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Disponibilidade de instrumentos validados para o estudo da religiosidade em amostras Brasileiras

CARTA AO EDITOR

Disponibilidade de instrumentos validados para o estudo da religiosidade em amostras brasileiras

André F. CarvalhoI, II; TaUily C. TaünayII; Francisco de Assis Aquino GondimI

IDepartamento de Medicina Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, CE, Brasil

IIGrupo de Pesquisas em Psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFC, Fortaleza, CE, Brasil

O Brasil é um país de dimensões continentais que apresenta uma matriz cultural caracterizada pela pluralidade, o que se reflete em uma diversidade de práticas religiosas. De fato, um inquérito populacional demonstrou que mais de 80% dos brasileiros atribuem um importante significado à religião2. A maioria dos estudos indica claramente que a religiosidade é um fator de proteção independente para a saúde física e mental3. Nas últimas duas décadas, houve uma explosão de estudos acerca das relações entre religiosidade e saúde mental3-4. Entretanto, há uma predominância de investigações oriundas de amostras norte-americanas (preponderantemente protestante)4. No Brasil, o estudo da religiosidade como fator influenciador da saúde mental é incipiente.

Deve-se ressaltar que os avanços nesse campo de pesquisa têm sofrido críticas em relação ao rigor científico e à validade de se aferir religiosidade3. Em grande parte, críticos têm sugerido que há uma extrapolação na conclusão de muitos estudos, em que o efeito protetor de um aspecto da religiosidade é interpretado como indicativo de que a religiosidade é positiva como um todo3. A mensuração da religiosidade em saúde é um desenvolvimento relativamente recente e data de investigações pioneiras realizadas no pós-guerra5,6. King e Hunt logo constataram que a religiosidade é um construto multidimensional6. Há na atualidade mais de uma centena de instrumentos disponíveis para mensurar religiosida-de4. Entretanto, poucos instrumentos estão validados para uso em amostras brasileiras. O inventário de religiosidade de Duke (DUREL), desenvolvido por Lucchetti et al., é um instrumento breve que mede três facetas da religiosidade, a saber: religiosidade organizacional (RO), religiosidade não organizacional (RNO) e religiosidade intrínseca (RI)7. A versão em português brasileiro do DUREL (P-DUREL) foi inicialmente validada por Lucchetti et al. em uma amostra comunitária de baixa renda7. Nesse estudo, o P-DUREL apresentou adequada consistência interna e validade convergente-discriminante7. Nosso grupo de pesquisa posteriormente estendeu essas observações e demonstrou que o P-DUREL apresenta adequada consistência interna, confiabilidade teste-reteste e validade convergente-discriminante em uma amostra de pacientes psiquiátricos e outra de estudantes de graduação8. O estudo de Martinez et al1. validou o P-DUREL em uma amostra de estudantes de pós-graduação e verificou propriedades psicomé-tricas semelhantes às do estudo de Taunay et al.8. Os três estudos de validação da P-DUREL dão suporte ao uso desse instrumento para o estudo da religiosidade em nosso meio.

Apesar desses esforços iniciais, há uma necessidade de avanço nesse campo de pesquisa. Há apenas outro instrumento validado para o estudo da religiosidade em amostras brasileiras: o inventário de religiosidade intrínseca (IRI)9. Há outros instrumentos validados que mensuram construtos correlatos, como: a Escala de Bem-Estar Espiritual10 e a Escala de Coping Religioso Espiritual11. Estudos futuros devem determinar as propriedades psicométricas do P-DUREL em amostras distintas (por exemplo, amostras comunitárias mais representativas e amostras de pacientes clínicos).

O desenvolvimento e a validação de instrumentos que mensurem religiosidade são um passo crucial para a evolução desse campo de pesquisa no Brasil. A Revista de Psiquiatria Clínica tem, ao longo dos últimos anos, publicado estudos que relacionam religiosidade à saúde mental para uma audiência crescente.

Referências

  • 1. Martinez EZ, Santos Almeida RG, Carvalho ACD. Propriedades da Escala de Religiosidade de Duke em uma amostra de pós-graduandos. Rev Psiq Clín. 2012;39:180.
  • 2. Moreira-Almeida A, Pinsky I, Zaleski M, Laranjeira R. Envolvimento religioso e fatores sociodemográficos: resultados de um levantamento nacional no Brasil. Rev Psiq Clín. 2010;37:12-5.
  • 3. Hall DE, Meador KG, Koenig HG. Measuring religiousness in health research: review and critique. J Relig Health. 2008;47:134-63.
  • 4. Koenig HG. Research on religion, spirituality, and mental health: a review. Can J Psychiatry. 2009;54:283-91.
  • 5. Allport G. The individual and his religion: a psychological interpretation. New York: Macmillan; 1950.
  • 6. King M, Hunt R. Measuring the religious variable: amended findings. J Sci Study Relig. 1967;8:321-3.
  • 7. Lucchetti G, Granero Lucchetti AL, Peres MF, Leão FC, Moreira-Almeida A, Koenig HG. Validation of the Duke Religion Index: DUREL (Portuguese version). J Relig Health. 2012;51(2):579-86.
  • 8. Taunay TCD, Gondim FAA, Macêdo DS, Moreira-Almeida A, Gurgel LA, Andrade LMS, et al. Validação da versão brasileira da escala de religiosidade de Duke (DUREL). Rev Psiq Clín. 2012;39(4):130-5.
  • 9. Taunay TC, Cristino ED, Machado MO, Rola FH, Lima JW, Macêdo DS, et al. Development and validation of the Intrinsic Religiousness Inventory (IRI). Rev Bras Psiquiatr. 2012;34:76-81.
  • 10. Marques LF, Sarriera JC, Dell'Aglio DD. Adaptação e validação da Escala de Bem-Estar Espiritual (EBE). Aval Psicol. 2009;8:179-86.
  • 11. Panzini RG, Bandeira D. Escala de Coping Religioso-Espiritual (escala CRE): elaboração e validação de constructo. Psicologia em Estudo. 2005;10:507-16.
  • Correspondence to:

    André F. Carvalho
    Departamento de Medicina Clínica, Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará
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    60430-040 - Fortaleza, CE, Brazil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      2012
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