Resumo
O objetivo deste artigo é avaliar a prevalência e os fatores associados à adesão a terapia de reposição enzimática em adolescentes com Fibrose cística. Estudo transversal, descritivo e observacional. Foram coletados dados sociodemográficos e clínicos. Os instrumentos utilizados para avaliar adesão foram: questionário de Morisky-Green e a dispensação de medicação na farmácia e para os fatores associados, entrevista com questionário estruturado. Foram entrevistados 44 adolescentes. Segundo o método de análise de dispensação da farmácia e o questionário de Morisky-Green, encontramos uma adesão de 45,5% e 11,4%, respectivamente. A maior adesão foi observada naqueles com diagnóstico precoce e a menor nos adolescentes mais velhos e nas meninas. Os fatores com a maior prevalência de não adesão foram: não levar as enzimas ao comer fora de casa, tomar enzimas somente nas grandes refeições, função pulmonar normal, com obstrução grave e muito grave. A prevalência de adesão a enzima foi pequena. Informações relacionadas à doença e ao tratamento devem ser aprimoradas, principalmente em adolescentes mais velhos e com comprometimento da função pulmonar, com criação de estratégias e estudos longitudinais para identificar fatores que interferem na adesão.
Palavras-chave
Adesão à medicação; Fibrose cística e terapia de reposição de enzimas
Abstract
This article sets out to evaluate the prevalence and factors associated with adherence to enzyme replacement therapy among adolescents with cystic fibrosis. It is a cross-sectional, descriptive and observational study. Sociodemographic and clinical data were collected. The instruments used to assess adherence were: the Morisky-Green questionnaire and medication dispensation at the pharmacy, and interviews with structured questionnaires for the associated factors. Forty-four adolescents were interviewed. According to the method of the pharmacy medication dispensation analysis and the Morisky-Green questionnaire, the adherence of 45.5% and 11.4% was found, respectively. The higher adherence was observed in those with early diagnosis and the lowest in older adolescents and girls. The factors with the highest prevalence of non-adherence were: not taking enzymes when eating out of the home; only taking enzymes with major meals; normal lung function; with severe and very severe obstruction. The prevalence of adhesion to enzymes was low. Information related to the disease and treatment should be improved, especially among older adolescents and with impairment of lung function, with the creation of strategies and longitudinal studies to identify factors that interfere with adherence.
Key words
Adherence to medication; Cystic fibrosis and enzyme replacement therapy
Introdução
A Fibrose Cística (FC) é uma doença genética autossômica recessiva, causada por mutações no gene Regulador de Condutância Transmembranar (CFTR)11 Nussbaum RL, Mclnnes RR, Willard HF. Fibrose Cística. In: Thompson JS, Thompson MW. Genética médica. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002.. A sobrevida destes pacientes aumentou significativamente devido à instituição de melhores regimes terapêuticos22 Ratjen F, Doring G. Cystic fibrosis. Lancet 2013; 361(9358):681-689.. A insuficiência pancreática (IP) está presente na maioria dos pacientes e seu tratamento com reposição enzimática é mandatório para a vida toda33 Rosa FR, Dias FG, Nobre LN e Morais HA. Fibrose cística: uma abordagem clínica e nutricional. Rev. Nutr 2008; 21(6):729-733..
No Brasil, existem vários pacientes com FC e, por ser uma doença crônica e multissistêmica, há necessidade de uso contínuo de vários medicamentos. Entretanto, a realização deste tratamento necessita da adesão dos pacientes a um programa complexo de autocuidado e é comum a não aceitação do mesmo3-5. O sentimento e ações contra o tratamento é acentuado na adolescência que é uma fase de turbulências, descobertas, tomadas de decisões e conflitos internos em busca de identidade e amadurecimento para a vida adulta44 Hodson ME. Psycological aspects for the management of adults with Cystic Fibrosis. Ped Pulmonology 1997; (16):113-114..
A baixa adesão ao tratamento do paciente com doença crônica é um problema grave que interfere negativamente na sua eficácia, na qualidade de vida e aumenta as despesas com a saúde66 Pan American Health Organization. Poor adherence to long-term treatment of chronic diseases is a worldwide problem. Rev Panam Salud Publica 2003; 14(3):218-221..
A avaliação da adesão ao tratamento pode ser feita utilizando métodos diretos ou indiretos, entre eles: Monitorização de medicamento em fluidos corporais, contagem de comprimidos; auto-relato; registro de dispensa de medicação na farmácia; registros de prontuários. O método deve ser escolhido de acordo com os objetivos propostos77 Obreli Neto PR, Baldoni AO Guidoni CM, Bergamini D, Hernandes KC, Luz RT, Silva FB, Silva RO, Pereira LRL, Cuman RKN. Métodos de avaliação de adesão a farmacoterapia. Rev Bras Farm 2012; 93(4):403-410..
Apesar de mais de cinco décadas de pesquisa sobre adesão, até o momento existem poucos estudos na literatura nacional sobre adesão ao tratamento da FC88 Dalcin PTR, Rampon G, Pasin LR, Ramon GM, Abrahão CLO, Oliveira VZ. Adesão ao tratamento em pacientes com fibrose cística. J Bras Pneumol 2007; 33(6):664..
Essa carência possivelmente se deve a várias situações complexas com que o paciente com FC convive. Desta forma, o objetivo deste estudo é verificar a prevalência e os fatores que interferem na adesão a terapia de reposição enzimática (TRE) em adolescentes com Fibrose Cística.
Método
Trata-se de um estudo transversal, descritivo e observacional, realizado em um Centro de Referência no Rio de Janeiro para o tratamento da FC para crianças e adolescentes.
Foram incluídos pacientes, com idade entre 10 e 19 anos incompletos, de ambos os sexos, com diagnóstico FC após confirmação da alteração de eletrólitos pelo Teste do Suor (≥ 60 mmol/L de cloro) em duas amostras e/ou presença de duas mutações no gene da CFTR99 Ribeiro JD, Ribeiro MAGO, Ribeiro AF. Controvérsias na fibrose cística - do pediatra ao especialista. J Pediatr 2002; 78(2):S173-S175., com insuficiência pancreática e cadastrados no serviço de farmácia do Centro de Referência.
Foram excluídos aqueles com paralisia cerebral e internados.
A coleta de dados sociodemográficos, de avaliação a adesão a TRE foi realizada por meio de entrevista, no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2015. A adesão ao tratamento foi verificada pelo questionário Morisky-Green1010 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self-reported measure of medication adherence. Med Care 1986; 24(1):67-74. respondido pelo adolescente e através do registro de retirada das enzimas pancreáticas obtido na farmácia.
Para verificar os fatores que possam interferir na adesão à farmacoterapia, realizou-se revisão bibliográfica de vários estudos sobre adesão, e selecionou-se algumas questões que foram aplicadas no questionário em entrevista com o adolescente e seu responsável.
Dados clínicos como: presença de IP, função pulmonar, tipo de mutação, data de diagnóstico, estado nutricional e tratamento prescrito foram obtidos do prontuário do paciente. A análise dos dados sociodemográficos seguiu os critérios adotados pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP)1111 Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critério Brasil 2015 e atualização da distribuição de classes para 2016. [acessado 2015 Set 10]. Disponível em: http://www.abep.org/criterio-brasil.
http://www.abep.org/criterio-brasil...
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Na avaliação antropométrica foi utilizado o índice de massa corporal para idade(IMC/I) e estatura para idade(E/I), classificados pelas curvas de crescimento da OMS, segundo o gênero, com auxílio do software WHO Anthro Plus (2009). Foram utilizados os pontos de corte estabelecidos pelo Consenso em FC de 20161212 Turck D, Braegger CP, Colombo C, Declercq D, Morton A, Pancheva R , Robberecht E, Stern M, Strandvik B, Wolfe S, Schneider SM, Wilschanski M. Guidelines on nutrition care for infants, children, and adults with cystic fibrosis. Clin Nutr 2016; 35(3):557-577..
O comprometimento da função pulmonar dos pacientes foi avaliado pelo volume expiratório forçado no primeiro segundo (VFE1) previsto e os valores de referência seguiram as recomendações da American Thoracic Society1313 Pellegrino R, Viegi G, Brusasco V, Crapo RO, Burgos F, Casaburi R. Interpretative estrategies for lung functions tests. J Eur Respir 2005; 26(5):948-968..
Para se verificar a adesão através da dispensação de enzimas pela farmácia, foram colhidos dados da ficha eletrônica de dispensação do ambulatório da farmácia no período de janeiro de 2015 a dezembro de 2015.
Esse método foi escolhido pela sua ampla utilização em estudos de adesão. Além de ser pouco dispendioso e de fácil aplicação, principalmente quando se tem um número grande de pacientes, quando informatizado, é possível que todos os dados da dispensação sejam acessados em qualquer farmácia interligada. Esse método é muito usado em pesquisas no SUS77 Obreli Neto PR, Baldoni AO Guidoni CM, Bergamini D, Hernandes KC, Luz RT, Silva FB, Silva RO, Pereira LRL, Cuman RKN. Métodos de avaliação de adesão a farmacoterapia. Rev Bras Farm 2012; 93(4):403-410..
Tendo em vista as particularidades da utilização das enzimas pancreáticas, como a variação da dose dependendo da quantidade e tipo de alimento, frequência de alimentação, utilizamos como padrão de retirada irregular, e consequentemente não adesão, o atraso igual ou superior a 60 dias na dispensação das enzimas pancreáticas, o mesmo critério utilizado por Carmody et al.1414 Carmody ER, Diaz T, Starling P, Santos APRB, Sacks HS. An evaluation of antiretroviral HIV/AIDS treatment in a Rio de Janeiro public clinic. Trop Med Int Health 2003; 8(5):378-385..
Questionário de Morisky-Green
Formulário próprio de entrevista com perguntas adaptadas do questionário de adesão formulado por Morisky-Green1010 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self-reported measure of medication adherence. Med Care 1986; 24(1):67-74..
Nos últimos 3 meses:
-
Você alguma vez se esqueceu de tomar seu remédio?
-
Você, ás vezes, é descuidado quanto ao horário de tomar seu remédio?
-
Quando você se sente bem, alguma vez, você deixou de tomar seu remédio?
-
Quando você se sente mal com o remédio, ás vezes deixa de tomá-lo?
Foram considerados aderentes ao tratamento medicamentoso aqueles que responderam não a todas as perguntas obtendo a pontuação 4 (um ponto por resposta negativa), e não aderentes aqueles que obtiveram pontuação igual ou inferior a 31010 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self-reported measure of medication adherence. Med Care 1986; 24(1):67-74..
A escolha do teste de Morisky-Green fundamenta-se no fato de estar disponível em língua portuguesa, estar validado, ser muito utilizado para pesquisas de adesão em doenças crônicas, ser instrumento com número pequeno de questões, de fácil medida, compreensível e verificar a atitude do paciente em relação ao seu tratamento medicamentoso.
O teste de Morisky-Green é bastante utilizado em pesquisas com grande número de indivíduos e com limitados recursos financeiros77 Obreli Neto PR, Baldoni AO Guidoni CM, Bergamini D, Hernandes KC, Luz RT, Silva FB, Silva RO, Pereira LRL, Cuman RKN. Métodos de avaliação de adesão a farmacoterapia. Rev Bras Farm 2012; 93(4):403-410..
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Instituto Fernandes Figueira. Todos os responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias.
Análise estatística
Na análise descritiva foram apresentados os valores médios e desvios padrões para as variáveis contínuas com distribuição Normal. Variáveis contínuas sem distribuição Normal foram descritas através dos valores medianos, mínimos e máximos. A normalidade das variáveis contínuas foi verificada através do teste de Kolmogorov-Smirnov.
O nível de significância adotado foi 5%. As análises foram realizadas no programa SPSS versão 20, 2011.
Resultados
Dos 190 pacientes cadastrados no serviço de farmácia, inicialmente foram considerados elegíveis 55 pacientes. Um paciente se mudou para São Paulo, um faleceu, outro permaneceu internado durante todo o período da pesquisa e 08 faltaram às consultas. No decorrer da pesquisa, não tivemos recusa. Foram entrevistados 44 adolescentes. A mediana de idade ao diagnóstico foi de 18 meses. A média de idade dos entrevistados foi de 14,8(± 2,6anos).
Em relação ao genótipo da população estudada observamos que 52% e 14% era homozigoto e heterozigoto respectivamente para a mutação DF508.
Segundo o método de análise de dispensação de medicamento da farmácia e o que utiliza o questionário de Morisky-Green, a prevalência de adesão ao tratamento com enzimas pancreáticas foi de 45,5% e 11,4%, respectivamente.
Os fatores que podem facilitar ou dificultar a adesão ao uso da enzima estão descritos na Tabela 1. O fato de não levar as enzimas sempre que sai de casa acarretou em uma menor adesão à TRE.
Fatores que podem facilitar ou dificultar a adesão ao uso da terapia de reposição enzimática relacionados com a adesão pelo método de dispensação da farmácia, dos adolescentes com Fibrose Cística acompanhados no Centro de Referência do Rio de Janeiro de Janeiro de 2015 a dezembro de 2015.
Nenhuma variável sociodemográfica influenciou na adesão.
Pacientes diagnosticados mais precocemente (13 meses) foram mais aderentes que os pacientes diagnosticados mais tardiamente (23 meses).
A utilização das enzimas foi considerada indispensável à saúde para 95% dos pacientes estudados e foram usadas em todas as refeições por 73% dos pacientes, 18% usou apenas nas grandes refeições e 9% só toma enzima às vezes.
Com relação ao veículo de administração das enzimas: 36,4% declarou ingerir com água, 11,4% sem líquido e 52,2% com qualquer líquido, podendo ser água, suco ou refrigerante. Todos os pacientes ingeriram cápsulas fechadas. Quanto ao momento da ingestão, 79% o fazem antes, 14% durante e 7% depois das refeições.
Mais da metade da população estudada (55%) revelou que já tomou escondido as enzimas, 23% já deixou de se alimentar para não tomá-las.
Dentre alguns fatores relatados como motivo para não tomar as enzimas, o esquecimento foi mencionado em 93% dos casos, vergonha 32% e somente 2% não tomou enzima por não achar importante para sua saúde.
As enzimas foram retiradas da embalagem original e armazenadas em outro recipiente por 34% dos entrevistados.
O número de refeições diárias realizadas foi de: 3 a 4; 5 a 6 e, 6 vezes por 31,8%, 45,5% e 22,7%, respectivamente dos casos.
Discussão
Nesta pesquisa, ao utilizar 2 tipos de instrumentos para verificar a adesão, encontramos resultados bem diferentes, 45,5% (método de análise de dispensação da farmácia) e 11,4% (questionário de Morisky-Green). Esses achados estão de acordo com os dados da OMS em que somente metade das pessoas com doenças crônicas toma seus medicamentos como prescrito1515 World Health Organization (WHO). Adherence to long-term therapies: evidence for action. Geneva: WHO; 2003. [acessado 2015 Out 5]. Disponível em: http://www.who.int/chp/knowledge/publications/adherence_introduction.pdf
http://www.who.int/chp/knowledge/publica...
. Embora estudos sobre adesão a TRE relatem uma prevalência de 27,4% até 96,5%1616 Donohoe RO, Fullen BM. Adherence of Subjects with Cystic Fibrosis to Their Home Program: a systematic review. Respir Care 2014; (11):59..
Neste estudo, a prevalência de adesão na avaliação pela dispensação da farmácia foi semelhante ao encontrado por Modi e Quittner1717 Modi AC, Quittner AL. Barriers to Treatment Adherence for Children with Cystic Fibrosis and Asthma: What Gets in the Way? J Pediatr Psychol 2006; (8):31.. Apesar da eficácia comprovada da utilização correta de medicamentos prescritos na redução dos sintomas da doença e prevenção ou diminuição de complicações associadas a ela, ainda encontramos baixos percentuais de adesão.
Goodfellow et al.1818 Goodfellow NA, Hawwa AF, Reid AJM, Horne R, Shields MD, McElnay J. Adherence to treatment in children and adolescents with cystic fibrosis: a cross-sectional, multi-method study investigating the influence of beliefs about treatment and parental depressive symptoms. BMC Pulm Med 2015; 15:43., em seu estudo sobre adesão as enzimas em crianças e adolescentes com FC por meio de questionários, classificaram: 72% como sendo não aderente, Shakkottai et al.1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229. encontraram 90% de adesão a TRE quando utilizado o método de auto-relato. Essa diferença talvez tenha ocorrido devido a vários fatores: inconsistência na definição uniforme de não adesão, diferentes métodos de coleta e análise de dados, diversidade da população estudada e tipo de tratamento utilizado2020 Sackett DL, Snow JC. Compliance in health care. Baltimore: University Press; 1979.. Por isso, para avaliação de adesão à farmacoterapia, geralmente é aplicado mais de um método de avaliação paralelamente, para reduzir os vieses e limitações de cada método77 Obreli Neto PR, Baldoni AO Guidoni CM, Bergamini D, Hernandes KC, Luz RT, Silva FB, Silva RO, Pereira LRL, Cuman RKN. Métodos de avaliação de adesão a farmacoterapia. Rev Bras Farm 2012; 93(4):403-410..
Ambos os instrumentos utilizados neste estudo possuem limitações. A dispensação de medicamentos na farmácia é um método pouco dispendioso e muito usado, mas nos fornece uma estimativa de adesão, pois não sabemos se o paciente realmente tomou as medicações que lhe foi entregue e isso pode superestimar a adesão.
Por outro lado, o questionário de Morisky-Green, apesar de validado e muito utilizado para avaliar adesão em doenças crônicas, é muito rigoroso por não permitir nenhum episódio de esquecimento no período de 3 meses. Essa inflexibilidade do método, o fato de superestimar a não adesão e as peculiaridades relacionadas a TRE (a variação da dose dependendo da quantidade e tipo de alimento e frequência de alimentação) nos fez adotá-lo somente para verificar a prevalência de adesão. Para correlacionar com os fatores que se associam a adesão, optamos por utilizar o método de análise de dispensação da farmácia.
A transição para a adolescência dos pacientes com FC representa a sobrevivência a uma doença letal, geralmente acompanhada com o declínio das condições de saúde. Conquistar etapas, passar da infância para adolescência consiste em vivenciar muitas fragilidades e comprometimentos físicos, como: emagrecimento, necessidade de oxigenioterapia, sonda nasogástrica, realização de gastrostomia e de fisioterapia várias vezes ao dia2121 Mello DB, Moreira MCN. A hospitalização e o adoecimento pela perspectiva de crianças e jovens portadores de fibrose cística e osteogênese imperfeita. Cien Saude Colet 2010; 15(2):453-461.
Nesta pesquisa, notamos que os adolescentes com 15 anos são os que menos aderem ao tratamento em ambos os testes de adesão aplicados. Este resultado foi semelhante aos estudos de Arias et al.2222 Arias RP, Llorente A, García CB, Martín JJD. Treatment compliance in children and adults with Cystic Fibrosis. J Cyst Fibros 2008; 7(5):359-367, Shakkottai et al.1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229. e Goodfellow et al.1818 Goodfellow NA, Hawwa AF, Reid AJM, Horne R, Shields MD, McElnay J. Adherence to treatment in children and adolescents with cystic fibrosis: a cross-sectional, multi-method study investigating the influence of beliefs about treatment and parental depressive symptoms. BMC Pulm Med 2015; 15:43.. Segundo Lopes2323 Lopes MCB. Aplicação de questionário doença específica na avaliação da qualidade de vida de crianças e adolescentes com fibrose cística no Instituto Fernandes Figueira [dissertação]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2010., adolescentes com FC na faixa etária de 14 a 19 anos se declaram insatisfeitos, devido à necessidade de uma rotina rígida de tratamento e de auto administração de medicamentos, que os deixam muito aborrecidos.
No estudo realizado por Williams et al.2424 Williams B, Mukhopadhyay S, Dowell J, Coyle J. Problems and solutions: accounts by parents and children of adhering to chest physiotherapy for cystic fibrosis. J Disabil Rehabil 2007; 29(14):1097-1105., foi constatado que crianças mais velhas ganham mais responsabilidades para administrarem suas próprias medicações. Esta responsabilidade pode ser prematura para alguns, pois eles ainda podem apresentar problemas emocionais ou cognitivos que interferem em suas habilidades de desempenhar funções independentemente.
Para os pacientes com FC participarem ativamente do seu tratamento, é necessário que, desde a confirmação do diagnóstico, eles tenham consciência da doença, dos sinais e sintomas e da gravidade da doença2121 Mello DB, Moreira MCN. A hospitalização e o adoecimento pela perspectiva de crianças e jovens portadores de fibrose cística e osteogênese imperfeita. Cien Saude Colet 2010; 15(2):453-461.
O ideal é que seja dado a esse adolescente um grau de independência, confiança e vigilância, bem como uma boa comunicação entre a equipe de saúde e o adolescente seja estabelecida, para que a adesão ao tratamento seja favorecida. Já esperávamos encontrar maior adesão em adolescentes mais jovens, devido à maior presença dos pais no tratamento. Com o avançar da idade, os pais estimulam o empoderamento dos adolescentes, embora nem todos estejam preparados para assumir toda a responsabilidade que o tratamento exige.
Verificou-se que 61% dos meninos e 35% das meninas aderiram ao tratamento. Esses dados corroboram os resultados de Shakkottai et al.1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229., que também encontraram maior adesão ao tratamento da FC por parte dos meninos. Possivelmente, essa maior adesão encontrada entre os meninos se deva a maior supervisão dos pais. As mulheres costumam amadurecer mais precocemente e, consequentemente, mais cedo se tornam responsáveis pelo seu tratamento e, muitas vezes, ainda não se encontram totalmente preparadas para tal responsabilidade ou, até mesmo, devido ao desejo de não ganhar peso, algumas meninas podem não aderir ao tratamento com enzimas propositalmente.
Em nosso estudo, as características sociodemográficas não impactaram substancialmente na adesão ao tratamento, resultado semelhante ao encontrado por Conway et al.55 Conway SP, Pond MN, Hamnett T, Watson A. Compliance with treatment in adult patients with cystic fibrosis. Thorax 1996; 51(1):29-33.. E pode ter ocorrido devido a distribuição do medicamento ser gratuita. Embora os adolescentes com pais com escolaridade mais alta tenham demonstrado maior aderência, talvez isso tenha acontecido pelo fato destes pais deterem maior conhecimento sobre a importância do tratamento.
Neste estudo aferimos que os pacientes que aderem ao tratamento são os que conseguiram o diagnóstico da doença mais precocemente (13 meses). Dalcin et al.88 Dalcin PTR, Rampon G, Pasin LR, Ramon GM, Abrahão CLO, Oliveira VZ. Adesão ao tratamento em pacientes com fibrose cística. J Bras Pneumol 2007; 33(6):664., em Porto Alegre, também encontraram uma mediana de idade de diagnóstico menor (108 meses) para os pacientes com FC aderentes e mediana de idade de diagnóstico maior (132 meses) em pacientes não aderentes.
Alguns estudos demonstraram que o diagnóstico precoce diminuiu a morbidade e destacam a importância do início precoce do tratamento da IP e da desnutrição2424 Williams B, Mukhopadhyay S, Dowell J, Coyle J. Problems and solutions: accounts by parents and children of adhering to chest physiotherapy for cystic fibrosis. J Disabil Rehabil 2007; 29(14):1097-1105.,2525 Tauber E, Eichier I, Gartner C, Halmerbauer G, Gotz M, Rath R. Improvements of lung function in cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol 2002; 33(4):263-268..
Em relação ao genótipo observamos que mais da metade da população estudada possuía pelo menos um alelo para a mutação DF508. Este resultado provavelmente se deve ao critério de inclusão (ter insuficiência pancreática), pois há forte associação de homozigose da mutação DF 508 com a IP.
Em um estudo realizado em 2015, na mesma instituição desta pesquisa, aferiu que a maioria dos pacientes com FC apresentam uma ingestão energética e de lipídeos inapropriado, evidenciando baixa aderência a terapia nutricional2626 Chaves CRMM, Costa AC, Cunha ALP, Lacerda SV, Costa RSS. Estado nutricional e distribuição de gordura corporal em crianças e adolescentes com Fibrose Cística. Cien Saude Colet 2015; 20(11):3319-3328..
Em relação à avaliação nutricional pelo IMC/I e E/I, 70% dos entrevistados considerados com estado nutricional inadequado foram classificados como não aderentes. Resultado semelhante foi descrito por Shakkottai et al.1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229., que aferiu quanto maior o IMC maior probabilidade de adesão. Mostrando a relevância da reposição enzimática na manutenção de um bom estado nutricional. Cabe ressaltar que a TRE também auxilia a absorção das vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) evitando entre outras complicações a desmineralização óssea, encontrada nestes pacientes.
Outro fator que pode ter corroborado para o comprometimento do estado nutricional foi o fato de apenas 22,7% dos pacientes realizarem 6 refeições por dia conforme o orientado e o fato de vários pacientes realizarem a TRE somente nas grandes refeições.
Os adolescentes com função pulmonar normal, com obstrução grave e muito grave eram menos aderentes quando comparados aos pacientes com obstrução leve, moderada e moderada grave (Tabela 2). Dziuban et al.2727 Dziuban EJ, Saab-Abazeed L, Chaudhry SR, Streetman DS, Nasr SZ. Identifying barriers to treatment adhrence and related attitudinal patterns in adolescents with cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol 2010; 45(5):450-458. e George et al.2828 George M, Rand-Giovannetti D, Eakin MN, Borrelli B, Zettler M, Riekert KA. Perceptions of barriers and facilitators: selfmanagement decisions by older adolescents and Adults with cf. J Cyst Fibros 2010; 9(6):425-432. encontraram que 42% e 56%, respectivamente, dos pacientes com FC entrevistados em seus estudos não tomam seus medicamentos quando não apresentam sintomas da doença. Presumimos que pacientes com função pulmonar normal, não se sentem doentes e pensam que não precisam de enzimas.
Características clínicas e a relação com a adesão pelo método de dispensação da farmácia de adolescentes com FC acompanhados no centro de referência do Rio de Janeiro de Janeiro de 2015 a dezembro de 2015.
Em contrapartida, aqueles com obstrução pulmonar grave e muito grave, sugere-se que a falta de adesão a TRE deteriorou o estado nutricional e consequentemente a função pulmonar. Provavelmente, devido ao círculo vicioso entre desnutrição e o declínio da função pulmonar, a perda de peso e, consequentemente, a diminuição de massa magra afeta diretamente os músculos respiratórios e a elasticidade pulmonar, levando a um prognóstico ruim da doença2929 Bentur L, Kalnins D, Levinson H, Corey M, Durie PR. Dietary intakes of youg children with cystic fibrosis: is there a difference? J Pediatr Gastroenterol Nutr 1996; 22(3):254-258..
Todos os pacientes entrevistados relataram orientação quanto ao uso das enzimas pancreáticas e apenas 7% possuíam dúvidas sobre sua forma de utilização. Vários estudos também demonstraram a importância da comunicação médico-paciente sobre vários aspectos da doença e do tratamento na adesão a TRE1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229.,2828 George M, Rand-Giovannetti D, Eakin MN, Borrelli B, Zettler M, Riekert KA. Perceptions of barriers and facilitators: selfmanagement decisions by older adolescents and Adults with cf. J Cyst Fibros 2010; 9(6):425-432.,3030 Oliveira VZ, Gomes WB. O adolescer em jovens portadores de doenças orgânicas crônicas. In: Gomes W. Fenomenologia e pesquisa em psicologia. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 1999. p. 97-113..
Assim como aferido por Oliveira e Gomes3030 Oliveira VZ, Gomes WB. O adolescer em jovens portadores de doenças orgânicas crônicas. In: Gomes W. Fenomenologia e pesquisa em psicologia. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 1999. p. 97-113., o nosso estudo sugere que algumas vezes a informação não garante a adesão.
Isto pode ocorrer por uma dificuldade na comunicação entre os profissionais de saúde e os pacientes. Explicar as questões relacionadas ao tratamento baseado no cotidiano e no universo cultural do paciente pode auxiliar no entendimento da terapia prescrita, o que poderá influenciar positivamente na adesão3131 Leite SN, Vasconcelos MPC. Adesão à terapêutica medicamentosa: elementos para discussão de conceitos e pressupostos adotados na literatura. Cien Saude Colet 2003; 8(3):775-782..
Algumas atitudes da equipe de saúde, como: linguagem de fácil entendimento e adequada ao perfil dos pacientes, tempo utilizado para a consulta, atendimento acolhedor, respeito com os questionamentos e motivações para o cumprimento do tratamento, podem interferir positivamente na adesão da terapia3131 Leite SN, Vasconcelos MPC. Adesão à terapêutica medicamentosa: elementos para discussão de conceitos e pressupostos adotados na literatura. Cien Saude Colet 2003; 8(3):775-782..
Um resultado que chamou a atenção foi que somente 4,5% dos pacientes entrevistados recebeu orientação do farmacêutico na hora da dispensação, deixando de lado a relevância do acompanhamento farmacêutico na adesão ao tratamento. Isto não ocorre só no Brasil, no Reino Unido, Mooney et al.3232 Mooney K, Ryan CN, Downey DG. Pharmacists' perpectives on monitoring adherence to treatment in Cystic Fibrosis. Int J Clin Pharm 2016; 38(2):296-302. demonstraram que 76% dos farmacêuticos declarou que o monitoramento de adesão aos pacientes com FC é insuficiente e associam a falta de farmacêutico clínico especialista na equipe multiprofissional como um fator importante na baixa adesão ao tratamento.
É função do farmacêutico realizar atenção farmacêutica, que consiste na provisão responsável da farmacoterapia, prevenir ou resolver os problemas relacionados com os medicamentos. Além disso, compreende a realização do acompanhamento farmacológico e responsabilizar-se junto com o paciente para que o medicamento seguro e eficaz, na posologia correta, resulte no efeito terapêutico desejado3333 Cipolle R, Strand L, Morley P. El ejercicio de La atención farmacêutica. Madrid: McGrawhill, Interamericana; 2000..
A maioria dos pacientes deste estudo não referiu dificuldade ao acesso ao medicamento que é um dos principais fatores responsáveis pela não adesão ao tratamento.
Nesta pesquisa constatamos que 30% dos adolescentes ingeriram as enzimas com a saliva e 4%, com a comida. Este resultado é preocupante porque as enzimas pancreáticas devem ser administradas antes das refeições ou lanches, com o auxílio de um líquido para se misturarem com a comida e realizar a digestão quando passarem pelo intestino3434 Struckmeier SS. Open label, single arm, multicenter study to evaluate the efficacy and tolerability of Creon for children in infants with pancretic exocrine insufficiency caused by cystic fibrosis. Bruxelas: Solvay Pharmaceuticals; 2006..
Dos entrevistados 38% disseram tomar as enzimas com suco, mas cabe ressaltar que este deverá possuir pH < 5,5. Por isto os sucos mais indicados são: maça, laranja e abacaxi. As bebidas com pH acima de 5,5 podem romper o revestimento ácido resistente das enzimas pancreáticas. Isso pode resultar em uma liberação antecipada de enzimas na cavidade oral e possivelmente levará a uma redução da eficácia e irritação das membranas da mucosa3535 Buchler M, Struckmeier SS, Schmidtmann B. Double-blind, multicenter, placebo controlled, randomized, parallel group study to prove superior efficacy of creonminimicrospheres in sachets in subjects with pancreatic exocrine insufficiency caused by total or partial gastrectomy. Bruxelas: Solvay Pharmaceuticals; 2000..
A não adesão ao tratamento medicamentoso não está somente relacionada a tomar ou não o medicamento, mas como o paciente administra seu tratamento em relação à dose, horário, forma de administração e duração. Portanto, a não adesão deve ser assumida como um constructo de múltiplas dimensões3636 Santa Helena ET, Memes MIB, Eluf Neto J. Desenvolvimento e validação de questionário multidimensional para medir não adesão ao tratamento com medicamentos. Rev Saude Publica 2008; 42(4):764-767..
Aproximadamente, 80% dos entrevistados ingerem a enzima antes das refeições, o importante é que estas durem aproximadamente 40 minutos, para que toda enzima seja aproveitada.
Nas entrevistas constatamos que 34% dos pacientes retiram os comprimidos da embalagem original e guardam em outro local. Os laboratórios que produzem as enzimas pancreáticas não garantem a eficácia destas quando tiradas do blister (embalagem metálica onde os comprimidos vêm armazenados)3535 Buchler M, Struckmeier SS, Schmidtmann B. Double-blind, multicenter, placebo controlled, randomized, parallel group study to prove superior efficacy of creonminimicrospheres in sachets in subjects with pancreatic exocrine insufficiency caused by total or partial gastrectomy. Bruxelas: Solvay Pharmaceuticals; 2000.. Sendo assim, as mesmas devem permanecer em sua embalagem protegida do sol e umidade.
Neste estudo, aferimos, que em geral, os pacientes menos aderentes costumam tomar as enzimas somente nas grandes refeições, deixando de ingeri-las nos lanches, que podem até apresentar um conteúdo maior de gordura do que o almoço e o jantar, e não levam as enzimas sempre que comem fora de casa. Este último também foi corroborado pelos dados do estudo de Shakkottai et al.1919 Shakkottai A, Kelley MK, Townsend M, Nasr SZ. A Five-Year Retrospective Analysis of Adherence in Cystic Fibrosis. Pediatric Pulmonology 2015; 50(12):1224-1229..
Nesta pesquisa observamos que a maioria dos entrevistados disse que a TRE não atrapalhava sua rotina, entretanto, verificou-se que 55% tomaram enzimas escondidos e 32% deixaram de ingerir as cápsulas por vergonha. George et al.2828 George M, Rand-Giovannetti D, Eakin MN, Borrelli B, Zettler M, Riekert KA. Perceptions of barriers and facilitators: selfmanagement decisions by older adolescents and Adults with cf. J Cyst Fibros 2010; 9(6):425-432. e Sawicki et al.3737 Sawicki GS, Holier KS, Dermars N, Robinson WM. Motivating adherence among adolescents with cystic fibrosis youth and parent perspectives. Pediatr Pulmonol 2015; 2(127):136-150., encontraram como barreiras da adesão ao tratamento da FC a falta de tempo e vergonha. Lopes2323 Lopes MCB. Aplicação de questionário doença específica na avaliação da qualidade de vida de crianças e adolescentes com fibrose cística no Instituto Fernandes Figueira [dissertação]. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2010., em outro estudo sobre qualidade de vida de crianças e adolescentes com FC, observou que adolescentes ficam incomodados ao incluir, na sua rotina diária, os cuidados com o tratamento, pelo fato de ocupar muito tempo e reclamam de administrar as enzimas em horário de convívio com os amigos, o que pode ser responsável pelos resultados negativos sobre adesão ao tratamento. Isso sugere que não é tão fácil, aceitar e associar o tratamento a sua rotina. Isso também ressalta a necessidade da equipe de saúde conversar mais sobre a doença, sobre o tratamento e seus estigmas com os pacientes.
Murphy et al.3838 Murphy DVA, Sarr M, Durako SJ, Moscicki AB, Wilson CM, Muenz LR; Adolescent Medicine HIV/AIDS Research Network. Barries to HAART, adherence among immunodeficiency vírus-infected adolescents. Arch Pediatr Adolesc Med 2003; 157(3):249-255. concluíram em seu estudo que, quando os adolescentes não possuem o hábito de administrar as medicações junto com as atividades diárias, apresentam dificuldades em seguir o tratamento. Principalmente para aqueles em que a adesão pode ser vista não apenas como um problema de tomar a medicação, mas também representar uma mudança no estilo de vida.
Neste estudo verificamos que 95% dos entrevistados acham a TRE indispensável para à saúde, apesar de a adesão ser inferior à metade dos entrevistados. Goodfellow et al.1818 Goodfellow NA, Hawwa AF, Reid AJM, Horne R, Shields MD, McElnay J. Adherence to treatment in children and adolescents with cystic fibrosis: a cross-sectional, multi-method study investigating the influence of beliefs about treatment and parental depressive symptoms. BMC Pulm Med 2015; 15:43. e Sawicki et al.3737 Sawicki GS, Holier KS, Dermars N, Robinson WM. Motivating adherence among adolescents with cystic fibrosis youth and parent perspectives. Pediatr Pulmonol 2015; 2(127):136-150. acreditam que, quando os pacientes assumem que o tratamento é necessário para sua saúde, isso é um facilitador para adesão.
A avaliação da adesão pelo questionário de Morisky-Green realizada neste estudo mostra que 89% dos adolescentes se esqueceram de tomar as enzimas nos 3 meses anteriores à aplicação do questionário. Este dado sugere que o esquecimento é uma das maiores barreiras a ser enfrentada para se alcançar a adesão ao tratamento.
Nos casos em que o paciente se esquece de tomar as enzimas eles são orientados que se o mesmo lembrar dentro de 30 minutos a enzima deverá ser ingerida3535 Buchler M, Struckmeier SS, Schmidtmann B. Double-blind, multicenter, placebo controlled, randomized, parallel group study to prove superior efficacy of creonminimicrospheres in sachets in subjects with pancreatic exocrine insufficiency caused by total or partial gastrectomy. Bruxelas: Solvay Pharmaceuticals; 2000.. Caso ultrapasse esse tempo o ideal é pular a dose e continuar o tratamento normalmente. Essa questão deve ser reforçada nas orientações fornecidas pelo profissional de saúde tendo em vista que 50% dos pacientes simplesmente pulam a dose e 36% tomam a hora que lembram.
Apesar do delineamento do estudo, o resultado é preocupante, pois a baixa adesão à terapia de reposição das enzimas pancreáticas leva à esteatorreia que é um dos principais fatores responsáveis pelo comprometimento do estado nutricional. Sendo este um fator prognóstico independente da doença.
Nos Estados Unidos, o não cumprimento para regimes de medicação pode custar US $300 bilhões anualmente, resultante da ineficácia do tratamento e agravamento da progressão e complicações da doença, medicação, eventos adversos, internações e reinternações, consultas de emergência, e até mesmo a morte3939 Shi L, Liu J, Fonseca V, Walker P, Kalsekar A, Pawaskar M. Correlation between adherence rates measured by MEMS and self-reported questionnaires: a meta-analysis. Health Qual Life Outcomes 2010; 8:99..
Conclusões
A prevalência encontrada de adesão à terapia de reposição enzimática por adolescentes com FC foi baixa isto é preocupante porque poderá trazer implicações econômicas para o centro de referência e o SUS e possivelmente contribuirá para um declínio do estado clínico.
A realização do diagnóstico precoce é de grande importância para os pacientes com fibrose cística, pois observamos que quando diagnosticados precocemente estes têm melhor adesão ao tratamento.
Intervenções devem ser pensadas principalmente para os adolescentes mais velhos, que foram os menos aderentes a TRE, pois eles em breve serão tratados como adultos e transferidos para outro hospital, se não estiverem preparados para assumir tamanha responsabilidade, problemas relacionados à adesão ao tratamento poderão surgir.
O método de avaliação de adesão Morisky-Green, devido a sua inflexibilidade, se mostrou inadequado para avaliação da adesão ao tratamento com enzimas pancreáticas.
Orientações sobre a forma de armazenamento e administração das enzimas pancreáticas devem ser reforçadas pela equipe multiprofissional, pois observamos algumas condutas inadequadas que interferem diretamente na eficácia do tratamento. A criação de estratégias e estudos longitudinais para clarear os fatores que interferem na adesão também é importante.
Medir a adesão dos pacientes com FC a terapia prescrita é o primeiro passo para compreensão do potencial de não adesão e resultados adversos que possam surgir no decurso da doença. A equipe de saúde tem que estar alerta para esses sinais de não adesão a fim de evitar a ineficácia do tratamento.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
25 Nov 2019 -
Data do Fascículo
Dez 2019
Histórico
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Recebido
02 Mar 2017 -
Aceito
22 Maio 2018 -
Publicado
24 Maio 2018