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Economia e empresa

INFORME TRIMESTRAL

Economia e empresa

Alkimar R. Moura

2.1 A volta dos créditos-prêmio à exportação de manufaturados

O governo federal decidiu restabelecer, no início de abril do corrente ano, o mecanismo de concessão de créditos-prêmio sobre o IPI, nas exportações de produtos manufaturados. Estes incentivos haviam sido eliminados no "pacote" de dezembro de 1979, quando se promoveu a maxidesvalorização do cruzeiro e se procurou simplificar o regime cambial, por meio da supressão do depósito prévio sobre importações, da redução das isenções tarifárias para compras externas de bens de capitais e outras medidas tendentes a liberalizar o comércio internacional do país. Entretanto, com a decisão posterior de se pré-fixar a correção cambial a um nível que se revelou muito aquém da inflação interna, os ganhos com a maxidesvalorização foram sendo gradualmente eliminados no decorrer de 1980, embora o governo ainda mantivesse incentivos creditícios à exportação de manufaturados, sob a forma de taxas de juros subsidiadas. Mesmo levando-se em conta estes últimos benefícios, estimativas recentes demonstram que ocorreu uma queda acentuada na rentabilidade das exportações de produtos industrializados em 1980, em decorrência da pré-fixação cambial. Assim, com o retorno dos incentivos fiscais à exportação, procura-se restabelecer a competitividade externa dos manufaturados brasileiros, restaurando-se desta forma mais um dos mecanismos de política econômica existentes em 1979.

O crédito-prêmio foi fixado em 15% em 1981, em 9% para 1982 e em 3% até junho de 1983, quando deverá ser extinto. Esta última data coincide com aquela que havia sido fixada para a retirada gradual dos créditos-prêmio, em acordo que o governo brasileiro assinou em 1979 com o Tesouro norte-americano. No entanto, o nível de 15%, fixado para o crédito-prêmio, é bastante superior ao que deveria vigorar, se o país tivesse mantido o esquema negociado com as autoridades econômicas norte-americanas.

Existem algumas diferenças entre o antigo crédito-prêmio e o mecanismo agora restabelecido. Em primeiro lugar, a base de cálculo do novo crédito-prêmio é o valor FOB, em moeda nacional, das vendas ao exterior, a qual nada tem a ver com a alíquota de IPI sobre o produto exportado. Além disso, na nova sistemática, a alíquota é constante para todos os produtos, o que não acontecia no sistema anterior, onde o montante do subsídio dependia da taxa do imposto (IPI), incidente sobre o produto. Em segundo lugar, o exportador irá receber o pagamento do benefício em dinheiro, e não sob a forma de crédito tributário. Por último, o crédito-prêmio, considerado como rendimento não-tributável da empresa, fica isento do imposto de renda.

A justificativa oficial para a medida foi a necessidade de evitar-se uma nova maxidesvalorização do cruzeiro, em face de um crescimento vagaroso das exportações de manufaturados, no primeiro trimestre de 1981, relativamente a igual período do ano anterior. Esta tendência, se continuada, iria comprometer as metas de redução do desequilíbrio na balança comercial. Na verdade, a decisão acentua o regime de taxas múltiplas de câmbio, que de fato vigora no país, o qual se caracteriza pela existência das seguintes taxas:

a) uma taxa de câmbio para exportação de manufaturados, que consiste na taxa oficial mais crédito-prêmio, mais juros subsidiados;

b) uma taxa oficial para empréstimos externos em moeda e para despesas com serviços (turismo, juros, lucros, etc);

c) uma taxa oficial mais 25% de IOF sobre as importações em geral, exclusive petróleo bruto;

d) uma taxa para exportação de café (taxa oficial menos quota de contribuição;

e) uma taxa para exportação de produtos primários (exceto café), consistindo na taxa oficial menos subsídios negativos representados pela tributação (ICM) sobre as exportações de produtos primários.

Existem pelo menos três questões que devem ser consideradas na análise da decisão de restabelecer a política de subsídios fiscais à exportação:

a) a probabilidade de retaliação de nossos parceiros comerciais: os produtos industrializados brasileiros podem vir a sofrer taxação compensatória nos países importadores, de modo a neutralizar o efeito dos subsídios. Esta não é uma hipótese inviável, principalmente nos EUA, onde a nova administração parece advogar uma postura muito favorável ao comércio livre, contra, portanto, qualquer forma de protecionismo às exportações. Mesmo que ocorram reações contrárias à decisão brasileira, a implementação de medidas retaliatórias no exterior é um processo longo, envolvendo negociações entre empresas, sindicatos, políticos e burocratas. Nesse ínterim, o Brasil poderá aumentar transitoriamente suas vendas externas;

b) mesmo na ausência de retaliação, há que se considerar o efeito do crédito-prêmio para estimular as exportações, através do aumento da competitividade dos manufaturados brasileiros. Para o mercado americano, é provável que a medida signifique exportações adicionais. Para os mercados europeu e japonês a resposta não é tão óbvia. Alguns países (Alemanha Ocidental, por exemplo) estão implementando políticas recessivas para combater o desequilíbrio cambial, e mesmo que os produtos brasileiros sejam mais baratos, isto não significa que nossas vendas aumentarão. De outro lado, há que se considerar a evolução provável da taxa de câmbio entre o dólar norte-americano e as moedas européias. A valorização recente do dólar em relação às principais moedas européias deve ter desistimulado as exportações brasileiras para os demais mercados, que não os EUA. Assim, persistindo esta tendência de fortalecimento da moeda norte-americana, o efeito do crédito-prêmio diluir-se-á, via encarecimento relativo de nossas exportações para a Europa e Japão;

c) finalmente, a questão mais importante refere-se ao financiamento dos subsídios fiscais: estima-se que a medida exigirá recursos da ordem de no mínimo Cr$ 140 bilhões neste ano. Este montante, que significa uma redução na receita tributária prevista, terá de ser obtido via orçamento fiscal ou através do orçamento monetário. A primeira alternativa implica aumentar impostos e/ou reduzir os gastos governamentais, de maneira a manter as mesmas metas orçamentárias para 1981 (receita e despesas de Cr$ 1,8 trilhão). O financiamento pelo orçamento monetário admite duas possibilidades: mediante pura e simples expansão da base monetária ou através do aumento dos recursos não-monetários, isto é, captação de recursos pela colocação de títulos públicos (LTN e ORTN) ou peia simples transferência de recursos de instituições financeiras governamentais para o Tesouro (por exemplo, recursos de cadernetas de poupança da Caixa Econômica Federal, além dos Cr$ 100 bilhões já contemplados no orçamento monetário em 1981), que deverão ser canalizados para o financiamento de exportações. Se ocorrer a primeira alternativa (expansão da base), provavelmente não será possível manter as metas de expansão dos meios de pagamento. A segunda maneira implica aumentar as taxas de juros nos papéis do Tesouro e/ou a remuneração para os aplicadores em cadernetas. Os dois resultados indicam que o financiamento pelo orçamento monetário tem efeitos nitidamente inflacionários. Assim, mais uma vez, a política de combate à inflação deverá ser sacrificada, em favor do equilíbrio na balança comercial.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1981
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