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Oficinas como proposta democrática para mudanças no trabalho da supervisão em enfermagem

RESUMO

Objetivo:

relatar a experiência de desenvolver oficinas como estratégia de intervenção em uma pesquisa-ação, visando rever o trabalho da supervisão em enfermagem hospitalar.

Método:

relato da experiência de planejar, desenvolver e avaliar oficinas com abordagem psicossocial. Foram realizadas três oficinas, em local reservado, com a participação de 21 supervisores de um hospital público universitário. Cada oficina foi organizada com aquecimento, trabalho do dia, fechamento com sínteses e consensos.

Resultado:

o trabalho proporcionou trocas de experiências, reflexões e propostas para dificuldades identificadas no processo de trabalho que afastam os supervisores do gerenciamento da assistência como a comunicação falha, o retrabalho e a indefinição de atribuições na equipe.

Conclusão:

a dinâmica das oficinas favoreceu aos supervisores propor ações para soluções das dificuldades da sua prática de forma mais democrática e participativa, mediante interações dialógicas, partilha dos sentimentos pertinentes ao contexto de trabalho e estabelecimento de consensos para a finalização da tarefa.

Descritores:
Supervisão de Enfermagem; Serviço Hospitalar de Enfermagem; Educação; Administração Hospitalar; Organização e Administração

ABSTRACT

Objective:

to report the experience of developing workshops as an intervention strategy in an action research, aiming to review the work of supervision in hospital nursing.

Method:

to report of the experience of planning, developing and evaluating workshops with a psychosocial approach. Three workshops were held, in a reserved place, with the participation of 21 supervisors of a public university hospital. Each workshop was organized with heating, day work, closure with syntheses and consensus.

Results:

the work provided the exchange of experiences, reflections and proposals for difficulties identified in the work process that distract supervisors from the management of assistance such as communication failure, reworking and lack of definition of assignments in the team.

Conclusion:

the dynamics of the workshops favored supervisors to propose solutions to the difficulties of their practice in a more democratic and participative way, through dialogical interactions, sharing of the feelings pertinent to the work context and establishing consensus for the completion of the task.

Descriptors:
Nursing supervision; Hospital Nursing Service; Education; Hospital Administration; Organization and Administration

RESUMEN

Objetivo:

relatar la experiencia de desarrollar talleres como estrategia de intervención en una investigación -acción, buscando revisar el trabajo de la supervisión en enfermería hospitalaria.

Método:

relato de la experiencia de planear, desarrollar y evaluar talleres con abordaje psicosocial. Se realizaron tres talleres, en local reservado, con la participación de 21 supervisores de un hospital público universitario. Cada taller fue organizado con calentamiento, trabajo del día, cierre con síntesis y consensos.

Resultado:

el trabajo proporcionó intercambios de experiencias, reflexiones y propuestas para dificultades identificadas en el proceso de trabajo que alejan a los supervisores de la gestión de la asistencia como la comunicación falla, el retrabajo y la indefinición de atribuciones en el equipo.

Conclusión:

la dinámica de los talleres favoreció a los supervisores proponer acciones para soluciones de las dificultades de su práctica de forma más democrática y participativa, mediante interacciones dialógicas, compartiendo los sentimientos pertinentes al contexto de trabajo y establecimiento de consensos para la finalización de la tarea.

Descriptores:
Supervisión de Enfermería; Servicio Hospitalario de Enfermería; Educación; Administración Hospitalaria; Organización y Administración

INTRODUÇÃO

Na prática gerencial do trabalho da enfermagem está a atividade de supervisão como elemento intermediador que integra gerentes do nível central (planejadores) com profissionais da equipe de enfermagem (operacionais) e outros profissionais envolvidos, direta e indiretamente, na assistência, orientando-os a fim de cumprir o que foi planejado e, ao mesmo tempo, administrando as demandas de pessoal e de materiais, tensões e conflitos entre as equipes de trabalho, assim como outras questões cotidianas(11 Soares MI, Camelo SHH, Resck ZMR, Terra FS. Nurses' managerial knowledge in the hospital setting. Rev Bras Enferm[Internet]. 2016 [cited 2017 Feb 03]; 69(4):631-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n4/en_0034-7167-reben-69-04-0676.pdf
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-22 Silva EM. Supervisão como essência do gerenciamento em enfermagem. In: Vale EG, Peruzzo SA, Felli VEA, (Orgs.). PROENF Programa Atualização em Enfermagem: Gestão: Ciclo 03. Porto Alegre: Artmed/Panamericana; 2014. p.79-107.).

Tal característica da supervisão, como um elemento de ligação e conhecedora da dinâmica institucional, confere ao profissional de enfermagem uma posição estratégica para atuação reflexiva sobre como fazer a gestão do cuidado no ambiente hospitalar, promovendo mudanças no pensar e no agir da equipe de enfermagem e saúde, planejando a assistência na qual se considera a subjetividade dos pacientes e não somente o controle do cumprimento de técnicas e protocolos clínicos(22 Silva EM. Supervisão como essência do gerenciamento em enfermagem. In: Vale EG, Peruzzo SA, Felli VEA, (Orgs.). PROENF Programa Atualização em Enfermagem: Gestão: Ciclo 03. Porto Alegre: Artmed/Panamericana; 2014. p.79-107.).

De modo geral, a literatura nacional aponta o potencial da supervisão para melhorar a qualidade assistencial integrando os processos de cuidar e administrar de forma sistematizada e reflexiva, planejando ações, atuando com fundamentação em dados, avaliando resultados com habilidade para empreender e realizar ações inovadoras(11 Soares MI, Camelo SHH, Resck ZMR, Terra FS. Nurses' managerial knowledge in the hospital setting. Rev Bras Enferm[Internet]. 2016 [cited 2017 Feb 03]; 69(4):631-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n4/en_0034-7167-reben-69-04-0676.pdf
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,33 Hausmann M, Peduzzi M. Articulação entre as dimensões gerencial e assistencial do processo de trabalho do enfermeiro. Texto Contexto Enferm[Internet]. 2009 [cited 2014 Mar 15]; 18(2):258-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v18n2/08.pdf
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).

Na literatura internacional, há estudos, desde a década de 1990, sobre uma prática denominada supervisão clínica, focada no desenvolvimento de competências e capacidade reflexiva, que orienta enfermeiros na condução do planejamento da assistência, proporcionando suporte para tomada de decisão nas intervenções. Para tanto, desenvolveram-se modelos que sistematizam a sua prática, mostrando resultados positivos para a assistência com maior capacidade de liderança dos enfermeiros supervisionados, redução de erros, melhoria na motivação para o trabalho com a redução do estresse e insatisfações(44 Dilworth S, Higgins I, Parker V, Kelly B, Turner J. Finding a way forward: a literature review on the current debates around clinical supervision. Contemp Nurse[Internet]. 2013 [cited 2014 Mar 15]; 45(1):22-32. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24099223
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2409...
).

Diante do exposto, considera-se que a supervisão de enfermagem tem papel fundamental no gerenciamento da assistência, com potencial para mudar a forma de trabalhar do enfermeiro, aproximando-se mais de práticas reflexivas conforme as experiências internacionais, se sobrepondo ao controle e a organização do ambiente terapêutico hospitalar observado nos dias atuais(11 Soares MI, Camelo SHH, Resck ZMR, Terra FS. Nurses' managerial knowledge in the hospital setting. Rev Bras Enferm[Internet]. 2016 [cited 2017 Feb 03]; 69(4):631-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n4/en_0034-7167-reben-69-04-0676.pdf
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2 Silva EM. Supervisão como essência do gerenciamento em enfermagem. In: Vale EG, Peruzzo SA, Felli VEA, (Orgs.). PROENF Programa Atualização em Enfermagem: Gestão: Ciclo 03. Porto Alegre: Artmed/Panamericana; 2014. p.79-107.

3 Hausmann M, Peduzzi M. Articulação entre as dimensões gerencial e assistencial do processo de trabalho do enfermeiro. Texto Contexto Enferm[Internet]. 2009 [cited 2014 Mar 15]; 18(2):258-65. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tce/v18n2/08.pdf
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-44 Dilworth S, Higgins I, Parker V, Kelly B, Turner J. Finding a way forward: a literature review on the current debates around clinical supervision. Contemp Nurse[Internet]. 2013 [cited 2014 Mar 15]; 45(1):22-32. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24099223
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2409...
).

Com essa motivação, as pesquisadoras desenvolveram este estudo com objetivo de rever o processo de trabalho da supervisão de enfermagem, para construir, em conjunto com o grupo de supervisores, uma proposta de atuação que supere as dificuldades que os afastam do gerenciamento da assistência. Para isso, optou-se pela abordagem qualitativa, fundamentada no referencial do processo de trabalho, alicerçado na metodologia da Pesquisa-Ação (PA).

A PA é um tipo de pesquisa social, com origens nos estudos de Kurt Lewin sobre a dinâmica de pequenos grupos realizados na década de 1940. A PA é desenvolvida em processo de investigação construído por etapas, de forma colaborativa e democrática, em que pesquisadores e membros da instituição trabalham juntos, de forma crítica e participativa, para diagnosticar e propor soluções para uma situação ou um problema identificado(55 Tanajura LLC, Bezerra AAC. Pesquisa-ação sob a ótica de René Barbier e Michel Thiollent: aproximações e especificidades metodológicas. Rev Eletr PesquisEdu[Internet]. 2015 [cited 2017 Jan 10]; 7(13):10-23. Available from: http://periodicos.unisantos.br/index.php/pesquiseduca/article/view/408
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). Na enfermagem a PA tem sido desenvolvida para produzir conhecimentos em várias áreas de atuação, bem como diagnóstico da equipe, das relações e ambiente de trabalho para sinalizar estratégia mobilizadora para gestores e apoio institucional visando à promoção de mudanças efetivas(66 Silva AP, Munari DB, Brasil VV, Chaves LDP, Bezerra ALQ, Ribeiro LCM. Trabalho em equipe de enfermagem em unidade de urgência e emergência na perspectiva de Kurt Lewin. Ciênc Cuid Saúde.[Internet]. 2012 [cited 2017 Jan 10]; 11(3):549-56. Available from: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/16609/pdf
http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.p...
).

Este estudo contou com a participação das pesquisadoras da Diretoria do Departamento de Enfermagem (DEnf) e dos supervisores, desde o desenvolvimento do projeto, planejamento das ações de cada fase, avaliações, validação dos resultados apresentados em reuniões respeitando os interesses do grupo e pactuação das ações.

O estudo foi realizado em quatro fases: a primeira foi destinada a compreender o processo de trabalho da supervisão; na segunda realizou-se observação participante, o que propiciou a interlocução com o grupo de supervisores; na terceira foram desenvolvidas ações por meio de oficinas e por último, se apresenta a quarta fase de avaliação, que se deu ao longo de todo o processo da pesquisa.

Os resultados da primeira fase, por meio de entrevistas com supervisores e enfermeiros mostraram que o trabalho da supervisão acontece de forma fragmentada nas 24h, com dificuldades de comunicação para a continuidade da assistência entre os períodos diurno e noturno. As ações de supervisão estão centradas no controle do trabalho, principalmente voltadas para a frequência da equipe de enfermagem e disponibilidade dos materiais, respondendo às demandas inesperadas que dificultam a continuidade do planejamento realizado pelos Serviços de Enfermagem, sobretudo quanto ao acompanhamento de atividades da gestão da assistência. As observações e o acompanhamento de atividades dos supervisores, na segunda fase, validaram os resultados da primeira e subsidiaram o planejamento de ações da terceira fase.

Para o desenvolvimento da terceira fase, optou-se pelo método de "oficinas" por entender que são espaços planejados em encontros, independentemente do número, destinadas ao trabalho com pequenos grupos para construção coletiva de uma tarefa(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.).

A prática de oficinas não é recente, mas é bastante disseminada como dispositivo privilegiado para promover a reflexão e a consciência crítica em um trabalho coletivo, sendo empregada em diversas áreas, como na psicologia para intervenções psicoterapêuticas, na educação para a formação pedagógica, no setor público para o desenvolvimento de competências gerenciais para gestores(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.

8 Spink MJ, Meganon VM, Medrado B. Oficinas como estratégia de pesquisa: articulações teórico-metodológica a aplicações éticas-políticas. Psicol Soc[Internet]. 2014.[cited 2016 Nov 22]; 26(1)32-43. Available from: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v26n1/05.pdf
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-99 Amaral MA, Fonseca RMGS. A oficina de trabalho como estratégia educativa com adolescentes na área de sexualidade. Rev Min Enferm[Internet]. 2005 [cited 2017 Jun 10]; 9(2):168-73. Available from: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/457
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). A literatura nacional, após os anos 90, mostra a sua utilização na enfermagem em intervenções educativas para diversos pacientes (crônicos, gestantes, adolescentes, cuidadores), no atendimento terapêutico na saúde mental, na investigação(99 Amaral MA, Fonseca RMGS. A oficina de trabalho como estratégia educativa com adolescentes na área de sexualidade. Rev Min Enferm[Internet]. 2005 [cited 2017 Jun 10]; 9(2):168-73. Available from: http://www.reme.org.br/artigo/detalhes/457
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), identificando-se uma lacuna para o desenvolvimento profissional na área gerencial da enfermagem. Na literatura internacional, além das citadas, oficinas mostram-se eficientes para a capacitação de profissionais em obter habilidades na pesquisa e conhecimentos com especialistas, para implementar evidências na sua prática(1010 Yost J, Ciliska D, Dobbins M. Evaluating the impact of an intensive education workshop on evidence-informed decision making knowledge, skills, and behaviours: a mixed methods study. BMC Med Educ[Internet]. 2014 [cited 2017 Jun 10];14:13. Available from: https:// www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/24433582
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).

Considera-se desenvolver oficinas como uma estratégia adequada aos princípios norteadores da pesquisa-ação, em que os participantes constroem propostas para resolução de problemas com apoio da pesquisadora, por meio de diálogos e estabelecimento de consensos para buscarem soluções capazes de provocar mudanças, uma vez que o grupo participante da pesquisa é conhecedor da cultura e da realidade institucional. Outro fator determinante para a escolha de oficinas foi seu caráter democrático e participativo(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.-88 Spink MJ, Meganon VM, Medrado B. Oficinas como estratégia de pesquisa: articulações teórico-metodológica a aplicações éticas-políticas. Psicol Soc[Internet]. 2014.[cited 2016 Nov 22]; 26(1)32-43. Available from: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v26n1/05.pdf
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), pois intencionava-se colocar à disposição dos supervisores uma estratégia diferenciada das capacitações tradicionais com transmissão do conhecimento, proporcionando-lhes espaço de reflexão e socialização de suas experiências, sendo uma experiência inovadora para este grupo.

Diante do exposto, o presente artigo teve por objetivo relatar a experiência do desenvolvimento de oficinas como estratégia utilizada para a fase de intervenção de uma PA, na qual a proposta, a partir da construção coletiva foi baseada em mudanças no processo de trabalho da supervisão de enfermagem.

Percurso metodológico das oficinas

Trata-se de relato de experiência do planejamento, desenvolvimento e avaliação de oficinas, realizadas com supervisores de enfermagem.

A pesquisa foi desenvolvida no DEnf de um Hospital de Clínicas (HC) de grande porte (405 leitos) e alta complexidade, universitário, vinculado ao Sistema Único de Saúde. O DEnf possui 1.447 profissionais operacionais entre enfermeiros, técnicos de enfermagem e auxiliares de enfermagem, dimensionados para atuar em todas as unidades do hospital. A supervisão envolve 25 supervisores, que respondem hierarquicamente ao Diretor de Serviço, sendo oito no período noturno (19-7h) e o restante no diurno em horários flexíveis para acompanhamento dos plantões da manhã (7-13h) e da tarde (13-19h).

O método de oficinas utilizado propõe abordagem psicossocial, fundamentada na contribuição de várias teorias que se articulam para ajudar a coordenação na compreensão da dinâmica e evolução do grupo. Essa articulação teórica abrange três dimensões: 1) dimensão psicossocial para entendimento da dinâmica de grupo com contribuição da teoria de campo de Kurt Lewin, 2) dimensão psicodinâmica de grupos, encontrada em autores como Freud, Bion, Foulkes e Pichon-Rivière e 3) dimensão educativa baseada na pedagogia da autonomia de Paulo Freire(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.).

Planejamento e organização das oficinas(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.)

A demanda sobre a necessidade de rever o processo de trabalho da supervisão foi proposta pelas pesquisadoras e acordada com a diretoria do DEnf, possibilitando o apoio para a participação de todos os supervisores, do diurno e noturno. Porém, o que foi trabalhado neste vasto campo emergiu dos resultados da primeira fase do projeto e confirmados pela interlocução da pesquisadora no acompanhamento do cotidiano de supervisores na unidade de internação durante a segunda fase. Deste modo, a tarefa pactuada com o grupo participante, ou seja, o objetivo das oficinas ficou estabelecido em: discutir as atividades realizadas pelos supervisores e determinar o que se aproxima, ou não, da finalidade do trabalho, o gerenciamento da assistência, para propor mudanças no processo de trabalho compatíveis com a realidade institucional.

A composição do grupo para a coordenação das oficinas foi estabelecida entre a pesquisadora (com a responsabilidade de coordenar as oficinas), duas enfermeiras da Seção de Educação Continuada (SEC) e uma professora da Faculdade de Enfermagem/Unicamp, assessora do DEnf para o ensino e pesquisa, como apoiadoras no planejamento, organização, discussões, registro dos encontros e avaliações.

Para a organização e planejamento da estrutura das oficinas foram realizadas três reuniões preparatórias nas quais participaram o grupo de coordenação das oficinas com a diretoria do DEnf. Nesses encontros foram discutidas as expectativas e estabelecidos os consensos sobre a finalidade e responsabilidades da supervisão de enfermagem na instituição. Tal alinhamento de conceitos e ideias foi fundamental para a construção do eixo norteador para o trabalho das oficinas (Figura 1).

Figura 1
Eixo norteador do trabalho das oficinas com supervisores de enfermagem, outubro, 2016

Realizou-se um planejamento flexível contendo plano geral, como um guia para cada oficina, contendo na sua sequência temas e estratégias que estimularam a consciência crítica ao grupo para o cumprimento da tarefa. O plano foi revisto pela coordenação das oficinas após cada encontro, considerando as avaliações individuais dos participantes, a dinâmica do grupo, o conteúdo das discussões, a produção do dia e envolvimento dos participantes na realização da tarefa.

A estrutura das oficinas foi composta por três momentos(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.). No primeiro momento foram realizadas atividades lúdicas, escolhidas de acordo com o tema trabalhado na oficina, para sensibilização e descontração do grupo. No segundo momento, foram organizadas atividades chamadas "trabalho do dia", para mobilizar discussões, reflexões e incentivar a sua produção. No terceiro momento, a finalização, com exposição sistematizada pelo coordenador da produção e questões conflituosas do dia buscando consensos e validação pelo grupo produzindo uma síntese e avaliação do encontro. O Quadro 1 apresenta uma estrutura-padrão das oficinas.

Quadro 1
Estrutura-padrão das oficinas com supervisores de enfermagem, outubro, 2016

Foram marcadas inicialmente três oficinas, de três horas cada, segundo possibilidade oferecida pelo DEnf, em local reservado, fora do ambiente de trabalho, para garantir a privacidade e despreocupação das atribuições cotidianas.

Esclarecemos sobre a oportunidade de terem assegurado um espaço reservado para partilhar vivências, angústias e críticas sobre o processo de trabalho da supervisão, para construir propostas de mudanças.

A Figura 1, eixo norteador das oficinas, foi apresentada neste momento para reflexão do grupo sobre "onde estamos" e, com o decorrer do trabalho, para "onde queremos chegar" com o trabalho da supervisão em enfermagem e atitudes esperadas do supervisor.

As questões em destaque no centro da Figura 1 foram trabalhadas ao longo dos três encontros, estimulando a crítica e a reflexão. As discussões entre os participantes permitiram a problematização da prática por meio de relatos sobre as experiências, provocando ruídos internos e conflitos marcados pela percepção das diferenças de atuação. Os relatos carregavam angústias e, por vezes, "falas filtradas" pelos ruídos externos ao grupo, determinadas pela cultura de uma instituição pública, com relações de poder hierarquizadas e, atualmente, com forte redução de recursos financeiros, falta de materiais, provocando conflitos de relacionamentos entre os pares e os serviços de apoio (farmácia, laboratório e outros).

A avaliação do trabalho foi feita pela coordenação das oficinas, por meio do registro das narrativas, observação das posturas, comportamentos e produção do grupo, considerando a combinação de duas dimensões: a tarefa externa mais objetiva, centrada no que se propôs alcançar e a tarefa interna mais subjetiva, relacionada ao crescimento do grupo(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.).

Após três meses do término das oficinas enviamos um questionário online para o grupo participante para acompanhamento e avaliação do entendimento das oficinas como espaço de reflexão do trabalho e a realização das atividades propostas.

Ressalta-se que foram seguidos os preceitos ético-legais de pesquisa e os participantes foram orientados quanto aos objetivos e sigilo. Depois de esclarecidas suas dúvidas, foi solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp/Campus de Campinas, sob parecer de nº 887.936.

Avaliação dos resultados das oficinas

- Os três encontros de três horas (totalizando 9 horas) não foram suficientes para finalizar a tarefa devido ao envolvimento dos participantes nas discussões e houve necessidade de acrescentar mais dois encontros (somando outras 6 horas, totalizando 15 horas) organizados pelo grupo, mostrando o seu comprometimento com a finalização da tarefa. O tempo planejado para o trabalho nem sempre é coincidente com os processos internos de elaboração do grupo, portanto, há necessidade de esclarecer, tanto na instituição quanto com os participantes, a possibilidade de um planejamento flexível tanto de tempo como de conteúdo e estratégias(77 Afonso MLM, (Org.). Oficinas: em dinâmica de grupos na área da saúde. 2ª Ed. São Paulo, SP: Casa do psicólogo; 2010.-88 Spink MJ, Meganon VM, Medrado B. Oficinas como estratégia de pesquisa: articulações teórico-metodológica a aplicações éticas-políticas. Psicol Soc[Internet]. 2014.[cited 2016 Nov 22]; 26(1)32-43. Available from: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v26n1/05.pdf
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).

- Participaram 21 supervisores, pois dois se encontravam em férias e dois estavam impedidos por outros compromissos profissionais. Esse número foi avaliado como excessivo, dificultando a evolução das discussões. No trabalho em subgrupos, com cerca de 6 pessoas, a participação e interação se deu com maior intensidade e melhor interatividade. Na literatura é recomendada a formação de grupos de 5 a 12 pessoas, para não gerar subgrupos com ideias cristalizadas que dificultam o processo democrático de acordos e consensos(88 Spink MJ, Meganon VM, Medrado B. Oficinas como estratégia de pesquisa: articulações teórico-metodológica a aplicações éticas-políticas. Psicol Soc[Internet]. 2014.[cited 2016 Nov 22]; 26(1)32-43. Available from: http://www.scielo.br/pdf/psoc/v26n1/05.pdf
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).

- Quanto à dinâmica grupal, as oficinas proporcionaram ao grupo discussões e trocas de experiências da vivência e dificuldades. O espaço preservado foi fundamental para o diálogo sobre algumas dificuldades recorrentes, relacionadas ao nível superior hierárquico, como a falta de feedback do trabalho, falha na comunicação e falta de definição de responsabilidades para algumas tarefas apontadas como realizadas com retrabalho. Após análise, concluiu-se que os momentos de discussão da dinâmica grupal, a tarefa interna, foram necessários e fundamentais para que os participantes evoluíssem na sua identificação como grupo se sentissem sensibilizados para a existência de diferenças de atuação entre o período diurno e noturno e, dessa forma, alcançassem a coesão necessária para terem foco e concluírem a tarefa externa.

- Quanto à conclusão da tarefa externa, o grupo construiu coletivamente uma proposta para solucionar as dificuldades emergentes do cotidiano contendo um plano de ações, estratégias, cronograma e os responsáveis para cada uma delas, denominada "Gerenciamento compartilhado da assistência" composta de três atividades para sua operacionalização: 1) rever a gestão do trabalho assistencial nas 24h, 2) melhorar a comunicação institucional e 3) rever retrabalho entre supervisores, diretores, enfermeiros e funcionários administrativos. Esta proposta foi apresentada por um representante dos supervisores, por explanação oral e documento com assinatura de todos os supervisores em reunião na qual, participaram supervisores, diretores e assistentes do DEnf. Houve discussão sobre cada atividade e pactuação para a sua realização.

- As oficinas foram avaliadas após três meses, por questionário online, por 67% dos participantes. Na afirmativa "Oficinas como espaço de reflexão sobre o trabalho" obtiveram-se 50% de concordância parcial, 35,7% integral e 14,3% de discordância parcial justificada pelo excessivo número de participantes. Quanto à realização das atividades 1, 2 e 3, citadas acima, 64% afirmaram que são feitas parcialmente, 22% afirmaram que não são realizadas e 14% que são realizadas integralmente. Avaliamos que a discrepância de realizações se deve à falta de unicidade de condutas nos serviços de enfermagem, fato que também foi apontado pelos supervisores nas oficinas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O método das oficinas proporcionou ambiente favorável às interações dialógicas, respeitando as diferenças, de acordo com o que se espera de um processo democrático e participativo, bem como a implicação e engajamento do grupo para cumprir os objetivos propostos. Neste processo democrático, ao terem livre expressão de suas angústias e insatisfações expressadas pela falta de autonomia, falta de apoio e descrédito, os supervisores se fortaleceram na sua identidade grupal, refletindo sobre novas possibilidades para uma atuação diferente do "cumprir e fazer cumprir tarefas", superando dificuldades cotidianas que os desviam da finalidade do seu trabalho. Deste modo, avaliamos que as oficinas foram uma experiência intensa, na instituição estudada, sendo uma estratégia positiva e inovadora para um grupo acostumado com as capacitações técnicas tradicionais que enfocam a transmissão do conhecimento.

Para a coordenadora e as apoiadoras, o desenvolvimento das oficinas foi um desafio contínuo, árduo e ao mesmo tempo prazeroso, na medida em que, se acompanhou a evolução do grupo. As constantes avaliações pré e pós encontros permitiram entender o movimento do grupo e fortalecer o seu processo interno de pertencimento, comunicação, cooperação, aprendizagem e produção.

Conclui-se que o método de oficinas pode contribuir em instituições semelhantes, sendo uma estratégia eficiente para gestores de enfermagem desenvolver consciência crítica sobre processos internos encobertos pela comunicação bloqueada e atravessada por relações de poder institucionalizadas. Este movimento de conscientização é necessário e fundamental nas discussões sobre mudanças nos processos de trabalho, sem o qual não deixarão de reproduzir atitudes e comportamentos restritos ao controle do trabalho para reais transformações das práticas de supervisão alinhadas à finalidade do gerenciamento da assistência.

AGRADECIMENTOS

Sinceros agradecimentos à Diretoria do Departamento de Enfermagem e Seção de Educação Continuada pelo apoio, parceria e implicação no desenvolvimento da pesquisa.

REFERENCES

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    » http://www.scielo.br/pdf/reben/v69n4/en_0034-7167-reben-69-04-0676.pdf
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    6 Maio 2017
  • Aceito
    22 Jun 2017
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