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Impacto da supervisão clínica na satisfação profissional e na competência emocional dos enfermeiros

RESUMO

Objetivo:

Avaliar o impacto da implementação do Modelo de supervisão clínica SafeCare na satisfação profissional e no perfil de competência emocional dos enfermeiros.

Métodos:

Estudo quase-experimental, com uma amostra de 28 enfermeiros de um hospital do norte de Portugal. Aplicou-se um questionário de autopreenchimento, utilizado como pré e pós-teste, que engloba caracterização sociodemográfica e profissional, “Escala da Satisfação Profissional” e “Escala Veiga de Competência Emocional”. Realizaram-se análise estatística descritiva e Teste de Wilcoxon.

Resultados:

Observou-se uma diminuição significativa na satisfação dos enfermeiros com o superior hierárquico no pós-teste. Não se verificaram diferenças significativas na satisfação profissional e na competência emocional dos enfermeiros após a implementação do Modelo SafeCare.

Conclusão:

É necessário aperfeiçoar o Modelo SafeCare, sugerindo que se aumente o tempo de formação administrada aos enfermeiros e fortaleça o vínculo da instituição de saúde ao Modelo.

Descritores:
Enfermagem; Satisfação no Emprego; Inteligência Emocional; Mentores; Pesquisa em Enfermagem Clínica

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the impact of implementing the SafeCare clinical supervision model on nurses’ job satisfaction and emotional competence profile.

Methods:

This is a quasi-experimental study, with a sample of 28 nurses from a hospital in northern Portugal. A self-administered questionnaire was applied, used as pre and post-test, which included: sociodemographic and professional characterization; “Job Satisfaction Scale”; and “Veiga Emotional Competence Scale”. We conducted descriptive statistical analysis and the Wilcoxon Test.

Results:

A significant decrease in the nurses’ satisfaction with hierarchical superior was observed in the post-test. No significant differences were found in the nurses’ job satisfaction and emotional competence after the implementation of the SafeCare Model.

Conclusion:

The SafeCare Model needs improvement, suggesting increasing the amount of training time administered to nurses and strengthening the healthcare institution’s link to the Model.

Descriptors:
Nursing; Job Satisfaction; Emotional Intelligence; Mentors; Clinical Nursing Research

RESUMEN

Objetivo:

Evaluar el impacto de la aplicación del Modelo de supervisión clínica SafeCare en la satisfacción laboral y en el perfil de competencia emocional de los enfermeros.

Métodos:

Se trata de un estudio cuasi experimental, realizado con una muestra de 28 enfermeros de un hospital del norte de Portugal. Se aplicó un cuestionario autocompletado como pre y pos test, que incluía la caracterización sociodemográfica y profesional, la “Escala de Satisfacción Laboral” y la “Escala Veiga de Competencia Emocional”. Se llevaron a cabo análisis estadísticos descriptivos y la prueba de Wilcoxon.

Resultados:

Fue posible observar una disminución significativa de la satisfacción de los enfermeros con su superior jerárquico en la prueba posterior al test. No se encontraron diferencias significativas en la satisfacción laboral y en la competencia emocional de los enfermeros tras la aplicación del modelo SafeCare.

Conclusión:

Es necesario perfeccionar el Modelo SafeCare, aumentando la cantidad de formación impartida a los enfermeros y reforzando el vínculo de la institución sanitaria con el Modelo.

Descriptores:
Enfermería; Satisfacción Laboral; Inteligencia Emocional; Mentores; Investigación en Enfermería Clínica

INTRODUÇÃO

A supervisão clínica em Enfermagem tem sido regularmente estudada pelos enfermeiros desde 1980(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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). Pode ser definida como um processo formal de acompanhamento da prática profissional que visa promover a tomada de decisão autônoma, de modo a valorizar a proteção da pessoa e a segurança dos cuidados, através de processos de reflexão e análise da prática clínica(22 Ordem dos Enfermeiros. Caderno temático - Modelo de desenvolvimento profissional: fundamentos, processos e instrumentos para a operacionalização do Sistema de Certificação de Competências. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros; 2010.), sendo considerada essencial para uma prática de qualidade dos profissionais de saúde(33 Gonge H, Buss N. Is it possible to strengthen psychiatric nursing staff’s clinical supervision? RCT of a meta-supervision intervention. J Adv Nurs. 2015;71(4):909-21. https://doi.org/10.1111/jan.12569
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). O âmago da supervisão clínica é a segurança e o bem-estar dos utentes e das suas famílias, desempenhando também um papel fundamental no apoio às necessidades e no bem-estar dos profissionais, o que por si só continua a ser e a justificar a sua implementação e manutenção(44 MacCulloch T, Shattell M. Clinical supervision and the well-being of the psychiatric nurse. Issues Ment Health Nurs. 2009;30(9):589-90. https://doi.org/10.1080/01612840902954541
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).

Nesse âmbito, constata-se a existência de vários modelos de supervisão clínica, o que denota a ausência de consenso sobre a melhor forma de colocar em prática a supervisão clínica no contexto clínico(55 Pollock A, Campbell P, Deery R, Fleming M, Rankin J, Sloan G, et al. A systematic review of evidence relating to clinical supervison for nurses, midwives and allied health professionals. J Adv Nurs. 2017;73(8):1825-37. https://doi.org/10.1111/jan.13253
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). Alguns estudos indicam que os modelos de supervisão clínica desenvolvidos até ao momento não têm conseguido dar resposta à diversidade dos contextos da prática e ao potencial das várias equipas(66 Carvalho A, Barroso C, Pereira M, Teixeira A, Pinho F, Osório M. Implementação de um modelo de supervisão clínica em enfermagem. Porto: Uniarte Gráfica; 2019). Uma limitação recorrente na investigação produzida nesse âmbito relaciona-se com a falta de operacionalização da supervisão clínica, nomeadamente a definição pouco clara quanto aos participantes, à quantidade e aos conteúdos de supervisão clínica administrados(77 Snowdon D, Leggat S, Taylor N. Does clinical supervision of healthcare professionals improve effectiveness of care and patient experience? a systematic review. BMC Health Serv Res. 2017;17(1):786. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2739-5
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). Em Portugal, face à ausência de um modelo que se mostrasse eficaz para os enfermeiros, foi criado o Modelo de supervisão clínica SafeCare, baseado no Modelo de Supervisão Clínica em Enfermagem Contextualizado, que tem vindo a ser aperfeiçoado ao longo do tempo(88 Cruz S, Carvalho A, Sousa P. Clinical supervision and emotional intelligence capabilities: excellence in clinical practice. Proced Social Behav Sciences. 2015;171:153-57. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.01.101
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). O Modelo SafeCare é um modelo de supervisão clínica em enfermagem que tem como finalidade contribuir para a promoção da segurança e qualidade dos cuidados de enfermagem, tendo como propósito desenvolver, nos enfermeiros, um conjunto de competências que lhes permita ter um exercício profissional de excelência, através da identificação de áreas de intervenção(66 Carvalho A, Barroso C, Pereira M, Teixeira A, Pinho F, Osório M. Implementação de um modelo de supervisão clínica em enfermagem. Porto: Uniarte Gráfica; 2019).

A literatura sugere que a supervisão clínica permite aos profissionais desenvolverem conhecimentos e competências essenciais para a obtenção de níveis mais elevados de cuidados de enfermagem, sendo que melhores cuidados geram aumento no desenvolvimento profissional, fato que contribui para o aumento da sua satisfação profissional(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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). A satisfação profissional pode ser definida como a resposta emocional do trabalhador a diferentes fatores relacionados com o trabalho, a qual resulta na procura de prazer, conforto, confiança, recompensas, crescimento pessoal, progressão, e reconhecimento, tendo o valor monetário como remuneração(99 Temesgen K, Aycheh M, Leshargie C. Job satisfaction and associated factors among health professionals working at Western Amhara Region, Ethiopia. Health Qual Life Outcomes. 2018;16(1):16-65. https://doi.org/10.1186/s12955-018-0898-7
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). A satisfação profissional influencia a satisfação pessoal, e indivíduos satisfeitos são motivados e equilibrados, física e emocionalmente, que facilmente proporcionarão cuidados de saúde com maior qualidade(1010 Silva C, Potra T. Job satisfaction of nurses: a Scoping review. Pens Enferm. 2016;20(2):33-50. https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2019.01.011
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). Melhores rácios enfermeiro/doente, mais formação dos enfermeiros e uma maior implicação na tomada de decisão e políticas da organização conduzem a melhores níveis de produtividade e de satisfação, favorecendo os resultados dos cuidados de enfermagem e da organização de saúde(1111 Boamah S, Read E, Laschinger H. Factors influencing new graduate nurse burnout development, job satisfaction and patient care quality: a time-lagged study. J Adv Nurs. 2017;73(5):1182-1195. https://doi.org/10.1111/jan.13215
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).

A supervisão clínica possibilita também que os indivíduos desenvolvam e mantenham níveis emocionais mais saudáveis, potenciando uma cultura de trabalho emocionalmente mais favorável ao desempenho dos profissionais de saúde(55 Pollock A, Campbell P, Deery R, Fleming M, Rankin J, Sloan G, et al. A systematic review of evidence relating to clinical supervison for nurses, midwives and allied health professionals. J Adv Nurs. 2017;73(8):1825-37. https://doi.org/10.1111/jan.13253
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). O fenômeno da competência emocional do enfermeiro possui um lugar de relevo na profissão de enfermagem, dado que permite ao enfermeiro compreender o impacto das emoções nos outros e, por vezes, conter as suas próprias emoções para não ser perturbador para os outros, evitando potenciais conflitos(1212 Lopes P. Emotional intelligence in organizations: bridging research and practice. Emot Review. 2016;8(4):316-21. https://doi.org/10.1177/1754073916650496
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). O conceito de competência emocional foi criado a partir do modelo misto de inteligência emocional(1313 Goleman D. Emotional Intelligence. Lisboa: Temas e Debates; 2003), referindo-se à capacidade dos indivíduos estarem atentos às suas próprias emoções e reações e ajustarem a forma como interagem com os outros(1414 Veiga-Branco A. Competência emocional. In: Jardim J, Franco J. Dicionário de Educação para o Empreendedorismo. Lisboa: Gradiva; 2019. p. 132-35).

No que diz respeito aos cuidados prestados, um enfermeiro que possua competência emocional terá mais facilidade em desenvolver uma relação terapêutica positiva, pois tem a capacidade de antecipar as reações emocionais dos utentes(1515 Raghubir A. Emotional intelligence in professional nursing practice: a concept review using Rodgers’s evolutionary analysis approach. Int J Nurs Sciences. 2018;5(2):126-30. https://doi.org/10.1016/j.ijnss.2018.03.004
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). Nesse sentido, a implementação de modelos de supervisão clínica que incidam sobre as variáveis satisfação profissional e competência emocional reveste-se de inolvidável valor, uma vez que poderá contribuir para a identificação de necessidades nos locais de trabalho e para o planeamento de possíveis soluções, repercutindo-se em melhorias nos serviços de saúde e na segurança e qualidade dos cuidados prestados(1616 Wallbank S, Hatton S. Reducing burnout and stress: the effectiveness of clinical supervision. Community Pract. 2011;84(7):31-35).

O Modelo SafeCare, criado por um grupo de investigadores portugueses do Projeto SafeCare(66 Carvalho A, Barroso C, Pereira M, Teixeira A, Pinho F, Osório M. Implementação de um modelo de supervisão clínica em enfermagem. Porto: Uniarte Gráfica; 2019), surgiu como resposta à ausência de um modelo de supervisão clínica que conseguisse dar resposta à diversidade dos contextos da prática clínica, ou seja, houve a necessidade de se criar um modelo de supervisão clínica em enfermagem que estivesse focado nas reais necessidades e interesses sentidos pelos enfermeiros. O fato de, na sua implementação, se utilizarem instrumentos que permitem a recolha de dados, numa perspetiva quantitativa, vai de encontro ao que a evidência sugere, uma vez que existe uma escassez de estudos de supervisão clínica que contemplem uma metodologia quantitativa, pelo que se torna essencial a sua realização, de forma a desenvolver e sustentar a evidência produzida nessa temática(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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). O Modelo SafeCare apresenta também a mais-valia de operacionalizar e clarificar os aspectos inerentes à sua própria aplicação nos contextos da prática, uma vez que a maioria dos estudos nesse âmbito não refere como se pode operacionalizar a supervisão clínica, o que inviabiliza a sua replicação a posteriori (55 Pollock A, Campbell P, Deery R, Fleming M, Rankin J, Sloan G, et al. A systematic review of evidence relating to clinical supervison for nurses, midwives and allied health professionals. J Adv Nurs. 2017;73(8):1825-37. https://doi.org/10.1111/jan.13253
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,77 Snowdon D, Leggat S, Taylor N. Does clinical supervision of healthcare professionals improve effectiveness of care and patient experience? a systematic review. BMC Health Serv Res. 2017;17(1):786. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2739-5
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). Assim, o Modelo SafeCare comporta quatro etapas: diagnóstico de situação, identificação das necessidades em supervisão clínica, implementação do Modelo SafeCare e avaliação dos resultados. Na primeira etapa (diagnóstico de situação), tendo em consideração as necessidades visíveis no contexto de cuidados, definem-se, conjuntamente com os enfermeiros gestores (enfermeiro diretor, enfermeiro supervisor dos serviços e enfermeiros chefes), as variáveis a serem estudadas, sendo aplicado, também, a todos os enfermeiros do contexto o questionário de recolha de dados. Na segunda etapa (identificação das necessidades em supervisão clínica), realizam-se reuniões com os enfermeiros dos contextos para identificar quais os aspectos, na sua opinião, que necessitam de mudança: podem ser intrínsecos, de índole pessoal, ou extrínsecos, relativos à organização do serviço e prestação de cuidados. Esta etapa reveste-se de extrema importância, uma vez que permite adaptar o Modelo ao contexto em que está a ser implementado. A terceira etapa (implementação do Modelo SafeCare) diz respeito à intervenção, na qual ocorrem as sessões de supervisão em grupo, que têm como objetivo promover a reflexão e a discussão sobre as necessidades em supervisão clínica identificadas pelos enfermeiros, assim como administrar formação sobre as variáveis definidas na etapa de diagnóstico de situação. Por último, a quarta etapa (avaliação dos resultados) tem como objetivo avaliar a eficácia da implementação do Modelo SafeCare, voltando a aplicar-se a todos os enfermeiros o questionário de recolha de dados aplicado na etapa 1, referente à satisfação profissional e competência emocional.

OBJETIVO

Avaliar o impacto da implementação do Modelo de supervisão clínica SafeCare na satisfação profissional e no perfil de competência emocional dos enfermeiros.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Para a realização deste estudo, foi obtida a autorização por parte do Conselho de Administração e da Comissão de Ética para a Saúde do hospital onde os dados foram recolhidos. Os autores das escalas que integram o questionário de recolha de dados autorizaram a sua utilização. Foram solicitados, a cada um dos enfermeiros, a assinatura do consentimento informado e o preenchimento do contrato de supervisão, de modo que todos os intervenientes assumissem a supervisão clínica de forma formal.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo quase-experimental, de tipo pré-teste pós-teste, sem grupo de controlo, dado que se pretende conhecer o impacto de uma intervenção (neste caso, a implementação do Modelo SafeCare) nas variáveis em estudo (satisfação profissional e competência emocional). O estudo foi desenvolvido, no período de 2017 a 2019, em dois serviços de medicina de um hospital de elevada complexidade de cuidados, localizado no norte de Portugal.

Amostra do estudo; critérios de inclusão

A amostra era inicialmente constituída por 44 enfermeiros (a totalidade de enfermeiros dos serviços), mas, devido a absentismo por gravidez de risco (n = 6; 13,6%), transferência de serviço (n = 4; 9,1%), mudança de instituição de saúde (n = 3; 6,8%) e absentismo por doença prolongada (n = 3; 6,8%), só foi possível emparelhar 28 enfermeiros que completaram o estudo. Para a definição da amostra, foram tidos como critérios de inclusão os seguintes fatores: exercer funções como enfermeiro ou enfermeiro especialista nos dois serviços de medicina do hospital em que foi autorizada a realização da investigação.

Protocolo do estudo

A recolha de dados foi realizada através da aplicação de um questionário de autopreenchimento, elaborado para a presente investigação, que incorpora três partes: a caracterização sociodemográfica e profissional, a “Escala da Satisfação Profissional”(1717 Gabinete da Qualidade da ULSM. Documento Normativo nº 2482.1 de 17 de outubro. Avaliação da satisfação dos profissionais da ULSM. 2014) e a “Escala Veiga de Competência Emocional”(1818 Veiga-Branco A. Emotional Competence. Coimbra: Quarteto; 2004-1919 Vilela C. Inteligência Emocional - Um recurso para Enfermeiros: Contributos para a gestão, formação e desenvolvimento de competências emocionais. Mauritius: Novas Edições Académicas; 2018). A “Escala da Satisfação Profissional”, elaborada pelo hospital onde foram recolhidos os dados, é composta por 28 itens, avaliados numa escala de Likert de 5 pontos, sendo que 1 corresponde a “mau” e 5 a “excelente”. Essa escala comporta quatro dimensões: satisfação com o superior hierárquico, satisfação com as relações profissionais, satisfação com a qualidade do local de trabalho e satisfação com a melhoria contínua da qualidade. A pontuação total é obtida pelo cálculo da média dos itens que compõem a escala, variando de 0 a 5 pontos, pelo que quanto maior for a média obtida, maior é a satisfação profissional. A consistência interna foi avaliada pelo coeficiente alfa de Cronbach, verificando-se que a escala, no seu total, tem um índice de consistência interna adequado no pré-teste (α = 0,97) e no pós-teste (α = 0,96). A “Escala Veiga de Competência Emocional”, adaptada para enfermeiros(1919 Vilela C. Inteligência Emocional - Um recurso para Enfermeiros: Contributos para a gestão, formação e desenvolvimento de competências emocionais. Mauritius: Novas Edições Académicas; 2018), é composta por 85 itens, avaliados numa escala de Likert de 7 pontos, sendo que 1 corresponde a “nunca” e 7 a “sempre”. Essa escala é constituída por cinco domínios: autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia e gestão de emoções em grupos. A pontuação total é obtida pelo cálculo da média ponderada dos itens que compõem a escala, variando de 85 a 595 pontos, pelo que quanto maior for a média ponderada obtida, maior é a competência emocional. A consistência interna foi avaliada pelo coeficiente alfa de Cronbach, verificando-se que a escala, no seu total, tem um índice de consistência interna adequado no pré-teste (α = 0,92) e no pós-teste (α = 0,94).

No que diz respeito ao procedimento de recolha de dados e implementação da intervenção, este estudo foi constituído por três momentos essenciais (pré-teste, intervenção e pós-teste). O primeiro momento (pré-teste) foi realizado de outubro a dezembro de 2017, integrando a etapa 1 e a etapa 2 do Modelo SafeCare (aplicação do questionário aos enfermeiros previamente à implementação da intervenção, assim como a identificação das necessidades em supervisão clínica dos enfermeiros). Foi, assim, entregue a cada enfermeiro o questionário em formato de papel, dentro de um envelope fechado. Explicaram-se o objetivo e o procedimento do estudo, solicitando-se aos enfermeiros o preenchimento do questionário. Foi ainda salientada a voluntariedade da participação dos enfermeiros no estudo, sendo assegurado que a não participação não constituiria motivo de prejuízo.

De forma a assegurar o anonimato das respostas, os enfermeiros foram informados a não colocar o seu nome em nenhum local do questionário. A identificação das necessidades em supervisão clínica foi realizada através de reuniões com os enfermeiros dos contextos. Na primeira reunião, foi solicitado aos enfermeiros que refletissem sobre as práticas vigentes e a dinâmica do contexto, a fim de serem identificados aspectos a requerer mudanças, salientando-se que as necessidades em supervisão clínica podiam ser de índole pessoal, como a aquisição de conhecimentos numa área específica ou no domínio instrumental, e, também, relacionadas com a própria dinâmica do contexto de cuidados. Para assegurar que não houvesse constrangimentos, foi pedido aos enfermeiros que a enumeração das necessidades sentidas por cada um deles fosse exposta por escrito de forma individual.

Na reunião seguinte, os enfermeiros entregaram à investigadora principal a lista individual das necessidades em supervisão clínica nomeadas por cada um deles. O segundo momento do estudo consistiu na etapa 3 do Modelo SafeCare (implementação do Modelo SafeCare), que decorreu de janeiro a dezembro de 2018, tendo englobado diversas atividades. Primeiramente, realizou-se formação em Supervisão Clínica em grupo a todos os enfermeiros do contexto, pela investigadora principal, sendo abordadas as seguintes temáticas: conceitos e história da supervisão clínica; modelos de supervisão clínica, com ênfase no Modelo SafeCare; relação supervisiva; aprendizagem e desenvolvimento pessoal e profissional; processos de inovação, gestão de cuidados e liderança; qualidade de cuidados e segurança do utente. Seguidamente, procedeu-se à identificação dos enfermeiros supervisores clínicos e enfermeiros supervisados. A seleção dos enfermeiros supervisores clínicos foi efetuada pelos enfermeiros-chefes e teve em consideração um conjunto de critérios definidos pelos investigadores, os quais refletem o que a evidência científica preconiza(2020 Gazzola N, Stefano J, Thriault A, Audet C. Learning to be supervisors: A qualitative investigation of difficulties experienced by supervisors-in-training. J Clin Superv. 2013;32(1):15-39. https://doi.org/10.1080/07325223.2013.778678
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), nomeadamente: possuir cinco ou mais anos de experiência profissional no contexto de prestação de cuidados, demonstrar interesse e disponibilidade para o desempenho do papel, demonstrar envolvimento na profissão, demonstrar competências de pensamento crítico e de relação interpessoal, ser capaz de estabelecer relações de confiança, ser reconhecido pelos pares, ser ponderado e assertivo, possuir formação/certificação de competências de domínio da supervisão clínica, possuir experiência em processos formativos. Ainda em conjunto com os enfermeiros-chefes, foram constituídas as equipas de supervisão, num rácio de um enfermeiro supervisor clínico para oito a dez enfermeiros supervisados(2121 Ducat W, Kumar S. A systematic review of professional supervision experiences and effects for allied health practitioners working in non-metropolitan health care settings. J Multidiscip Healthc. 2015;26(8):397-407. https://doi.org/10.2147/JMDH.S84557
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).

Por último, foram planeadas e calendarizadas as sessões de supervisão em grupo, com periocidade de uma sessão mensal por equipa de supervisão, cuja duração foi de 90 minutos. Durante a implementação do Modelo SafeCare, foram abordados os temas de satisfação profissional e de competência emocional, sendo ainda trabalhadas as necessidades em supervisão clínica identificadas pelos enfermeiros, as quais se encontravam abarcadas nos seguintes domínios: comunicação, gestão de emoções, indicadores contratualizados com a instituição, prestação de cuidados, registos nos sistemas de informação em enfermagem e revisão de protocolos do serviço. O ambiente vivenciado nas sessões de supervisão foi de interação e de partilha de experiências entre os enfermeiros, de forma a fomentar o espírito de equipa e a reforçar a aprendizagem coletiva. O terceiro momento (pós-teste) integra a etapa 4 do Modelo SafeCare (avaliação dos resultados) e foi realizado de janeiro a março de 2019, consistindo na aplicação do mesmo questionário aplicado na etapa 1 após a implementação da intervenção, para ser possível objetivar possíveis alterações na satisfação profissional e na competência emocional dos enfermeiros após a implementação do Modelo.

Análise dos resultados e estatística

Para a análise dos dados, foram mobilizados a estatística descritiva e o teste não paramétrico para amostras emparelhadas - Teste de Wilcoxon (dada a dimensão da amostra e o tipo de estudo) na comparação do pré-teste com o pós-teste, através do programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 25.0, tendo sido considerado um nível de significância de 5%.

RESULTADOS

A amostra é constituída por 28 enfermeiros, sendo a maioria do gênero feminino (n = 24; 85,7%). A idade varia entre 22 e 49 anos, sendo a média de idades de aproximadamente 35 anos (35±8). No que se refere ao título profissional, a maioria dos participantes possui a categoria de enfermeiro (n = 23; 82,1%) e apenas cinco (17,9%) são enfermeiros especialistas. O tempo de exercício profissional varia entre 0 e 27 anos, no qual a média é de aproximadamente 11 anos (11±8).

A Tabela 1 mostra os resultados obtidos no pré-teste e no pós-teste relativamente ao score total e às quatro dimensões da “Escala da Satisfação Profissional”. No pré-teste e no pós-teste, os enfermeiros revelam níveis moderados de satisfação profissional, assim como nas restantes dimensões, à exceção da dimensão relações profissionais, que se encontra ligeiramente abaixo do moderado.

Tabela 1
Estatística descritiva da satisfação profissional dos enfermeiros no pré-teste e no pós-teste (N = 28), Porto, Portugal, 2017 e 2019

Através da Tabela 2, constata-se que não existem diferenças estatisticamente significativas na satisfação profissional dos enfermeiros entre o pré-teste e o pós-teste. Relativamente às quatro dimensões da satisfação profissional, verificou-se que existe uma diferença estatisticamente significativa na dimensão superior hierárquico (z = -2,63; p = 0,01). De acordo com a Tabela 1, os enfermeiros encontram-se mais satisfeitos com o seu superior hierárquico no pré-teste do que no pós-teste.

Tabela 2
Comparação da satisfação profissional dos enfermeiros entre o pré-teste e o pós-teste (N = 28), Porto, Portugal, 2017 e 2019

A Tabela 3 mostra os resultados obtidos no pré-teste e no pós-teste relativamente ao score total e aos cinco domínios da “Escala Veiga da Competência Emocional”. Verifica-se que os enfermeiros se percecionam com competência emocional reduzida antes e após a implementação do Modelo SafeCare, assim como no domínio da autoconsciência, da gestão de emoções e da automotivação. Por sua vez, os enfermeiros percecionam-se com um nível ligeiro de empatia em ambas as etapas, assim como no domínio de gestão de emoções em grupos.

Tabela 3
Estatística descritiva do perfil de competência emocional dos enfermeiros no pré-teste e no pós-teste (N = 28), Porto, Portugal, 2017 e 2019

Através da Tabela 4, constata-se que não existem diferenças estatisticamente significativas no perfil de competência emocional dos enfermeiros antes e após a intervenção. Verificou-se igualmente que não existem diferenças estatisticamente significativas, entre o pré-teste e o pós-teste, em nenhum dos domínios da competência emocional avaliados.

Tabela 4
Comparação do perfil de competência emocional dos enfermeiros entre o pré-teste e o pós-teste (N = 28), Porto, Portugal, 2017 e 2019

DISCUSSÃO

Relativamente à satisfação profissional, verificou-se uma diminuição estatisticamente significativa com o superior hierárquico após a implementação do Modelo SafeCare. Tais resultados podem ser explicados pelo fato de ter ocorrido uma mudança do enfermeiro-chefe num dos serviços durante a implementação da intervenção. Os enfermeiros chefes assumem uma relevância primordial no estabelecimento de estratégias que possam melhorar o ambiente de trabalho e promover a satisfação profissional dos enfermeiros(1010 Silva C, Potra T. Job satisfaction of nurses: a Scoping review. Pens Enferm. 2016;20(2):33-50. https://doi.org/10.1016/j.ijnurstu.2019.01.011
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). De fato, o papel do superior hierárquico é fundamental não só pela gestão de recursos humanos e materiais, como também, pela efetividade da comunicação e inter-relação entre os profissionais, nomeadamente no que diz respeito à gestão de conflitos(2222 Ferreira C, Fernandez R, Anes E. Job satisfaction of nurses working in hospital units of northen Portugal. Rev Enf Ref. 2017;4(15):109-18. https://doi.org/10.12707/RIV17043
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).

Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas nas restantes dimensões da satisfação profissional dos enfermeiros antes e após a implementação do Modelo SafeCare. Esses resultados diferem dos de outro estudo, em que após a implementação de um modelo de supervisão clínica os enfermeiros referiam sentir maior satisfação profissional(33 Gonge H, Buss N. Is it possible to strengthen psychiatric nursing staff’s clinical supervision? RCT of a meta-supervision intervention. J Adv Nurs. 2015;71(4):909-21. https://doi.org/10.1111/jan.12569
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). No presente estudo, existiram fatores que podem ter contribuído para os resultados obtidos, tais como mudança do enfermeiro-chefe de um dos serviços onde decorreu a intervenção e a alteração na constituição das equipas de enfermagem, o que levou à ocorrência de uma maior sobrecarga dos elementos que se mantiveram na equipa e completaram o estudo.

O contexto profissional assume um lugar central na intervenção em supervisão clínica, cujo conjunto de interações medeia os restantes eixos do Modelo SafeCare(66 Carvalho A, Barroso C, Pereira M, Teixeira A, Pinho F, Osório M. Implementação de um modelo de supervisão clínica em enfermagem. Porto: Uniarte Gráfica; 2019). De fato, o ambiente institucional é influenciado pela mobilidade dos enfermeiros, pois esta provoca comumente perda de profissionais experientes, o que, consequentemente, leva a um aumento da sobrecarga de trabalho, à diminuição na satisfação de trabalho e ao aumento de burnout (2323 Gifford W, Davies B, Edwards N, Griffin P, Lybanon V. Sustaining knowledge transfer through leadership. Worldviews Evid Based Nurs. 2007;4(3):126-45. https://doi.org/10.1111/j.1741-6787.2007.00095.x
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). No entanto, é de salientar que os enfermeiros mantiveram os níveis de satisfação profissional moderados obtidos no pré-teste, após a implementação do Modelo SafeCare, apesar de todos os constrangimentos ocorridos no contexto.

No que concerne ao perfil de competência emocional, verificou-se que não existem diferenças estatisticamente significativas em nenhum dos domínios avaliados. O défice de enfermeiros é um fator condicionador da sua resposta emocional(2424 Escribà V, Más P, Cárdenas E, Burguete R, Fernández R. Work-related stress factos and the psychological well-being of hospital nurses. Rev Enferm. 2000;23(7-8):506-11). De fato, como referido anteriormente, verificou-se no presente estudo uma diminuição na dotação de enfermeiros por serviço, sendo que, na maioria das vezes, não houve de imediato a admissão de novos enfermeiros. Nesse sentido, as equipas de enfermagem não integraram o número de enfermeiros adequados à prestação de cuidados de enfermagem de excelência. Esses resultados podem ainda ser explicados pelo fato da competência emocional ter sido apenas abordada numa das sessões de supervisão, não tendo existido o tempo necessário para dinamizar, tanto quanto se deveria, exercícios práticos, de forma a potenciar o desenvolvimento de capacidades relacionadas com a gestão de emoções e a gestão de conflitos. Além disso, a realização de sessões de supervisão individuais poder-se-iam ter revelado mais eficazes ao nível da intervenção na competência emocional, na medida em que permitiriam que o enfermeiro pudesse ser verdadeiramente genuíno relativamente às dificuldades sentidas, não se sentindo constrangido com a presença dos restantes enfermeiros da equipa de supervisão. Outra estratégia poderia consistir em solicitar colaboração interdisciplinar a outros profissionais, nomeadamente psicólogos, que participariam nas sessões de supervisão e potenciariam os ganhos ao nível de gestão e comunicação de emoções.

Este estudo engloba aspectos importantes e inovadores. De fato, a evidência sugere que apesar de existirem modelos de supervisão clínica com impacto positivo nas instituições de saúde, nos enfermeiros e nos utentes, a sua operacionalização não é clara, tornando-se difícil a sua replicação em outros contextos(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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,55 Pollock A, Campbell P, Deery R, Fleming M, Rankin J, Sloan G, et al. A systematic review of evidence relating to clinical supervison for nurses, midwives and allied health professionals. J Adv Nurs. 2017;73(8):1825-37. https://doi.org/10.1111/jan.13253
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). Este artigo é o primeiro que integra a avaliação do impacto da implementação do Modelo SafeCare na satisfação profissional e na competência emocional. Dessa forma, sendo o Modelo SafeCare um novo modelo de supervisão clínica, importa aplicá-lo aos contextos da prática, no sentido de perceber a sua eficácia e, consequentemente, sugerir alterações de forma a maximizar os resultados que da sua implementação possam advir.

A evidência científica revela que a supervisão clínica é fundamental para dar suporte aos enfermeiros e ajudá-los a desenvolver e melhorar a sua prática, sendo essencial a implementação de um modelo de supervisão clínica para atingir esse fim(2525 Dilworth S, Higgins I, Parker V, Kelly B, Turner J. Finding a way forward: a literature review on the current debates around clinical supervision. Contemp Nurse. 2013;45(1):22-32. https://doi.org/10.5172/conu.2013.45.1.22
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). No entanto, existem barreiras pessoais e institucionais à implementação dos modelos de supervisão clínica(2626 Koivu A, Saarinen P, Hyrkas K. Who benefits from clinical supervision and how? The association between clinical supervision and the work-related well-being of female hospital nurses. J Clin Nurs. 2012;21(17-18):2567-78. https://doi.org/10.1111/j.1365-2702.2011.04041.x
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). Para que se possa ultrapassar essas barreiras, torna-se crucial a existência de uma parceria de gestão e de liderança em enfermagem com responsabilidades conjuntas(2727 McKenna B, Thom K, Howard F, Williams V. In search of a national approach to professional supervision for mental health and addiction nurses: the New Zealand experience. Contemp Nurse. 2010;34(2):267-76. https://doi.org/10.5172/conu.2010.34.2.267
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), que esteja presente durante o desenvolvimento, a implementação, a coordenação e a avaliação do modelo de supervisão implementado. Essa parceria é essencial no sentido de vincular a instituição de saúde na garantia das condições necessárias, permitindo que a implementação do modelo de supervisão clínica decorra sem grandes alterações no seu contexto. Durante o decorrer do presente estudo, ocorreram várias alterações no contexto da prática de cuidados. Sugere-se, então, que em estudos futuros exista uma vinculação mais efetiva por parte da instituição de saúde, de forma a minimizar a mudança no contexto da implementação, pois os contextos em que se obtêm melhores resultados ao nível da eficácia da implementação de um modelo de supervisão clínica são aqueles nos quais as pessoas e a instituição são ativamente envolvidas numa fase prévia(2828 Buus N, Lynch L, Gonge H. Developing and implementing ‘meta-supervision’ for mental health nursing staff supervisees: opportunities and challenges. Cog Behav Therap. 2016;9(22):323-34. https://doi.org/10.1017/S1754470X15000434
https://doi.org/10.1017/S1754470X1500043...
).

Outra sugestão prende-se com a escolha dos supervisores clínicos. Neste estudo, a escolha dos enfermeiros supervisores clínicos foi realizada pelos enfermeiros-chefes. No entanto, existe evidência científica que indica que os supervisores clínicos devem ser escolhidos pelos seus pares, sendo este um aspecto fundamental para o sucesso da implementação da supervisão clínica(2929 Edwards D, Cooper L, Burnard P, Hannigan B, Juggesur T, Adams J et al. Factors influencing the effectiveness of clinical supervision. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2005;12(4):405-14. https://doi.org/10.1111/j.1365-2850.2005.00851.x
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). Constata-se ainda que o número de horas despendidas, nas sessões de supervisão em grupo, para trabalhar a satisfação profissional e a competência emocional não foi suficiente. Sugere-se que, em investigações futuras, se aumente o número de horas despendidas centradas nessas variáveis. É difícil estabelecer uma prática de supervisão clínica eficiente, na ausência de uma formação adequada sobre a temática(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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). Nesse sentido, sugere-se que futuramente a formação em supervisão clínica seja primeiramente fornecida a nível institucional e, posteriormente, aos enfermeiros que participam no estudo, de forma a terem já conhecimento sobre essa temática. Dessa maneira, cria-se a oportunidade de, mais rapidamente, compreender que a implementação do Modelo SafeCare pode trazer benefícios a nível da satisfação profissional, da competência emocional e da promoção da segurança e qualidade dos cuidados de enfermagem.

Limitações do Estudo

É igualmente necessário ultrapassar algumas limitações do estudo, nomeadamente a ausência de um grupo de controlo. Outra limitação prende-se com o fato da amostra do estudo ser reduzida (n = 28) e incluir apenas enfermeiros de serviços de medicina. Existiram mudanças significativas no contexto onde se implementou o modelo que não foram controladas, as quais podem ter produzido alterações nos resultados obtidos, como anunciado anteriormente.

Contribuições para a Área

Existem poucos estudos quantitativos sobre a temática da supervisão clínica, sendo necessária a sua realização, de forma a promover o desenvolvimento e a construção de um corpo de conhecimento nessa área(11 Cutcliffe J, Sloan G, Bashaw M. A systematic review of clinical supervision evaluation studies in nursing. Int J of Ment Health Nurs. 2018;27(5):1344-63. https://doi.org/10.1111/inm.12443
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). De fato, verifica-se ausência de evidência sobre modelos robustos de aplicação de supervisão clínica, sobre investigação relativa à sua implementação e, ainda, sobre formação administrada aos seus participantes(77 Snowdon D, Leggat S, Taylor N. Does clinical supervision of healthcare professionals improve effectiveness of care and patient experience? a systematic review. BMC Health Serv Res. 2017;17(1):786. https://doi.org/10.1186/s12913-017-2739-5
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). O presente estudo pretendeu dar resposta às considerações supramencionadas, constituindo-se como um importante contributo para o avanço do conhecimento científico na área da supervisão clínica em Enfermagem.

CONCLUSÕES

A evidência científica demonstra que existem vantagens na implementação de modelos de supervisão clínica nos enfermeiros, nos utentes e nas próprias instituições de saúde. Teoricamente, o Modelo SafeCare deveria gerar simultaneamente ganhos em supervisão e ganhos em saúde. Esse modelo deveria revestir-se de utilidade para a prática supervisiva, uma vez que, ao dar resposta às necessidades, possibilita que os enfermeiros se tornem mais aptos para o exercício profissional, aumentando, dessa forma, a sua satisfação e vinculação à profissão. No que concerne aos ganhos em saúde, também traria benefícios, devido ao seu elevado potencial de conceção de cuidados de qualidade.

Apesar de neste estudo a implementação do Modelo SafeCare não ter tido um impacto na satisfação profissional e no perfil de competência emocional dos enfermeiros, explicam-se estes resultados devido às profundas e diversas mudanças ocorridas no contexto, assim como a alguns fatores intrínsecos ao Modelo (número de horas despendidas na abordagem da satisfação profissional e da competência emocional, seleção dos enfermeiros supervisores clínicos, entre outros). De fato, existem fatores pessoais (medo de mudança, falta de confiança e de conhecimentos/competência, desconhecimento em relação à supervisão clínica e crenças erróneas) e fatores institucionais (conflitos profissionais e políticos, questões da falta de tempo/recursos, turnos rotativos/desgastantes) que se constituem como barreiras à implementação de modelos de supervisão clínica. Ao nível dos fatores pessoais, sugere-se que, em estudos futuros, exista uma maior clarificação dos benefícios da supervisão clínica através da realização de um maior número de horas de formação nesse âmbito, assim como seja fornecida mais formação aos enfermeiros supervisores clínicos, de forma a potenciar o desempenho do seu papel. Do ponto de vista dos fatores institucionais, deverá haver uma vinculação mais efetiva à implementação do Modelo SafeCare, no sentido de garantir as condições necessárias que permitam que a implementação do modelo de supervisão clínica decorra sem grandes mudanças no seu contexto. Sugere-se a implementação do Modelo SafeCare em diferentes contextos (hospitalar e comunitário), assim como em diferentes zonas do país, porque só dessa forma se pode avaliar a real eficácia do modelo e os benefícios que dele possam advir.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Elizabete Salvador

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2021
  • Aceito
    12 Abr 2021
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