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Opinião das mães sobre a posição do bebê dormir após campanha nacional: estudo de base populacional no extremo sul do Brasil

The opinion of mothers regarding babies' sleeping position after a national campaign: a population-based study in the far south of Brazil

Resumos

OBJETIVOS:

avaliou-se o conhecimento materno sobre a posição do bebê dormir após campanha nacional.

MÉTODOS:

aplicou-se questionário padronizado às mães que tiveram filho em 2010 em Rio Grande, RS.

RESULTADOS:

dentre as 2395 mães entrevistadas, 20% referiram conforme campanha o decúbito dorsal como a melhor posição para o bebê dormir. Destas, 39% disseram ter obtido este conhecimento junto à campanha nacional. Dentre aquelas que indicaram o decúbito lateral como posição correta, 74% disseram ter aprendido com suas mães.

CONCLUSÕES:

evidencia-se potencial impacto da campanha nacional e importante influência da avó materna sobre a opinião das mães em colocar o bebê para dormir em decúbito dorsal.

Morte súbita; Decúbito dorsal; Avaliação de impacto


OBJECTIVES:

to evaluate the knowledge of mother's regarding the sleeping position of babies after a national campaign.

METHODS:

a standardized questionnaire was applied to mothers who had had a baby in 2010 in Rio Grande, in the Brazilian State of Rio Grande do Sul.

RESULTS:

of the 2395 mothers interviewed, 20% agreed with the campaign that the dorsal decubitus position is the best sleeping position for babies. Of these, 39% stated that they had obtained this information from the national campaign. Of those who stated that the lateral decubitus position was the correct one, 74% said that they had learnt this from their mothers.

CONCLUSIONS:

the study provides evidence of the potential impact of the national campaign and the important influence of the maternal grandmother on the opinion of mothers regarding placing babies in the dorsal decubitus position when sleeping.

Death sudden; Supine position; Impact evaluation


Introdução

A ocorrência de óbito entre menores de um ano sem causa aparente, sem explicação pelas informações coletadas ou pela realização de exame pós-morte é classificada como síndrome da morte súbita do lactente (SMSL).11. American Academy of Pediatrics. Task force on infant sleep position and sudden infant death syndrome. Changing concepts of sudden infant death syndrome: implications for infant sleeping environment and sleep position. Pediatrics. 2000;105:650-6. Sua incidência varia de 0,5 a 3,5/1000 em diferentes países.22. Miller LC,Johnson A, Duggan L, Behm M. Consequences of the "Back to Sleep" Program in Infants. J Pediatric Nurs. 2011;26:364-8.,33. Geib LT, Nunes ML. The incidence of sudden death syndrome in a cohort of infants. J Pediatr. 2006;82:21-6. A principal forma de evitar este tipo de óbito é a colocação do lactente para dormir em decúbito dorsal (posição supina).22. Miller LC,Johnson A, Duggan L, Behm M. Consequences of the "Back to Sleep" Program in Infants. J Pediatric Nurs. 2011;26:364-8.

Há poucos estudos sobre o tema no Brasil.33. Geib LT, Nunes ML. The incidence of sudden death syndrome in a cohort of infants. J Pediatr. 2006;82:21-6.

4. Pinho APS, Nunes ML. Epidemiological profile and strategies for diagnosing SIDS in a developing country. J Pediatr. 2011;87:115-22.

5. Nunes ML, Pinho APS, Aerts D, Sant' Anna A, Martins MPM, Costa JC. Síndrome da morte súbita do lactente: aspectos clínicos de uma doença subdiagnosticada. J Pediatr. 2001;77:29-34.
-66. Pinho APS, Aerts D, Nunes ML. Fatores de risco para síndrome da morte súbita do lactente em um país em desenvolvimento. Rev Saúde Pública. 2008;42:396-401. Apesar das limitações desses estudos, quer seja em decorrência da dificuldade em estabelecer diagnóstico preciso do óbito ou em função do reduzido número de casos, estima-se incidência entre 0,6 e 4,0/1000.33. Geib LT, Nunes ML. The incidence of sudden death syndrome in a cohort of infants. J Pediatr. 2006;82:21-6.

Em vista de esta taxa de óbito ser importante e da facilidade de intervenção foi instituída em 2009, por iniciativa da Pastoral da Criança em parceria com várias outras entidades, a campanha nacional "Dormir de Barriga para Cima".77. Pastoral da Criança. [acesso em 2 out 2013]. Disponível em: http://pastoraldacrianca.org.br/noticias2
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Esta campanha estimulava às mães a colocar o recém-nascido para dormir na posição supina e se baseou na produção de videotapes, material impresso e outdoors disponibilizados em algumas capitais do país. Além destes, foram criados hot sites e blogs e concedidas entrevistas pela coordenação adjunta da Pastoral da Criança em diversos meios de comunicação visando prestar esclarecimento sobre a Campanha.77. Pastoral da Criança. [acesso em 2 out 2013]. Disponível em: http://pastoraldacrianca.org.br/noticias2
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Esta iniciativa foi também divulgada junto com a Campanha Nacional de Vacinação contra poliomielite e no 34º Congresso Brasileiro de Pediatria em 2009.77. Pastoral da Criança. [acesso em 2 out 2013]. Disponível em: http://pastoraldacrianca.org.br/noticias2
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Este procedimento simples, de baixo custo pode contribuir para a redução da mortalidade infantil no Brasil. Em vista disso, o presente trabalho teve por objetivo conhecer a opinião das puérperas residentes no município de Rio Grande, RS, após veiculação de campanha nacional incentivando colocar o bebê para dormir em decúbito dorsal.

Métodos

Todas as puérperas cujos recém-nascidos tenham apresentado peso igual ou superior a 500 gramas ou pelo menos 20 semanas de idade gestacional e que tenham sido assistidas nas maternidades da Santa Casa de Misericórdia e no Hospital Universitário da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) entre 01/01 e 31/12 de 2010 foram incluídos neste estudo. No caso de gemelar, somente um questionário era respondido pela mãe. Além disso, estas mães deveriam residir em Rio Grande, município com cerca de 200 mil habitantes localizado na metade sul do Estado do Rio Grande do Sul, distante cerca de 300 km de Porto Alegre. Utilizou-se delineamento transversal, sendo as mães entrevistadas na maternidade em até 24 horas após o parto.

As informações foram coletadas por meio de questionário único pré-codificado com a quase totalidade das perguntas fechadas. Três entrevistadoras com nível universitário foram previamente treinadas e contratadas para aplicar os questionários. Todas as mães assinaram termo de consentimento antes da realização da entrevista.

Os questionários aplicados foram codificados pelas próprias entrevistadoras ao final de cada dia de trabalho e entregues na sede do projeto onde eram revisados, digitados e analisados em blocos de, no máximo, 100 questionários quanto à presença de valores inesperados. Em seguida, foram colocados rótulos e realizada categorização de variáveis bem como criadas variáveis derivadas. Esta entrada de dados foi feita utilizando-se o programa Epidata 3.1,88. Lauritsen JM. (Ed.) EpiData Data Entry, Data Management and basic Statistical Analysis System. Odense Denmark, EpiData Association, 2000-2008. Http://www.epidata.dk
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enquanto a análise dos dados, que consistiu de listagem de frequência simples, foi realizada no programa Stata 11.0.99. StataCorp. Stata statistical software: release 11.2. College Station: Stata Corporation; 2011.

O controle de qualidade constou de repetição de 5% das entrevistas, sendo isto feito na maioria das vezes por telefone ou através de visita domiciliar. O protocolo de pesquisa foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde (CEPAS) da Universidade Federal do Rio Grande. Às mães foi garantida confidencialidade dos dados coletados, participação voluntária e possibilidade de deixar o estudo quando desejassem, sem necessidade de justificativa.

Resultados

Em 2010 houve 2464 nascimentos cujas mães residiam no município de Rio Grande. Destas, 2395 (97,2% do total) foram entrevistadas e sete (0,3%) gemelares foram excluídos. Pouco mais de um quinto das mães era constituída de adolescentes (<20 anos); 70% eram de cor da pele branca, 83% viviam com companheiro, 55% possuíam nove anos ou mais de escolaridade, 49% renda familiar superior a 2 salários mínimos mensais (SMM) e 57% delas exerceram trabalho remunerado durante a gestação; cerca de 80% realizaram seis ou mais consultas de pré-natal, iniciaram estas consultas ainda no primeiro trimestre de gravidez e consultaram sempre com o mesmo médico; 55% realizaram pré-natal em serviços públicos, 57% tiveram parto cesariana, 44% eram primigestas e 3% já tiveram pelo menos um filho morto.

A Tabela 1 mostra que somente 20,0% das mães afirmaram que a melhor posição para o bebê dormir é o decúbito dorsal. Destas, 41,9% alegaram que esta posição evita de a criança afogar-se ou engasgar-se, 37,5%disseram que esta posição de dormir havia sido recomendada na campanha nacional, enquanto 29,4% disseram ter esta opinião em virtude de orientação dada pelo médico. É possível verificar ainda que a maioria das mães (76,8%) disse que a posição mais adequada para o recém-nascido dormir é o decúbito lateral. A principal razão era, segundo elas, também para não se afogar, não se engasgar (75,6%). Cerca de três quartos delas (73,6%) disseram ter aprendido isto com suas mães (avó materna).

Tabela 1
Opinião das mães sobre a posição do bebê dormir. Rio Grande, RS, 2010.

Discussão

Pouco mais de um quinto das mães (20,5%) mostrou intenção de colocar o filho para dormir na posição supina conforme recomendado na campanha nacional. Para a maioria delas, esta decisão foi baseada em informações veiculadas na própria campanha e naquelas repassadas pelos médicos. Em relação às demais mães, que pretendem colocar o bebê para dormir em decúbito lateral, esta decisão foi tomada com base em recomendação feita pela avó materna do recém-nascido.

A proporção de mães riograndinas com intenção de colocar o bebê para dormir na posição supina foi relativamente baixa. No entanto, é interessante notar que de cada sete delas, praticamente quatro tomaram esta decisão com base em informações veiculadas na Campanha Nacional e três a partir de orientações dadas pelo médico. Como os médicos não foram entrevistados, não se sabe se este conhecimento foi também adquirido a partir desta Campanha. De qualquer forma, se acrescentarmos a estes dois achados o fato de metade daquelas com intenção de colocar o bebê para dormir em decúbito lateral mostrarem-se dispostas a adotar a posição supina para o seu filho dormir, desde que esta recomendação fosse feita por médico, praticamente 60,0% (0,78 x 0,50 + 0,20 = 59,0%) dos recém-nascidos de Rio Grande passariam a dormir na posição correta. Embora seja necessário interpretar este dado com cautela em virtude do delineamento utilizado, evidencia-se enorme potencial de aumento da cobertura para esta iniciativa. A partir dos dados aqui apresentados fica também evidente a influência da avó materna sobre a intenção da mãe colocar o bebê para dormir em decúbito lateral. É bem provável que esta influência decorra de experiência prévia, já que esta era a posição anteriormente adotada. Esta forma de agir pode ter sido decorrente da não indicação de qualquer posição para dormir, do fato de a morte súbita ser um evento relativamente raro e de estes óbitos não terem sido atribuídos à posição inadequada para dormir, fato reconhecido há não mais que três décadas.11. American Academy of Pediatrics. Task force on infant sleep position and sudden infant death syndrome. Changing concepts of sudden infant death syndrome: implications for infant sleeping environment and sleep position. Pediatrics. 2000;105:650-6.

2. Miller LC,Johnson A, Duggan L, Behm M. Consequences of the "Back to Sleep" Program in Infants. J Pediatric Nurs. 2011;26:364-8.

3. Geib LT, Nunes ML. The incidence of sudden death syndrome in a cohort of infants. J Pediatr. 2006;82:21-6.

4. Pinho APS, Nunes ML. Epidemiological profile and strategies for diagnosing SIDS in a developing country. J Pediatr. 2011;87:115-22.

5. Nunes ML, Pinho APS, Aerts D, Sant' Anna A, Martins MPM, Costa JC. Síndrome da morte súbita do lactente: aspectos clínicos de uma doença subdiagnosticada. J Pediatr. 2001;77:29-34.
-66. Pinho APS, Aerts D, Nunes ML. Fatores de risco para síndrome da morte súbita do lactente em um país em desenvolvimento. Rev Saúde Pública. 2008;42:396-401.

Apesar deste relativo sucesso e enorme potencial, a Campanha "Dormir de Barriga para Cima" deixou de ser veiculada em 2011. A retomada desta campanha, que deverá ocorrer a partir de 2014, deveria buscar uma participação mais efetiva dos médicos, das avós, sobretudo da avó materna, e das mães. Este conhecimento de que a posição mais segura para o bebê dormir é aquela em decúbito dorsal deve ser amplamente disseminado e reforçado junto a estes grupos populacionais. Além disso, tanto nas consultas individuais quanto nos grupos de gestantes esta informação deveria ser exaustivamente difundida junto às mães por todos os profissionais de lidam com a assistência pré-natal.

Em termos de pesquisa seria oportuno conhecer também a opinião dos médicos. É bem possível que muitos desconheçam que a posição supina seja a mais segura para o bebê dormir e que, mesmo sabendo desta nova recomendação pelo menos aqui no Brasil, alguns se mostrem resistentes em virtude de orientações dadas no passado favorável ao decúbito lateral ao até mesmo ao decúbito ventral.

Assim como em outras localidades, é de fundamental importância a identificação de fatores associados à morte súbita na infância bem como a criação de mecanismos de intervenção que resultem na mudança desta prática e que permitam medir o impacto de dormir na posição supina sobre a mortalidade infantil.1010. Robida D, Moon RY. Factors influencing infant sleep position: decisions do not differ by SES in African-American families. Arch Dis Child. 2012;97:900-5.,1111. Chung-Park MS. Knowledge, opinions, and practices of infant sleep position among parents. Mil Med. 2012;177:235-9. Isto possibilitaria reduzir a ocorrência de óbitos infantil a partir de uma medida simples, de baixíssimo custo e com total possibilidade de execução pelas próprias mães, familiar ou pelo seu cuidador. Persistindo o quadro atual, a mortalidade infantil no Brasil continuará semelhante à de países muito menos desenvolvidos.

Referências

  • 1
    American Academy of Pediatrics. Task force on infant sleep position and sudden infant death syndrome. Changing concepts of sudden infant death syndrome: implications for infant sleeping environment and sleep position. Pediatrics. 2000;105:650-6.
  • 2
    Miller LC,Johnson A, Duggan L, Behm M. Consequences of the "Back to Sleep" Program in Infants. J Pediatric Nurs. 2011;26:364-8.
  • 3
    Geib LT, Nunes ML. The incidence of sudden death syndrome in a cohort of infants. J Pediatr. 2006;82:21-6.
  • 4
    Pinho APS, Nunes ML. Epidemiological profile and strategies for diagnosing SIDS in a developing country. J Pediatr. 2011;87:115-22.
  • 5
    Nunes ML, Pinho APS, Aerts D, Sant' Anna A, Martins MPM, Costa JC. Síndrome da morte súbita do lactente: aspectos clínicos de uma doença subdiagnosticada. J Pediatr. 2001;77:29-34.
  • 6
    Pinho APS, Aerts D, Nunes ML. Fatores de risco para síndrome da morte súbita do lactente em um país em desenvolvimento. Rev Saúde Pública. 2008;42:396-401.
  • 7
    Pastoral da Criança. [acesso em 2 out 2013]. Disponível em: http://pastoraldacrianca.org.br/noticias2
    » http://pastoraldacrianca.org.br/noticias2
  • 8
    Lauritsen JM. (Ed.) EpiData Data Entry, Data Management and basic Statistical Analysis System. Odense Denmark, EpiData Association, 2000-2008. Http://www.epidata.dk
    » Http://www.epidata.dk
  • 9
    StataCorp. Stata statistical software: release 11.2. College Station: Stata Corporation; 2011.
  • 10
    Robida D, Moon RY. Factors influencing infant sleep position: decisions do not differ by SES in African-American families. Arch Dis Child. 2012;97:900-5.
  • 11
    Chung-Park MS. Knowledge, opinions, and practices of infant sleep position among parents. Mil Med. 2012;177:235-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2013

Histórico

  • Recebido
    14 Fev 2013
  • Revisado
    03 Jun 2013
  • Aceito
    10 Jul 2013
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