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Parametrização de modelo agrometeorológico de estimativa de produtividade do cafeeiro nas condições do Estado de São Paulo

Calibration of an agrometeorological model for predicting coffee (Coffea arabica L.) productivity in Sao Paulo State, Brazil

Resumos

O desenvolvimento de modelos agrometeorológicos que possibilitem a estimativa de quebra de produtividade antecipada é importante para subsidiar os programas de previsão de safras de café. Uma boa estimativa da produtividade implica utilização de modelos que considerem os efeitos ambientais aos processos fisiológicos determinantes da produção. Este trabalho teve o objetivo de modificar e parametrizar um modelo matemático agrometeorológico de monitoramento e de estimativa de quebra de produtividade do cafeeiro (Coffea arabica L.), considerando diferentes regiões do Estado de São Paulo. O modelo original se baseia apenas na penalização da produtividade potencial da cultura em função do déficit hídrico quantificado através da relação [1- (ETr/ETp)], ajustadas por coeficientes de sensibilidade da cultura (ky) ocorridos em diferentes fases fenológicas. O modelo foi modificado visando considerar também os efeitos da produtividade do ano anterior e de temperaturas adversas. A parametrização dos coeficientes "ky" indicou os maiores valores durante as fases do florescimento e da granação. O teste do modelo parametrizado indicou valores de coeficientes de correlação "R" entre 0,76 e 0,93, de índices de concordância "d" entre 0,73 e 0,90, de índices de confiança "C" entre 0,60 e 0,84 e de erros aleatórios (Ea), variando de 144 a 558 Kg.ha-1. Os valores de erros sistemáticos (Es) foram relativamente baixos para as Fazendas São Carlos e Monte D'Este (324 e 396 kg ha-1), quando comparados com a E.E. Mococa e Fazenda Serra (744 e 762 kg ha-1), pois apresentaram pequena tendência a superestimar a produtividade. Por esses resultados, verifica-se que o modelo modificado e parametrizado tem potencial para estimar a produtividade do café, podendo servir como subsídio aos trabalhos de previsão de safra.

café; produtividade; fenologia; modelagem; coeficientes de sensibilidade; deficiência hídrica; temperatura do ar


Agrometeorological models make possible to assess the quantitative influence of climatic variables, such as air temperature and soil water balance on the coffee development and grain production. An agrometeorological model (CAMARGO et al., 2003) that monitor and assess agrometeorological impact on coffee yields just before the beginning of the maturation growth stage was modified and calibrated. Grain yield were collected from adult coffee plantations at four different regions of the State of Sao Paulo, Brazil. The modified agrometeorological model is based in two parts: first, the model estimates the beginning of the floral induction based on accumulated growing degree days, and a critical rainfall depth. The second part is based on penalization of the potential crop grain yield according to the previous yield and the water stress ratio (ETr/ETp), derived by a 10-day soil water balance during different growth stages. These ratios were weighted by derivation of crop phase yield-response sensitivity coefficients (Ky values), in a multiplicative type model. Also, the model considers penalization for minimum and maximum air temperature. An analysis of the sensitivity coefficients values shows that this model gives higher weight to the water relations during flowering and coffee bean formation phases. This period generally occurs between October and January and it will determine the production of the coffee crop. The statistical analysis for actual and estimated coffee grain yield presented a good linear relationship, "R" between 0.76 and 0.93, "d" index of agreement between 0.73 and 0.90, "C" index of performance between 0.60 and 0.84, and "Ea" unsystematic error between 144 and 558 kg ha-1. The values of "Es" systematic error were relatively low, between 324 and 762 kg ha-1, showing a little tendency of the model to overestimate the predicting coffee grain productivity. The results support the overall conclusion that the proposed model shows a good capacity to estimate coffee grain productivity and it is a promising tool for monitoring climatic impacts on coffee grain yields.

coffee; productivity; phenology; modelling; sensitivity coefficients; water deficit; air temperature


METODOLOGIA E TÉCNICAS EXPERIMENTAIS

Parametrização de modelo agrometeorológico de estimativa de produtividade do cafeeiro nas condições do Estado de São Paulo

Calibration of an agrometeorological model for predicting coffee (Coffea arabica L.) productivity in Sao Paulo State, Brazil

Marco Antonio dos SantosI; Marcelo Bento Paes de CamargoII

IAluno de Mestrado no Curso de Agricultura Tropical e Subtropical, área de Concentração Tecnologia da Produção Agrícola, IAC, Campinas, SP. Com bolsa CAPES. E-mail: marcoins@uol.com.br

IIInstituto Agronômico (IAC), 13012-970 Campinas (SP). E-mail: mcamargo@iac.sp.gov.br. Com bolsa de produtividade científica do CNPq

RESUMO

O desenvolvimento de modelos agrometeorológicos que possibilitem a estimativa de quebra de produtividade antecipada é importante para subsidiar os programas de previsão de safras de café. Uma boa estimativa da produtividade implica utilização de modelos que considerem os efeitos ambientais aos processos fisiológicos determinantes da produção. Este trabalho teve o objetivo de modificar e parametrizar um modelo matemático agrometeorológico de monitoramento e de estimativa de quebra de produtividade do cafeeiro (Coffea arabica L.), considerando diferentes regiões do Estado de São Paulo. O modelo original se baseia apenas na penalização da produtividade potencial da cultura em função do déficit hídrico quantificado através da relação [1- (ETr/ETp)], ajustadas por coeficientes de sensibilidade da cultura (ky) ocorridos em diferentes fases fenológicas. O modelo foi modificado visando considerar também os efeitos da produtividade do ano anterior e de temperaturas adversas. A parametrização dos coeficientes "ky" indicou os maiores valores durante as fases do florescimento e da granação. O teste do modelo parametrizado indicou valores de coeficientes de correlação "R" entre 0,76 e 0,93, de índices de concordância "d" entre 0,73 e 0,90, de índices de confiança "C" entre 0,60 e 0,84 e de erros aleatórios (Ea), variando de 144 a 558 Kg.ha-1. Os valores de erros sistemáticos (Es) foram relativamente baixos para as Fazendas São Carlos e Monte D'Este (324 e 396 kg ha-1), quando comparados com a E.E. Mococa e Fazenda Serra (744 e 762 kg ha-1), pois apresentaram pequena tendência a superestimar a produtividade. Por esses resultados, verifica-se que o modelo modificado e parametrizado tem potencial para estimar a produtividade do café, podendo servir como subsídio aos trabalhos de previsão de safra.

Palavras-chave: café, produtividade, fenologia, modelagem, coeficientes de sensibilidade, deficiência hídrica, temperatura do ar.

ABSTRACT

Agrometeorological models make possible to assess the quantitative influence of climatic variables, such as air temperature and soil water balance on the coffee development and grain production. An agrometeorological model (CAMARGO et al., 2003) that monitor and assess agrometeorological impact on coffee yields just before the beginning of the maturation growth stage was modified and calibrated. Grain yield were collected from adult coffee plantations at four different regions of the State of Sao Paulo, Brazil. The modified agrometeorological model is based in two parts: first, the model estimates the beginning of the floral induction based on accumulated growing degree days, and a critical rainfall depth. The second part is based on penalization of the potential crop grain yield according to the previous yield and the water stress ratio (ETr/ETp), derived by a 10-day soil water balance during different growth stages. These ratios were weighted by derivation of crop phase yield-response sensitivity coefficients (Ky values), in a multiplicative type model. Also, the model considers penalization for minimum and maximum air temperature. An analysis of the sensitivity coefficients values shows that this model gives higher weight to the water relations during flowering and coffee bean formation phases. This period generally occurs between October and January and it will determine the production of the coffee crop. The statistical analysis for actual and estimated coffee grain yield presented a good linear relationship, "R" between 0.76 and 0.93, "d" index of agreement between 0.73 and 0.90, "C" index of performance between 0.60 and 0.84, and "Ea" unsystematic error between 144 and 558 kg ha-1. The values of "Es" systematic error were relatively low, between 324 and 762 kg ha-1, showing a little tendency of the model to overestimate the predicting coffee grain productivity. The results support the overall conclusion that the proposed model shows a good capacity to estimate coffee grain productivity and it is a promising tool for monitoring climatic impacts on coffee grain yields.

Key words: coffee, productivity, phenology, modelling, sensitivity coefficients, water deficit, air temperature.

1. INTRODUÇÃO

O conhecimento prévio das safras agrícolas torna-se cada vez mais uma questão estratégica para o país, seja para o planejamento do abastecimento interno, seja para a orientação das ações referentes ao mercado externo. A estimativa antecipada e precisa da produção de café requer o conhecimento do tripé "Área-Produtividade-Tempo". A área pode ser estimada através das tecnologias de imagem de satélite georeferenciadas em campo, como base para o mapeamento geoprocessado e conseqüente cadastramento das áreas cafeeiras. O tempo é importante, pois uma estimativa consistente deve ser obtida antecipadamente, pelo menos até o ultimo bimestre do ano anterior à produção. O conhecimento da produtividade é fundamental para caracterizar a produção final. A produtividade envolve vários fatores como insumos, avanços técnicos, fatores biológicos e climáticos, na qual esse último é fundamental, podendo ser bem caracterizado através de modelos agrometeorológicos.

A utilização de modelos agrometeorológicos que monitoram os efeitos do clima durante os estádios fenológicos críticos do cafeeiro é importante para a estimativa de produtividade. No Brasil, alguns trabalhos sobre modelos agrometeorológicos aplicados para a estimativa da produtividade do cafeeiro podem ser encontrados, como TOSELLO e ARRUDA (1962), CAMARGO et. al. (1984), SILVA et al. (1987), LIU e LIU (1988), WEILL (1990), PICCINI et al. (1999), CARVALHO et al. (2003) e CAMARGO et al. (2003).

PICCINI et al. (1999) e CARVALHO et al. (2003) testaram diferentes modelos agrometeorológicos para estimativa de produtividade de café, com base nos modelos matemáticos de STEWART et al. (1976), DOORENBONS e KASSAN (1979) e de RAO (1988). Esses modelos sugerem que o consumo hídrico seja expresso pela razão entre a evapotranspiração real (ETr) e a evapotranspiração potencial (ETp) ocorridos nos diferentes estádios fenológicos da cultura, quantificando assim o efeito da água disponível no solo sobre o decréscimo da produtividade final. Incluem, também a produtividade do ano anterior devido à interdependência de um ano sobre o subseqüente, que causa a alternância ou bienalidade produtiva, resultante da ação da partição de elementos fotossintetizados entre as relações fonte-dreno, em vista de as fases reprodutiva e de crescimento vegetativo para o ano seguinte ocorrerem simultaneamente (BARROS, 1997).

Esses modelos, no entanto, penalizam a produtividade apenas pelo fator déficit hídrico que segundo CARVALHO et al. (2003) e CAMARGO et al. (2003) não deve ser considerado isoladamente, pois outros fatores climáticos interferem na produtividade, especialmente temperaturas do ar adversas ocorridas nos diferentes estádios fenológicos da cultura. Assim, CAMARGO et. al. (2003) propuseram um modelo matemático fenológico-agrometeorológico de monitoramento visando estimar a quebra de produtividade do café, embasado em componentes fenológicos, hídricos e térmicos. Os autores ressaltam a necessidade da parametrização dos coeficientes de sensibilidade e teste do modelo para diferentes regiões. A identificação e parametrização dos coeficientes de sensibilidade relacionados aos fatores fenológicos, térmicos e do balanço hídrico são de fundamental importância para a obtenção de modelos agrometeorológicos de estimativa de quebra de produtividade mais consistentes, os quais são dependentes dos níveis hierárquicos de estimativa de produtividade, como para planta, talhão, município ou região.

O objetivo do trabalho foi modificar e parametrizar o modelo matemático agrometeorológico proposto por CAMARGO et al. (2003) de monitoramento e estimativa de quebra de produtividade do cafeeiro, em nível de talhão, para diferentes regiões cafeeiras do Estado de São Paulo.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Foram consideradas produtividades (kg ha-1 de café beneficiado) observadas de talhões com cafeeiros adultos de quatro diferentes regiões agroecológicas do Estado de São Paulo, referente aos municípios de Mococa, Campinas e Gália (Tabela 1).

Da região de Mococa foram utilizados dados de duas áreas. A primeira, da antiga Estação Experimental de Mococa (E.E.Mococa) do IAC, com altitude média de 665 m e produtividades referentes a nove anos (1965/66 a 1973/74) de talhões da variedade Mundo Novo, plantados em 1956 em uma área de 0,76 ha, com espaçamento de 3,5 x 2,0 m (GALLO, 1995). A segunda área, Fazenda Serra, com altitude média de 827 m, com produtividades de 13 anos (1990/91 a 2002/03) de oito talhões de café da variedade Mundo Novo, plantados entre 1970 e 1986 em uma área de 14,2 ha, com espaçamentos médios de 3,8x2,5 m (FAHL et al., 2001).

Da região de Campinas, foram consideradas produtividades do período de sete anos (1996/97 a 2002/03) de talhões de cafeeiros adultos da Fazenda Monte D'Este, com altitude média de 689 m, relativas a variedades Mundo Novo e Catuaí, com espaçamentos médios de 3,5x2,0 m. Para a região de Gália, com altitude média de 522 m, consideraram-se produtividades de nove talhões da Fazenda São Carlos plantados em 1977, em uma área de 3,4 ha de café Mundo Novo, com espaçamentos médios de 3,5 x 2,0 m referentes ao período de 17 anos (1983/84 a 1999/00).

Os valores diários de temperaturas máximas e mínimas e precipitações pluviais foram obtidos junto aos arquivos do setor de Climatologia Agrícola do Centro Integrado de Informações Agrometeorológicas (CIIAGRO) do Instituto Agronômico (IAC), relativos aos postos meteorológicos localizados próximos aos talhões de café das quatro propriedades consideradas (E.E.Mococa, Fazenda Serra, Fazenda Monte D'Este e Fazenda São Carlos).

Foi utilizado o modelo matemático agrometeorológico de monitoramento, que visa estimar a quebra relativa da produtividade do café, desenvolvido por CAMARGO et al. (2003) para as regiões cafeeiras do Brasil. Basicamente, o modelo multiplicativo é composto por componentes fenológicos, hídricos e térmicos, expressos por:

em que: Q (%) é a estimativa da quebra relativa da produtividade do café; f DH, f TMIN e f TMAX são os fatores de penalização por deficiência hídrica, temperatura mínima e temperatura máxima respectivamente.

O componente fenológico não está inserido na equação acima, pois é utilizado apenas para estimar o início da fase do florescimento pleno do cafeeiro. Utilizou-se o esquema fenológico desenvolvido por CAMARGO e CAMARGO (2001), válido para as condições tropicais do Brasil. Observações efetuadas em cafeeiros adultos revelaram que as gemas florais completam a maturação e entram em dormência, ficando aptas para a antese plena quando o somatório da evapotranspiração potencial (ETp), a partir de abril (decêndio10) atinge cerca de 350 mm. Esse valor é um indicador da quantidade de calor acumulado e influi diretamente na planta. Por esse modelo, a quantidade mínima de chuva necessária para o "choque hídrico" para que as gemas maduras sejam induzidas à antese é de pelo menos 10 mm. Neste trabalho, considerou-se o valor de quantidade de chuva mínima necessária para a antese de 5 mm, por ser esse valor o que simulou com mais precisão o início das floradas nos experimentos com café do IAC. Esse componente fenológico do modelo tem boa capacidade de indicar o início do período da florada principal do café arábica, com erros de estimativa inferiores a um decêndio, podendo ser incorporado ao modelo de monitoramento e de estimativa de quebra de produtividade, que necessita dessa informação fenológica.

O componente hídrico do modelo de café de CAMARGO et al. (2003) é similar aos trabalhos de DOORENBOS e KASSAN (1979) e PICINI (1998) que consideram as penalizações através de "somatórios decendiais". O modelo de CAMARGO et al., (2003) baseia-se nos resultados do balanço hídrico seqüencial, em que o estresse hídrico por deficiência é quantificado através de "produtórios decendiais" das relações [1-(ETr/ETp)] ajustadas por diferentes coeficientes de sensibilidade da cultura ao déficit hídrico (ky), ocorridos nos quatro estádios fenológicos (indução floral, florescimento, granação e maturação).

A parametrização decendial dos valores de ky foi feita com base em critérios e observações experimentais, de acordo com a fenologia bienal do cafeeiro proposta por CAMARGO e CAMARGO (2001). Foram testadas quinze diferentes seqüências de ky, subdivididas em três grupos. O grupo 1 possui seis seqüências (ky1, ky2, ky3, ky4, ky5 e ky6), variando apenas a grandeza dos coeficientes. A penalização pelo déficit hídrico tem início juntamente com a plena florada (setembro ou outubro) e seu maior valor de penalização está entre os meses de outubro e janeiro. No grupo 2, há quatro diferentes seqüências (ky7, ky8, ky9 e ky10), com início da penalização no primeiro decêndio de abril, e valores menores do que os ky do período do florescimento. Nesse segundo grupo foram acrescentadas também as penalizações por temperatura mínima absoluta (geada) e temperaturas elevadas após a antese. Considerou-se ainda o acúmulo térmico para a ocorrência da plena antese, que necessita de uma acumulação térmica equivalente a 340 mm de ETp, a partir do primeiro decêndio de abril, juntamente com chuva de no mínimo 5 mm. O grupo 3 é similar ao anterior, porém com cinco diferentes seqüências (ky11, ky12, ky13, ky14 e ky15), considera coeficientes menores na fase da indução floral e com coeficientes maiores penalizando os déficits hídricos ocorridos (f DH) durante os três primeiros decêndios após a antese principal. A expressão utilizada foi:

em que: é o produtório e ky é o coeficiente de sensibilidade à deficiência hídrica.

Para a estimativa da disponibilidade hídrica do solo, utilizou-se o modelo de balanço hídrico seqüencial, segundo THORNTHWAITE e MATHER (1955), em escala decendial. A capacidade máxima de água disponível (CAD) considerada foi de 100 mm que, segundo ALFONSI et al. (1990), CAMARGO e PEREIRA (1994) e CARVALHO et al. (2003), engloba a grande maioria dos tipos de solos das áreas cafeeiras do Estado de São Paulo.

O componente térmico do modelo se baseia na ocorrência de temperaturas adversas mínimas (fTMIN) e máximas (fTMAX), ocorridas durante os estádios fenológicos críticos e que interferem na produtividade da cultura. Para temperaturas mínimas absolutas, utilizou-se o modelo gaussiano de penalização proposto por CAMARGO et al. (2003), que estima a porcentagem (%) de cafeeiros danificados a partir da ocorrência de temperaturas mínimas absolutas anuais inferiores a 2 °C, obtidas em abrigo meteorológico, ocorridas no ano anterior à produção, da seguinte forma:

em que: fTMIN é a porcentagem de cafeeiros danificados, com base em temperatura mínima absoluta anual; x1 é a temperatura mínima absoluta de abrigo (°C); e os coeficientes a1 = 140,3445; b1 = -2,9580; c1 = 1,7701.

Para temperaturas elevadas durante o florescimento utilizou-se o modelo de Gompertz proposto por CAMARGO et al. (2003) que considera a penalização por temperaturas máximas absolutas do ar superiores a 34 °C, durante os três primeiros decêndios após a plena antese. O valor de 34 °C pode ser substituído pela temperatura média de 23°C, ficando:

em que: fTMAX é a penalização por temperaturas medias decendiais durante os estádios do florescimento e chumbinho (%); x2 é a temperatura média (°C) dos três primeiros decêndios subseqüentes a plena florada e os coeficientes a2 = 141,771; b2 = 17,9486; c2 = 0,6782.

Neste trabalho foi incorporado um fator de penalização pela produção do ano anterior, que considera o coeficiente de sensibilidade (ky0), a produtividade do ano anterior (Yaa) e a produtividade potencial (Yp). Os valores de ky0 testados variaram de 0,60 (menor influência de Yaa) a 1,05 (maior influência de Yaa).

Assim, o modelo agrometeorológico geral de estimativa de produtividade do café com base em funções de penalização pode ser expresso por:

em que: Yest é a produtividade estimada (kg ha-1); Yaa é a produtividade do ano anterior (kg ha-1); Yp é a produtividade potencial da cultura (kg ha-1), sendo considerado a maior produtividade observada no período acrescida de 10%, segundo PICINI et al. (1999) e CARVALHO et al. (2003); ky0 corresponde ao coeficiente de penalização relativo à produtividade do ano anterior e função do nível hierárquico considerado (talhão).

Para os testes do modelo foram comparadas as produtividades estimadas e observadas, utilizando-se plotagem gráfica e análises de regressão envolvendo coeficientes de correlação (R), erros sistemático (Es) e aleatório (Ea) e o índice "d" (índice de concordância) proposto por WILLMOT et al. (1985). O "R" indica a precisão do modelo, ou seja, quanto à variação da variável dependente é explicada por aquela das variáveis independentes. O índice "d", com variação entre 0 e 1, indica o grau de exatidão entre os valores estimados e observados, quanto mais próximo de 1, melhor a exatidão do modelo em estimar a variável dependente. Também foi utilizado o índice de confiança "C," de acordo com CAMARGO e SENTELHAS (1997), o qual associa os coeficientes de correlação "R" (precisão) com o de concordância "d" (exatidão) em forma de produtório.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na figura 1 são apresentadas as séries anuais de produtividade observada das quatro propriedades analisadas, E.E.Mococa, Fazenda Serra, Fazenda Monte D'Este e Fazenda São Carlos. Observa-se na produtividade dos talhões das quatro localidades uma clara alternância entre os anos de baixa e os de alta produção. Observa-se também, grande amplitude das produtividades entre um ano e outro, variando de 66 kg ha-1 para a Fazenda São Carlos no ano agrícola de 1990/91 a 4.320 kg ha-1 para a E.E. Mococa no ano agrícola 1971/72.


As produtividades potenciais estimadas foram da 4.752, 3.468, 3.222 e 3.084 kg ha-1 para a E.E.de Mococa, Fazenda São Carlos, Fazenda Serra e Fazenda Monte D'Este, respectivamente, com base no método proposto por PICINI (1998).

Temperaturas mínimas absolutas anuais (Tminab) inferiores a 2,0 °C foram observadas em todas as localidades, com exceção da E. E. Mococa (Tabelas 2 e 3). As menores Tminab ocorreram no inverno de 1994 nas Fazendas Serra (0,0 °C) e São Carlos (-2,0 °C) que levaram a uma penalização da produtividade pelo fator geada no ano agrícola 1994/95 de 34,7 e 100,0% respectivamente.

Nas tabelas 2 e 3, verificam-se temperaturas mínimas absolutas anuais e temperaturas médias do ar ocorridas no período do florescimento, compreendida para os três decêndios subseqüentes à plena antese. Temperaturas médias acima de 23 °C, que equivalem às temperaturas máximas de 34 °C (CAMARGO et al., 2003), não foram observadas no período de florescimento na Fazenda Monte D'Este em Campinas. Entretanto, ocorreram temperaturas elevadas nas regiões de Mococa e Gália nos anos agrícolas de 1967/68, 1968/69, 1994/95 e 2000/01, provocando perdas na produtividade até de 6%, como no ano agrícola de 1994/95 em Mococa devido à temperatura média de 24,8 °C.

Os balanços hídricos decendiais indicaram para o município de Mococa que, em alguns anos agrícolas ocorreram períodos com déficit hídrico acentuado, prejudicando a produtividade final do cafeeiro como em 1967/68, 1968/69, 1999/00, 2000/01 e 2002/03, cujos valores das perdas são apresentados nas tabelas 2 e 3. Nesses anos agrícolas, a seca teve início em março, prolongando-se até novembro, interferindo na fase crítica do florescimento, na formação de novos ramos e botões florais, afetando consideravelmente a produtividade do ano seguinte.

Nos anos agrícolas de 1991/92, 1995/96 e 1998/99, embora não sejam considerados anos secos, as condições pluviométricas afetaram consideravelmente a produtividade do café, pois ocorreram períodos com déficit hídrico logo após a plena florada prejudicando o pegamento do botão floral e o desenvolvimento do "chumbinho".

Para o município de Gália, os anos agrícolas com períodos de déficit hídrico acentuado foram 1985/86, 1991/92, 1994/95 e 1999/2000, e em 1991/92 ocorreu a maior duração e intensidade, com maiores perdas na produtividade (Tabela 3).

Nos anos agrícolas de 1984/85, 1986/87, 1989/90 e 1998/99 ocorreram períodos com déficit hídrico, especialmente em outubro, novembro e dezembro, afetando, assim, o desenvolvimento dos grãos. Por esse motivo, houve quebra na produtividade final do talhão. Nos demais anos agrícolas, o índice pluviométrico foi satisfatório, proporcionando baixa taxa de quebra na produtividade do cafeeiro. Para a região de Campinas, os balanços hídricos indicaram secas nos anos agrícolas de 1997/98, 1999/2000, 2000/01, 2001/2002 e 2002/2003, reduzindo a produtividade dos talhões.

As análises estatísticas das séries de ky e ky0 (Tabela 4) indicaram a seqüência ky10, considerando ky0 igual a 0,96, como de melhor desempenho nas estimativas da produtividade, por apresentarem os maiores coeficientes "R" e índices "d" de WILMOTT et al. (1985) e o índice "C" de CAMARGO e SENTELHAS (1997) para os talhões da E. E. de Mococa (0,93, 0,90 e 0,84), Fazenda Monte D'Este (0,93, 0,85 e 0,79) e Fazenda Serra (0,82, 0,73 e 0,60). Para a Fazenda São Carlos, as análises estatísticas indicaram a seqüência ky14 e ky0 igual a 0,96 como de melhor desempenho nas estimativas (0,78, 0,88 e 0,69), muito próximas do desempenho da seqüência ky10 (0,76, 0,85 e 0,65).

Esses resultados permitem inferir que a combinação mais adequada ao modelo de quebra de produtividade para a cultura do café, no nível hierárquico de talhão, foi a seqüência ky10 (Figura 2). Tal seqüência considera valores de coeficientes de sensibilidade ao estresse hídrico em penalizações decendiais de 12 meses, variando de abril do ano anterior a março do ano da produção (maturação). Durante o período entre o fim do repouso (agosto) e o início da plena florada, que normalmente varia de setembro a outubro, o modelo considera um valor fixo de 0,02.


Os maiores valores dos coeficientes são relativos aos estádios fenológicos da indução floral, florescimento e granação, especialmente os dois últimos, concordando com o trabalho de PICINI et al. (1999) que indicou serem os meses de setembro a janeiro os mais importantes.

Com relação ao fator de penalização pela produtividade do ano anterior (ky0), com valor igual a 0,96, foi próximo ao valor unitário proposto por PICINI et al. (1999).

Os desempenhos do modelo geral na estimativa da produtividade, comparadas com as produtividades observadas de café para as quatro regiões estão apresentadas nas figuras 3 e 4. Pela comparação entre as produtividades observadas e estimadas, verifica-se que o desempenho do modelo foi similar para os quatro locais estudados, com valores de erros aleatórios (Ea) relativamente baixos, variando de 144 a 558 kg ha-1. As produtividades estimadas e observadas ficaram próximas e seguiram a bienalidade da cultura do café. Os valores do índice "d" variaram de 0,73 (Fazenda Serra) a 0,90 (E.E. Mococa) e os valores de "R" variaram de 0,76 (Fazenda São Carlos) a 0,93 (E.E.Mococa e Fazenda Monte D'Este). Os valores do índice "C" variaram de 0,60 (Fazenda Serra) a 0,84 (E.E. Mococa), mostrando um bom desempenho do modelo, com relação ao índice de exatidão e precisão.



Os valores dos erros sistemáticos (Es) foram relativamente baixos para as Fazendas São Carlos (324 kg ha-1) e Monte D'Este (396 kg ha-1), quando comparados com a E.E. Mococa (744 kg ha-1) e Fazenda Serra (762 kg ha-1). Por esses valores relativamente altos de "Es" observa-se que o modelo tendeu a superestimar levemente as produtividades para esses locais.

4. CONCLUSÕES

1. Pela parametrização dos coeficientes de sensibilidade da cultura ao déficit hídrico (ky), verifica-se que os estádios fenológicos da indução floral, florescimento e granação são importantes nas penalizações decendiais do modelo agrometeorológico de estimativa de produtividade.

2. O modelo matemático-agrometeorológico, proposto por CAMARGO et al. (2003), modificado e parametrizado, considerando o fator de penalização por déficit hídrico (seqüência ky10), o coeficiente de penalização pela produtividade do ano anterior (ky0) igual a 0,96, além da inclusão da penalização por geada e temperatura elevada no período do florescimento, apresenta desempenho consistente na estimativa de produtividade do cafeeiro em nível de talhão, para diferentes regiões cafeeiras do Estado de São Paulo.

Recebido para publicação em 13 de dezembro de 2004 e aceito em 5 de janeiro de 2006.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Abr 2006
  • Data do Fascículo
    2006

Histórico

  • Recebido
    13 Dez 2004
  • Aceito
    05 Jan 2006
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