Acessibilidade / Reportar erro

A prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência: uma revisão integrativa* * Artigo extraído da disciplina "A Tipesc e o enfrentamento da violência doméstica na perspectiva de gênero e geração", Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva, Programa de Pós-Graduação Interunidades de Doutoramento, Escola de Enfermagem/Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2014.

Resumo

OBJETIVO

Analisar a produção científica sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes no campo da saúde, considerando as categorias de gênero e geração.

MÉTODO

Revisão integrativa, cuja busca foi realizada nas bases de dados LILACS, PubMed/MEDLINE e SciELO.

RESULTADOS

Foram selecionados 30 artigos. Os resultados indicam que a maior parte dos estudos tratava da avaliação de intervenções por programas de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a). O método predominante foi o quantitativo, no que concerne à área de conhecimento os estudos concentram-se nas áreas de enfermagem, psicologia e medicina. A maioria dos cenários dos estudos foi constituída por escolas, seguidos de domicílio, hospital, centro de saúde e tribo indígena.

CONCLUSÃO

Constata-se que a análise do fenômeno não foi realizada a partir de uma perspectiva de gênero e geração, estando a produção científica pautada nos moldes positivistas de pesquisa, que se aproximam da lógica da saúde pública clássica e centrada na dimensão singular.

Descritores:
Adolescente; Violência; Violência Doméstica; Gênero e Saúde; Revisão

Abstract

OBJECTIVE

To analyze the scientific literature on preventing intimate partner violence among adolescents in the field of health based on gender and generational categories.

METHOD

This was an integrative review. We searched for articles using LILACS, PubMed/MEDLINE, and SciELO databases.

RESULTS

Thirty articles were selected. The results indicate that most studies assessed interventions conducted by programs for intimate partner violence prevention. These studies adopted quantitative methods, and most were in the area of nursing, psychology, and medicine. Furthermore, most research contexts involved schools, followed by households, a hospital, a health center, and an indigenous tribe.

CONCLUSION

The analyses were not conducted from a gender- and generation-based perspective. Instead, the scientific literature was based on positivist research models, intimately connected to the classic public healthcare model and centered on a singular dimension.

Descriptors:
Adolescent; Violence; Domestic Violence; Gender and Health; Review

Resumen

OBJETIVO

Analizar la producción científica acerca de la prevención de la violencia por pareja íntima entre adolescentes en el campo de la salud, considerando las categorías de género y generación.

MÉTODO

Revisión integradora, cuya búsqueda se llevó a cabo en las bases de datos LILACS, PubMed/MEDLINE y SciELO.

RESULTADOS

Fueron seleccionados 30 artículos. Los resultados señalan que la mayor parte de los estudios trataba de la evaluación de intervenciones por programas de prevención de la violencia por pareja íntima. El método predominante fue el cuantitativo; en lo que se refiere al área de conocimiento los estudios se concentran en las áreas de enfermería, psicología y medicina. La mayoría de los escenarios de los estudios estuvo constituida de escuelas, seguidos de domicilio, hospital, centro de salud y tribu indígena.

CONCLUSIÓN

Se constata que el análisis del fenómeno no fue realizado desde una perspectiva de género y generación, estando la producción científica pautada en los modelos positivistas de investigación, que se acercan a la lógica de la salud pública clásica y centrada en la dimensión singular.

Descriptores:
Adolescente; Violencia; Violencia Doméstica; Género y Salud; Revisión

Introdução

O reconhecimento da violência de gênero como uma questão de saúde e a inserção da temática como objeto de estudos nesta área é recente. Construído em consonância com o contexto de luta do feminismo pela visibilidade social e inclusão política do fenômeno, a partir da década de 1980, a produção de conhecimentos sobre violência no âmbito da saúde vem crescendo significativamente, constituindo também problemática inserida na agenda das políticas de saúde no Brasil. A maioria dos estudos sobre violência entre parceiros íntimos se dedica a investigar a violência nas relações conjugais entre adultos. Contudo, deste enfoque derivam, mais recentemente, os estudos voltados para a violência por parceiro(a) íntimo(a) entre jovens, também denominada, no âmbito internacional, de violência no namoro ( dating violence )(11 Organização Mundial da Saúde. Prevenção da violência sexual e da violência pelo parceiro íntimo contra a mulher: ação e produção de evidência [Internet]. Genebra: OMS; 2012 [citado 2014 dez. 05]. Disponível em: Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44350/3/9789275716359_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

O estudo realizado de 2007 a 2010 em escolas públicas e privadas de 10 capitais brasileiras foi um dos primeiros a investigar, especificamente no âmbito nacional, o tema da violência nas relações de intimidade entre os jovens de 15 a 19 anos. Revelou prevalência de 86,9% de vitimização e 86,8% de perpetração de algum tipo de agressão durante um relacionamento, com 76,6% dos rapazes e moças sendo, ao mesmo tempo, vítima e autor de variadas formas de agressão(22 Minayo MCS. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do "ficar" entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.). As recomendações apontam para a necessidade de estratégias de prevenção e enfrentamento da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência, tanto pela sua magnitude quanto pelas vulnerabilidades determinadas pelas vivências que marcam essa geração.

A vivência das primeiras relações afetivas e sexuais, determinadas pelas normas sociais vigentes em cada contexto e pela construção da identidade de gênero de meninos e meninas, pode estar relacionada com significativa vulnerabilidade em relação à experiência de vitimização ou perpetração da violência. Além disso, a violência na adolescência parece apresentar importante relação com a vitimização na infância, com a violência conjugal na fase adulta, assim como com a violência presenciada no contexto familiar e comunitário. Assim, o fenômeno é compreendido como um continuum , para o qual intervenções precoces voltadas à sua prevenção podem ser promissoras(22 Minayo MCS. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do "ficar" entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.).

A violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes tem especificidades próprias dessa faixa etária e é tão grave quanto a violência que ocorre entre adultos em termos de prevalência, lesões, danos psicológicos e sociais à vítima e, portanto, requer abordagem específica(11 Organização Mundial da Saúde. Prevenção da violência sexual e da violência pelo parceiro íntimo contra a mulher: ação e produção de evidência [Internet]. Genebra: OMS; 2012 [citado 2014 dez. 05]. Disponível em: Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44350/3/9789275716359_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

Contudo, não se pode reduzir a análise da violência entre adolescentes a questões centradas nos aspectos cronológicos e biológicos desse grupo social. É importante considerar a adolescência para além da dimensão etária do conceito, enfatizando os aspectos que se relacionam à inserção social desse grupo e às relações de poder estabelecidas pelas iniquidades de gênero, vivenciadas e naturalizadas no que tange a essa geração. Essa perspectiva precisa ser compreendida e considerada para a promoção de relacionamentos saudáveis e livres de violência.

Nesse contexto, as categorias gênero e geração são recortes férteis para trazer à tona importantes polaridades para a análise dos fenômenos sociais. A geração define o lugar ocupado pela adolescência, de modo que tais sujeitos são parte da sociedade e do mundo, sendo necessário conectá-los a estruturas sociais maiores(33 Egry EY, Fonseca RMGS, Oliveira MAC. Ciência, Saúde Coletiva e Enfermagem: destacando as categorias gênero e geração na episteme da práxis. Rev Bras Enferm. 2013;66(n.esp):119-33.).

Estudos avaliativos sobre programas de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) em diversas fases da vida revelam que uma abordagem precoce e fundamentada na equidade de gênero pode ser potente para intervir no desenvolvimento de trajetórias que rumam ao comportamento violento(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.-55 Foshee VA, Karriker-Jaffe KJ, Reyes HLM, Ennett ST, Suchindran C, Bauman KE, et al. What accounts for demographic differences in trajectories of adolescent dating violence? An examination of intrapersonal and contextual mediators. J Adolesc Health. 2008;42(6):596-604.). Estudos sobre as estratégias de prevenção desse fenômeno ainda são escassos na América Latina, a maioria significativa das pesquisas é oriunda de países da América do Norte(11 Organização Mundial da Saúde. Prevenção da violência sexual e da violência pelo parceiro íntimo contra a mulher: ação e produção de evidência [Internet]. Genebra: OMS; 2012 [citado 2014 dez. 05]. Disponível em: Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44350/3/9789275716359_por.pdf
http://apps.who.int/iris/bitstream/10665...
).

A abordagem da violência perpetrada por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes constitui uma necessidade concreta do campo da saúde, cujos conteúdos que norteiam a compreensão sobre as relações de intimidade reproduzem a visão hegemônica, alimentando contravalores que fomentam a violência e as iniquidades de gênero em diversas fases da vida. Assim, de modo a subsidiar o desenvolvimento de estratégias de superação desse cenário e diante da lacuna do conhecimento científico produzido a respeito da prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes, especialmente na América Latina, o presente estudo se propõe a analisar a produção científica sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes no campo da saúde, considerando as categorias de gênero e geração . Para alcançar o objetivo proposto, o estudo buscou, na literatura científica nacional e internacional, o estado da arte da produção do conhecimento sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência.

Método

Trata-se de uma revisão integrativa que seguiu a descrição das etapas recomendadas para a sua implementação: 1) elaboração da questão de pesquisa; 2) busca na literatura e definição dos critérios de inclusão e exclusão dos estudos; 3) definição das informações a serem extraídas e categorização dos estudos; 4) avaliação dos estudos incluídos; 5) interpretação dos resultados; 6) apresentação da revisão e síntese do conhecimento(66 Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2008;17(4):758-64.).

A questão de pesquisa definida para a revisão foi: Os estudos sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes consideram questões relativas a gênero e geração ?

Foi realizada a busca de artigos publicados até novembro de 2014 na base de dados LILACS, na SciElo e no PubMed/MEDLINE. Os descritores selecionados n PubMed foram os MeSH terms (Medical Subject Heading): Violence AND Adolescent AND Courtship AND Prevention & control. Na SciELO (Scientific Electronic Library Online) e na LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde) foram usadas as palavras-chaves Dating violence AND Prevention. Justifica-se a realização da busca utilizando-se diferentes termos na SciELO e na LILACS, pois, ao reproduzir a busca realizada no PubMed, não foram encontrados resultados. Como as referidas bases não utilizam MESHterms e sua equivalência não foi encontrada nos Descritores em Ciências da Saúde (DECS) utilizados, optou-se pelo uso das palavras-chaves selecionadas, o que permitiu a seleção do maior número de artigos publicados na SciELO e na LILACS. Ao se reproduzir a busca incluindo o MeSHterm AND Gender identity aos MeSHterms descritos anteriormente e a palavra chave AND Gender não foram encontrados artigos diferentes dos que já compilados na busca anterior. Para todas as buscas foram utilizados os mesmos descritores em Inglês, Português e Espanhol.

Foram definidos como critérios de inclusão: estudos que abordam a violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes, derivados de pesquisas primárias, dentre eles os disponíveis na íntegra, nos idiomas inglês, português ou espanhol. Os critérios de exclusão foram: estudos com deficiência metodológica ou que não contivessem os elementos componentes da metodologia científica.

A coleta de dados foi realizada no mês de novembro de 2014. As fontes mencionadas foram acessadas e a busca resultou em um total de 61 referências potenciais. A análise dos artigos, segundo os critérios de inclusão e exclusão, resultou em uma seleção de 30 estudos. Foram extraídos respectivamente, da LILACS, da SciELO e do portal PubMed, um, quatro e 25 artigos. Os 30 estudos selecionados foram analisados na íntegra por, no mínimo, duas pesquisadoras, buscando-se repostas à problemática da investigação a partir de um instrumento padronizado de análise de coleta de dados(77 Knafl K, Sandelowski M. "Mixed methods synthesis of research on childhood chronic conditions and family" [Internet]. Chapel Hill: UNC/School of Nursing; 2011 [cited 2015 Mar 22]. Available from: Available from: http://familysynthesis.unc.edu/etc/Final_Proposal.pdf
http://familysynthesis.unc.edu/etc/Final...
). Mediante a construção de um banco de dados, os achados foram organizados e sintetizados de modo que abrangeram a amostra do estudo, os objetivos, o objeto, a metodologia empregada, a síntese dos resultados e as conclusões, assim como os aspectos relativos à prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes.

Resultados

Na análise da produção nacional e internacional sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes, foram analisados 30 artigos científicos, entre os quais a abordagem quantitativa é predominante (n=23). Cinco estudos são de abordagem qualitativa e dois utilizam as duas abordagens. No que concerne ao país do estudo, há uma predominância de estudos norte-americanos, com os Estados Unidos da América representando 57% (n=17). Canadá, Tailândia, Espanha, Austrália, Reino Unido, Suécia, Portugal, Brasil, México, Chile, Colômbia e África do Sul são os países de origem dos demais estudos.

No que concerne à área de conhecimento, apenas um estudo é da área de educação, e os outros estudos, da área da saúde, concentram-se nas áreas de enfermagem, psicologia e medicina. A maioria dos cenários dos estudos foi constituída por escolas (n=21), seguidos de domicílio (n=2), universidades (n=2), hospital (n=1), centro de saúde (n=1), consultório médico (n=1), tribo indígena (n=1) e outro local (n=1).

Em relação ao período de publicação, o primeiro estudo foi publicado em 1997 e o último em 2013, ano de predominância dos estudos, que foram numericamente equivalentes nos anos 1998, 2000, 2001, 2008, 2010 e 2012. Na América Latina, o primeiro estudo foi publicado em 2010. Este dado confirma o quanto é recente e escassa a abordagem da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes nesse cenário. 17 estudos tratavam da avaliação de intervenções por programas de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes. Dentre eles, 14 programas tinham como base sessões curriculares aplicadas com grupos de adolescentes na escola, dois tratavam de outras abordagens desenvolvidas no ambiente escolar e um foi aplicado apenas no domicílio. Entre esses estudos, cinco investigaram o Safe Dates Program , que associa intervenções na escola e comunidade. Um dos estudos, desenvolvido em escola, descreveu o processo de intervenção de um programa que utiliza o teatro do oprimido como estratégia de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência.

A maior parte dos artigos avaliados era do tipo exploratório (n=11), seguidos por ensaios clínicos randomizados (n=8) que diziam respeito à avaliação de programas preventivos e por estudos longitudinais (n=5), quase-experimentais (n=3) e outros (n=3).

A maioria dos estudos teve como sujeitos adolescentes, homens e mulheres (n=25). Dois destes também incluíram a família como sujeito da pesquisa. Quatro estudos foram realizados apenas com mulheres jovens ou adolescentes do sexo feminino e um foi realizado apenas com adolescentes do sexo masculino.

No que concerne à técnica de produção dos dados, a maioria dos estudos (n=23) utilizou escalas e questionários, quatro utilizaram entrevistas e três, outras técnicas de produção de dados, como a observação de sessões de teatro, o uso de dados secundários, grupo focal e triangulação.

Foram utilizados instrumentos próprios desenvolvidos para o estudo ou adaptações de outros instrumentos. A Conflict in Adolescent Dating Relationships Inventory (CADRI) foi a escala mais utilizada, sozinha ou junto a outros questionários. Alguns estudos a adaptaram em parte, conforme os seus objetivos. ACASI, Safe Dates Evaluation, Safe Dates Physical Violence Perpetration Scale e Conflicts Tactics Scale foram outros instrumentos utilizados. Os estudos que utilizaram entrevistas tiveram como instrumentos roteiros com questões abertas e fechadas.

A maioria dos estudos quantitativos utilizou métodos estatísticos para análise dos dados, enquanto os qualitativos utilizaram predominantemente a análise de conteúdo seguida do software ATLAS Ti (n=3). Os objetos dos estudos analisados são apresentados no Quadro 1.

Quadro 1
Artigos que compuseram a amostra selecionada nas bases PubMed/MEDLINE, LILACS e SCIELO, publicados de 1997 a 2013 - São Paulo, 2014

Discussão

A partir da análise dos estudos na íntegra, constatou-se que significativa parte das pesquisas trata de estudos avaliativos sobre programas de prevenção da violência. Outra parte enfatiza a exploração do fenômeno a partir de aspectos relacionados à determinação da violência e suas repercussões na saúde, achados considerados pelos autores como relevantes para subsidiar a prevenção do fenômeno. A maioria dos estudos também traz dados sobre a magnitude do fenômeno na população investigada.

A análise dos artigos demonstrou que a violência por parceiro(a) íntimo(a) faz parte da realidade de adolescentes de ambos os sexos e dos diversos países nos quais foram realizados os estudos(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,99 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.,1212 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.-1313 Howard D, Qiu Y, Boekeloo B. Personal and social contextual correlates of adolescent dating violence. J Adolesc Health. 2003;33(1):9-17.,1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.,2020 Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.,2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.-2323 Wiklund M, Malmgren-Olsson EB, Bengs C, Ohman A. "He messed me up": Swedish adolescent girls' experiences of gender-related partner violence and its consequences over time. Violence Against Women. 2010;16(2):207-32.,3030 Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.). Trata-se de um fenômeno de elevada magnitude(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,99 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.,1212 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.-1313 Howard D, Qiu Y, Boekeloo B. Personal and social contextual correlates of adolescent dating violence. J Adolesc Health. 2003;33(1):9-17.,1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.,2020 Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.,2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.,3030 Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.), caracterizado pela perpetração e vivência de diversos tipos de violência(99 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.,1212 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.-1313 Howard D, Qiu Y, Boekeloo B. Personal and social contextual correlates of adolescent dating violence. J Adolesc Health. 2003;33(1):9-17.,2020 Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.,2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.

23 Wiklund M, Malmgren-Olsson EB, Bengs C, Ohman A. "He messed me up": Swedish adolescent girls' experiences of gender-related partner violence and its consequences over time. Violence Against Women. 2010;16(2):207-32.
-2424 Pick S, Leenen I, Givaudan M, Prado A. "Yo quiero, yo puedo... prevenir la violencia": programa breve de sensibilización sobre violencia en el noviazgo. Salud Mental. 2010;33(2): 153-60.,2626 Pradubmook-Sherer P. Youth attitudes toward dating violence in Thailand. Int J Offender Ther Comp Criminol. 2011;55(2):182-206.-2727 Póo AM, Vizcarra MB. Diseño, implementación y evaluación de un Programa de Prevención de la Violencia en el Noviazgo.Ter Psicol. 2011;29(2):213-23.,3030 Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.), tanto por parte dos meninos quanto das meninas(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,1111 Foshee VA, Linder F, MacDougall JE, Bangdiwala S. Gender differences in the longitudinal predictors of adolescent dating violence. Prev Med. 2001;32(2):128-41.

12 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.
-1313 Howard D, Qiu Y, Boekeloo B. Personal and social contextual correlates of adolescent dating violence. J Adolesc Health. 2003;33(1):9-17.,3232 Martsolf DS, Draucker CB, Brandau M. Breaking up is hard to do: how teens end violent dating relationships. J Am Psychiatr Nurses Assoc. 2013;19(2):71-7.), embora haja diferenças de gênero quanto aos tipos de violência vivenciados e perpetrados(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,1111 Foshee VA, Linder F, MacDougall JE, Bangdiwala S. Gender differences in the longitudinal predictors of adolescent dating violence. Prev Med. 2001;32(2):128-41.-1212 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.,1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.-1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.,2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.,2525 Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.).

Estudo sobre as percepções de meninas tailandesas quanto ao namoro e à violência por parceiro(a) íntimo(a), realizado com 24 adolescentes(1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.), revelou que 31% (n=7) delas vivenciaram comportamentos agressivos perpetrados pelo parceiro atual, como exigir que tenham relações sexuais, empurrões, estrangulamentos, ofensas, comportamentos manipulativos e arremesso de objetos. Entre as participantes, 81% (n=19) relataram ter vivenciado comportamentos de controle, como dizer à parceira onde ela deveria ir e a que horas deveria voltar para casa; criticar a roupa da parceira; proibir que tivesse amigos do sexo masculino e negar-lhe a possibilidade de decidir juntos o que o casal faria.

Em estudo realizado na Austrália(2020 Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.)foi evidenciado que 60% (n=74) das meninas relataram ter vivenciado ciúmes e comportamentos possessivos perpetrados pelo parceiro. No Canadá(3030 Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.), pesquisa com 1.259 adolescentes de ambos os sexos revelou que 13,6% (n=171) dos adolescentes relataram ter vivenciado e também perpetrado violência física, sendo 16,6% (n=125) do sexo feminino e 9,0% (n=46) do masculino. Outro estudo realizado na Espanha(2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.), com 567 adolescentes, de ambos os sexos, revelou que 96,3% (n=546) dos(as) adolescentes admitiram perpetrar violência psicológica em seus relacionamentos de intimidade, enquanto 95,4% (n=541) relataram vitimização. O percentual de adolescentes que relataram perpetrar violência física foi de 24,3% (n=138), sendo 16,1% (n=38) do sexo masculino e 30,2% (n=100) do sexo feminino, e 21,7% (n=123) relataram terem vivenciado este tipo de violência, sendo 26,3% (n=62) do sexo masculino e 17.5% (n=58) do sexo feminino.

Os estudos apresentados, embora tenham diferentes recortes metodológicos, revelam uma elevada magnitude do fenômeno e corroboram os resultados encontrados em uma pesquisa realizada em 10 capitais brasileiras com 3.205 adolescentes de ambos os sexos(22 Minayo MCS. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do "ficar" entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.). Os resultados indicaram que 86,9% dos(as) adolescentes já haviam sido vítimas de algum tipo de violência e 86,8% afirmaram ter praticado algum tipo de agressão durante o relacionamento. O relato de violência física sofrida variou de 24,2% a 15,9% nas 10 capitais, enquanto a perpetração de violência física variou de 34,1% a 17,9%. Quanto à violência verbal, 85% dos(as) adolescentes relataram vitimização e 85,3% perpetração. Deste modo, observa-se que adolescentes de ambos os sexos vivenciam e perpetram comportamentos violentos, sendo frequente a ocorrência dos diversos tipos de violência.

Partindo do referencial teórico e filosófico que busca a interpretação crítica dos dados a partir da categoria gênero(3737 Fonseca RMGS. Gênero e saúde da mulher: uma releitura do processo saúde doença das mulheres. In: Fernandes RAQ, Narchi NZ, organizadoras. Enfermagem e saúde da mulher. São Paulo: Manole; 2012. p. 30-68.), entende-se que a violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes também é um fenômeno social e historicamente construído e, por isso, determinado também pelas questões de gênero. Apesar de tratar-se de um ponto central para a discussão da violência por parceiro(a) íntimo(a) e dos resultados de diferentes estudos analisados(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,1111 Foshee VA, Linder F, MacDougall JE, Bangdiwala S. Gender differences in the longitudinal predictors of adolescent dating violence. Prev Med. 2001;32(2):128-41.-1212 Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.,1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.-1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.,2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.,2525 Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.)evidenciarem que ela apresenta características vinculadas ao sexo, essa categoria não compõe um ponto central de análise na maioria dos estudos desta revisão. Com exceção de um estudo realizado com adolescentes tailandesas sobre a naturalização da violência(1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.), os demais estudos, no máximo, diferenciaram algumas questões entre meninos e meninas.

Estudo norte-americano revelou diferenças significativas no estabelecimento da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes. Os meninos reportaram praticar mais violência do tipo severa do que as meninas. Para as meninas percebeu-se que os laços sociais desenvolvidos na escola estão associados a uma diminuição na probabilidade de perpetrar violência. Surpreendentemente, o mesmo não se mostra verdadeiro para os meninos, pois entre eles os laços sociais estão ligados a um aumento na probabilidade de praticar a violência nas relações com adolescentes de ambos os sexos(2525 Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.).

Outros resultados indicam a diferenciação sexual na ocorrência da violência por parceiro(a) íntimo(a). Um estudo identificou que as meninas reportaram uma frequência de perpetração de violência verbal e psicológica maior do que as reportadas pelos meninos(2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.). Essa diferença levanta diferentes questionamentos. Um deles já foi explorado pelos autores que questionam a relação desse perfil com a prática de autodefesa feminina, na qual meninas, ao serem mais violentadas fisicamente, acabam se defendendo por meio de comportamentos violentos verbais e psicológicos(2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.).

Contudo, se tomarmos essa questão abordada pelo artigo(2222 Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.)à luz de gênero, novos olhares são possíveis. Questiona-se, portanto, se as meninas de fato praticam mais violência psicológica ou se por questões pautadas no gênero, elas relatam mais em seus discursos esse comportamento do que os meninos. A segunda questão relaciona-se à naturalização em relação à violência verbal e psicológica, tendo em vista que muitos comportamentos e formas de tratamento que colocam as mulheres em posição inferior aos homens são aceitos e até mesmo estimulados pela sociedade nas relações entre meninos e meninas.

Um dos estudos(1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.)chama atenção para a naturalização e aceitação do fenômeno da violência. Apesar de ter sido realizado com adolescentes tailandesas e, portanto, estar sujeito a diferentes formas culturais, seus resultados evidenciam importantes questões de gênero a respeito da percepção e do impacto da violência entre jovens. Os resultados remetem à violência por parceiro(a) íntimo(a) como uma violência generificada e sustentada pelo modelo originado do patriarcado, que confere posições sociais diferenciadas para homens e mulheres e que, da mesma forma, classificam as próprias mulheres em diferentes grupos estigmatizados. A divisão entregarotas boas e más é uma constante, referida pela maior parte das adolescentes entrevistadas(1818 Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.). As primeiras são aquelas que reúnem qualidades valorizadas pela sociedade, como bom comportamento, educação e virgindade, estas serão as potencialmente escolhidas para casamentos. Já as segundas, serão aquelas com quem os homens terão relacionamentos casuais.

Tal visão remete ao estigma do sexo antes do casamento, proibido para as mulheres, mas socialmente aceito para os homens. Esse conceito estigmatizado que deliberadamente segrega e rotula as mulheres é corroborado noutro estudo Tailandês(2626 Pradubmook-Sherer P. Youth attitudes toward dating violence in Thailand. Int J Offender Ther Comp Criminol. 2011;55(2):182-206.), evidenciando a influência cultural na construção da identidade de gênero. O entendimento de que situações violentas são inevitáveis e até mesmo esperadas nos relacionamentos amorosos leva à naturalização do fenômeno, que subjuga as mulheres à autoridade masculina.

Programas de intervenção direcionados a escolas e, sobretudo, aqueles direcionados às famílias são eficientes no que tange à prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes(1616 Akers AY, Yonas M, Burke J, Chang JC. "Do you want somebody treating your sister like that?" Qualitative exploration of how African American families discuss and promote healthy teen dating relationships. J Interpers Violence. 2011;26(11):2165-85.,1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.). Contudo, é importante salientar que até mesmo a avaliação dessas medidas pode aparecer atravessada pela vivência dos papéis e normas de gênero no campo da sexualidade. Exemplo dessa característica é o que foi demonstrado por um estudo com mais de 1.700 adolescentes de Londres, em que metade do grupo foi submetida à intervenção. O fato de apenas os meninos que participaram da intervenção relatarem aumento na decisão sobre o uso do preservativo nas relações sexuais coloca em cheque a construção generificada do poder de decisão das meninas sobre o próprio corpo. Diante disso, pode-se indagar se as meninas que participaram do estudo de fato não desejaram utilizar mais preservativos durantes as relações sexuais ou se não detinham tal poder de decisão, estando assim, naturalizadamente subjugadas à decisão do companheiro(1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.).

Apenas dois estudos analisados(1616 Akers AY, Yonas M, Burke J, Chang JC. "Do you want somebody treating your sister like that?" Qualitative exploration of how African American families discuss and promote healthy teen dating relationships. J Interpers Violence. 2011;26(11):2165-85.,2626 Pradubmook-Sherer P. Youth attitudes toward dating violence in Thailand. Int J Offender Ther Comp Criminol. 2011;55(2):182-206.)aproximaram-se, embora tangencialmente, da análise por meio da categoria gênero ao indicarem nas considerações finais a necessidade de incorporar a categoria na exploração da violência por parceiros íntimos. Ao abordar o fenômeno pela perspectiva de risco e partindo do pressuposto de que ele se dá de maneira similar para grupos de diferentes sexos, classes sociais e etnias, os estudos podem incorrer em uma falácia e na perigosa conclusão de que medidas de prevenção destinadas ao enfrentamento da problemática não necessitam incorporar os determinantes sociais da violência.

A partir da análise dos artigos, foi possível também compreender o papel da categoria geração na determinação da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes. Observa-se que a subalternidade de geração determina importante vulnerabilidade à violência por parceiro(a) íntimo(a), uma vez que interdita o diálogo entre adolescentes e adultos, o qual tem se mostrado essencial para a sua prevenção e para auxiliar os(as) adolescentes no momento do rompimento dos relacionamentos violentos.

Percebe-se que a categoria geração também é potente para a compreensão da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes, ao evidenciar os processos de mudança históricas e sociais que impactaram os relacionamentos de intimidade dos adolescentes, como as guerras mundiais, os movimentos feministas e o desenvolvimento dos meios de comunicação que facilitou a circulação rápida das informações(22 Minayo MCS. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do "ficar" entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.).

Destaca-se que os estudos foram produzidos sob a ótica positivista e priorizam a análise de pontos de risco em detrimento à compreensão dos determinantes do processo saúde-doença, os quais se estabelecem para cada sujeito como vulnerabilidades e potencialidades e que determinam, entre outras coisas, a ocorrência de processos violentos entre os(as) adolescentes.

Os artigos analisados nesta revisão justificam a importância e a urgência de novas e aprimoradas estratégias para a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes, sobretudo no ambiente escolar, devido aos resultados das pesquisas evidenciarem que a vivência de situações violentas nos relacionamentos, durante a adolescência, relaciona-se a uma maior exposição a fatores ou a comportamentos de risco, como depressão e sentimentos relacionados à tristeza, uso abusivo de álcool e outras drogas(1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.,2525 Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.).

As consequências da violência por parceiro(a) íntimo(a) para a vida de meninas adolescentes vitimadas foram estudadas em pesquisa empreendida na Suécia, entre 2005 a 2007. Foram reportados o estresse físico e emocional, repercutindo no trabalho e estudo, o medo de outros relacionamentos pautado, principalmente, na visão do corpo como a cena do crime, o stress pós-traumático e as dificuldades de falar sobre o assunto(2323 Wiklund M, Malmgren-Olsson EB, Bengs C, Ohman A. "He messed me up": Swedish adolescent girls' experiences of gender-related partner violence and its consequences over time. Violence Against Women. 2010;16(2):207-32.).

Nesse âmbito, um estudo canadense(3030 Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.)demonstrou que para as meninas, ter sido vítima de assédio sexual está diretamente relacionado a uma maior perpetração de violência contra seus parceiros. Em contrapartida, outro estudo analisado aponta para a potencialidade dos programas de prevenção no que tange a menor exposição a fatores e comportamentos de risco. O estudo revelou que adolescentes do sexo masculino que participaram de um programa de intervenção, após até cinco anos de acompanhamento, reportaram uma maior prática de uso de preservativos nas relações sexuais(1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.)

Importante destaque é dado para o impacto das influências das relações sociais entre adolescentes, principalmente as desenvolvidas no ambiente escolar, para a determinação da violência por parceiro(a) íntimo(a). A aceitação e naturalização de atitudes como ciúmes e controle excessivo, difamação, humilhação pública e possessividade pelos adolescentes revelaram importante relação com a determinação e aceitação da violência(2020 Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.,2323 Wiklund M, Malmgren-Olsson EB, Bengs C, Ohman A. "He messed me up": Swedish adolescent girls' experiences of gender-related partner violence and its consequences over time. Violence Against Women. 2010;16(2):207-32.). No entanto, em um dos estudos, essas relações sociais entre adolescentes também emergiram como potentes para a prevenção, na medida em que estudo identificou sua associação com uma menor probabilidade de perpetração de violência quando, por exemplo, o grupo manifesta atitudes de não aceitação da violência(2525 Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.).

Depreende-se dessa discussão que, embora os estudos analisados sejam pautados, sobretudo, no referencial de risco, há potencialidade para superação dessa visão a partir da adoção do conceito de vulnerabilidade, uma vez que ele antecede o risco e considera a inserção social dos grupos na determinação dos fenômenos. O conceito de vulnerabilidade objetiva aproximar os elementos abstratos associados e associáveis aos processos de adoecimento aos planos teóricos concretos e particularizados. As pesquisas que utilizam o conceito de vulnerabilidade diferem dos estudos de risco, pois almejam a universalidade e não a reprodutibilidade ampliada de sua fenomenologia e inferência. Dessa forma, a vulnerabilidade revela os potenciais de adoecimento, de não adoecimento e de enfrentamento, que dizem respeito a cada indivíduo(3838 Munoz Sanchez AI, Bertolozzi MR. Pode o conceito de vulnerabilidade apoiar a construção do conhecimento em Saúde Coletiva? Ciênc Saúde Coletiva. 2007;12(2):319-24.).

Essa perspectiva é fundamental para pensarmos para além da prevenção - conceito pautado na doença e no risco -, na perspectiva da promoção da saúde e da equidade de gênero. Assim, para o enfrentamento das vulnerabilidades relacionadas à violência, que é um fenômeno complexo, multifacetado e socialmente determinado, é necessário considerar uma perspectiva que priorize a determinação social do processo saúde-doença e que supere a abordagem quantificada do risco.

Entre os estudos analisados, 17 envolveram a avaliação de intervenções implementadas com adolescentes objetivando a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a)(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,88 Avery-Leaf S, Cascardi M, O'Leary KD, Cano A. Efficacy of a dating violence prevention program on attitudes justifying aggression. J Adolesc Health. 1997;21(1):11-7.

9 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.

10 Foshee VA, Bauman KE, Greene WF, Koch GG, Linder GF, MacDougall JE. The Safe Date program: 1-year follow-up results. Am J Public Health. 2000;90(10):1619-22.
-1111 Foshee VA, Linder F, MacDougall JE, Bangdiwala S. Gender differences in the longitudinal predictors of adolescent dating violence. Prev Med. 2001;32(2):128-41.,1414 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Suchindran C, Benefield T, Linder GF. Assessing the effects of the dating violence prevention program "safe dates" using random coefficient regression modeling. Prev Sci. 2005;6(3):245-58.,1717 Richmond LS, Peterson DJ, Betts SC. The evolution of an evaluation: a case study using the tribal participatory research model. Health Promot Pract. 2008;9(4):368-77.,1919 Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.,2121 Fredland NM. Nurturing healthy relationships through a community-based interactive theater program. J Community Health Nurs. 2010;27(2):107-18.,2424 Pick S, Leenen I, Givaudan M, Prado A. "Yo quiero, yo puedo... prevenir la violencia": programa breve de sensibilización sobre violencia en el noviazgo. Salud Mental. 2010;33(2): 153-60.,2727 Póo AM, Vizcarra MB. Diseño, implementación y evaluación de un Programa de Prevención de la Violencia en el Noviazgo.Ter Psicol. 2011;29(2):213-23.,2929 Foshee VA, Reyes HLM, Ennett ST, Cance JD, Bauman KE, Bowling JM. Assessing the effects of Families for Safe Dates, a family-based teen dating abuse prevention program. J Adolesc Health. 2012;51(4):349-56.,3131 Miller E, Tancredi DJ, McCauley HL, Decker MR, Virata MC, Anderson HA, et al. One-year follow-up of a coach-delivered dating violence prevention program: a cluster randomized controlled trial. Am J Prev Med. 2013;45(1):108-12.,3333 Taylor BG, Stein ND, Mumford EA, Woods D. Shifting Boundaries: an experimental evaluation of a dating violence prevention program in middle schools. Prev Sci. 2013;14(1):64-76.

34 Ball B, Tharp AT, Noonan RK, Valle LA, Hamburger ME, Rosenbluth B. Expect respect support groups: preliminary evaluation of a dating violence prevention program for at-risk youth. Violence Against Women. 2012;18(7):746-62.

35 Murta SG, Santos BRP, Nobre LA, Araújo IF, Miranda AAV, Rodrigues IO, et al. Prevenção à violência no namoro e promoção de habilidade de vida em adolescentes. Psicol USP. 2013;24(2):263-88.
-3636 Saavedra R, Martins C, Machado C. Relacionamentos íntimos juvenis: programa para a prevenção da violência. Psicologia. 2013;27(1):115-32.).

Entre eles, o Programa Coach Delivery , destinado a jovens atletas do sexo masculino e baseado em sessões curriculares, foi avaliado como promissor para aproximar jovens e reduzir a violência por parceiro(a) íntimo(a), revelando evidências de sua potência para promover a atitude contrária aos comportamentos agressivos(3131 Miller E, Tancredi DJ, McCauley HL, Decker MR, Virata MC, Anderson HA, et al. One-year follow-up of a coach-delivered dating violence prevention program: a cluster randomized controlled trial. Am J Prev Med. 2013;45(1):108-12.).

Outro estudo, cuja intervenção envolveu adolescentes e famílias revelou significativa associação da condição de grupo que recebeu a intervenção com fatores motivacionais para a prevenção. Durante o acompanhamento do grupo dos pais, mães e responsáveis, foi evidenciado aumento da percepção sobre a severidade da violência praticada por parceiro(a) íntimo(a), resposta eficaz para a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) e aumento da condição de conversar com o(a) adolescente sobre o assunto. O programa foi efetivo em promover mudanças no contexto familiar que favoreceram a continuidade da discussão sobre a violência, mostrando-se potente para diminuir a comunicação negativa entre pais, mães e adolescentes(2929 Foshee VA, Reyes HLM, Ennett ST, Cance JD, Bauman KE, Bowling JM. Assessing the effects of Families for Safe Dates, a family-based teen dating abuse prevention program. J Adolesc Health. 2012;51(4):349-56.).

O programa Expect Respect demonstrou aumento dos relatos de comportamentos saudáveis e de resolução de conflitos. No entanto, tais habilidades, em geral, não resultaram em menos perpetração ou vitimização. Participantes com perpetração no pré-teste e que fizeram um maior número de sessões foram mais propensos a reportar perpetração no pós-teste, evidenciando um aumento do reconhecimento a respeito de seus comportamentos violentos(3434 Ball B, Tharp AT, Noonan RK, Valle LA, Hamburger ME, Rosenbluth B. Expect respect support groups: preliminary evaluation of a dating violence prevention program for at-risk youth. Violence Against Women. 2012;18(7):746-62.).

Cinco artigos abordaram o programa Safe Dates , baseado em atividades escolares e comunitárias para a prevenção e redução da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência. As atividades escolares desenvolvidas envolveram a produção de uma peça de teatro, sessões curriculares e um concurso de cartazes. Em relação às atividades comunitárias, foram desenvolvidos serviços para os(as) adolescentes em relacionamentos abusivos, como grupos de suporte, material para os pais e mães e uma linha telefônica para contato em situações de crise(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,88 Avery-Leaf S, Cascardi M, O'Leary KD, Cano A. Efficacy of a dating violence prevention program on attitudes justifying aggression. J Adolesc Health. 1997;21(1):11-7.-99 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.,1414 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Suchindran C, Benefield T, Linder GF. Assessing the effects of the dating violence prevention program "safe dates" using random coefficient regression modeling. Prev Sci. 2005;6(3):245-58.).

Os resultados do Safe Dates foram percebidos principalmente por mudanças nas normas de violência por parceiro(a) íntimo(a) e papéis de gênero, sendo também relatado que os(as) adolescentes que participaram do programa apresentaram menor aceitação da violência, maior percepção das consequências negativas dos relacionamentos violentos, além de estarem mais conscientes quanto aos serviços disponíveis para vítimas e para perpetradores(44 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.,88 Avery-Leaf S, Cascardi M, O'Leary KD, Cano A. Efficacy of a dating violence prevention program on attitudes justifying aggression. J Adolesc Health. 1997;21(1):11-7.-99 Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.,1414 Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Suchindran C, Benefield T, Linder GF. Assessing the effects of the dating violence prevention program "safe dates" using random coefficient regression modeling. Prev Sci. 2005;6(3):245-58.).

Contudo, estudo norte-americano de revisão sistemática sobre a efetividade de programas de prevenção de violência sexual entre parceiros íntimos realizado em 2014(3939 Lundgren R, Amin A. Addressing intimate partner violence and sexual violence among adolescents: emerging evidence of effectiveness.. J Adolesc Health 2015;56(1 Suppl):S42-50.), apontou lacunas em relação à avaliação dos resultados, dada a dificuldade em se analisar mudanças de comportamentos em um período de tempo limitado. A inconsistência apontada pelos autores refere-se à impossibilidade de uma medida quantificável de atitudes e comportamentos violentos, à utilização de diferentes instrumentos de avaliação que impossibilitam a comparação de resultados e ao desafio de avaliações a longo prazo pela maioria dos estudos(3939 Lundgren R, Amin A. Addressing intimate partner violence and sexual violence among adolescents: emerging evidence of effectiveness.. J Adolesc Health 2015;56(1 Suppl):S42-50.).

Outro estudo que avaliou um programa baseado no Teatro do Oprimido foi evidenciado como experiência potente e que proporcionou aquisição de novos conhecimentos sobre bullying e assédio sexual. A partir da própria experiência, os(as) adolescentes referiram que seus comportamentos, assim como o de seus colegas, poderiam ser modificados com base nas novas informações apreendidas no processo(2121 Fredland NM. Nurturing healthy relationships through a community-based interactive theater program. J Community Health Nurs. 2010;27(2):107-18.).

O programa " Yo quiero, yo puedo...prevenir la violencia "(2424 Pick S, Leenen I, Givaudan M, Prado A. "Yo quiero, yo puedo... prevenir la violencia": programa breve de sensibilización sobre violencia en el noviazgo. Salud Mental. 2010;33(2): 153-60.)desenvolvido em escolas mexicanas destacou-se por trazer, na sua metodologia, o marco teórico da categoria gênero ao abordar, em uma das oito conferências propostas, temas como a sexualidade, gênero e sua relação com a violência. Os autores pautam a discussão abordando as questões de gênero e destacam que as diferenças de poder entre homens e mulheres construídas ao longo da história legitimam processos de violência, inclusive entre adolescentes e, em vista desse aspecto, defendem a necessidade de programas de prevenção que estimulem a equidade de gênero entre os(as) mais jovens. Seus resultados apontam que após a participação no programa, os meninos aumentaram a capacidade de reconhecimento da violência por parceiro(a) íntimo(a) em 20%, evidenciando que tal violência é naturalizada, sobretudo na população masculina.

Um estudo português que procurou avaliar o impacto do programa " The Fourth R "(3636 Saavedra R, Martins C, Machado C. Relacionamentos íntimos juvenis: programa para a prevenção da violência. Psicologia. 2013;27(1):115-32.)de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) corrobora os achados do programa " Yo quiero, yo puedo...prevenir la violencia "(2424 Pick S, Leenen I, Givaudan M, Prado A. "Yo quiero, yo puedo... prevenir la violencia": programa breve de sensibilización sobre violencia en el noviazgo. Salud Mental. 2010;33(2): 153-60.), no que tange à percepção de alterações mais significativas em relação à menor legitimação da violência e ao aumento de competências positivas para a resolução de conflitos entre os meninos que receberam a intervenção.

Da mesma forma, o programa " Construyendo una Relación de Pareja Saludable "(2727 Póo AM, Vizcarra MB. Diseño, implementación y evaluación de un Programa de Prevención de la Violencia en el Noviazgo.Ter Psicol. 2011;29(2):213-23.)também prevê, na sua construção metodológica, a inserção da categoria gênero, ao abordar temáticas como as diferenças de poder nas relações de gênero, o surgimento de estereótipos de gênero e o exercício da violência. A avaliação da implementação desse programa confirmou que os(as) participantes aumentaram o reconhecimento da violência por parceiro(a) íntimo(a), bem como as formas sutis da violência e das suas diferentes manifestações. Os autores acreditam que o sucesso do programa relaciona-se com a diversidade de estratégias pedagógicas utilizadas, como por exemplo, os jogos, destacado pelos participantes como uma das modalidades que mais favoreceu a aprendizagem significativa, devido seu caráter interativo.

Estudo empreendido em escola de ensino médio brasileira(3535 Murta SG, Santos BRP, Nobre LA, Araújo IF, Miranda AAV, Rodrigues IO, et al. Prevenção à violência no namoro e promoção de habilidade de vida em adolescentes. Psicol USP. 2013;24(2):263-88.)destaca que um dos principais desafios para a condução de intervenções preventivas entre adolescentes é a motivação para a participação no programa. Nesse sentido, os autores consideram necessária a inclusão da avaliação dos interesses dos adolescentes como ferramenta de delineamento da intervenção, levando em conta, dessa forma, as prioridades elencadas pelos próprios participantes. Os resultados apontaram para interações com maior grau de responsividade entre os(as) adolescentes, favorecendo uma maior adesão.

A maioria dos estudos foram baseados em intervenções no currículo escolar e, de um modo geral, os autores recomendam que intervenções devam ser implementadas o mais precocemente possível, uma vez que as atitudes e comportamentos relacionados à vivência da sexualidade e dos papéis de gênero são moldados antes mesmo da primeira experiência de relacionamentos afetivos. Assim, estudos(14,22,26,29,33)sugerem a formulação de estratégias que envolvam a família, assim como os pares e o contexto no qual os(as) adolescentes estão inseridos. Esse contexto tem profundas relações com a formação e aceitação de atitudes e comportamentos nas relações de intimidade e o manejo de conflitos que envolve os relacionamentos e atitudes(2626 Pradubmook-Sherer P. Youth attitudes toward dating violence in Thailand. Int J Offender Ther Comp Criminol. 2011;55(2):182-206.). Os estudos apontam para a necessidade de ênfase na prevenção primária, voltada para reduzir a incidência de violência por parceiro(a) íntimo(a) antes que ocorra. No que concerne aos serviços de saúde, os estudos ressaltam que há necessidade de estratégias de intervenção situadas nesse campo.

Os programas referidos utilizaram diferentes estratégias, desde aulas expositivas até dramatizações, folhetos educativos, jogos e teatro. Entretanto, os programas com ênfase no contexto social de adolescentes e que consideram o papel importante da cultura e dos pares na formação e manutenção de valores que permeiam os relacionamentos íntimos, constituem minoria. Esse conhecimento poderia subsidiar a criação de modelos que vinculem a violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência às relações conjugais conflituosas nas famílias, por exemplo, de modo a subsidiar intervenções cada vez mais potentes para abranger o contexto familiar e social.

De um modo geral, os estudos ressaltam o problema da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência e suas repercussões a curto e longo prazo. Apontam a ausência de políticas públicas específicas para a prevenção e enfrentamento do fenômeno nessa fase da vida e a importância de estratégias precoces de prevenção em virtude da magnitude das consequências. No âmbito da produção científica sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência, é amplamente discutida a necessidade de inclusão da problemática como objeto do trabalho no cotidiano da atenção à saúde, assim como o desenvolvimento e a avaliação contínua dos programas de prevenção que envolvam a escola, a família e o contexto social dos(as) adolescentes.

Conclusão

De uma maneira geral, os estudos que avaliam ou discorrem sobre a prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) entre adolescentes não analisam o fenômeno a partir das perspectivas de gênero e geração. Esta revisão buscou, entre outros aspectos, analisar até que ponto os estudos trazem possibilidades de relacionar essas categorias sociais com a violência por parceiro(a) íntimo(a) na adolescência, no contexto da vivência da sexualidade. Pressupõe-se que essa violência assume significado importante nessa fase de vida e tem profundas relações com a construção da identidade de gênero, da sexualidade e a determinação da violência, aspecto não identificado na análise da maioria das produções.

A maior parte dos estudos que avaliam intervenções de prevenção da violência por parceiro(a) íntimo(a) tem como foco o reconhecimento e a tomada de consciência sobre a violência, assim como habilidades de gestão de conflitos e resolução de questões de estereótipos de gênero. Tais questões são reconhecidas como estratégias que possibilitam instrumentalizar adolescentes para gerenciar relacionamentos problemáticos antes que hábitos interpessoais vulneráveis se estabeleçam. Entretanto, é reconhecida a fragilidade dos estudos em abordar questões que ultrapassam a dimensão singular das atitudes e comportamentos e que ampliem a discussão para o contexto social da cultura, dos pares, da mídia e da inserção social dos(as) adolescentes.

A estrutura social, no que tange às políticas de prevenção e enfrentamento, assim como a inserção de adolescentes na estrutura político-ideológica enquanto grupo social são discussões escassas nos estudos em análise. Esses aspectos evidenciam uma produção científica pautada nos moldes positivistas de pesquisa, que se aproximam da lógica da saúde pública clássica, centrada na dimensão singular.

References

  • 1
    Organização Mundial da Saúde. Prevenção da violência sexual e da violência pelo parceiro íntimo contra a mulher: ação e produção de evidência [Internet]. Genebra: OMS; 2012 [citado 2014 dez. 05]. Disponível em: Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44350/3/9789275716359_por.pdf
    » http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/44350/3/9789275716359_por.pdf
  • 2
    Minayo MCS. Amor e violência: um paradoxo das relações de namoro e do "ficar" entre jovens brasileiros. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2011.
  • 3
    Egry EY, Fonseca RMGS, Oliveira MAC. Ciência, Saúde Coletiva e Enfermagem: destacando as categorias gênero e geração na episteme da práxis. Rev Bras Enferm. 2013;66(n.esp):119-33.
  • 4
    Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Linder GF, Benefield T, Suchindran C Assessing the long-term effects of the Safe Dates program and a booster in preventing and reducing adolescent dating violence victimization and perpetration. Am J Public Health. 2004;94(4):619-24.
  • 5
    Foshee VA, Karriker-Jaffe KJ, Reyes HLM, Ennett ST, Suchindran C, Bauman KE, et al. What accounts for demographic differences in trajectories of adolescent dating violence? An examination of intrapersonal and contextual mediators. J Adolesc Health. 2008;42(6):596-604.
  • 6
    Mendes KDS, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2008;17(4):758-64.
  • 7
    Knafl K, Sandelowski M. "Mixed methods synthesis of research on childhood chronic conditions and family" [Internet]. Chapel Hill: UNC/School of Nursing; 2011 [cited 2015 Mar 22]. Available from: Available from: http://familysynthesis.unc.edu/etc/Final_Proposal.pdf
    » http://familysynthesis.unc.edu/etc/Final_Proposal.pdf
  • 8
    Avery-Leaf S, Cascardi M, O'Leary KD, Cano A. Efficacy of a dating violence prevention program on attitudes justifying aggression. J Adolesc Health. 1997;21(1):11-7.
  • 9
    Foshee VA, Bauman KE, Arriaga XB, Helms RW, Koch GG, Linder GF. An evaluation of Safe Dates, an adolescent dating violence prevention program. Am J Public Health. 1998;88(1):45-50.
  • 10
    Foshee VA, Bauman KE, Greene WF, Koch GG, Linder GF, MacDougall JE. The Safe Date program: 1-year follow-up results. Am J Public Health. 2000;90(10):1619-22.
  • 11
    Foshee VA, Linder F, MacDougall JE, Bangdiwala S. Gender differences in the longitudinal predictors of adolescent dating violence. Prev Med. 2001;32(2):128-41.
  • 12
    Swart LA, Seedat M, Stevens G, Ricardo I. Violence in adolescents' romantic relationships: findings from a survey amongst school-going youth in a South African community. J Adolescence. 2002;25(4):385-95.
  • 13
    Howard D, Qiu Y, Boekeloo B. Personal and social contextual correlates of adolescent dating violence. J Adolesc Health. 2003;33(1):9-17.
  • 14
    Foshee VA, Bauman KE, Ennett ST, Suchindran C, Benefield T, Linder GF. Assessing the effects of the dating violence prevention program "safe dates" using random coefficient regression modeling. Prev Sci. 2005;6(3):245-58.
  • 15
    Teitelman AM, Ratcliffe SJ, Dichter ME, Sullivan CM. Recent and past intimate partner abuse and HIV risk among young women. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 2008;37(2):219-27.
  • 16
    Akers AY, Yonas M, Burke J, Chang JC. "Do you want somebody treating your sister like that?" Qualitative exploration of how African American families discuss and promote healthy teen dating relationships. J Interpers Violence. 2011;26(11):2165-85.
  • 17
    Richmond LS, Peterson DJ, Betts SC. The evolution of an evaluation: a case study using the tribal participatory research model. Health Promot Pract. 2008;9(4):368-77.
  • 18
    Thongpriwan V, McElmurry BJ. Thai female adolescents' perceptions of dating violence. Health Care Women Int. 2009;30(10):871-91.
  • 19
    Wolfe DA, Crooks C, Jaffe P, Chiodo D, Hughes R, Ellis W, et al. A school-based program to prevent adolescent dating violence: a cluster randomized trial. Arch Pediatr Adolesc Med. 2009;163(8):692-9.
  • 20
    Murphy KA, Smith DI. Adolescent girls' responses to warning signs of abuse in romantic relationships: implications for youth-targeted relationship violence prevention. J Interpers Violence. 2010;25(4):626-47.
  • 21
    Fredland NM. Nurturing healthy relationships through a community-based interactive theater program. J Community Health Nurs. 2010;27(2):107-18.
  • 22
    Fernández-Fuertes AA, Fuertes A. Physical and psychological aggression in dating relationships of Spanish adolescents: motives and consequences. Child Abuse Negl. 2010;34(3):183-91.
  • 23
    Wiklund M, Malmgren-Olsson EB, Bengs C, Ohman A. "He messed me up": Swedish adolescent girls' experiences of gender-related partner violence and its consequences over time. Violence Against Women. 2010;16(2):207-32.
  • 24
    Pick S, Leenen I, Givaudan M, Prado A. "Yo quiero, yo puedo... prevenir la violencia": programa breve de sensibilización sobre violencia en el noviazgo. Salud Mental. 2010;33(2): 153-60.
  • 25
    Foshee VA, Reyes HL, Ennett ST, Suchindran C, Mathias JP, Karriker-Jaffe KJ, et al. Risk and protective factors distinguishing profiles of adolescent peer and dating violence perpetration. Adolesc Health. 2011;48(4):344-50.
  • 26
    Pradubmook-Sherer P. Youth attitudes toward dating violence in Thailand. Int J Offender Ther Comp Criminol. 2011;55(2):182-206.
  • 27
    Póo AM, Vizcarra MB. Diseño, implementación y evaluación de un Programa de Prevención de la Violencia en el Noviazgo.Ter Psicol. 2011;29(2):213-23.
  • 28
    Rey-Anacona CA. Exposición a violencia entre los padres de adolescentes y adultos jóvenes víctimas de alguna conducta de maltrato en el noviazgo. Diversitas. 2011;7(2):253-64.
  • 29
    Foshee VA, Reyes HLM, Ennett ST, Cance JD, Bauman KE, Bowling JM. Assessing the effects of Families for Safe Dates, a family-based teen dating abuse prevention program. J Adolesc Health. 2012;51(4):349-56.
  • 30
    Boinvin S, Lavoie F, Hébert M, Gagné M. Past victimizations and dating violence perpetration in adolescence: the mediating role of emotional distress and hostility. J Interpers Violence. 2012;27(4):662-84.
  • 31
    Miller E, Tancredi DJ, McCauley HL, Decker MR, Virata MC, Anderson HA, et al. One-year follow-up of a coach-delivered dating violence prevention program: a cluster randomized controlled trial. Am J Prev Med. 2013;45(1):108-12.
  • 32
    Martsolf DS, Draucker CB, Brandau M. Breaking up is hard to do: how teens end violent dating relationships. J Am Psychiatr Nurses Assoc. 2013;19(2):71-7.
  • 33
    Taylor BG, Stein ND, Mumford EA, Woods D. Shifting Boundaries: an experimental evaluation of a dating violence prevention program in middle schools. Prev Sci. 2013;14(1):64-76.
  • 34
    Ball B, Tharp AT, Noonan RK, Valle LA, Hamburger ME, Rosenbluth B. Expect respect support groups: preliminary evaluation of a dating violence prevention program for at-risk youth. Violence Against Women. 2012;18(7):746-62.
  • 35
    Murta SG, Santos BRP, Nobre LA, Araújo IF, Miranda AAV, Rodrigues IO, et al. Prevenção à violência no namoro e promoção de habilidade de vida em adolescentes. Psicol USP. 2013;24(2):263-88.
  • 36
    Saavedra R, Martins C, Machado C. Relacionamentos íntimos juvenis: programa para a prevenção da violência. Psicologia. 2013;27(1):115-32.
  • 37
    Fonseca RMGS. Gênero e saúde da mulher: uma releitura do processo saúde doença das mulheres. In: Fernandes RAQ, Narchi NZ, organizadoras. Enfermagem e saúde da mulher. São Paulo: Manole; 2012. p. 30-68.
  • 38
    Munoz Sanchez AI, Bertolozzi MR. Pode o conceito de vulnerabilidade apoiar a construção do conhecimento em Saúde Coletiva? Ciênc Saúde Coletiva. 2007;12(2):319-24.
  • 39
    Lundgren R, Amin A. Addressing intimate partner violence and sexual violence among adolescents: emerging evidence of effectiveness.. J Adolesc Health 2015;56(1 Suppl):S42-50.
  • *
    Artigo extraído da disciplina "A Tipesc e o enfrentamento da violência doméstica na perspectiva de gênero e geração", Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva, Programa de Pós-Graduação Interunidades de Doutoramento, Escola de Enfermagem/Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2016

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2015
  • Aceito
    14 Set 2015
Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: reeusp@usp.br