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Comparação entre o trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas e o trabalho de dirigentes de grandes empresas através da observação estruturada

NOTAS E COMENTÁRIOS

Comparação entre o trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas e o trabalho de dirigentes de grandes empresas através da observação estruturada

Hélio Janny Teixeira

Professor na EAESP/FGV e na FEA/USP na área de Administração Geral

O comportamento no cargo administrativo resulta de uma interação complexa entre características pessoais do ocupante e exigências do cargo, da organização como um todo e do seu ambiente externo. Esses elementos formam uma configuração de demandas, restrições e opções, cujo entendimento é fundamental para o bom desempenho. Apesar da importância desse assunto, há poucas pesquisas abrangentes sobre o trabalho real dos administradores e seu contexto. Predominam publicações prescritivas, dizendo o que os administradores devem fazer. E, ainda, sofrem de um agravante: são genéricas, não distinguindo as diferenças no trabalho administrativo, quando mudam o cargo, a organização, o ocupante, etc.

Tencionamos analisar algumas influências do porte dá organização sobre o comportamento de administradores de cúpula ou dirigentes, ocupantes dos cargos de maior nível hierárquico da sua situação de trabalho. É importante realçar, que o trabalho administrativo apresenta inúmeras dimensões ou facetas e permite múltiplos enfoques. Na realidade, abordamos apenas algumas dimensões do mesmo, abarcadas pela metodologia empregada para coleta de dados. Sabemos, também, que é difícil identificar e mensurar isoladamente a influência do porte da organização, independentemente dos outros fatores mencionados no início do artigo.

1. ALGUMAS INFORMAÇÕES SOBRE A METODOLOGIA DE PESQUISA

Conforme pode ser visto no quadro 1, os dados que analisaremos neste artigo foram obtidos por três pesquisadores, em diferentes países, mediante o mesmo método de coleta de dados: a observação estruturada. Isto permitiu a comparação dos resultados, uma vez que originalmente ou mediante reclassificações1 1 O trabalho de Choran (1969) constitui-se numa tese de mestrado orientada pelo Prof. Mintzberg, que realizou um trabalho análogo em 1968. Ambos seguiram o mesmo esquema de categorização das atividades. Os dados da nossa pesquisa foram reprocessados nos seguintes pontos, para seguir os mesmos critérios das outras: a) retiramos do dia de trabalho as atividades de natureza social, desvinculadas da empresa; b) desconsideramos os contatos com a secretária; c) aglutinamos, considerando como uma única atividade, os trabalhos de observação e re-observação de um mesmo documento. Estes procedimentos levaram a uma redução de 19 atividades e 25 minutos do dia médio de trabalho dos dirigentes brasileiros. os esquemas de coleta de dados e conceitos operacionais adotados foram idênticos.


Como o próprio nome indica, observação estruturada envolve a coleta de dados através de um observador independente da situação de trabalho, que registra os eventos ou aspectos de interesse, conforme esquema preestabelecido, ou seja, um conjunto de categorias orientadoras da observação, codificação e registro do observado.

No anexo 1 apresentamos algumas informações sobre a metodologia de pesquisa. Maiores detalhes sobre a metodologia podem ser obtidos em qualquer das publicações originais.

2. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

No quadro 2 apresentamos os dados das pesquisas.


Eles mostram a grande semelhança entre os frutos da observação de Choran e a nossa, e ambos contrapõem-se ao outro estudo sobre dirigentes de grandes empresas. Isto serve de indicador de que existe um padrão de trabalho dos dirigentes, fruto do porte da empresa, independentemente do ambiente externo, pois Choran efetuou seus estudos no Canadá.

A comparação entre o trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas com o de grandes empresas mostra os pontos seguintes:

a) Nas pequenas empresas é maior:

- o número de atividades, a variedade e a fragmentação das mesmas. Decorrente disso, nota-se que nas empresas menores houve bem mais atividades com duração inferior a nove minutos e quase não há concentração numa atividade por uma hora ou mais;2 2 Essas conclusões também aparecem em Mintzberg (1973, p. 104,105 e 106 ) e Choran (1968, p. 166-9).

- a utilização dos meios menos formais de comunicação, como o telefone e os contatos não programados;3 3 Id. Ibid.

- o número de rondas;4 4 Id. Ibid.

- os trabalhos de mesa envolvendo papéis;

- o número de atividades iniciadas pelos próprios dirigentes.

b) Nas pequenas empresas é menor:

- o tempo dedicado às reuniões programadas;5 5 Id. Ibid.

- o tempo dedicado à comunicação verbal.

As constatações efetuadas podem ser interpretadas como decorrentes da necessidade de intervenção mais freqüente dos dirigentes das pequenas e médias empresas nos diversos fluxos de trabalho. Devido ao menor grau de formalização, seus processos funcionam "menos automaticamente''. Como são vários os fluxos de trabalho simultâneos (compras, vendas, produção, projetos de melhoria, etc), e todos solicitam o dirigente, a freqüência de mudança de atenção é maior, maior o número de rondas. O fato de um maior número de atividades serem iniciadas pelos dirigentes de pequenas e médias empresas, é coerente com a menor "automatização" dos seus processos. Compete a esses dirigentes a iniciativa de intervir mais freqüentemente do que numa grande empresa. Também, na grande, a variedade e freqüência de solicitações de terceiros é maior, levando seu dirigente a atender maior número de iniciativas de terceiros. O que foi dito não significa que o dirigente de pequenas e médias empresas tenha maior controle do conteúdo do próprio cargo, pois certamente os dirigentes das grandes empresas pesquisadas selecionam os solicitantes a serem atendidos.

O menor tempo dedicado a comunicações verbais nas pequenas e médias empresas decorre do maior tempo despendido em rondas e em trabalhos com papéis, devido ao maior envolvimento com as rotinas do dia-a-dia, que exigem leituras e assinaturas diversas (ordens de produção, cheques, duplicatas, etc).

Nas grandes empresas, devido ao menor envolvimento com rotinas, os dirigentes podem passar maior parcela de tempo em reuniões.

Julgamos que os dados e análises apresentados, apesar de basearem-se em pequenas amostras são úteis para "situar" e diferenciar o trabalho de dirigentes de portes variados de organizações e também alertam os dirigentes quanto ao problema da manutenção de um processo de administração incompatível com o crescimento da empresa com fragmentação excessiva, insuficiência de reuniões programadas, etc, muito comum nas empresas brasileiras.

BIBLIOGRAFIA

ANEXO 1

Algumas informações sobre a observação estruturada

a) Uma atividade foi caracterizada pela unicidade de contato, de meio de comunicação adotado, de propósito básico e de local de trabalho. Quando um destes quatro elementos mudou, considerou-se que houve mudança de atividade.

b) As atividades foram classificadas em cinco gêneros - trabalhos de mesa, telefonemas, reuniões programadas, reuniões não-progr amadas e rondas:

- foi considerado "trabalho de mesa" o trabalho que não envolve contato e durante o qual o dirigente lê, pensa e trabalha com papéis;

- foi considerado "telefonema" todo contato interno ou externo realizado através do telefone;

- "reuniões programadas": contato (exceto pelo telefone) com uma ou mais pessoa(s) definido ou marcado previamente ("agendado" pelo dirigente no dia anterior ou antes);

- "reuniões não-programadas": contato (exceto pelo telefone) com uma ou mais pessoas sem definição ou marcação prévia;

- foi considerada "ronda" todo deslocamento físico do dirigente tanto dentro como fora da empresa.

c) Todos os contatos internos foram incluídos nos registros, com exceção daqueles com as secretárias, Foram excluídas as atividades puramente sociais (telefonemas à esposa, etc.). Incluiu-se apenas aquelas ligadas ao negócio.

- nos contatos, todos os participantes com nível hierárquico inferior foram classificados como subordinados.

- "fornecedores" incluem advogados, consultores e fornecedores diversos.

d) As observações de um mesmo documento foram consideradas atividade única.

e) Contatos iniciados pelo dirigente: quando a atividade é iniciada pelo próprio dirigente, devido a escolha pessoal no momento (não foi programado e nem ocorreu devido a solicitação de terceiros).

  • Mintzberg, R The nature of managerial work. New York, Harper & Row, 1973.
  • Teixeira, Helio Janny. Descrição e análise do trabalho de dirigentes de pequenas e médias empresas. Tese de mestrado não-publicada apresentada à FEA-USP, 1979.
  • Choran, I. The manager of a small company. Montreal, Mac Gill University, Unpublished MBA tesis, 1969.
  • 1
    O trabalho de Choran (1969) constitui-se numa tese de mestrado orientada pelo Prof. Mintzberg, que realizou um trabalho análogo em 1968. Ambos seguiram o mesmo esquema de categorização das atividades. Os dados da nossa pesquisa foram reprocessados nos seguintes pontos, para seguir os mesmos critérios das outras: a) retiramos do dia de trabalho as atividades de natureza social, desvinculadas da empresa; b) desconsideramos os contatos com a secretária; c) aglutinamos, considerando como uma única atividade, os trabalhos de observação e re-observação de um mesmo documento. Estes procedimentos levaram a uma redução de 19 atividades e 25 minutos do dia médio de trabalho dos dirigentes brasileiros.
  • 2
    Essas conclusões também aparecem em Mintzberg (1973, p. 104,105 e 106 ) e Choran (1968, p. 166-9).
  • 3
    Id. Ibid.
  • 4
    Id. Ibid.
  • 5
    Id. Ibid.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 1982
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