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Reconfiguração dos cuidados paliativos de enfermagem oncológica: contribuições da enfermagem

RESUMO

Objetivo:

analisar as estratégias empreendidas pelo enfermeiro para reconfigurar o cuidado paliativo oncológico frente ao processo de acreditação hospitalar no Hospital do Câncer IV.

Método:

pesquisa qualitativa, de abordagem histórico-social, cujas fontes diretas utilizadas foram documentos escritos e quatro depoimentos orais.

Resultados

as estratégias empreendidas evidenciadas foram: criação da Divisão de Enfermagem; gerenciamento de pessoal da enfermagem; consolidação do setor da Educação Continuada; criação do Regimento Interno de Enfermagem, com elaboração de normas e rotinas; reuniões; discussão de casos clínicos; treinamento e aulas; implantação do Núcleo de Assistência de Enfermagem; criação do ambulatório de curativos tumorais e ostomizados; organização do Fórum do 5º Sinal Vital.

Considerações finais:

os enfermeiros, apoiados por uma aliança pactuada com a direção da instituição, empreenderam eficazes estratégias e alcançaram significativos avanços, à medida que participavam desse investimento, se transformavam em porta-vozes legítimos de um discurso autorizado no campo da enfermagem oncológica no Brasil.

Descritores:
Cuidados Paliativos; História da Enfermagem; Acreditação Hospitalar; Enfermagem Oncológica; Gestão da Qualidade

ABSTRACT

Objective:

to analyze the strategies implemented by nurses to reconfigure palliative oncological care due to the hospital accreditation process in Hospital do Câncer IV (Hospital of Cancer IV).

Method:

qualitative research of historical-social approach, whose direct sources in use were written documents and four spoken accounts.

Results:

implemented strategies were: creation of the Nursing Division; nursing staff management; consolidation of Continuing Education sector; creation of Internal Nursing Bylaws through development of norms and routines; meetings; discussion of clinical cases; training and classes; creation of Núcleo de Assistência de Enfermagem (Nursing Assistance Core); creation of a tumoral and ostomy wound-dressing ambulatory; and organization of the 5th Vital Sign Forum.

Final considerations:

nurses, supported by an alliance with the institution directors, implemented effective strategies and reached significant advancement. As they took part in this endeavor, they became legitimate spokespeople of an authorized discourse in the field of oncological nursing care in Brazil.

Descriptors:
Palliative Care; History of Nursing; Hospital Accreditation; Oncological Nursing; Quality Management

RESUMEN

Objetivo:

analizar las estrategias emprendidas por las enfermeras para reconfigurar los cuidados paliativos oncológicos frente al proceso de acreditación hospitalaria en lo Hospital do Câncer IV (Hospital del Cancer IV).

Método:

investigación cualitativa, con un enfoque histórico-social, cuyas fuentes directas utilizadas fueron documentos escritos y cuatro declaraciones orales.

Resultados

las estrategias emprendidas evidenciadas fueron: creación de la División de Enfermería; gestión del personal de enfermería; consolidación del sector de Educación Continua; creación del Reglamento Interno de Enfermería, con elaboración de normas y rutinas; reuniones; discusión de casos clínicos; entrenamiento y clases; implementación del Núcleo de Assistência de Enfermagem (Centro de Atención de Enfermería); creación de la clínica ambulatoria para apósitos de tumor y ostomía; organización del V Foro de Signo Vital.

Consideraciones finales:

las enfermeras, apoyadas por una alianza acordada con la gerencia de la institución, emprendieron estrategias efectivas e hicieron avances significativos mientras participaban en esta inversión, se convirtieron en portavoces legítimos de un discurso autorizado en el campo de la enfermería oncológica en Brasil.

Descriptores:
Cuidados Paliativos; Historia de la Enfermería; Acreditación de Hospitales; Enfermería Oncológica; Gestión de la Calidad

INTRODUÇÃO

A partir da década de 1990, no Brasil, surgiram importantes alterações relacionadas à assistência oncológica, que tinham como objetivo promover a qualidade de vida de pacientes e suas famílias por meio de medidas de conforto e alívio do sofrimento; tratamento da dor e outros problemas de ordem física, psicossocial e espiritual capazes de proporcionar condições de compreensão da finitude da vida ao paciente diminuindo os efeitos negativos da doença e planejando a qualidade de vida(11 Gomes ANZ, Othero MB. Cuidados paliativos. Estud Av. 2016;30(88):155-66. doi: 10.1590/s0103-40142016.30880011
https://doi.org/10.1590/s0103-40142016.3...
-22 Instituto Nacional de Câncer. Cuidados Paliativos: O que são os Cuidados Paliativos [Internet]. 2018 [cited 2019 Mar 25]. Available from: https://www.inca.gov.br/tratamento/cuidados-paliativos
https://www.inca.gov.br/tratamento/cuida...
).

Diante disto, os cuidados aos pacientes com câncer avançado e sem resposta farmacológica foram fortalecidos no ano de 1990, com sua primeira definição do conceito de cuidados paliativos definidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS)(11 Gomes ANZ, Othero MB. Cuidados paliativos. Estud Av. 2016;30(88):155-66. doi: 10.1590/s0103-40142016.30880011
https://doi.org/10.1590/s0103-40142016.3...
). No ano seguinte, o INCA inaugurou oficialmente o primeiro serviço de cuidados paliativos(33 Instituto Nacional de Câncer. Hospital do Câncer IV (HC IV) [Internet]. 2019. [cited 2019 Mar 25]. Available from: http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op=cv&id=233
http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op...
).

No país, a acreditação apresentou-se pela primeira vez através do Manual Internacional de Padrões de Acreditação Hospitalar. Durante os anos 1990 este era utilizado pelo Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), parceiro nacional da Joint Commission International (JCI), e o processo proposto se finalizava com a concessão de um certificado internacional de instituição acreditada. Essa certificação permite que o estatuto dos hospitais seja reconhecido por organizações de outros países(44 Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA) [Internet]. Histórico/ Sobre o CBA, 2019 [cited 2019 Mar 25]. Available from: http://cba.provisorio.ws/institucional/
http://cba.provisorio.ws/institucional/...
).

É nesse contexto que, em 1998, os cuidados paliativos têm sua regulamentação no Brasil, conforme previa a Portaria n° 3.535 da Secretaria de Assistência à Saúde, subordinada ao Ministério da Saúde (MS)(55 Ministério da Saúde (BR). Portaria n.º 3.535/GM, de 02 de setembro de 1998. Estabelece critérios para cadastramento de centros de atendimento em oncologia [Internet]. Diário Oficial da República Federativa do Brasil Seção 1, p. 53-54. 1998[cited 2019 Mar 25]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/1998/prt3535_02_09_1998_revog.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
). De modo a fortalecer o movimento dos cuidados paliativos no Brasil, neste mesmo ano foi finalizada a construção de uma nova unidade do INCA, inicialmente chamada de Centro de Suporte Terapêutico Oncológico (CSTO), cuja denominação foi alterada, em 2004, para Hospital do Câncer IV (HCIV)(33 Instituto Nacional de Câncer. Hospital do Câncer IV (HC IV) [Internet]. 2019. [cited 2019 Mar 25]. Available from: http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op=cv&id=233
http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op...
). Desde modo, unificava-se a nomenclatura dos hospitais do INCA.

Desta forma, frente à perspectiva crescente de demandas de cuidados paliativos no país e a premência de políticas públicas de controle do câncer, nas décadas seguintes, Portarias importantes foram instituídas para subsidiar e estimular a criação e o desenvolvimento deste serviço. Neste contexto, acompanhando o movimento nacional e internacional de cuidados paliativos, o HCIV definiu, em 2004, sua missão, qual seja promover e prover cuidados paliativos oncológicos da mais alta qualidade, com habilidade técnica e humanitária, com foco na obtenção da melhor qualidade de vida a seus pacientes e familiares(33 Instituto Nacional de Câncer. Hospital do Câncer IV (HC IV) [Internet]. 2019. [cited 2019 Mar 25]. Available from: http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op=cv&id=233
http://www1.inca.gov.br/impressao.asp?op...
). Tais iniciativas também visavam a obtenção da acreditação em cuidados paliativos no país, a certificar a excelência da unidade nessa assistência.

Durante o ano de 2004, no HCIV, iniciou-se a reconfiguração da assistência em cuidados paliativos oncológicos e a reorganização dos serviços de saúde na Unidade, com vista ao processo de acreditação. Assim, teve-se que rever procedimentos internos relativos ao gerenciamento e à avaliação da qualidade dos serviços de saúde ali realizados, com vista à excelência nos cuidados ao paciente e nas condições de trabalho dos profissionais.

O ano de 2004 foi, portanto, marcado por diversas alterações e pela trajetória rumo à acreditação hospitalar das unidades do INCA, como o HCIV. Iniciou-se na unidade de cuidados paliativos o processo de acreditação hospitalar, de acordo com os padrões internacionais de qualidade no atendimento, cujo objetivo era rever procedimentos internos em busca da excelência nos cuidados e nas condições de trabalho dos profissionais. Foram promovidas alterações operacionais, normatizando e racionalizando processos, documentando rotinas assistenciais, organizando condutas profissionais, estabelecendo indicadores de atendimento e qualidade. Também se expandiu o projeto de humanização para todas as áreas. Diante do exposto, apresentamos como questão: quais os desafios enfrentados pelos enfermeiros no processo de reconfiguração da assistência de enfermagem paliativa oncológica, com vista à acreditação, no HCIV/INCA?

OBJETIVO

Analisar as estratégias empreendidas pelo enfermeiro para reconfigurar o cuidado paliativo oncológico frente ao processo de acreditação hospitalar no HCIV.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Os aspectos éticos foram respeitados, conforme as recomendações das Resoluções no. 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional de Saúde. O estudo foi provado pelos Comitês de Ética em Pesquisa da instituição proponente e coparticipante.

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo histórico-social, de abordagem qualitativa, na perspectiva da História do Tempo Presente, cujo corpus se compôs de fontes históricas diretas escritas e orais, e fontes indiretas utilizadas para sustentar a discussão dos resultados.

O recorte temporal compreende o ano de 2004, quando se deu início à reconfiguração dos cuidados paliativos de enfermagem na unidade do HCIV, diante dos novos investimentos institucionais e dos eixos de trabalho. Entre eles está o eixo da acreditação, o que exigiu rever procedimentos técnico-científicos, com vistas à melhoria das atividades assistenciais, em busca de excelência na qualidade dos serviços, levando também em consideração as condições de trabalho dos profissionais do município de Rio de Janeiro, Brasil.

Procedimentos metodológicos

Cenário do estudo

O cenário é o HCIV, unidade de referência e exclusiva de cuidados paliativos do INCA, no município do Rio de Janeiro, estado do Rio de Janeiro.

Fonte dos dados

Os documentos escritos foram constituídos por relatórios de gestão anual do INCA, livros de atas de reuniões (diretoria e da Divisão de Enfermagem), registros da Divisão de Enfermagem relacionados ao planejamento e atividades institucionais voltadas ao processo de acreditação hospitalar. Esses documentos estão arquivados no HCIV/INCA. Também foram entrevistados 4 participantes, sendo adotados os seguintes critérios de inclusão no estudo: profissionais que exerceram cargos de chefia de andar, dentre os quais uma médica que ocupava posição de liderança na gestão do hospital; que vivenciaram o processo de acreditação hospitalar; estando ou não inseridos atualmente na instituição-cenário; com vínculo ou não de trabalho; externando assentimento pela assinatura do TCLE; além de ter disponibilidade e tempo para conceder a entrevista. Para o recrutamento, os participantes foram identificados por meio de quadro de funcionários pertencente à instituição e também indicados por outros profissionais que participaram da pesquisa. As fontes indiretas foram constituídas de artigos de periódicos científicos produzido sobre a temática.

Foram excluídos da pesquisa os profissionais que possuíram cargos de chefe que estavam de férias ou licença durante o período de coleta de dados. No recorte da dissertação de Mestrado, o número de profissionais que possuía cargo de chefia era de 12. Desses, 3 se reusaram a participar, 1 encontrava-se de atestado médico, 1 era falecido, 7 participaram da pesquisa e 4 tiveram seus trechos de entrevistas aqui explicitados em contribuição direta ao fenômeno estudado no artigo.

Coleta e organização dos dados

Para os documentos escritos, considerou-se sua natureza, disponibilidade e exaustividade, ou seja, todos os documentos estavam digitalizados, categorizados em pastas nomeadas e foram disponibilizados para a consulta e cópia. Assim, foi possível o confronto entre os mesmos para identificar possíveis divergências.

As entrevistas foram realizadas no período de fevereiro a junho de 2018, sendo norteadas por um roteiro semiestruturado com perguntas abertas sobre o tema em questão como: qual sua percepção acerca das mudanças necessárias para a acreditação da unidade? Comente sobre sua participação nesse processo. Comente sobre os desafios enfrentados. Como a equipe de enfermagem foi preparada para tais mudanças? Como percebes o investimento realizado por profissionais e instituição? As entrevistas foram gravadas por meio digital e, posteriormente, transcritas e validadas pelos participantes, mediante leitura e autorização escrita para o uso. Estas foram precedidas da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), após ratificação de que não haviam dúvidas sobre o desenvolvimento da pesquisa e respectivos objetivos. O local das entrevistas foi definido pelos participantes. O tempo médio das entrevistas foi de 65 minutos. Na identificação dos depoimentos, foi utilizada a letra inicial da sua profissão, seguida do número arábico correspondente à ordem sequencial das entrevistas: enfermeiras (E1; E2; E3), médica (M1).

Análise dos dados

Para fundamentar a análise de dados da pesquisa, o corpus documental considerou a crítica externa e interna para eliminar quaisquer divergências relacionadas ao conteúdo e origem das fontes. Além disso, considerou-se a cronologia dos dados coletados no período investigado. O corpus documental foi analisado considerando procedimentos ativos de interrogação dos documentos, com postura independente da versão oficial e, dessa maneira, melhor evidenciar o fenômeno histórico. A confiabilidade dos resultados foi assegurada, com a valorização do conjunto documental e não os documentos isoladamente, a emergir as seguintes categorias: Divisão de Enfermagem, Liderança de enfermagem, Educação Continuada e Gestão estratégia. Os dados foram analisados com base em artigos e livros sobre o tema, ou seja, as fontes indiretas.

RESULTADOS

A busca pela excelência na qualidade dos serviços de um hospital de referência nacional em cuidados paliativos exigiu grande investimento institucional, e profissionais especializados na área de cuidados paliativos. Nesta perspectiva, os enfermeiros que atuavam no HCIV precisaram se adequar na perspectiva de um novo modelo de gestão. Assim, fica evidente com os excertos das entrevistas a necessidade de investimento na implantação de ações de enfermagem relevantes para aquela unidade, além de se criar, implantar e/ou consolidar alguns serviços. Observa-se ainda a premência de se elaborar e difundir normas e rotinas nos setores de enfermagem dessa unidade.

A criação da Divisão de Enfermagem no HCIV, uma das estratégias empreendidas para a reconfiguração do cuidado paliativo oncológico, atuava como porta-voz da enfermagem e na unidade HCIV no âmbito do INCA. A Direção de enfermagem liderou a participação da enfermagem na consolidação institucional enquanto referência nacional em cuidados paliativos, ratificando seu papel no campo da saúde como instância técnica e executiva do MS tanto no desenvolvimento de pesquisa quanto na prestação de assistência especializada, voltada exclusivamente para o atendimento do SUS. A enfermeira Fátima Vinhas foi selecionada pela direção do HCIV para ocupar o cargo de chefe, uma posição de liderança da enfermagem, em função do seu volume de capital social e científico.

A Fátima se candidatou a Divisão de Enfermagem [...] construímos essa Divisão de Enfermagem, foi na nossa gestão também! E as enfermeiras aqui não tinham nem DAS para ser chefe [gratificação adicional no salário para cargo de chefia]. [...] no INCA todo [todas as outras unidades do INCA] têm Divisão de Enfermagem [...] a única unidade que não tinha Divisão era o HCIV [...] (M1)

Foi aí que o doutor Maurílio [diretor do HCIV] viu meu trabalho, quando eu era chefe de enfermagem do PA [Pronto Atendimento], ele viu e me chamou! Isso foi em 2004, quando ele assumiu [a direção do HCIV], ele faleceu já. Ele chegou para mim e falou assim - estou querendo criar uma Divisão de Enfermagem porque o hospital não tem, você aceita? (E3)

A criação da Divisão impôs aos enfermeiros do HCIV o enfrentamento de resistências de outras enfermeiras das Divisões de Enfermagem das demais unidades do INCA, justificadas pela alteração da estrutura organizacional dessa instituição. A Divisão de Enfermagem do HCIV, naquele momento, não constava do organograma administrativo da Fundação Ary Frauzino, instituição responsável pela administração do INCA. Assim, tem-se que o organograma determinado pela direção do HCIV impunha às demais chefias das Divisões das outras unidades a liderança de enfermeiras que ocupavam cargo equivalente, no âmbito do HCIV.

As enfermeiras da Divisão de Enfermagem das outras unidades diziam - não, nós não vamos reconhecer a Divisão de Enfermagem de vocês [do HCIV] [...] eu falei - não tem problema! Para mim, ela [a enfermeira selecionada para chefia da Divisão de Enfermagem do HCIV] será a chefe de enfermagem! Eu a considero a chefe de enfermagem! [...] vocês podem nem querer ouvi-las! [...] não está no organograma. Não pode no HCIV! Não vai ter DAS para elas [...] mas estou criando uma Divisão de Enfermagem. [...] (M1)

[...] tínhamos muitas dificuldades para impor as coisas, porque não existia a Divisão [...] Essas dificuldades eram normais porque a gente não tinha Divisão e as outras unidades tinham [...]. Tinha rotina no HCII, no HCIII e no HCIV não tinha, não tinha nem regimento interno. (E3)

Tendo na chefia da Divisão de Enfermagem uma liderança para toda a equipe de enfermagem do HCIV, foi possível identificar práticas de gerenciamento de pessoal da enfermagem, iniciativa que fortaleceu a gestão do planejamento estratégico que se iniciava, de forma a contribuir para a organização e execução das atividades, com objetivos e planos de ação.

A primeira coisa feita foi o levantamento de todos os funcionários por categoria e vendo onde iam atuar para melhorar [...] de todos os técnicos [...] na época, tínhamos auxiliares [...] era preciso saber tudo sobre a equipe que trabalhava no hospital [...]. Fomos ver o perfil de quem era bom para ficar na enfermaria, quem era bom para ficar na emergência [...] quem tinha perfil que ia ter mais paciência com a família [...]. (E3)

As estratégias empreendidas pela Divisão e pelos enfermeiros na unidade exclusiva de cuidados paliativos evidenciaram a consolidação de alguns serviços, como o setor de Educação Continuada, responsável pela capacitação e treinamento na unidade para capacitação dos profissionais de enfermagem, no que tange à assistência no HCIV.

Fomos vendo onde poderia trabalhar as dificuldades [...] foi-se criando a Educação Continuada, levantamento de todos os funcionários por categoria e fomos vendo onde iríamos atuar para melhorar ainda mais [...] como o treinamento dos técnicos de enfermagem, oferecemos treinamento com o suporte da Educação Continuada [...] a Educação Continuada foi consolidada a partir da Divisão de Enfermagem. (E3)

[...] houve algumas reuniões e alguns treinamentos para podermos saber o que estava sendo cobrado, o que seria pontuado, tiveram alguns treinamentos nesse sentido. [...] nós tínhamos muita aula promovida pelo setor de Educação Continuada, eu lembro que tínhamos aula com frequência de temas comuns de cuidado paliativo [...] aulas de sedação, de acesso, aula de lesão para instrumentalizar [...] (E2)

Com apoio da Direção, a Divisão foi evidenciando planejamento e ações para a enfermagem do HCIV, a estabelecer competências e atribuições profissionais. A criação do Regimento Interno de Enfermagem e a elaboração e divulgação de normas e rotinas, no âmbito dos serviços da unidade, nortearam e unificaram as ações da enfermagem naquela unidade.

[...] depois criei todo o Regimento de Enfermagem do HCIV [...] porque você tem que ter um Regimento [...] a diretora ajudou com o regimento interno [...]. Algumas normas e rotinas a gente já desenvolvia no trabalho, mas elas foram registradas a partir de 2004, na minha época da Divisão de Enfermagem [...] reunimos as chefias de setores e criamos essas normas e rotinas com auxílio da Direção. (E3)

Algumas estratégias utilizadas pelas enfermeiras, pela Divisão e pela Direção incluíram reuniões de rotina; discussão de casos clínicos entre os membros da equipe do HCIV; treinamento e aulas. Nessas ocasiões, havia espaço para serem expostas as dificuldades dos profissionais, para juntos definirem a melhor maneira de atender às necessidades da unidade:

[...] trabalhávamos com treinamento em serviço, com Educação [...] discutíamos casos [...] tinham aulas [...] a gente só direcionava para atender aquela demanda [...] íamos controlar a dor [...] trabalhar esse novo formulário para a questão da dor [...] a gente revia essa questão da dor, revia a questão da avaliação e da anotação. (E1)

Esses investimentos não aconteceram com todos os profissionais de enfermagem de forma unificada. Aqueles que trabalhavam com escalas de plantões tinham mais dificuldades para incorporar as normas e rotinas criadas e disponibilizadas nos serviços de enfermagem do HCIV, necessárias à acreditação dessa unidade e motivação institucional para a reconfiguração da assistência de enfermagem e outros serviços:

[...] acho que a dificuldade foi de se preparar melhor [...] falar mais com as pessoas [...] porque não foi coeso o processo com todo mundo e se falar a mesma linguagem [...] estava preparada no sentido que eu já tinha passado na acreditação [em outro hospital de trabalho] [...] sabemos que eles cobram o passo a passo [...] o pessoal que era diarista dos andares estavam organizados quanto a esse aspecto [...] mas podia faltar alguma coisa para alguns plantonistas porque não teve tempo hábil para falar com todo mundo [...]. (E2)

Outras estratégias registradas pela Divisão de Enfermagem, com o apoio da Direção, foram a implantação do Núcleo de Assistência de Enfermagem (NAE) e a criação do ambulatório de curativos tumorais e ostomizados.

Tinha uma comissão de curativo [...] quando organizamos o ambulatório, organizamos um espaço específico para enfermagem [...]. Pensei “essa enfermeira precisa de um espaço maior para atuar com eles [pacientes], porque no ambulatório ela é a enfermeira que faz, ela orientava com muita competência. A enfermagem precisava de espaço maior” [...] espaço para orientação dos pacientes e dos cuidadores [...] 27% deles têm ferida tumoral, não dá para elas terem uma salinha [...] criamos um Núcleo de Assistência de Enfermagem (NAE) [...] tivemos o NAE no ambulatório [...]. Era delas [das enfermeiras] [...] tinham os indicadores e os indicadores especiais de ferida [...] a organização dos estágios da ferida foi construída aqui dentro [do HCIV] com elas [...] elas que ensinaram a gente isso [...] surgiu desse NAE [...]. (M1)

[...] inauguramos o NAE dentro do ambulatório [...] tinham os consultórios médicos e tinha o nosso Núcleo [...] Tinham duas salas [...] tinha a sala de procedimentos e a sala de consultas [...] onde fazíamos consultas de enfermagem e os curativos [...] mostrávamos os indicadores no final do mês [...] e através desses indicadores analisávamos se estávamos controlando o odor [...] fazíamos curativos, manutenção de cateter, coleta de sangue, orientações, troca de fentanil, ou uma medicação se precisasse fazer [...] a nossa unidade também tinha uma pessoa que fazia parte da subcomissão de curativos [...] a gente tinha nossa comissão de curativo e tinha a comissão grande do INCA onde todos os participantes das unidades discutiam os protocolos [...]. (E3)

Nesse mesmo ano, um evento importante, ocorrido em 20 de agosto, foi registrado no Relatório da Gestão da Divisão de Enfermagem e no Relatório de Gestão de 2004 do INCA - o Fórum do 5º Sinal Vital. Esse evento, realizado em um único dia, foi oferecido pela Divisão de Enfermagem do HCIV a todos os profissionais do INCA, com carga horária de 6 horas. O evento ocorreu no auditório Gama Filho do Hospital do Câncer III (HCIII), sendo abordados os seguintes temas: alívio da dor nos pacientes com câncer; princípios gerais do controle de dor; terapêutica analgésica; apresentação do grupo de controle de dor do HCIV; e oficinas de trabalhos com discussões de casos clínicos.

Em 2004, na minha gestão, quando criei a Divisão de Enfermagem, conseguimos fazer o I Fórum do quinto sinal Vital [...] o HCIV que criou [...]. Organizei tudo [...] o primeiro Hospital a fazer um Fórum do quinto Sinal Vital foi o HCIV [...] criamos carimbos do quinto sinal vital pra colocar nas evoluções [...] treinamos os técnicos de como avaliar [a dor] e a fazer anotação [...] eles eram treinados de como tinha que ser feita a avaliação da dor [...] sempre treinando todo mundo. (E3)

DISCUSSÃO

Os enfermeiros do HCIV empreenderam várias estratégias para reconfigurar o cuidado paliativo oncológico frente ao processo de acreditação hospitalar na unidade e, assim, também atender aos investimentos institucionais. Com isso, reafirmava a importância de se realizar uma assistência de excelência voltada para este perfil de paciente, seus familiares e demais envolvidos no processo.

No que tange à reconfiguração destes cuidados, uma das estratégias foi a criação da Divisão de Enfermagem. Para ocupar a chefia, as enfermeiras se disponibilizaram de forma individual para a vaga, sendo a enfermeira Fátima Vinhas selecionada pela direção do HCIV para o cargo, em função do seu volume de capital social e científico. A seleção da referida enfermeira foi, portanto, um poder concedido pelo médico, contando com a chancela deste.

O apoio da Direção, pessoas que decidem sobre o destino de uma organização, integrado ao trabalho profissional, é de extrema importância para que ocorra avanço na qualidade assistencial, aumento da segurança do paciente e o desenvolvimento de uma relação de troca mais forte entre o líder (por exemplo, gerente de enfermagem)(66 Hanse JJ, Harlin U, Jarebrant C, Ulin K, Winkel J. The impact of servant leadership dimensions on leader-member Exchange among health care professionals. J Nurs Manag. 2016;24:1-7. doi: 10.1111/jonm.12304
https://doi.org/10.1111/jonm.12304...
). É relevante considerar que para ocorrer a assistência com qualidade e o alcance das metas e transformações na organização do trabalho, o enfermeiro, enquanto gerente, precisa estar preparado para assumir o papel de líder(77 Carrion MCD. A arte de liderar na enfermagem. São Paulo: Baraúna; 2016.).

É relevante considerar, diante dessas mudanças institucionais, a experiência e o conhecimento desse profissional, além de características, como a agilidade, que também auxiliam no desenvolvimento das organizações(88 Fischer SA. Transformational leadership in nursing: a concept analysis. J Adv Nurs. 2016;72(11):2644- 53. doi: 10.1111/jan.13049
https://doi.org/10.1111/jan.13049...
). A autonomia dos enfermeiros é reconhecida pela equipe quando eles se mostram como líderes, consequentemente proporcionando a ele um poder de articulação com os outros profissionais de saúde, maior comprometimento com os pacientes e, assim, valorização profissional(99 Copelli FHS, Oliveira RJT, Erdmann AL, Gregório VRP, Pestana AL, Santos JLG. Understanding nursing governance practice in a obstetric center. Esc Anna Nery. 2015;19(2):239-45. doi: 10.5935/1414-8145.20150031
https://doi.org/10.5935/1414-8145.201500...
).

A Divisão de Enfermagem não fazia parte do organograma da Fundação, o que fez com que os enfermeiros das outras unidades do INCA não reconhecessem as enfermeiras do HCIV, a despeito de o cargo de chefia ter sido registrado pelo diretor da unidade e ter conferido a uma delas a representatividade que até então não existia. Tal situação revelava-se em um desafio a mais para a enfermeira chefe da Divisão de Enfermagem do HCIV.

O cuidado paliativo oncológico do enfermeiro passou a ser legitimado sob a liderança da chefe da Divisão de Enfermagem e das estratégias empreendidas para a reconfiguração desse cuidado e a consolidação de um conhecimento especializado, com vistas à excelência na assistência, a contribuir para o reconhecimento da unidade enquanto referência nacional nessa especialidade.

A gestão estratégica tem como foco a missão e a visão da instituição, sendo realizada com o acompanhamento, análise e realinhamento sistemático das estratégias da unidade, a partir de um processo desenvolvido por meio de reuniões, com foco na tomada de decisão, utilizando o planejamento estratégico. O planejamento estratégico e a habilidade de pensamento são ferramentas essenciais para os líderes de enfermagem, sendo um processo da gestão que compreende a formulação de objetivos estratégicos para o serviço e os planos de ação para sua execução, mensuráveis e consistentes, baseados nas condições externas e internas da instituição, planejando, dessa forma, sua evolução(1010 Conselho Federal de Enfermagem. Manual do Cofen Selo de Qualidade de 2016 [Internet]. 2016[cited 2019 Mar 25]. Available from: http://www.cofen.gov.br/planejamento-estrategico-20152018
http://www.cofen.gov.br/planejamento-est...
-1111 Falk NL, Garrison KF, Brown MM, Pintz C, Bocchino J. Strategic planning and Doctor of Nursing Practice education: developing today "sand tomorrow" leaders. Nurs Econ [Internet]. 2015[cited 2019 Apr 20];33(5):246-53. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26625577
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2662...
).

É de extrema importância analisar a contribuição e os papéis dos membros da equipe, pois impactam diretamente na assistência, na força de trabalho e na qualidade dos serviços. É preciso considerar quais as habilidades necessárias para atingir metas e quais seriam as essenciais para atender às necessidades do perfil de paciente assistido. É importante também considerar os dados da força de trabalho para tomar decisões na organização da composição de uma equipe(1212 Zomorodi M. Exploring New Paradigms for Team-Based Care. N C Med J [Internet]. 2018 [cited 2019Apr 12];79(4):219-222. Available from:doi: 10.18043/ncm.79.4.219.
https://doi.org/10.18043/ncm.79.4.219...
).

Alguns participantes também narraram a consolidação de algumas estratégias utilizadas, entre elas a Educação Continuada, setor criado e desenvolvido na unidade, responsável pela capacitação e treinamento institucional. Nesse sentido, a iniciativa desse grupo, comprometida com o desenvolvimento de suas atividades enquanto ações de forte impacto para a qualidade da assistência, representava uma estratégia que permitia, a todos os envolvidos, a acumulação de capital científico. Ou seja, aumentava e diversificava o conhecimento, refletindo diretamente no cuidado integral ao paciente, seus familiares e todos os envolvidos e na qualidade da assistência prestada.

Uma instituição de saúde que investe na Educação Continuada da enfermagem reconhece a contribuição desses profissionais nos cuidados de saúde. Esses investimentos capacitam enfermeiros, proporcionando-lhes melhoria do conhecimento e práticas de habilidades resultantes da aquisição de experiência. Profissionais capacitados e atualizados refletem diretamente na reconfiguração das práticas assistenciais em saúde, nos cuidados e nos sistemas institucionais, além da contribuição direta da disseminação da adequada atuação assistencial e na melhoria da qualidade desses(1313 Jho MY, Kang Y. Perceptions of Continuing Nursing Education in Korea. J Cont Educ Nurs. 2016;47(12):566-72. doi: 10.3928/00220124-20161115-10
https://doi.org/10.3928/00220124-2016111...
).

Estratégias de segurança do paciente contribuíram diretamente na qualidade da assistência, favorecendo as novas propostas dos eixos de trabalho da unidade IV do INCA. Dessa forma, a enfermagem se respaldava por meio dessas estratégias para o desenvolvimento também de suas novas propostas, mantendo seu esforço e participação em consolidar o HCIV como referência nacional em cuidados paliativos. Ademais, afirmava seu papel no campo da saúde como instância técnica e executiva do MS como órgão de pesquisa e prestador de assistência especializada, voltada exclusivamente para atendimento do SUS.

Destaca-se a importância de a líder de enfermagem priorizar o desenvolvimento de competências para contemplar as exigências institucionais e do órgão normativo, além das exigências da Joint Commission International (JCI). Assim, de acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), o regimento interno estabelece a estrutura organizacional, requisitos, competências e atribuições do quadro funcional e normatizações relacionados à enfermagem. Esse documento tem como finalidade facilitar o conhecimento das normas, procedimentos e orientações quanto aos processos de trabalho para todos os profissionais que integram a equipe de enfermagem. Além disso, há necessidade de ter sua aprovação pela Direção, cuja responsabilidade é prover meios para que ele seja cumprido(1111 Falk NL, Garrison KF, Brown MM, Pintz C, Bocchino J. Strategic planning and Doctor of Nursing Practice education: developing today "sand tomorrow" leaders. Nurs Econ [Internet]. 2015[cited 2019 Apr 20];33(5):246-53. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26625577
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).

O ano de 2004 foi bastante intenso, com muitas mudanças para o cuidado de enfermagem e a realidade da unidade - HCIV/ INCA. O processo de adaptação foi um fator muito lembrado pelas participantes. Também foram pontuadas algumas dificuldades em relação à aceitação, insegurança e resistência da equipe, cujas atitudes influenciaram o andamento de alguns processos.

A Educação Continuada também teve papel importante para superar tais resistências, pois surge das necessidades e da realidade do ambiente de trabalho, desenvolvendo-se a partir de situações vivenciadas diariamente. Possui como objetivo discutir a realidade e beneficiar o desenvolvimento do trabalhador, ao estimular reflexões críticas, com suas ações pautadas no conhecimento em constante transformação(1414 Salum NC, Prado ML. Continuing education in the development of competences in nurses. Texto Contexto Enferm. 2014;23(2):301-8. doi: 10.1590/0104-070720140021600011
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). Além disso, pode tornar as práticas mais eficientes e potencializar a qualificação do trabalho em equipe, podendo agregar aos profissionais novos olhares sobre o modo de assistir e liderar, a proporcionar novas formas de compartilhamento dos sabres(1515 Amestoy SC, Trindade LL, Silva GT, Santos BP, Reis VR, Ferreira VB. Leadership in nursing: from teaching to practice in a hospital environment. Esc Anna Nery. 2017;21(4):1-7. doi: 10.1590/2177-9465-ean-2016-0276
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).

A Educação Continuada é uma importante contribuição no contexto da assistência, pois é considerada apoio para fatores como o aumento da motivação relacionada ao trabalho e ao fortalecimento da identidade profissional e da unidade de saúde. Além disso, concede ao enfermeiro oportunidades de desenvolvimento profissional e fortalecimento das habilidades de liderança, proporcionando-lhe uma atuação profissional em níveis gerenciais(1616 Clark M, Julmisse M, Marcelin N, Merry L, Tuck J, Gagnon A. Nursing continuing education in Haiti. Int Nurs Rev. 2015;62:54-63. doi: 10.1111/inr.12165
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).

O cuidado de enfermagem especializado no HCIV se fortaleceu através da criação do ambulatório de curativos tumorais e ostomizados. Tal iniciativa favoreceu a atuação da enfermagem dentro dessa unidade do INCA, uma vez que os enfermeiros passavam a realizar alguns cuidados em um espaço específico. Demarca-se, dessa maneira, um território de cuidados assistenciais da enfermagem, portanto uma oportunidade de se evidenciar autonomia profissional. Por outro lado, não parecia ser esse espaço o mais adequado, tendo em vista que aquele ambulatório se resumia a uma sala onde várias outras atividades de enfermagem eram desenvolvidas como: coleta de sangue, administração de medicação e manutenção de cateter, além dos curativos.

Para o desenvolvimento do cuidado de enfermagem especializado no HCIV, fazia-se necessário um cuidado de enfermagem diferenciado. A implantação do NAE, no entanto, não se encontrava dentro dos padrões exigidos para acreditação hospitalar. Isso exigiu algumas reuniões envolvendo a chefia da Divisão de Enfermagem e a direção do HCIV, para o planejamento de normas, rotinas e protocolos de enfermagem. Nesse ano, foi destacado como um obstáculo, a falta de computadores no serviço do NAE, dificultando as anotações de enfermagem no instrumento de avaliação de controle da dor e de consumo de material.

O envolvimento dos enfermeiros no ano de 2004 também se deu através do Fórum do 5º Sinal Vital. Nesse evento, foi discutida a relação da dor em cuidados paliativos e, além disso, a unidade previa incluir a dor como quinto sinal vital nos registros de rotina. Desse modo, os protocolos institucionais são aprimorados, com efeito na qualidade dos cuidados de enfermagem, e ampliação da visibilidade ao HCIV, tanto frente às outras unidades do INCA quanto diante das outras instituições hospitalares em todo território nacional.

Salienta-se a importância da identificação e descrição da dor, através de dados imprescindíveis, como a sistematização nos serviços, a detecção da queixa, avaliação e registro para que o tratamento seja realizado. Nesse contexto, a equipe de enfermagem possui uma posição importante, podendo influenciar no seu controle(1717 Pereira DTS, Andrade LL, Agra G, Costa MML. Therapeutic conducts used in pain management in oncology. Rev Pesqui: Cuid Fundam. 2015;7(1):1883-90. doi: 10.9789/2175-5361.2015.v7n1.1883-1890
https://doi.org/10.9789/2175-5361.2015.v...
). Sendo assim, os instrumentos de avaliação da dor são de grande relevância para respaldo e direcionamento da atuação do enfermeiro, além de servirem de base para o diagnóstico, prescrição e avaliação da eficácia, farmacológica ou não, obtida(1818 Araujo LC, Romero B. Pain: evaluation of the fifth vital sign: a theoretical reflection. Rev Dor. 2015;16(4):291-296. doi: 10.5935/1806-0013.20150060
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).

O ano de 2004 foi intenso na unidade, com novas propostas de trabalho e grandes investimentos por parte da Direção e da enfermagem. Nos dias 22, 23 e 24 de novembro, ocorreu a primeira etapa do processo de acreditação hospitalar, quando foi realizada uma avaliação dos padrões internacionais de acreditação para cuidados continuados, registrado como estatística geral do HC IV: 60% conformidade, 16% conformidade parcial e 24% não conformidade, gerando um plano de adequação(1919 Instituto Nacional de Câncer(INCA). Relatório de gestão 2004. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer; 2004. 42p.).

Limitações do estudo

As limitações do estudo consistem na possibilidade de que outros documentos históricos sejam localizados futuramente, a despeito do intenso investimento realizado na busca destes materiais, o que permitiria ajustes na versão histórica ora apresentada.

Contribuições para a área da enfermagem

A contribuição deste estudo evidencia a necessidade de reflexão cuidadosa no que se refere ao entendimento das estratégias nesse perfil de assistência e a trajetória das práticas na atenção em saúde oncológica no Brasil, que poderiam ser utilizadas pelos profissionais em todos os níveis de atenção. Contribuiu ainda na ampliação do conhecimento dos que atuam nessa área, a fim de promover uma maior possibilidade de entendimento e domínio acerca das estratégias no perfil dos cuidados paliativos oncológicos, visando à qualidade da atenção em saúde. Além disso, é importante também como subsídio aos profissionais que se deparam constantemente com esse perfil de usuários inseridos em todos os níveis de atenção.

Este trabalho também serve de importante instrumento analítico para ampliar a compreensão da trajetória da enfermagem nesta modalidade de assistência no país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essas estratégias, que estabeleciam as competências e atribuições profissionais, favoreceram a sistematização dos serviços, contribuindo para o novo modelo de gestão compartilhada e os eixos de trabalho propostos, pois foram capazes de redesenhar o funcionamento das atividades assistenciais e o cuidado de enfermagem propriamente dito. Ademais, pode-se perceber a importância da padronização das normas e rotinas e do regimento interno de enfermagem para a reconfiguração do cuidado de enfermagem dentro do HCIV, pois estes, além de sistematizarem as atribuições e o cuidado de enfermagem, refletiram diretamente no contexto em que a unidade se encontrava enquanto candidata à acreditação hospitalar, que buscava o alcance dos padrões determinados pela JCI.

É possível evidenciar que, no ano de 2004, o HCIV investiu na implantação de novos protocolos e rotinas assistenciais. Além do mais, se constituiu em um cenário profícuo ao desenvolvimento de estratégias pelos enfermeiros, para a evolução e a reconfiguração dos cuidados paliativos da enfermagem frente aos novos desafios que se impunham, tal como determinavam as propostas institucionais. Para que a unidade se firmasse como liderança nacional e se consolidasse referência nos cuidados paliativos oncológicos, era preciso que a enfermagem fosse especializada para atuar em um serviço mais qualificado e também estruturado.

Após o início dos investimentos institucionais e dos eixos propostos, iniciou-se a operacionalização de um plano estratégico institucional, ficando evidente a necessidade de envolver também a enfermagem. Além da imprescindibilidade de se implantar ou consolidar serviços que contavam com a participação desses profissionais, também era previsto elaborar e difundir normas e rotinas de enfermagem na unidade. Faz-se relevante destacar que os enfermeiros utilizaram novas estratégias enquanto lógica de reconfiguração dos cuidados paliativos em prol da qualidade da assistência realizada. Isso proporcionou a atualização do seu capital científico e, por conseguinte, reconfigurou o habitus profissional destes, caracterizado pela inovação de saberes específicos na perspectiva dos cuidados paliativos, ao encontro das exigências constantes nos eixos de trabalho e dos padrões estabelecidos no Manual Internacional de Padrões de Acreditação Hospitalar.

Conclui-se que, no HCIV, as enfermeiras empreenderam eficazes estratégias frente ao desafio que se impunha em prol do cuidado paliativo de enfermagem. Isso culminou com uma melhor ocupação de suas posições nesse campo, transformando-o e contribuindo para a consolidação da unidade como referência no cenário de saúde brasileiro e fortalecendo a área de atuação profissional. É relevante destacar também que o esforço e a autoridade das enfermeiras permitiram a consolidação de suas atividades, com grandes possibilidades de desenvolverem o seu potencial profissional, e a criação de um cenário para desenvolvimento de seus saberes nos processos de assistenciais, no ensino e na produção científica, fortalecendo a excelência na qualidade do cuidado no HCIV.

  • FOMENTO
    Este trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da Escola de Enfermagem Anna Nery/Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Marcos Brandão

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2019
  • Aceito
    28 Set 2019
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