está a consulta de enfermagem, uma ferramenta da saúde que requer abordagem compartilhada e alinhada da equipe. Colocá-la em prática na nefrologia demanda disponibilidade para escutar, além da compreensão de que essa é uma ferramenta que não pode, de forma alguma, ser desacreditada ou ter seu conteúdo esvaziado⁽¹⁶⁾. É através dela que os enfermeiros estabelecem hábitos saudáveis, monitorizam as emoções, ensinando o autocuidado⁽²⁾.

Gerenciar exige, portanto, o domínio dessa pluralidade, o compartilhamento contínuo das tensões, anseios e desejos, o autorreconhecimento emocional - uma vez que os princípios fundamentais do cuidado, em espaços coletivos, tendem a lograr êxito somente a partir da articulação efetiva entre as esferas administrativas, assistenciais, educativas e pesquisa. Ambos devem acontecer de forma ativa, crítica e propositiva⁽¹⁷⁾.

Embora a máquina seja considerada pelos participantes como a protagonista e elemento fundamental à saúde do paciente que ali está, é, também, a grande geradora de alterações nos padrões emocionais. Daquele que depende de uma máquina para obter uma melhor qualidade de vida, espera-se o desenvolvimento de estratégias como grupos de convivência que permitam melhorar seu relacionamento com o processo em si, coping⁽¹⁴⁾. Ou seja, desenvolver habilidades comportamentais e cognitivas que permitam controlar as demandas do ambiente interno e externo, o gerenciamento do evento estressor, o controle, a redução ou mesmo a eliminação de respostas emocionais, uma vez que esse processo nem sempre acontece de maneira harmoniosa^(17-18).

Entender essa gama de sentimentos e sensações, reflexo da dependência de uma máquina, requer dos enfermeiros uma postura que desperte no paciente o olhar para si durante todo o tratamento, ou seja, que além de dar vez e voz, instrumentalize-o ao autocuidado. Isto é, que desperte a autopercepção, fazendo com que se enxergue como o grande protagonista de sua saúde e de seu tratamento^(18-19).

Despertar a autopercepção requer dos enfermeiros um mergulho no mais íntimo de si, para se autoconhecer e conhecer o outro e, ainda, encontrar caminhos que garantam o resgate da autonomia⁽³⁾. Entender o cuidado nessas perspectivas significa associá-lo a uma maior valorização da vida, extrapolando-se, por meio de elementos como a recepção, a vinculação e a responsabilização, o foco de atenção aos sinais e sintomas, da doença à pessoa, integralmente⁽¹⁹⁾.

O cuidado integral é, assim, voltado para a pessoa, que necessita de múltiplos olhares, da multidisciplinaridade, que se encontra, por vezes, vinculada a um sistema de saúde quase sempre transversal, em rede⁽²⁰⁾. Perceber-se imbricado nesse processo é um caminhar rumo à conquista da autonomia do paciente e, também, tornar possível a integralidade do cuidado.

Ao considerar essas questões acerca do cuidado integral, a educação permanente em saúde, um conjunto de ações que garantem o acolhimento e a orientação do paciente e de sua família se apresenta como uma oportunidade de melhoria ao tratamento⁽²¹⁾. Para tornar esse processo terapêutico, psicólogos ou mesmo enfermeiros devem estar presentes, direcionando sua abordagem para a convivência com o processo em si.

Na prática do serviço da nefrologia, pensar o cuidado integral ainda é um desafio, em especial para o enfermeiro, considerando o quantitativo de 35 atendimentos por turno de trabalho estabelecido pela Portaria do Ministério da Saúde Nº 389 de 2014, não contabilizando a assistência técnica, gerando, além de lacunas na garantia do acolhimento e orientação, desgaste diário da equipe de saúde⁽²²⁾. Mesmo diante dessa limitação, em 7 de junho de 2018, foi instituída uma nova Portaria, Nº 1.675, que aumenta o quantitativo de atendimentos do enfermeiro para 50 pacientes em cada turno de diálise⁽²³⁾.

Cabe a esses profissionais, que trabalham com pacientes com DRC, não apenas realizar as funções administrativas e assistenciais, mas também funções educativas e de pesquisa, principalmente para tentar suprir as falhas provenientes da atenção primária quanto ao diagnóstico precoce e tratamento⁽²⁴⁾. O cuidado integral, deve, assim, ser precedido da lógica da intencionalidade, da corresponsabilidade, da colaboração e da coparticipação dos envolvidos com a assistência⁽²⁰⁾.

Limitações do estudo

A participação de enfermeiros atuantes no campo prático estudado pode ser considerada pouca expressiva, vislumbrando-se o processo de mudanças efetivas na abordagem profissional ao paciente com DRC, além da necessidade de identificação dos fatores intervenientes, as demandas de cuidado e os elementos da intersubjetividade que envolve a percepção de si e do outro e as relações interpessoais. Sugere-se, desse modo, sua replicação, com amplitude de participantes, e em outras realidades, a fim de verificar a compatibilidade dos dados com outros serviços.

Contribuições para a área da enfermagem

A experiência permitiu aos enfermeiros refletirem, em profundidade e conteúdo, sobre o cuidado prestado ao paciente com DRC, atentando-se aos aspectos psicoafetivos, relevados nos cenários de tensões, anseios, desejos, necessidades e limitações comuns no ambiente de trabalho da nefrologia. Em algumas situações, tais elementos se apresentam no processo de comunicação cognoscível e cognoscente que incide diretamente na interação entre enfermeiro-paciente-ambiente-tratamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As recomendações propostas pelos enfermeiros se voltaram ao exercício da empatia; monitoramento das emoções do paciente a partir da implementação da consulta de enfermagem; compartilhamento contínuo das tensões, anseios e desejos; reconhecimento da própria emoção e aos aspectos psicoafetivos do cuidar propriamente ditos; ampliação da disponibilidade para ouvir; a efetivação da abordagem em equipe, bem como a criação de grupos de convivência no serviço. Observa-se que tais recomendações constituem poderosas ferramentas na produção de autoconhecimento e de autopercepção por parte dos profissionais, essenciais na aprendizagem e desenvolvimento de capacidades intelectuais, psíquicas, afetivas, interativas e emocionais para o cuidado em saúde integral.

O reconhecimento e a valorização da dimensão psicoafetiva pelo enfermeiro refletem no contexto psíquico e emocional do paciente na nefrologia, exigindo-lhes maior conhecimento científico e habilidade técnica para garantir o suporte terapêutico individual e grupal que estimule a criatividade, a autonomia, a solidariedade e a tomada de consciência. Reforça-se ainda a importância da ressignificação dos espaços de convivência no serviço, favorecendo o processo de acolhimento das emoções e afetos dos participantes, seja através da escuta ampliada, da dedicação ou mesmo do respeito a experiência subjetiva com a doença.

• FOMENTO
  Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

AGRADECIMENTO

Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro (EEAN/UFRJ).

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Marcia Magro

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Maio 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  19 Jul 2020
• Aceito
  10 Dez 2020