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O paciente em centro de terapia intensiva: reflexão bioética

The patient in intensive care unit: bioethics considerations

Resumos

A proposta deste artigo é refletir sobre algumas dimensões da assistência aos pacientes internados em centro de terapia intensiva (CTI), buscando alguns subsídios teóricos na bioética, a partir dos princípios de justiça, autonomia e beneficência dos direitos do doente crítico e da humanização do atendimento É oportuno discutir as perspectivas que vem assumindo o cuidar em terapia intensiva, na busca de ultrapassar a visão que reduz os pacientes aos padrões biológicos, incorporando a vida em sua complexidade e plenitude.

Bioética; Centro de terapia intensiva


The aim of this article is to reflect on some dimensions of the assistance to patients in Intensive Care Unit (ICU), looking for some theoretical subsidies in bioethics considering the principles of justice, autonomy and beneficence, the rights of the critically ill, and the humanization of attendance. It is timely to discuss the perspectives that involve caring in the intensive care unit, searching to surmount the view that reduces the patients to biological patterns, incorporating life in all of its complexity and completeness.

Bioethics; Intensive care unit


ARTIGO ORIGINAL

O paciente em centro de terapia intensiva: reflexão bioética* * Adaptado do trabalho apresentado à disciplina "Bioética Fundamental", do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem Psiquiátrica, ministrada pelo Prof. Dr. Francisco de Assis Correia, na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, em 1996.

The patient in intensive care unit: bioethics considerations

Adriana Katia Corrêa

Enfermeira. Professora Assistente do Departamento de Enfermagem Geral e Especializada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo e aluna do Programa Interunidades de Doutoramento em Enfermagem

RESUMO

A proposta deste artigo é refletir sobre algumas dimensões da assistência aos pacientes internados em centro de terapia intensiva (CTI), buscando alguns subsídios teóricos na bioética, a partir dos princípios de justiça, autonomia e beneficência dos direitos do doente crítico e da humanização do atendimento É oportuno discutir as perspectivas que vem assumindo o cuidar em terapia intensiva, na busca de ultrapassar a visão que reduz os pacientes aos padrões biológicos, incorporando a vida em sua complexidade e plenitude.

Unitermos: Bioética. Centro de terapia intensiva.

ABSTRACT

The aim of this article is to reflect on some dimensions of the assistance to patients in Intensive Care Unit (ICU), looking for some theoretical subsidies in bioethics considering the principles of justice, autonomy and beneficence, the rights of the critically ill, and the humanization of attendance. It is timely to discuss the perspectives that involve caring in the intensive care unit, searching to surmount the view that reduces the patients to biological patterns, incorporating life in all of its complexity and completeness.

Uniterms: Bioethics. Intensive care unit.

INTRODUÇÃO

Vivenciamos, atualmente, um momento de reestruturação do sistema de saúde, com a ampliação da concepção do processo saúde-doença, não mais compreendida apenas em seus determinantes biológicos, e com a tentativa de implantação do Sistema Único de Saúde.

Nesse contexto, emerge o usuário do setor saúde como participante efetivo do sistema, enquanto possibilidade de exercício da cidadania. É essa uma perspectiva que ainda não se dá no cotidiano da saúde, em sua plenitude. É um movimento que vem tentando se fortalecer.

Outra "novidade" que também podemos apreender no sistema de saúde, ainda que de forma restrita, é a discussão acerca da qualidade, na busca de formas de gestão dos serviços de saúde que visam a eficácia, a eficiência, a satisfação dos trabalhadores e dos clientes.

Nesse sentido, compreendo que apenas a lógica da técnica perfeita e do cientificismo não sejam suficientes no atendimento à saúde. Assim, a qualidade em saúde “(...) não é mais algo pressuposto nos agentes, devido a seu alto nível de formação ou de qualificação, mas algo que os envolvidos nos atos de saúde estarão constantemente preocupados em aferir e aperfeiçoar para dar maior satisfação aos que necessitam desses serviços. Portanto, admite-se, ao contrário do axioma que herdamos da medicina flexneriana, que o preparo científico do corpo de profissionais e o atributo high-tech dos equipamentos usados não garantem ipso facto a qualidade do ato” (7,p-17).

Em minha prática profissional, trabalhei como enfermeira assistencial, por alguns anos, em um centro de terapia intensiva (CTI) de um hospital escola. Compreendo que um CTI tem algumas características peculiares: a gravidade dos pacientes internados, a ênfase no conhecimento técnico-científico e na tecnologia, a ansiedade dos pacientes e familiares, a possibilidade, muitas vezes tão próxima, da ocorrência da morte, dentre outras.

Essas características levaram-me a refletir acerca dos valores éticos e humanos que envolvem o cuidar em terapia intensiva, emergindo alguns questionamentos: nesse local é possível pensar em formas de participação do paciente? Como é considerado o homem? As técnicas invasivas e os recursos tecnológicos respondem as quais necessidades do ser humano? E possível humanizar esse serviço de saúde? Que direitos podem ser garantidos aos pacientes de terapia intensiva?

Nesse sentido, a proposta deste artigo é refletir sobre esses questionamentos inerentes à assistência prestada ao paciente internado em CTI, buscando alguns subsídios teóricos na bioética.

A Bioética

Penso que o movimento de resgate do paciente enquanto sujeito, participante das questões de saúde é ainda discreto frente ao desenvolvimento alcançado pela ciência em relação aos aparelhos de suporte vital, aos meios diagnósticos e terapêuticos, aos fármacos, aos transplantes de órgãos, dentre outros.

Esses avanços técnico-científicos, se por um lado podem trazer alguns benefícios à humanidade, por outro lado, podem produzir verdadeiros dilemas éticos no mundo da saúde.

Diante dessa situação, nasceu um movimento que busca conciliar a medicina com os valores éticos e humanistas, sendo o momento de maior projeção desse movimento a criação da bioética, há cerca de vinte anos nos Estados Unidos.(10)

Compreende-se hoje que “(...) a reflexão ética não pode limitar-se ao âmbito das relações interpessoais que constituem o relacionamento terapêutico. A ação do homem se estende ao biológico em toda a sua amplitude. A natureza viva é objeto não só de estudo, mas também de intervenções: estamos em condições de manipulá-la com resultados espetaculares, mas também, carregados de conseqüências para o futuro da humanidade (...)”.(10, p.20,21)

A bioética pode ser compreendida como o estudo interdisciplinar dos problemas gerados pelo progresso biomédico (em nível de relação individual, institucional ou de estrutura social), das suas repercussões e de seus sistemas de valores.(8)

Uma noção importante, então, é a interdisciplinaridade bioética que busca a articulação, o consenso de várias disciplinas relacionadas à área da saúde como também de outras áreas como a antropologia, a biologia, a sociologia, a política e a filosofia que se voltam à reflexão ética acerca da melhor conduta que pode ser prestada à pessoa humana, ao mundo vegetal e animal e à natureza.(4)

A bioética “(...) trata da VIDA: da natureza, da flora, da fauna e da vida humana, à luz dos valores humanos aceitos em uma sociedade democrática, pluralista, secular e conflitiva”. (4, p. 69)

Apreendo, no campo da saúde, um fervilhar de idéias e movimentos. O profissional de saúde quer conquistar um saber cada vez mais amplo, numa busca incessante de domínio dos conhecimentos técnico-científicos. Por outro lado, a clientela quer ser bem atendida, quer ser respeitada na sua individualidade ou, ter no mínimo, acesso garantido aos serviços de saúde. Ao mesmo tempo, a clientela quer também se utilizar de avanços tecnológicos já tão veiculados pela mídia, criando inclusive necessidades de consumo que sobrepujam as necessidades reais de saúde da maioria da população.

A intervenção da bioética faz-se necessária enquanto possibilidade de lançar luz nessas e em outras questões, resgatando os valores humanos.

Refere CORREIA (5, p.69) que “A atual situação da bioética tem demonstrado a urgência de um marco referencial ético em relação à prática da medicina e da assistência de saúde que responda, entre outras questões, à despersonalização dos cuidados no interior dos hospitais, à sistemática marginalização no interior dos serviços sanitários de certas categorias de pacientes, à tecnicidade da assistência (...)”.

Acredito que os profissionais que atuam na enfermagem precisam despertar para o movimento atual da bioética, revendo sua prática nos vários campos de atuação, bem como seus valores e atitudes, numa busca de resgatar a pessoa humana nas suas várias dimensões, por exemplo, biológica, psicológica, espiritual, política, social e filosófica.

O Paciente no Mundo Técnico-Científico do CTI

Um ponto inicial a ser tomado é que os centros de terapia intensiva enquanto unidades altamente especializadas que atendem, em nível terciário do sistema de saúde atual, pacientes em estado grave, utilizando uma tecnologia onerosa, representam uma questão particular dentro de toda a problemática de saúde do país, onde não se têm ainda resolvidas questões de infra-estrutura básica para garantir condições mínimas de vida e de saúde à maioria da população.

Nem todas as pessoas têm acesso a tais serviços e muitas que a eles têm acesso podem refletir problemas vivencidos nos níveis primários de saúde, como dificuldades de acesso, não resolutividade dos serviços, deficientes ações preventivas, bem como em outras instâncias sociais que extrapolam o campo da saúde. Tais problemas acabam levando os pacientes a condições graves expondo-os a tratamentos mais dolorosos, com riscos iatrogênicos.

Compreendo que se manifesta nesse ponto inicial a temática do direito à saúde, a qual é também tratada pela bioética, relacionada ao princípio da justiça. E o princípio da justiça que visa a garantia de "(...) distribuição justa, eqüitativa e universal dos benefícios dos serviços de saúde (..)". (8,p 20)

Outra característica da bioética é considerar o homem como sujeito e não somente objeto, sendo um dos princípios a autonomia que se refere "(..) à capacidade que tem a racionalidade humana de fazer leis para si mesma. Significa a capacidade de se autogovernar, escolher, dividir, avaliar (..)".(8,p.20)

No Brasil, de modo geral, o usuário do sistema de saúde pouco exerce essa autonomia. Ainda predomina uma relação na qual o profissional de saúde, detentor do saber técnico-científico, impõe ao cliente, objeto desse saber, suas receitas, ordens, cuidados e conselhos. Essa situação acaba por fortalecer uma cultura profissional que valoriza o paciente passivo, "o bonzinho". Cultura esta que se acentua na medida em que o paciente torna-se grave, menos capaz de cuidar de si mesmo, ou seja, de autogovernar-se.

Os pacientes em CTI, muitas vezes, ficam impedidos de falar, de se expressar com mais clareza, devido a presença de tubos, aparelhos de ventilação artificial, sedação, coma, dentre outros aspectos, perdendo o poder de controlar o seu próprio corpo quanto aos cuidados diários de higiene, vestimentas, alimentação, movimentação. Trata-se de uma sujeição total ou quase total aqueles que deles cuidam.

Nesses casos, não há praticamente nenhum grau de autonomia, nem mesmo em relação às atitudes mais próprias de cada um.

Comentam COHEN & MARCOLINO (3, p.57.58) que o princípio de respeito pela autonomia não pode ser completamente aplicado a pessoas que não estejam com possibilidade de agir de maneira autônoma, por serem, por exemplo, imaturas, incapacitadas, como as crianças, suicidas, dependentes de drogas. Referem ainda que “(...) o comportamento de pessoas não autônomas pode ser incontestavelmente controlado na base da beneficência, no sentido de protegê-las de perigos que podem resultar de seu comportamento. Aqueles que defendem os direitos da autonomia em bioética médica não negam que algumas formas de intervenção sejam justificadas se as pessoas forem inteiramente ou substancialmente não autônomas (..)”

Acredito que essa idéia possa se estender ao paciente de terapia intensiva. Em muitos momentos, a manutenção da sua vida exige que os profissionais da saúde tomem todas as decisões. Nesse sentido, emerge o princípio da beneficência: "(..) de bono facere (latim, fazer o bem ao paciente). O critério mais antigo da ética médica (..). As máximas deste critério são: FAZER O BEM, NÃO CAUSAR DANO, CUIDAR DA SAÚDE, FAVORECER A QUALIDADE (..)". (8, p.19.20)

CORREIA (4) comenta que hoje a beneficência encontra-se limitada pela dificuldade em se definir o que é bem do paciente, pela não aceitação do paternalismo que nela se encontra, pelo surgimento do critério de autonomia e pelas novas dimensões da justiça no campo da saúde.

Do mesmo modo, em se tratando do cuidar em CTI, torna-se difícil definir o que é bom para o paciente. São necessários dicernimento, empatia, sensibilidade para avaliar cada situação. Acredito que apesar da necessidade de técnicas invasivas, uso de aparelhos, ações rápidas e precisas, é possível resgatar a totalidade da pessoa humana, através de um outro “olhar” para o paciente de terapia intensiva. Esse outro “olhar”, sem dúvida, extrapola a lógica racional, a detecção somente de sinais sintomas que se diferem dos padrões de normalidade, ou seja, é preciso romper com a visão pela qual esses pacientes são reduzidos à vida biológica, a um corpo a ser manipulado.

Os procedimentos executados e os aparelhos utilizados respondem a algumas necessidades biológicas, mas não às necessidades da vida singular da pessoa humana.

Muitas vezes, face às dificuldades dessa prática, o que acaba prevalecendo é justamente o paternalismo, aí representado por atitudes dos profissionais que, apesar de bem intencionados, tendem a "infantilizar" o paciente, enfatizando, pois, ainda mais a sua dependência e impedindo a sua liberdade de escolha, já tão limitada pela gravidade do seu estado.

Uma situação que pode ocorrer em terapia intensiva é o profissional da saúde generalizar os pacientes, a ponto de sentir dificuldades em lidar com aqueles que estão apenas em observação ou aguardando a alta. Torna-se complicado cuidar aquele que fala, que pede, que indaga não apenas com o olhar, que se nega a alguns atos, que se queixa com clareza, ou seja, daquele que pode se manifestar, deixando emergir o sentimento de que ali permanece um ser de relações, um ser de possibilidades. Nesses casos, a relação com o paciente poder-se-ia deixar de ser tão verticalizada, tão concentrada no saber científico e no cumprimento de rotinas e tão despersonalizada.

Pensando nessa dificuldade, interrogo se é mais fácil lidar com o paciente quando entre ele e o profissional se interpõe a máquina.

Nesse sentido, o cuidar técnico em CTI torna-se complexo em muitos aspectos. Um banho, uma mudança de decúbito, uma higiene oral, procedimentos razoavelmente simples, aí exigem ainda mais cuidados principalmente, tendo em vista a atenção para que esses procedimentos não lesem os pacientes, desconectando-os, por exemplo, das máquinas que, no momento, dão sustentação à vida. Além disso, o uso de equipamentos exige a execução de outras técnicas, bem como observação rigorosa. Então, o que parece se tornar mais fácil?

Acredito que, justamente, a sujeição do paciente ao tratamento, aos cuidados, com poucas possibilidades de indagar e, principalmente, rejeitar. E, se isso ocorre deixa de ser o "bonzinho" e assume a denominação de "rebelde", "problema", o que explicita como é difícil vê-lo enquanto possível sujeito do seu cuidar.

A relação com a máquina pode mecanizar o cuidar, a ponto de o paciente tornar-se extensão do aparato tecnológico, não se percebendo até onde vai a máquina e tem início o ser humano. Relatam CIOSAK; SENA (2, P. 17) que um paciente admitido na UTI queixou-se a outro paciente acerca do ruído do monitor, obtendo a seguinte resposta:"(...) Não reclame, que este barulho aí é a sua vida e, se parar, comece a fazê-lo com a boca, senão eles te pulam no peito e te darão um murro, pois pensarão que você parou (...)".

Serão então incompatíveis os valores humanos e éticos com o desenvolvimento técnico-científico?

Na verdade, o horizonte ético é mais amplo que o horizonte da ciência e da técnica, mas situam-se ambos na mesma direção, que é a busca da liberdade. Quando as finalidades internas de ambos os sistemas não se compatibilizam à primeira instância, cabe a intervenção do horizonte ético, não para desmontar o processo técnico-científico, mas no sentido de compatibilizá-lo. Essa compatibilização não é possível em sistemas fechados. Um sistema ético detalhado até os mínimos comportamentos humanos, provavelmente, terá dificuldade em se conciliar com um sistema técnico-científico também intransigente. Ambos, assim, ficam limitados a se criticarem mutuamente de modo dogmático. Nesse sentido, somente os sistemas ético e científico abertos podem se lançar ao diálogo, convergindo ou divergindo com elevação e mútua tolerância.(8)

Desse modo, "(...) não é possível separar o ato humano livre e responsável do juízo ético e, por isso, da responsabilidade, pois todo ato livre tem um conteúdo: agir por alguma coisa ou sobre alguma coisa ou em relação a alguém e esse agir pode ser conforme ou disforme 3/4 mas jamais objetivamente indiferente ou nulo 3/4 em relação à pessoa que assim age e em relação aos seres que são destinatários desse agir(...)" (9. p.144)

Falar em humanização dos serviços, não enquanto um modismo, mas como um direito do paciente, torna-se um desafio, uma busca de novos valores, principalmente em CTI.

A Federação Mundial das Sociedades de Medicina Intensiva e Cuidados Críticos, através de um comitê de ética em cuidados intensivos, criado em 1989, estabeleceu os direitos do doente crítico: receber cuidados especializados que reduzam ao mínimo os riscos de morte ou de incapacidade permanente; obter informações adequadas sobre suas condições e a terapia; recusar tratamentos desde que informado das consequências de suas decisões; utilizar-se dos mais apropriados recursos disponíveis; receber visitas, bem como, se assim o desejar, apoio espiritual ou moral; ter a garantia de que as informações relativas ao seu cuidado sejam confidenciais; ser tratado com respeito e dignidade pela "staff" de cuidados intensivos; dentre outros. (6)

Compreendo que tais direitos são bem gerais, podendo servir como um guia norteador para a prática em terapia intensiva, os quais devem ser concretizados em estratégias de atendimento em cada contexto específico, não perdendo de vista a idéia exposta por Aguiar (1) : os direitos do paciente não se constituem apenas em leis ou códigos, mas são frutos dos conflitos, das tensões e contradições entre os grupos sociais.

Na literatura de enfermagem, principalmente a partir da década de 80, revelam-se preocupações com respeito à privacidade do paciente, à personalização do atendimento, à assistência psico-espiritual, à presença dos familiares, à informação sistemática acerca da gravidade, dos riscos, do prognóstico, dentre outros aspectos. Entretanto, acredito que, muitas vezes, esses aspectos parecem ser oferecidos como "cuidados extras", quando possível, a alguns pacientes, ao invés de serem formalmente reconhecidos, executados e avaliados com mais ênfase.

A gravidade, a dependência, o medo da morte e do desconhecido, o estresse da família podem tornar o paciente "desligado" dos seus próprios direitos, enquanto paciente hospitalizado e pessoa humana, tendo seu corpo entregue aos profissionais de saúde.

O respeito aos direitos dos pacientes na prática cotidiana em terapia intensiva, passa pelo questionamento dos próprios pacientes e familiares e pela abertura de espaços para diálogo com os próprios profissionais de saúde, tornando essa prática mais humanizada, apesar das limitações de ordem técnica que não podem ser negadas.

Acredito que não se trata apenas de buscar formalizações mas, principalmente, provocar discussões quanto as perspectivas que vêm assumindo o tratamento e o cuidar em terapia intensiva, buscando outras lógicas que incorporem, que resgatem a vida em sua complexidade e plenitude.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse mundo em constante transformação é relevante o repensar dos caminhos profissionais assumidos.

Os questionamentos que suscitaram essas reflexões circunscritas à prática em CTI e fundamentadas em algumas idéias da bioética, revelam a importância do redimensionamento de algumas concepções como homem, qualidade de vida, saúde, cuidado.

O repensar dessas concepções poderá mostrar caminhos para o cuidar ético em CTI, compreendido como aquele que, fundamentalmente, dirige-se ao homem em seu complexo existir, reconhecendo a dignidade da pessoa humana.

  • AGUIAR, R.A.R. Ética e direitos humanos. In: ASSAD, J.E. Desafios éticos Brasília, Conselho Federal de Medicina, 1993. p. 60-7.
  • CIOSAK, S.I.; SENA, S.G. A enfermagem em UTI: um momento de reflexão. São Paulo, Littera, 1993.
  • COHEN, C.; MARCOLINO, J.A.M. Relação médico-paciente: autonomia e paternalismo. In: SEGRE, M.; COHEN, C. Bioética São Paulo, EDUSP, 1995. p. 53-8.
  • CORREIA, F.A. Alguns desafios atuais da bioética. Rev. Eclesiástica Bras., v. 55. p. 65-86, março 1995.
  • CORREIA, F.A. A alteridade como critério fundamental e englobante da bioética. In: PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. Fundamentos da bioética São Paulo, Paulus, 1996. cap. 5, p. 68-74.
  • DECLARATION of the Council of the World Federation of Societies of Intensive and Critical Care Medicine. Ethical Guidelines, May 8, 1991. Intensive Crit. Care Digest, v. 11, n. 3, p. 41, 1992.
  • NOGUEIRA, R.P. Perspectivas da qualidade em saúde Rio de Janeiro, Qualitymark, 1994. cap.1 , p. 1-18: Introdução às questões da qualidade na perspectiva dos serviços de saúde.
  • PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE, C.P. Problemas atuais de bioética 2. ed. São Paulo, Loyola, 1994.
  • SGRECCIA, E. Manual de bioética: fundamentos e ética biomédica. São Paulo, Edições Loyola, 1996.
  • SPINSANTI, S. Ética biomédica São Paulo, Edições Paulinas, 1990.
  • *
    Adaptado do trabalho apresentado à disciplina "Bioética Fundamental", do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Enfermagem Psiquiátrica, ministrada pelo Prof. Dr. Francisco de Assis Correia, na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, em 1996.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 1998
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