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É improvável que a cirurgia seja suficiente para que o paciente pare de fumar 24 horas antes da internação hospitalar

Resumo

Introdução

A necessidade de cirurgia pode ser um fator decisivo para a cessação do tabagismo em longo prazo. Por outro lado, situações que precipitam o estresse podem precipitar a recaída do tabagismo. Decidimos avaliar o impacto de uma cirurgia no esforço do paciente para deixar de fumar durante pelo menos 24 horas antes da internação hospitalar e a possível recaída nas últimas 24 horas anteriores à internação em ex-fumantes.

Métodos

Fumantes, ex-fumantes e não fumantes adultos, quer de clínica pré-anestésica ou recentemente internados para cirurgias eletivas programadas que ficariam, no máximo, seis horas dentro das unidades hospitalares, foram incluídos no estudo. Os pacientes responderam um questionário na enfermaria ou na entrada da sala de operação (Grupo Internação) ou no início da primeira consulta pré-anestesia (Grupo Clínico) e fizeram mensurações dos níveis de CO.

Resultados

No total, 241 pacientes foram incluídos: 52 ex-fumantes, 109 que nunca fumaram e 80 não fumantes. Os fumantes apresentaram níveis mais elevados de monóxido de carbono expirado que os não fumantes e ex-fumantes (9,97 ± 6,50 vs. 2,26 ± 1,65 vs. 2,98 ± 2,69;p = 0,02). Entre os fumantes, o Grupo Clínico apresentou níveis de CO não estatisticamente diferentes daqueles do Grupo Internação (10,93 ± 7,5 vs. 8,65 ± 4,56; p = 0,21). Os ex-fumantes não apresentaram diferenças significativas entre os grupos Clínico e Internação para os níveis de monóxido de carbono (2,9 ± 2,3 vs. 2,82 ± 2,15; p = 0,45).

Conclusão

É improvável que uma condição médica, como uma cirurgia, sem assistência adequada seja suficiente para que um paciente pare de fumar, pelo menos, 24 horas antes da internação. A proximidade de uma cirurgia não foi associada à recaída do tabagismo nas 24 horas anteriores ao procedimento.

PALAVRAS-CHAVE
Fumar; Monóxido de carbono; Cirurgia eletiva

Abstract

Introduction

The need for surgery can be a decisive factor for long-term smoking cessation. On the other hand, situations that precipitate stress could precipitate smoking relapse. The authors decided to study the impact of a surgery on the patient's effort to cease smoking for, at least, 24 h before hospital admission and possible relapse on the last 24 h before hospital admission for ex-smokers.

Methods

Smoker, ex-smokers and non-smokers adults, either from pre-anesthetic clinic or recently hospital admitted for scheduled elective surgeries that were, at most, 6 h inside the hospital buildings were included in the study. The patients answered a questionnaire at the ward or at the entrance of the operating room (Admitted group) or at the beginning of the first pre-anesthetic consultation (Clinic group) and performed CO measurements.

Results

241 patients were included, being 52 ex-smokers and 109 never smokers and 80 non-smokers. Smokers had higher levels of expired carbon monoxide than non-smokers and ex-smokers (9.97 ± 6.50 vs. 2.26 ± 1.65 vs. 2.98 ± 2.69; p = 0.02). Among the smokers, the Clinic group had CO levels not statistically different of those on the Admitted group (10.93 ± 7.5 vs. 8.65 ± 4.56; p = 0.21). The ex-smokers presented with no significant differences for the carbon monoxide levels between the Clinic and Admitted groups (2.9 ± 2.3 vs. 2.82 ± 2.15; p = 0.45).

Conclusion

A medical condition, such as a surgery, without proper assistance is unlikely to be enough for a patient to stop smoking for, at least, 24 h prior to admission. The proximity of a surgery was not associated with smoking relapse 24 h before the procedure.

KEYWORDS
Smoking; Carbon monoxide; Elective surgery

Introdução

Na população cirúrgica, o hábito de fumar pode causar complicações graves no período perioperatório. A cessação desse hábito no período pré-operatório poderia minimizar possíveis efeitos cardiovasculares, pulmonares, de cicatrização e de regeneração óssea devido ao tabagismo e diminuir a incidência de complicações intraoperatórias e pós-operatórias.11 Moller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.,22 Theadom A, Cropley M. Effects of preoperative smoking cessation on the incidence and risk of intraoperative and postoperative complications in adult smokers: a systematic review. Tobacco Control. 2006;15:352-8. Portanto, há um interesse crescente em incentivar os pacientes submetidos a cirurgias eletivas a parar de fumar no período pré-operatório.33 Kai T, Maki T, Takahashi S, et al. Perioperative tobacco use interventions in Japan: a survey of thoracic surgeons and anaesthesiologists. Br J Anaesth. 2008;100:404-10.

As condições de saúde em usuários de tabaco, como a necessidade de cirurgia, são reconhecidas como fatores decisivos para a cessação do tabagismo em longo prazo.44 Shi Y, Warner DO. Surgery as a teachable moment for smoking cessation. Anesthesiology. 2010;112:102-7. A cirurgia foi associada a um aumento da probabilidade de cessação do tabagismo, especialmente quando cirurgias de grande porte foram feitas. No entanto, sabemos pouco sobre o esforço dos próprios pacientes para parar de fumar quando uma condição de saúde como a cirurgia se aproxima.

Tradicionalmente, a duração mínima necessária para definir clinicamente um paciente como ex-fumante é a completa abstinência de tabaco durante pelo menos 24 h.55 Ockene JK, Emmons KM, Mermelstein RJ, et al. Relapse and maintenance issues for smoking cessation. Health Psychol. 2000;19:17-31. Porém, os pacientes que se apresentam à cirurgia com mais de 24 h de cessação do hábito podem se declarar como ex-fumantes. Entretanto, os pacientes que não podem permanecer abstinentes durante pelo menos 24 h provavelmente não relatarão o esforço como uma verdadeira tentativa de parar de fumar.66 Berg CJ, An LC, Kirch M, et al. Failure to report attempts to quit smoking. Addict Behav. 2010;35:900-4.

Por outro lado, situações que precipitam o estresse, como trabalho, finanças e relacionamentos, e situações relacionadas ao humor, como a ansiedade, podem precipitar a recaída do tabagismo.77 Nakajima M, al'Absi M. Predictors of risk for smoking relapse in men and women: a prospective examination. Psychol Addict Behav. 2012;26:633-7.,88 Slopen N, Kontos EZ, Ryff CD, et al. Psychosocial stress and cigarette smoking persistence, cessation, and relapse over 9-10 years: a prospective study of middle-aged adults in the United States. Cancer Causes Control. 2013;24:1849-63. As condições de saúde, como a necessidade de uma cirurgia, são conhecidas por causar grande ansiedade e estresse ao paciente e também pode ser um fator potencial para a recaída do tabagismo.99 Kain ZN, Mayes LC, Caldwell-Andrews AA, et al. Preoperative anxiety, postoperative pain, and behavioral recovery in young children undergoing surgery. Pediatrics. 2006;118:651-8.

Com base nesses fatos, os autores objetivaram comparar os níveis de CO, que são um marcador sensível para o tabagismo nas últimas 24 h, de pacientes que foram internados para cirurgia eletiva com aqueles que se apresentaram para uma consulta ambulatorial.1010 Wee LH, West R, Mariapun J, et al. Should the threshold for expired-air carbon monoxide concentration as a means of verifying self-reported smoking abstinence be reduced in clinical treatment programmes?. Addict Behav. 2015;47:74-9. A hipótese foi que uma internação eletiva para cirurgia faria com que o paciente tentasse parar de fumar durante pelo menos 24 h antes da admissão hospitalar. Porém, uma operação também pode ser uma causa de recaída do tabagismo, uma vez que provoca estresse e ansiedade.99 Kain ZN, Mayes LC, Caldwell-Andrews AA, et al. Preoperative anxiety, postoperative pain, and behavioral recovery in young children undergoing surgery. Pediatrics. 2006;118:651-8. Portanto, os autores também investigaram os níveis de CO de ex-fumantes para detectar possíveis recaídas.

Métodos

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Projeto CAPPesq n° 0824/10) e os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Os pacientes recrutados eram adultos (> 18 anos), seja de clínica pré-anestésica ou recém-admitidos para cirurgias eletivas agendadas. Os pacientes foram recrutados entre agosto de 2012 e fevereiro de 2013. O estado de tabagismo foi definido pelo próprio paciente que se declarou: "fumante", "ex-fumante" ou "nunca fumante". Para o termo "ex-fumante", o participante devia estar livre de tabaco durante pelo menos três meses.

Os pacientes admitidos deveriam ficar no máximo 6 h dentro das instalações hospitalares antes da inclusão no estudo. Os pacientes admitidos por mais de 6 h foram excluídos. Após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, a mensuração dos níveis de CO foi feita com os pacientes no leito ou na entrada da sala de cirurgia (Grupo Internação) ou no início da primeira consulta pré-anestésica (Grupo Clínico). Como parte da rotina da consulta pré-operatória, todos os pacientes fumantes recebera orientações breves sobre a cessação do tabagismo.

Os pacientes responderam um questionário específico, contemplando idade, sexo, escolaridade, estado civil, ocupação (empregado, desempregado, aposentado), índice de massa corporal, comorbidades, histórico cirúrgico, tipo de cirurgia a ser feita, número de maços de cigarro por ano, hábitos de beber e fumar.

Antes e depois de responder o questionário, os pacientes foram solicitados a fazer uma respiração profunda e expirar em um analisador de monóxido de carbono (CO) expirado (monoxímetro eletrônico "piCO + Smokerlyzer" - Bedfont Scientific Ltd., Harrietsham, Inglaterra, calibrado). O valor médio entre essas duas medições foi considerado para análise. "Risco em monoximetria" foi definido como CO exalado acima de 6 ppm.

Análise estatística

Amostragem por conveniência foi usada, com a inclusão de pacientes internados no hospital por no máximo 6 h, de agosto de 2012 a fevereiro de 2013.

Os dados foram processados e analisados com um programa específico para análise de dados (IBM SPSS Statistics, versão 20). Significância estatística foi considerada para valores de p menores ou iguais a 0,05. As variáveis foram testadas para distribuição normal com o teste de Shapiro-Wilk. Para comparar os níveis de CO, o teste t de Student foi usado. Quando dois ou mais grupos foram comparados, Anova de um fator foi usada. Quando a normalidade não foi obtida, o teste de Mann-Whitney foi usado. Para comparação entre proporções, o teste do qui-quadrado seria usado caso os valores das células fossem > 5. Caso os valores individuais das células fossem < 5, o teste exato de Fisher seria usado.

Resultados

Epidemiologia

O estudo recrutou 241 pacientes, 146 mulheres (60,6%) e 95 homens (39,4%): 52 relataram ser fumantes atuais (21,6%), 80 ex-fumantes (33,2%) e 109 negaram fumar (45,2%) (tabela 1).

Tabela 1
Dados da população do estudo

Cinquenta pacientes (20,7%) apresentaram níveis médios de CO classificados como "de risco na monoximetria" (CO expirado > 6 ppm). Entre esses, 41 (82%) disseram ser fumantes, sete (14%) ex-fumantes e dois (4%) negaram fumar (tabela 2). Os pacientes que se declararam como fumantes apresentaram níveis estatisticamente mais altos de CO expirado do que os não fumantes e ex-fumantes (9,97 ± 6,50 vs. 2,26 ± 1,65 vs. 2,98 ± 2,69; p = 0,02).

Tabela 2
Média de monóxido de carbono expirado de acordo com o estado de tabagismo

As especialidades médicas com maior prevalência de fumantes foram a oftalmologia e a urologia (33,33%) e a especialidade médica com a menor prevalência de não fumantes foi a cirurgia geral (26,47%).

Na pesquisa de opinião sobre qual profissional de saúde seria melhor para auxiliar um paciente candidato a cirurgia eletiva a parar de fumar, 13 pessoas (5,4%) declararam ser um enfermeiro, 53 (22%) escolheram um médico, 55 (22,8%) escolheram um psicólogo e 120 (49,8%) afirmaram que nenhum deles seria eficaz na tarefa mencionada.

Fumantes

Em relação aos 52 pacientes fumantes, 30 deles tiveram seus níveis de CO medidos na consulta clínica (Grupo Clínico) e os 22 restantes foram avaliados durante a internação hospitalar (Grupo Internação). Desses, 13 tiveram seus níveis de CO registrados na entrada da sala de cirurgia e nove tiveram a avaliação dos níveis de CO feita enquanto estavam no leito.

Os pacientes do Grupo Clínico apresentaram níveis de CO não estatisticamente diferentes em comparação com os do Grupo Internação (10,93 ± 7,5 vs. 8,65 ± 4,56; p = 0,21). Não houve diferença estatisticamente significativa entre os pacientes avaliados na entrada da sala de cirurgia e aqueles recém-admitidos no hospital (9,08 ± 5,39 vs. 8,11 ± 3,91; p = 0,83). Não foram encontradas diferenças significativas entre as proporções de pacientes considerados de risco no exame de monoximetria no Grupo Internação (80%) e no Grupo Clínico (77%, p = 0,53).

Ex-fumantes

Declararam ser ex-fumantes 80 pacientes. Havia 51 no Grupo Clínico e 29 no Grupo Internação. A mediana (percentis 25 e 75) para o tempo livre de tabaco foi 22 (10-60), 19 (10-36) no Grupo Internação e 30 (12-168) no Grupo Clínico.

Não foram encontradas diferenças significativas nos níveis de CO entre os grupos Clínico e Internação (2,9 ± 2,3 vs. 2,82 ± 2,15; p = 0,45). Houve um paciente que apresentou risco na monoximetria no Grupo Internação e seis pacientes no Grupo Clínico, mas não houve diferença significativa entre os grupos (p = 0,41). Ao comparar os níveis de CO dos pacientes que se declararam ex-fumantes com os daqueles que se declararam não fumantes, houve uma tendência de os ex-fumantes apresentarem níveis maiores de CO, mas sem significância estatística (2,98 ± 2,69 vs. 2,25 ± 1,69; p = 0,09).

Houve uma proporção maior de pacientes que apresentou risco na monoximetria no grupo de ex-fumantes (13,8%) do que no grupo de não fumantes (5,8%; p = 0,05). Quando comparado o número de fumantes em domicílio, os ex-fumantes e não fumantes apresentaram valores semelhantes (mediana 0 IQ25-75 0-1 vs. 0 IQ25-75 0-1; p = 0,64).

Discussão

O principal achado deste estudo foi que, independentemente de o paciente ter sido internado por uma condição médica ou ter comparecido ao hospital para uma consulta ambulatorial, os níveis de CO não diferiram. Portanto, podemos inferir que uma condição médica, como a cirurgia, sem a devida assistência é improvável que seja suficiente para que um paciente pare de fumar durante pelo menos 24 h antes do procedimento. Por essas razões, há um interesse crescente em incentivar os candidatos à cirurgia eletiva a pararem de fumar no período pré-operatório.33 Kai T, Maki T, Takahashi S, et al. Perioperative tobacco use interventions in Japan: a survey of thoracic surgeons and anaesthesiologists. Br J Anaesth. 2008;100:404-10. Outro achado deste estudo foi que a proporção de pacientes com risco na monoximetria foi maior nos ex-fumantes do que nos não fumantes.

Muitas condições de saúde são momentos de aprendizado para estimular a cessação do tabagismo. Momentos de aprendizado para cessação do tabagismo incluem três construtos que são analisados para verificar se esse momento é significativo o suficiente: até que ponto o evento aumenta a percepção de risco pessoal, promove fortes respostas afetivas ou emocionais e impactos no autoconceito.1111 McBride CM, Emmons KM, Lipkus IM. Understanding the potential of teachable moments: the case of smoking cessation. Health Educ Res. 2003;18:156-70. Com base nesses fatos, a indicação de cirurgia pode ser considerada um momento de aprendizado, uma vez que preenche todos os critérios acima. Isso significa que se o aconselhamento adequado for feito durante todo o período perioperatório, uma maior incidência de cessação do tabagismo por um longo período pode ser alcançada.

Em relação aos fumantes, não observamos diferenças significativas nas proporções de pacientes com risco no exame de monoximetria e nos níveis de CO entre os pacientes ambulatoriais e internados. Esse achado mostrou que pacientes ambulatoriais e internados apresentaram proporções semelhantes de fumantes nas últimas 24 h. Pode-se inferir que uma condição médica, como a internação hospitalar para uma cirurgia, não foi, em si, suficiente para promover 24 horas livre de tabaco entre os pacientes cirúrgicos. Em nossa instituição, encorajamos de modo rotineiro a todos pacientes cirúrgicos que parem de fumar durante as consultas perioperatórias, mas nenhum encaminhamento para o programa formal de cessação do tabagismo é feito. Embora se espere uma taxa de abandono espontâneo de 2-3% entre os usuários de tabaco, sabe-se que uma breve intervenção de aconselhamento durante a consulta médica pode adicionar um incremento de 1-3% nas taxas de abandono do tabaco.1212 Stead LF, Buitrago D, Preciado N, et al. Physician advice for smoking cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2013;:CD000165. No entanto, para a nossa população estudada, conselhos breves durante a consulta pré-operatória, juntamente com a presença de uma condição de saúde, como uma cirurgia, sem a devida assistência, provavelmente não foram suficientes para que um paciente parasse de fumar. Se o tratamento apropriado de um paciente cirúrgico fumante não for adequadamente empregado, esse momento de aprendizado pode ser desperdiçado.

Quanto à assistência para cessação do tabagismo, os resultados da pesquisa de opinião apontaram a falta de tratamento adequado pelo profissional de saúde, pois cerca de metade (49,8%) do público pesquisado considerou que nenhum dos profissionais de saúde citados era adequado para ajudar um paciente na cessação do tabagismo no período pré-operatório. Isso enfatiza que é necessário treinamento adicional sobre como lidar com o fumante. Uma metanálise conduzida pela Cochrane mostrou que os profissionais de saúde que receberam treinamento eram mais propensos a fazer tarefas de cessação do tabagismo, como marcar uma data para parar, fazer consultas de acompanhamento e fornecer materiais de autoajuda.1313 Carson KV, Verbiest ME, Crone MR, et al. Training health professionals in smoking cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2012;:CD000214. Este estudo também conclui que treinar o profissional de saúde para fornecer intervenções para interromper o hábito de fumar teve um efeito mensurável na prevalência do tabagismo. Assim, podemos inferir que, se a assistência adequada com profissionais treinados não estiver disponível, apenas uma condição de saúde não é suficiente para o paciente parar de fumar.

Outro achado deste estudo foi uma proporção maior de pacientes que apresentou risco na monoximetria nos grupos de ex-fumantes do que de não fumantes. Esperávamos níveis semelhantes de CO entre os pacientes ex-fumantes e não fumantes, já que o número de fumantes com quem conviviam não era estatisticamente diferente. Esse achado pode sugerir que ou o paciente esconde seu verdadeiro estado de tabagismo do profissional de saúde ou há uma ocorrência de recaída. Como não encontramos diferenças estatísticas entre os pacientes ambulatoriais e os internados, podemos inferir que é mais provável que os pacientes forneçam informações erradas. Shipton et al. também verificaram esse achado ao descobrir que o autorrelato em grávidas fumantes subestima de modo significativo o número de grávidas fumantes na Escócia.1414 Shipton D, Tappin DM, Vadiveloo T, et al. Reliability of self reported smoking status by pregnant women for estimating smoking prevalence: a retrospective, cross sectional study. BMJ. 2009;339:b4347. Isso também ocorreu em uma população brasileira, na qual 38% dos pacientes com asma ou DPOC apresentaram discordância entre o estado de tabagismo autodeclarado e aquele determinado na concentração de cotinina urinária.1515 Stelmach R, Fernandes FL, Carvalho-Pinto RM, et al. Comparison between objective measures of smoking and self-reported smoking status in patients with asthma or COPD: are our patients telling us the truth?. J Bras Pneumol. 2015;41:124-32.

Obviamente, este estudo teve muitas limitações. A primeira limitação foi que, ao fazer as mensurações de CO durante a consulta pré-anestésica, o paciente já havia sido informado da necessidade de cirurgia. Assim, o efeito de uma condição de saúde já poderia ter causado seu efeito na cessação do tabagismo. Tentamos evitar isso definindo os ex-fumantes como não fumantes durante os últimos três meses, no mínimo. Outra limitação foi que o CO é produzido endogenamente e absorvido pelos pulmões. Como a maioria dos fumantes, ex-fumantes e não fumantes provavelmente está exposta à poluição significativa proveniente de combustíveis fósseis queimados, isso também poderia elevar o CO expirado e causar confusão quanto ao paciente ter parado de fumar ou ter ficado muito exposto ao CO. O nível de CO também pode estar elevado com base na exposição profissional do paciente - por exemplo, o trabalho com motores de combustão no qual o CO poderia estar elevado - e não com base no tabagismo. Outra limitação em relação aos níveis de CO foi avaliar se o paciente reduziu a quantidade de tabaco consumido antes da cirurgia, pois os níveis de CO só podem considerar os pacientes como fumantes ou não fumantes e apenas uma medida foi feita. Como os níveis de CO só podem avaliar as últimas 24 horas de tabagismo, é possível que tenhamos perdido a cessação do tabagismo de pacientes que poderiam ter parado durante todo o período pré-operatório, mas decidiram fumar pouco antes da internação hospitalar.1616 Perkins KA, Karelitz JL, Jao NC. Optimal carbon monoxide criteria to confirm 24-hr smoking abstinence. Nicotine Tob Res. 2013;15:978-82. O tamanho da amostra foi outra limitação do estudo, uma vez que foi baseado em amostragem por conveniência e nem todos os pacientes da instituição foram testados. Por fim, por ser um estudo transversal, não foi possível tirar conclusões claras sobre causa e efeito.

Em conclusão, o aconselhamento sobre o tabagismo com assistência profissional deve ser fornecido para todos os pacientes cirúrgicos fumantes, já que a própria disposição do paciente associada a um breve aconselhamento médico e a um estado de saúde pode não ser suficiente para a cessação do tabagismo no pré-operatório. Novos estudos são necessários para elucidar melhor essa hipótese, uma vez que este estudo apresenta limitações.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    29 Dez 2016
  • Aceito
    28 Dez 2017
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