COMENTÁRIOS
A análise de entrada/saída ou a análise de insumo-produto
Antônio Carlos Mattos
Engenheiro eletricista, formado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e aluno do Curso de Mestrado da Escola de Adminstração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas
A análise de entrada/saída consiste em um modelo matemático utilizado no estudo do fluxo de materiais econômicos entre os diversos setores da economia.
Esse modelo é de grande valia na realização de previsões, onde se buscam as influências mútuas, em termos de fluxo de dinheiro, entre os centros consumidores e produtores de um sistema econômico.
A funcionalidade desse método reside no fato de que êle encara o sistema de um modo global, em contraposição com os métodos clássicos, onde a previsão se resume numa simples extrapolação gráfica.
Os primeiros trabalhos sobre a Análise de Entrada/Saída datam de 1941, e são de autoria de Wassily W. Leontief, da Universidade de Harvard, Estados Unidos, sendo hoje universalmente aceitos e utilizados por exemplo, pelo governo da Holanda, onde é feito, anualmente, um estudo macroeconômico, baseado nesse modelo, sobre a realidade econômica desse país.
2. O Modelo Matemático
Vamos, inicialmente, imaginar uma rede hidráulica urbana como, v.g., a esquematizada abaixo:
Os círculos indicam os centros fornecedores e consumidores de águas 1, 2 e 3; 4 é um centro apenas consumidor; as setas indicam as direções de escoamento.
Esse esquema visa a dar uma idéia física do modelo que passaremos a apresentar.
O modelo de entrada/saída tem um comportamento parecido com o acima exposto e surge naturalmente ao fazermos as seguintes associações na rede acima, que passará a ser, então, a rede de interdependência entre os setores econômicos:
a) os círculos 1, 2 e 3 corespondem a centros (ou setores) de movimentação econômica. Esses setores nada mais são do que conjuntos de entidades produtoras, em princípio tão arbitrários como qualquer conjunto. A reunião desses setores deve fornecer o conjunto de tôdas as entidades produtoras, cujo comportamento se quer estudar.
Como exemplo, podemos fazer:
1. setor da agricultura
2. setor da indústria
3. setor de serviços.
Óbviamente, podemos ter tantos setores quanto nos convém. Usamos apenas quatro por simplicidade. (O governo holandês divide a economia do seu país em 35 setores diferentes).
b) o círculo 4 representa o centro consumidor, para onde fluem os produtos dos demais setores.
c) as setas indicam o intercâmbio de produtos econômicos, normalmente medidos em unidades monetárias, que é a mais conveniente.
No nosso exemplo, o setor 2 é, na realidade, o conjunto de todas as indústrias e o intercâmbio de produtos industriais entre elas está representado pela seta que começa e termina em 2. O mesmo sucede com os demais setores.
Passemos, agora, ao equacionamento matemático do modelo.
Antes, porém, transcreveremos uma tabela de entrada/saída oriunda do serviço de estatística americano, a título de exemplo:
Vamos supor uma tabela, semelhante à acima, válida para um determinado ano (que chamaremos de instante t0) e para uma determinada região econômica (na qual queremos realizar as previsões):
onde,
N é o número de setores produtivos
Xij é o fluxo medido em termos de valor do setor i para o setor j
Ci é o fluxo em dinheiro do setor i para o centro de consumo dos produtos de i.
Tk é o total do setor k, isto é,
Vamos estabelecer, agora, a hipótese fundamental do modelo de análise de entrada/saída.
Esta hipótese, embora característica do modelo ora em construção, mostrou-se aplicável na prática, dentro de certos erros, e é fruto de uma observação intuitiva, quando se estabelece a analogia hidráulica já apresentada.
Admitimos que, num intervalo Δt (temporal), T1 (t0) sofreu uma variação de p%, isto é
ΔT1= T1 (t) - T 1(t0) = p% · T1 (t0)
A hipótese diz que se o total que saiu de l, T1 (t0), sofreu uma variação de p% num intervalo Δt, então o que entrou em l, nesse mesmo intervalo Δt, também sofreu variações de p,%, ou seja
ΔX11 = X11 (t) - X11 (t0) = p% · X11 (t0)
...........
ΔXN1 = XN1 (t) - XN1 (t0) = p% · XN1 (t0)
De um modo geral, temos:
i = 1, 2, ..., NK = 1,2, ..., N
Definição: definimos como coeficiente técnico a relação
Kki =
ou, em conseqüência da hipótese acima,
Observação: poderíamos ter definido
Entretanto, as complexidades que tal definição introduziria não são justificáveis, pois a outra é suficiente para os fins a que se destina, além de não necessitar o conhecimento da função
Da relação (II)
Substituindo em (I):
Esta relação pode ser escrita sob a forma matricial; de fato, sendo
onde os kij são dados pela relação (II), vem
T = C + K . T;
daí temos que ΔT = ΔC + K · ΔT onde
Somando membro a membro as duas relações acima
T(t0) + ΔT = C(t0) + ΔC + K · [T(t0) + ΔT] ou T(t) = C(t) + K ·T(t) ou ainda
sendo I a matriz-unidade (NxN).
De (II) também obtemos:
Chegamos, assim, às expresões (III) e (IV) que nos permitem prever os valores de C (ou de T) num instante t ≠ t0, a partir do conhecimento de K e do valor de T (ou de C) para t = t.
Essas são as expressões matemáticas da Análise de Entrada/ Saída.
3. Exemplo Numérico
Vamos aplicar a fórmula acima num exemplo numérico, dado pela tabela inicialmente apresentada. Neste caso:
e sendo K = (xki/Ti)
K =
Vamos prever o valor de T(t) no caso do consumo agrícola sofrer um aumento de 0,5 bilhão de dólares, isto é, quando
C(t) =
Da expressão (III):
Resolvendo esse sistema, obtemos:
que são os valores de T(t) procurados.
Notemos, aqui, que um aumento do consumo agrícola influi também na produção industrial e de serviços, pois todo o sistema se acha inter-relacionado; este fato importante poderia passar despercebido numa análise empírica. No governo holandês, por exemplo, quando da publicação dos dados de insumo-produto, nota-se que variações no consumo de produtos têxteis implicam em variações na produção de tabaco, dois setores produtivos aparentemente não relacionados.
Observação: no caso acima, a relação (III) poderia ser escrita T(t) = (1 - K)-1· C(t)
4. Comentários Finais
A forma de abordagem global é patente nessa análise de entrada/saída. Ela permite prever inclusive engarrafamentos (bottlenecks) de produção.
Suponhamos, por exemplo, que um aumento de 5% no consumo de produtos agrícolas (economicamente razoável) implicasse num aumento de 50% na produção industrial. Como 50% é um valor não encontrado na prática, concluiríamos que o aumento de 5% não é viável, isto é, a produção industrial sofreria um processo de saturação (não é linear).
Bibliografia
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- LEONTIEF, W . W . et al. Studies in the Structure of the American Economy. Fair Lawn, N. J., Oxford University Press, 1953.
- THEIL, Henri, BOOT, John G. G. & KLOEK, Teun. Operations Research and Quantitative Economics. Intern. St. Ed., Nova Iorque, McGraw-Hill, 1965.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
28 Maio 2015 -
Data do Fascículo
Dez 1970