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Histórias na agenda: uma aplicação do “Narrative Policy Framework

Resumo

Este artigo aplica o “Narrative Policy Framework” (NPF) ao processo de produção das políticas de ações afirmativas da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) e propõe especificação de intersecção teórica entre o NPF e a literatura sobre formação de agenda, visando responder questões sobre o papel das narrativas em processos de produção de políticas públicas. O NPF é uma abordagem de orientação empírica que propõe que as histórias que os atores do processo de produção de políticas públicas utilizam têm componentes generalizáveis e são criadas estrategicamente, de acordo com suas ideias e sistemas de crença. Essas histórias são chamadas “narrativas de política” e são consideradas parte central dos processos de políticas públicas. Ao analisar a formulação de políticas públicas e abordar o papel das ideias e das narrativas, o NPF dialoga diretamente com a abordagem da formação de agenda e provê meios para a pesquisa empírica de conceitos desenvolvidos nesta literatura. A metodologia para este estudo utiliza análise de documentos regulatórios oficiais e entrevistas semiestruturadas. Resultados indicam que narrativas de política foram utilizadas e influenciaram a regulamentação das políticas de ações afirmativas da UFPel.

Palavras-chave:
narrative policy framework; análise de políticas públicas; formação de agenda; ações afirmativas

Abstract

This study applies the “Narrative Policy Framework” (NPF) to the affirmative action policy process of the Federal University of Pelotas (UFPEL) and proposes theoretical intersection between the NPF and agenda setting literature, seeking to find out the role of policy narratives in policy processes. NPF is an empiric-oriented framework that posits that the policy-makers’ stories have generalizable components and are built and crafted in accordance to their ideas. These are policy narratives, and are at the center of the policy process. By analyzing formulation stages of public policy and referring to ideas and narratives, the NPF refers to the agenda setting literature and provides means for empirical research of agenda setting concepts. The study undertook analysis of regulatory outputs and semi-structured interviews. Findings indicate that policy narratives have affected institutional regulatory outputs regarding UFPel’s affirmative action policies.

Keywords:
narrative policy framework; policy analysis; agenda setting; affirmative action

Resumen:

Este artículo aplica el Narrative Policy Framework (NPF) al proceso de producción de políticas de acciones afirmativas de la Universidad Federal de Pelotas (UFPEL) y propone avances teóricos que exploran la intersección entre el NPF y la literatura sobre formación de agenda. El NPF es un enfoque orientado empíricamente que propone que las historias que utilizan los actores en el proceso de formulación de políticas tienen componentes generalizables y se crean estratégicamente de acuerdo con sus ideas y sistemas de creencias. Estas historias se llaman “narrativas de política” y se consideran una parte central de los procesos de políticas públicas. Al analizar la formulación de políticas públicas y abordar el papel de las ideas y narrativas, el NPF dialoga directamente con la literatura sobre la formación de la agenda y proporciona medios para la investigación empírica de conceptos desarrollados en este enfoque. La metodología para este estudio utiliza análisis de documentos reglamentarios y entrevistas semiestructuradas. Los resultados indican que se utilizaron narrativas de políticas e influyeron en la regulación de las políticas de acciones afirmativas de la UFPEL.

Palabras clave:
narrative policy framework; análisis de políticas; formación de agenda; acciones afirmativas

1. INTRODUÇÃO

Pesquisadores da área de políticas públicas têm desenvolvido, desde o início dos anos 2000, o quadro de estudo de narrativas em políticas públicas chamado de “Narrative Policy Framework” (NPF), o qual visa construir uma abordagem para o estudo empírico de narrativas nas pesquisas em políticas públicas. Este quadro apresenta o conceito de narrativa de política, o qual designa as histórias que os “policy makers” utilizam estrategicamente para influenciar o processo de produção de políticas públicas. O objetivo do NPF é analisar o impacto dessas narrativas nos outputs de políticas públicas (O’Leary, Borland, Stockwell, & MacDonald, 2017O’Leary, R., Borland, R., Stockwell, T., &MacDonald, M. (2017). Claims in vapour device (e-cigarette) regulation: A Narrative Policy Framework analysis. International Journal Of Drug Policy, 44, 31-40.).

Neste artigo, este quadro é aplicado a um estudo de caso que investiga o papel de narrativas na produção de políticas em uma organização. Articulado com conhecidas abordagens como as de Kingdon ([1984] 2014) e de Baumgartner e Jones (1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press.), o NPF serve como uma plataforma de pesquisa para desenvolver conhecimento na fronteira entre a formulação de uma política pública, no cenário do governo federal, e a transformação da regulação mais ampla em uma política institucional, no nível local (Weible & Carter, 2017Weible, C. M., & Carter, D. P. (2017) Advancing Policy Process Research at Its Overlap with Public Management Scholarship and Nonprofit and Voluntary Action Studies. Policy Studies Journal, 45(1), 22-49.; Weible & Schlager, 2014Weible, C. M., & Schlager, E. (2014). Narrative Policy Framework: Contributions, limitations, and recommendations. In M. D. Jones; E. A. Shanahan; & M. K. McBeth. (Eds.), The science of stories: Applications of the Narrative Policy Framework in Public Policy Analysis (pp. 235-246). New York, NY: Palgrave Macmillan .). O estudo de caso em análise examina a construção e ascensão à agenda institucional das políticas de ações afirmativas de recorte étnico-racial na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no sul do Brasil. Considerando estudantes, docentes e funcionários administrativos, a comunidade acadêmica da UFPel é composta por mais de 25.000 pessoas1 1 Recuperado de http://portal.ufpel.edu.br . A cidade de Pelotas é uma das maiores do estado do Rio Grande do Sul2 2 Pelotas é a quarta maior cidade do Rio Grande do Sul, com mais de 340.000 habitantes. , mas o orçamento da Universidade é maior que o da Prefeitura municipal. O processo de tomada de decisão em uma organização deste tamanho, mesmo que não seja uma política pública em sentido estrito, pode ser analisado como um processo complexo, no qual ocorrem disputas envolvendo diferentes crenças, disputas argumentativas e construção de narrativas.

Neste sentido, tomar a UFPel como unidade de análise pode ser importante para entender o papel das narrativas em um processo decisório, especificamente sobre a questão das cotas étnico-raciais. A cidade de Pelotas possui uma história ligada ao passado Brasileiro escravocrata, tendo desenvolvido-se durante o século XIX como uma das mais importantes no Brasil, com base na produção do “charque”, uma qualidade específica de carne salgada, produzida pelos trabalhadores escravos. Até os dias de hoje, uma das principais atrações turísticas da cidade são as “charqueadas”, as luxuosas mansões dos “Barões do Charque”. Esses ecos de um passado escravista ainda geram controvérsia na cidade3 3 O clássico estudo “Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional”, do sociólogo e ex-Presidente Brasileiro Fernando Henrique Cardoso, foi realizado tendo a cidade de Pelotas como base para análise empírica (Cardoso, 2003) . Assim, a decisão de adotar políticas de ações afirmativas na UFPel constitui um estudo de caso relevante, devido ao conflito entre a fricção institucional por um lado, e o marcado avanço de políticas inclusivas, por outro, o que, segundo a hipótese do presente estudo, é possibilitado pelo desenvolvimento de narrativas. O objetivo principal deste artigo é examinar o papel e o impacto das narrativas no processo decisório da UFPel.

Estudos e perspectivas teóricas sobre formação de agenda visam examinar processos de definição de determinadas alternativas e exclusão de outras em processos decisórios. Sem dúvidas, o uso estratégico de narrativas é uma forma de influenciar esses processos. A partir deste pressuposto, este artigo analisa a atividade de coalizões organizadas na definição de um problema de política em uma organização complexa como uma uma universidade federal no Brasil. Busca-se examinar a construção de uma questão de política, sua ascensão à agenda e sua transformação em uma política institucional, visando responder à questão “Qual é o papel das narrativas nesse processo?”. Ao analisar um estudo de caso no ambiente organizacional, busca-se contribuir para a construção de conhecimento sobre o processo de produção de uma política institucional, explorando as fronteiras entre campos de pesquisa que têm compartilhado desenvolvimentos comuns, em especial uma guinada teórica em direção a uma abordagem social-construcionista para processos de cognição e comunicação (Fischer, 2003Fischer, F. (2003). Reframing public policy: Discursive politics and deliberative practices. New York, NY: Oxford University Press.; March & Simon, 1958March, J. G. & Simon, H. (1958). Organizations. New York, NY: Wiley.; Simon, 1979Simon, H. (1979) Comportamento administrativo: Estudo dos processos decisórios nas organizações administrativas (3. Ed.). Rio de Janeiro, RJ: Fundação Getulio Vargas.). Tanto o processo de produção de políticas públicas em si, quanto o processo decisório em uma organização complexa como uma universidade pública, são permeados por discursos nos quais estão organizadas e apresentadas as ideias das pessoas envolvidas. Assim, identifica-se similaridades entre o processo institucional de tomada de decisão e o processo mais amplo de produção de políticas públicas (Bozeman, 2013Bozeman, B. (2013). What organization theorists and public policy researchers can learn from one another: Publicness Theory as a case-in-point. Organization Studies, 34(2), 169-188.; Rodrigues, Barcelos & Pinto, 2019Rodrigues, D. D., Barcelos Neto, M,. & Pinto, R. S. (2019) Construção de problemas públicos e processos de tomada de decisão: Uma tentative de diálogo entre Análise de Políticas Públicas e Teorias Organizacionais. In Anais do 22º Seminários em Administração, São Paulo, SP.). O exame específico do processo institucional realizado neste estudo é baseado em três observações: 1) o apontamento de similaridades entre os ambientes institucionais de produção de políticas da universidade e do governo federal (Kingdon 2014Kingdon, J. W. (2014). Agendas, alternatives, and public policies. Melbourne, Australia: Pearson New International Edition., pp. 84-86); 2) oportunidade para avançar a produção de conhecimento sobre estágios não-especificados do processo de produção de políticas públicas (Bozeman, 2013; Weible & Carter, 2017Weible, C. M., & Carter, D. P. (2017) Advancing Policy Process Research at Its Overlap with Public Management Scholarship and Nonprofit and Voluntary Action Studies. Policy Studies Journal, 45(1), 22-49.); 3) oportunidade para avançar a produção de conhecimento sobre o NPF, que ainda é explorado timidamente no Brasil.

Muito tem sido estudado sobre o processo de produção de políticas públicas como um todo, mas estudos específicos sobre as particularidades de seus desdobramentos no nível organizacional continuam relativamente inexplorados (Weible & Carter, 2017Weible, C. M., & Carter, D. P. (2017) Advancing Policy Process Research at Its Overlap with Public Management Scholarship and Nonprofit and Voluntary Action Studies. Policy Studies Journal, 45(1), 22-49.). Neste sentido, analisar o processo de transformação da legislação maior sobre ações afirmativas em uma política no nível institucional torna-se relevante para a produção de conhecimento sobre uma fase não muito abordada do processo de produção de políticas públicas. Assim, este artigo apresenta um estudo exploratório sobre o impacto de narrativas no processo de construção das políticas de ações afirmativas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

Além desta introdução e das conclusões, este artigo é composto pelas seguintes seções: uma breve revisão de aspectos teóricos convergentes entre as abordagens de formação de agenda e o quadro do NPF; um panorama do NPF, com ênfase em aspectos centrais que são utilizados neste estudo; uma seção de metodologia; uma síntese do processo de produção das políticas de ações afirmativas da Universidade Federal de Pelotas; e uma seção de análise e discussão.

2. FORMAÇÃO DE AGENDA, IDEIAS E NARRATIVAS: CONTEXTUALIZAÇÃO E ASPECTOS CONVERGENTES

Existe uma longa tradição de estudos em políticas públicas, representada por perspectivas que analisam procedimentos pré-decisórios, um campo que toma impulso a partir das considerações de Schattschneider (1960Schattschneider, E. E. (1960). The semi-sovereign people: A realist’s view of democracy in America. Hirsdale, IL: The Dryden Press.) sobre escopo de conflito e mobilização de viés. Estudos pioneiros, assim como abordagens contemporâneas sobre formação de agenda, compartilham uma preocupação em comum, referente à análise de processos conflituosos, nos quais determinadas questões de política conquistam atenção em espaços públicos, enquanto outras são deixadas de fora.

O desenvolvimento de teorias do processo de produção de políticas públicas que focam na construção de questões de política avançou consideravelmente nas décadas de 1980 e 1990. Em 1984, John Kingdon apresentou a “Teoria dos Múltiplos Fluxos”, uma abordagem sobre formação de agenda desenvolvida a partir do ponto de partida de que “ideias importam” em processos políticos. Em sua introdução, Kingdon (2014Hajer, M. A. (1993). Discourse coalitions and the institutionalization of practice: The case of acid rain in Britain. In F. Fischer, J. Forester. (Eds.), The argumentative turn in policy analysis and planning(pp. 43-76). Durham, NC: Duke University Press ., p. 1) chama atenção para “o poder de uma ideia cuja hora chegou”, destacando a natureza dinâmica e fluida dos processos de tomada de decisão. A Teoria dos Múltiplos Fluxos destaca o papel dos “empreendedores de política”, atores que exploram janelas de oportunidade que, quando abertas, permitem acesso à agenda para determinadas questões. Na perspectiva de Kingdon, uma janela de oportunidade é um momento importante no qual convergem três fluxos relativamente independentes: 1) um problema é reconhecido; 2) uma solução de política pública é tecnicamente viável, e 3) existe aceitação política para a solução desenvolvida (Kingdon [1984], 2014Hajer, M. A. (1993). Discourse coalitions and the institutionalization of practice: The case of acid rain in Britain. In F. Fischer, J. Forester. (Eds.), The argumentative turn in policy analysis and planning(pp. 43-76). Durham, NC: Duke University Press .).

Menos de uma década após o trabalho seminal de Kingdon, Baumgartner e Jones (1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press.) apresentaram a “Teoria do Equilíbrio Pontuado” (TEP), a qual também foca em formação de agenda e enfatiza o papel de ideias e crenças no processo de produção de políticas públicas. Um conceito chave na TEP é “imagem de política”, cuja definição sintetiza o valor das ideias e o enquadramento estratégico de questões de política em termos favoráveis às ideias defendidas pelos policy makers - “Como uma política é entendida e discutida é a sua ‘imagem de política’ “ (Baumgartner & Jones, 1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press., p. 25). O conceito deixa implícito que são possíveis diferentes enquadramentos para uma questão e que a ascensão de um entendimento determinado pode ser construída através da argumentação. Assim, a persuasão toma um papel central na definição de imagens que são construídas por meio de representações simbólicas e sutilezas de linguagem. Esta natureza argumentativa evidencia o pressuposto de que, seja em uma organização (como é o caso do presente estudo), seja o processo de produção de políticas públicas em si, decisões políticas são socialmente construídas, em processos que envolvem convencimento. Nas palavras de Majone (1989Majone, G. (1989). Evidence, argument and persuasion in the policy process. New Haven, CT: Yale University Press., p. 1), “... políticas públicas são feitas de linguagem. Seja na forma escrita ou oral, a argumentação é central em todos os estágios do processo de produção de políticas públicas”.

Em processos de formação de agenda, certos aspectos são destacados, enquanto que outros são deliberadamente ignorados. Condições sociais por si só não geram políticas públicas; estas são geradas em processos de argumentação e construção de imagens. A produção de políticas públicas requer persuasão, convencimento sobre uma situação ser problemática, o que comumente é feito por meio de histórias que usam conexões causais para demonstrar que uma determinada condição social não é inerente à natureza, mas sim está ao alcance do controle humano, e assim pode ser sujeita à ação na forma de uma política pública. Conexões entre o problema e a solução proposta são demonstradas em histórias estrategicamente moldadas, que ligam o problema a uma solução através de mecanismos causais que apontam a culpa sobre uma situação problemática (Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., 2012Stone, D. (2012). Policy paradox: The art of political decision making. New York, NY: WW Norton.). Em política pública, um problema é uma situação que foi reconhecida como passível de gerar uma ação (Kingdon, 2014Kingdon, J. W. (2014). Agendas, alternatives, and public policies. Melbourne, Australia: Pearson New International Edition., pp. 109-115; Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., pp. 282-289).

Neste sentido, a literatura tem apontado o quanto agendas são impactadas pela forma como determinados atores interpretam e processam a realidade, moldando condições sociais em problemas que devem gerar soluções na forma de políticas públicas. Devido à importância reconhecida à argumentação, torna-se relevante analisar específica e sistematicamente o papel das narrativas no processo de produção de políticas públicas. Conceitos como “imagem de política” (Baumgartner & Jones, 1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press.), “definição de problema” (Rochefort & Cobb, 1994Rochefort, D. A., & Cobb, R. W. (Eds.) (1994). The politics of problem definition: Shaping the policy agenda. Lawrence, KS: University Press of Kansas.) e “histórias causais” (Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300.) relacionam-se entre si no sentido em que todos referem-se ao enquadramento de questões de política em termos congruentes às ideias e crenças de determinados atores envolvidos nos processos políticos.

O presente artigo, então, foca nos enquadramentos estratégicos que são realizados pelos “policy makers”, ligando assim os quadros teóricos das abordagens de formação de agenda e do Narrative Policy Framework. Narrativas têm tradicionalmente sido tratadas pela literatura sobre formação de agenda, a partir do reconhecimento de que elas sem dúvida interferem na percepção das pessoas sobre questões de política. Discursos, interpretações e representações simbólicas realizam um papel substancial na definição de problemas e os outputs de políticas públicas refletem mais processos argumentativos do que a aplicação de técnicas formais. A literatura sobre formação de agenda reserva às ideias um papel fundamental no processo de produção de políticas públicas e as ideias dos atores envolvidos nesses processos são comumente organizadas em narrativas criadas estrategicamente, as quais permeiam as principais teorias do processo de produção de políticas públicas. Peterson (2018Peterson, H. L. (2018). Political information has bright colors: Narrative Attention Theory. Policy Studies Journal, 46(4), 828-842., p. 837) sugere que “imagens de política comumente são narrativas de política” e Peterson e Jones (2016)Peterson, H. L., & Jones, M. D. (2016). Making sense of complexity: The narrative policy framework and agenda setting. In N. Zahariadis. (Ed.), Handbook of public policy agenda setting. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing. identificam similaridades entre os conceitos de imagem de política e definição de problema, apontando que esta definição “(permite) a ação política” (p. 114), o que é basicamente o que as narrativas de política visam realizar. Narrativas de política tipicamente possuem um roteiro dramático que é construído ao se destacar certos aspectos de uma história e “adicionar cores” às informações (Peterson, 2018Peterson, H. L., & Jones, M. D. (2016). Making sense of complexity: The narrative policy framework and agenda setting. In N. Zahariadis. (Ed.), Handbook of public policy agenda setting. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.). De acordo com Stone (1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300.), a principal forma de definição de problema na produção de políticas públicas é o apontamento da culpa pelos problemas sociais, o que é desenvolvido em histórias que exploram quatro mecanismos causais: causa mecânica, causa intencional, causa acidental, e cause inadvertida. Esses mecanismos referem-se à conexão causal específica entre um problema e uma solução. Stone (1989)Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300. chama os mecanismos acidental e intencional de “posições fortes”, as quais colocam condições ou no campo do mero acidental ou do controle humano, enquanto que os mecanismos mecânico e inadvertido expressam “posições mistas”, por expressarem estratégias mais difusas, jogando a culpa para a falha mecânica ou para causas sociais, institucionais ou estruturais, ao invés de culpar uma pessoa ou um grupo determinado (Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., pp. 283-289). No sentido de desenvolver métodos de análise empírica das narrativas de política, pesquisas que aplicam o NPF têm comumente apontado ou aplicado a tipologia de Stone como uma ferramenta para o estudo sistemático de estratégias de narrativa (Jones & McBeth, 2010; Shanahan et al., 2013Shanahan, E. A., Jones, M. D., McBeth, M. K., & Lane, R. R. (2013). An angel on the wind: How heroic policy narratives shape policy realities. Policy Studies Journal, 41(3), 453-483.; Shanahan, Adams, Jones & McBeth, 2014; Zanocco, Song & Jones, 2018Zanocco, C., Song, G., &Jones, M. (2018). Fracking bad guys: The role of narrative characters affect in shaping hydraulic fracturing policy preferences. PolicyStudiesJournal, 46(4), 978-999.).

No entanto, NPF e formação de agenda não são intrinsecamente conectados, o que chama para a delineação de possíveis intersecções entre essas abordagens. Peterson & Jones (2016Peterson, H. L., & Jones, M. D. (2016). Making sense of complexity: The narrative policy framework and agenda setting. In N. Zahariadis. (Ed.), Handbook of public policy agenda setting. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.) e Weible & Schlager (2014Weible, C. M., & Schlager, E. (2014). Narrative Policy Framework: Contributions, limitations, and recommendations. In M. D. Jones; E. A. Shanahan; & M. K. McBeth. (Eds.), The science of stories: Applications of the Narrative Policy Framework in Public Policy Analysis (pp. 235-246). New York, NY: Palgrave Macmillan .) atestam para o potencial do NPF funcionar como uma ponte para o desenvolvimento de estudos sobre narrativas em conjunto com outras abordagens e teorias do processo de produção de políticas públicas. Neste artigo, foca-se nos entendimentos comuns aos conceitos de imagem de política, definição de problema e narrativa de política. Argumenta-se que os roteiros das narrativas de política podem ser estudados como exemplos da construção de imagens de política ou da definição de problemas de política, considerando que as conexões causais que são destacadas na construção estratégica de uma imagem de política, segundo Baumgartner e Jones (1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press., p. 26) - “um misto de informação empírica e apelo emocional” - e na definição de um problema, conforme Stone (1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., p. 282) - “um processo de construção de imagens, onde as imagens têm a ver fundamentalmente com a atribuição de intencionalidade, culpa e responsabilidade” - são consistentes com a descrição do elemento estrutural do roteiro, na teoria do NPF.

3. UM PANORAMA DO NARRATIVE POLICY FRAMEWORK

Desde o final dos anos 1980, diversos autores têm apontado a importância dos estudos sobre o papel de discursos e narrativas no processo de produção de políticas públicas (Fischer & Forester, 1993Fischer, F; & Forester, J. (Eds.) (1993). The argumentative turn in policy analysis and planning. Durham, NC: Duke University Press.; Hajer, 1993Hajer, M. A. (1993). Discourse coalitions and the institutionalization of practice: The case of acid rain in Britain. In F. Fischer, J. Forester. (Eds.), The argumentative turn in policy analysis and planning(pp. 43-76). Durham, NC: Duke University Press .; Majone, 1989Majone, G. (1989). Evidence, argument and persuasion in the policy process. New Haven, CT: Yale University Press.; Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300.). Este campo foi marcado por sua oposição aos quadros mais tradicionais da Ciência Política e da Análise de Políticas Públicas, criticando-os por sua orientação positivista (Fischer, 2003, 2007); assim, essa vertente da literatura foi nomeada por Fischer (2006) como pós-positivista. Neste sentido, é importante constatar que o NPF origina-se e dialoga com quadros de orientação pós-positivista (Jones & Radaelli, 2015Jones, M. D; & Radaelli, C. M. (2015). The Narrative Policy Framework: Child or monster? Critical Studies Journal, 9(3), 339-355.). No entanto, se suas origens remetem à uma epistemologia interpretativa, seus desenvolvimento posteriores, especialmente do ponto de vista metodológico, tomaram outro caminho.

Devido às limitações de espaço, apresenta-se um panorama do NPF focando nos elementos que são abordados diretamente no presente estudo. Revisões compreensivas foram realizadas por Jones & McBeth (2010Jones, M. D; & McBeth, M. K. (2010). A Narrative Policy Framework: Clear enough to bewrong? Policy Studies Journal, 38(2), 329-353.) e por Shanahan, Jones, e McBeth (2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.). Em síntese, a teoria do NPF define que “narrativas de política” são “histórias com uma sequência temporal de eventos que ocorrem em um roteiro populado por momentos dramáticos, símbolos e personagens arquétipos, culminando em uma moral da história” (Jones & McBeth, 2010, p. 329). De acordo com o quadro teórico, os componentes das narrativas de políticas são os elementos estruturais citados no conceito acima (cenário, roteiro, personagens e moral da história) e as estratégias de narrativa que compõem o conteúdo de cada narrativa de política.

Cenário é o contexto ou ambiente onde a narrativa está situada. Pode ser um espaço geográfico ou institucional, um período de tempo ou mesmo uma controvérsia em si. Roteiro é a história que conecta os elementos estruturais da narrativa, normalmente contendo um arco dramático. Personagens são os protagonistas da história, tipicamente identificados como heróis, vilões e vítimas. E a moral da história é a conclusão da narrativa, a qual apresenta uma ação a ser tomada na forma de uma política pública ou ao menos uma menção a uma política (Jones, 2018Jones, M. D. (2018). Advancing the Narrative Policy Framework? The Musings of a Potentially Unreliable Narrator. Policy Studies Journal, 46(4), 724-746.; Jones & McBeth, 2010; Shanahan et al., 2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.).

O conteúdo das narrativas é muito menos passível de ser tipificado dessa forma, à medida que diferentes narrativas podem ter conteúdo completamente diferente. Porém, conforme ressaltado por Jones (2018Jones, M. D. (2018). Advancing the Narrative Policy Framework? The Musings of a Potentially Unreliable Narrator. Policy Studies Journal, 46(4), 724-746.), o NPF baseia-se na noção de relatividade restrita, a partir da qual postula-se que a composição das narrativas de política não é absolutamente imprevisível, mas sim relativa a estratégias de causalidade que refletem determinadas ideias e sistemas de crença. A estratégia mais desenvolvida nos estudos do NPF explora o uso dos mecanismos causais definidos por Stone (1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300.). Um importante estudo sobre a utilização dos mecanismos causais foi realizado por Shanahan, Jones, McBeth, e Lane (2014Shanahan, E. A., Adams, S. M., Jones, M. D., & McBeth, M. K. (2014). The blame game: Narrative persuasiveness of the intentional cause mechanism. In M. D. Jones; E. A. Shanahan;& M. K. McBeth. (Eds.), The science of stories: Applications of the Narrative Policy Framework in Public Policy Analysis (pp. 69-88). New York, NY: Palgrave Macmillan.), cujos resultados indicam que “mecanismos causais, como um todo, nem sempre afetam opiniões sobre política pública, mas sim qual mecanismo causal específico é aplicado” (p. 82).

Outro aspecto importante do NPF são os três níveis de análise, os quais referem-se ao escopo de aplicação do quadro. O nível micro refere-se à influência das narrativas de política nos indivíduos; o nível meso examina a influência das narrativas em coalizões de política; e o nível macro examina as narrativas em contextos culturais e institucionais amplos. Devido ao desenho desta pesquisa4 4 Revisões compreensivas e aplicações empíricas dos níveis de análise podem ser encontradas em Jones e McBeth (2010, p. 343-346), Shanahan et al. (2013, pp. 456-457), Kirkpatrick e Stoutenborough (2018) - sobre pesquisas no nível micro -, Ney (2014) - sobre conexões entre os níveis meso e macro - e Peterson (2018) - sobre inovações no nível macro. , foca-se aqui no nível meso, que é o mais desenvolvido e é especialmente passível de intersecção com conceitos da literatura sobre formação de agenda (Peterson & Jones, 2016Peterson, H. L., & Jones, M. D. (2016). Making sense of complexity: The narrative policy framework and agenda setting. In N. Zahariadis. (Ed.), Handbook of public policy agenda setting. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.). Muito do que se foca em formação de agenda é a atividade das coalizões de política no ambiente dos “subsistemas”, o qual é em si o foco de análise do nível meso. Conforme foi sugerido anteriormente, as coalizões envolvidas no processo de produção de políticas públicas não ficam simplesmente de fora, assistindo ao processo; elas tentam ativamente influenciar nos processos de tomada de decisão, o que é feito por meio de diversas estratégias estudadas na literatura sobre formação de agenda, como expansão de questões e transferência de culpa. Shanahan, Raile, French, e McEvoy (2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.) afirmam que as pesquisas no nível meso do NPF têm historicamente “realizado estudos de caso para identificar definições específicas para determinadas questões” (p. 924), o que é, em síntese, a abordagem proposta no presente estudo.

Um outro desdobramento do NPF, designado para contornar eventuais limitações à condução de pesquisas quantitativas, é o NPF Qualitativo, conforme Gray e Jones (2016Gray, G.; & Jones, M. D. (2016). A qualitative narrative policy framework? Examining the policy narratives of US campaign finance regulatory reform. Public Policy and Administration, 31(3), 193-220.). Estes autores propõem uma “sintonia fina” conceitual e a incorporação da epistemologia qualitativa, substituindo padrões quantitativos por padrões amplamente reconhecidos da pesquisa qualitativa, mais especificamente “credibilidade, transferência, dependência e confirmação” (Gray & Jones, 2016Gray, G.; & Jones, M. D. (2016). A qualitative narrative policy framework? Examining the policy narratives of US campaign finance regulatory reform. Public Policy and Administration, 31(3), 193-220., pp. 194-199).

Este foi um breve resumo do NPF, desenvolvido com o intuito de promover sua familiarização junto ao campo de estudo de políticas públicas no Brasil e mais especificamente dos estudos sobre formação de agenda. Visando elaborar as intersecções teóricas apontadas entre conceitos do NPF e da literatura sobre formação de agenda, este estudo aplica o quadro teórico do NPF ao processo de formação de agenda em uma universidade pública federal. A seguir, detalha-se a metodologia do estudo.

4. METODOLOGIA

Retomando-se a definição apresentada na introdução deste artigo, o objetivo principal é analisar o papel das narrativas nos processos de construção das decisões que resultaram na adoção de políticas de ações afirmativas na Universidade Federal de Pelotas (UFPel). No presente estudo, não é viável analisar todo o processo. Isto foi feito em uma pesquisa mais ampla, uma dissertação de Mestrado cujo escopo é expandido neste artigo (Rodrigues, 2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.). Essa pesquisa anterior e este artigo são ambos baseados em abordagens de estudo de caso, seguindo a perspectiva desenvolvida por autores como George e Bennett (2005George, A; & Bennet, G. (2005). Case study and theory development in the Social Sciences, Cambridge: MIT Press.) e Beach e Pedersen (2016Beach, B.; & Pedersen, R. B. (2016). Causal study methods: Foundations and guidelines for comparing, matching and tracing. Ann Arbor: Michigan University Press.). Assim, define-se um caso como “um exemplo de um processo em desenvolvimento” (Beach & Pedersen, 2016, p. 5). Neste sentido, a UFPel é tomada como uma unidade de análise para a observação do papel das narrativas em processo decisórios.

No presente estudo, procedimentos metodológicos incluem análise de conteúdo e aplicação do NPF Qualitativo (Gray & Jones, 2016Gray, G.; & Jones, M. D. (2016). A qualitative narrative policy framework? Examining the policy narratives of US campaign finance regulatory reform. Public Policy and Administration, 31(3), 193-220.). A análise de conteúdo foi realizada por meio de codificação, seguindo as diretrizes e o codebook de Shanahan et al. (2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.). A base de dados consiste de documentos e entrevistas semiestruturadas conduzidas durante pesquisa sobre o processo de formação de agenda e produção das políticas de ações afirmativas da UFPel. Embora as entrevistas não tenham sido conduzidas especificamente com o objetivo de realizar um estudo sob a perspectiva do NPF, intersecções teóricas entre abordagens e conceitos de formação de agenda e NPF são evidentes, uma vez que todos os informantes contam histórias estruturadas como narrativas. O que o presente estudo visa analisar é se estas narrativas condizem com o conceito mais estrito de “narrativa de política”, conforme desenvolvido no NPF, e qual o impacto das histórias na tomada de decisão. Esses objetivos são realizados pela comparação das histórias com o quadro teórico do NPF, e das narrativas identificadas com os documentos oficiais.

O conteúdo de todos os documentos e das transcrições das entrevistas foi lido cuidadosamente e cada parágrafo foi codificado em planilhas específicas, nas quais personagens, roteiro, moral da história e estratégias de narrativa eventualmente identificados foram marcados. Com base nessa codificação, foi identificada uma narrativa geral em cada unidade de análise. Ao todo, 162 parágrafos e seis transcrições de entrevistas foram codificados. Somente componentes explicitamente citados foram considerados. Roteiros e estratégias de narrativa foram codificados de acordo com o codebook de Shanahan et al. (2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.), o qual apresenta cinco roteiros comuns (“História de Declínio”, “Progresso Obstruído”, “Mudança é uma Ilusão”, “História de Controle e Desamparo” e “Conspiração”), e com os quatro mecanismos causais de Stone (1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300.; 2012Stone, D. (2012). Policy paradox: The art of political decision making. New York, NY: WW Norton.), os quais são comumente utilizado em pesquisas do NPF como modelos de estratégias de narrativa.

Em uma fase subsequente, os resultados da codificação foram comparados com os marcos regulatórios das políticas de ações afirmativas da UFPel. A base de dados para este estágio consiste de atas oficiais, documentos de arquivo e conteúdo das entrevistas; das alegações apresentadas nas atas e documentos e nas entrevistas; e dos documentos oficiais que regulam as políticas. Os documentos analisados são atas de reuniões dos conselhos acadêmicos da UFPel e documentos de arquivo obtidos pelos autores durante a pesquisa. Os marcos regulatórios analisados são os documentos oficiais que regulam as políticas de ações afirmativas de recorte étnico-racial da UFPel, sendo esses: A Resolução nº 06/2012, do Conselho Universitário (CONSUN), da UFPel; A Resolução nº 15/2015, do Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão (COCEPE), da UFPel; e as Resoluções nº 05/2017 e nº 16/2017, do CONSUN, recuperado de https://wp.ufpel.edu.br/scs.

Esses são os documentos oficiais da UFPel que regulam o sistema de cotas étnico-raciais no nível da graduação, o processo seletivo específico para estudantes Indígenas e Quilombolas5 5 Remanescentes das comunidades dos quilombos, caracterizados segundo critérios de autoatribuição: trajetória histórica própria, relações territoriais específicas, ancestralidade negra e resistência à escravidão (Decreto 4.887, 2003, Presidência da República do Brasil. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4887.htm). , o sistema de cotas étnico-raciais no nível da pós-graduação, e a política de permanência na pós-graduação, respectivamente. Essas são todas as políticas de ações afirmativas de recorte étnico-racial implementadas no período entre os anos de 2012-2017. Os documentos e decisões oficiais são sujeitos à análise no presente estudo, mas obviamente a produção de políticas públicas não inicia com as regulações formais. A pesquisa de Rodrigues (2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.) aborda os estágios pré-decisórios desse processo, remetendo à quase vinte anos antes de a UFPel implementar sua primeira política de ação afirmativa. São analisados os marcos regulatórios implementados entre os anos 2012 e 2017 porque este foi o período no qual a Universidade implementou suas políticas de ações afirmativas de recorte étnico-racial.

Conforme afirmado anteriormente, as entrevistas selecionadas para o presente estudo não foram conduzidas especificamente para a realização de um estudo do NPF, mas sim um estudo sobre formação de agenda. Resultados que eventualmente confirmem a presença de narrativas de política no processo poderão confirmar a hipótese referente às intersecções teóricas entre as abordagens. Os informantes entrevistados são seis empreendedores de política envolvidos no processo de produção das políticas de ações afirmativas da UFPel. É importante enfatizar que, no presente artigo, realiza-se um estudo exploratório, assim, os resultados não devem embasar conclusões absolutas sobre a aplicação do quadro do NPF. De qualquer forma, acredita-se que o presente estudo atende a critérios de pesquisa qualitativa como credibilidade, transferência, dependência e confirmação.

5. DEFINIÇÃO DE UM PROBLEMA DE POLÍTICA: CONTEXTUALIZANDO O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO NA UFPEL

Rodrigues (2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.) e Rosa, Nunes, e Larré (2017Rosa, R. R. G., Nunes, G. H. L., & Larré, R. B. (2017) As Ações Afirmativas na Universidade Federal de Pelotas: Políticas públicas, institucionalização e democratização da educação superior. In D. Mato. (Org.), Educación superior y pueblos indigenas y afrodescendientes en América Latina: Políticas y prácticas de inclusión, democratización e interculturalización. Buenos Aires, Argentina: Eduntref.) realizam descrições compreensivas do processo de produção das políticas de ações afirmativas na Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Os últimos analisam a institucionalização dessas políticas na Universidade, e o primeiro examina o processo de formação de agenda, concluindo que histórias contadas pelos atores envolvidos neste processo foram substancialmente relevantes para o reconhecimento da questão.

Em um contexto de gradual inserção de questões relativas à igualdade racial na agenda governamental, o Congresso Brasileiro aprovou, em agosto de 2012, a Lei Federal 12.711/2012, definindo um calendário de quatro anos para que as instituições federais de ensino superior implementassem um sistema de cotas, mas a UFPel aplicou a porcentagem completa prevista pela Lei já em 2014.

Antes da Lei 12.711/2012, a questão das ações afirmativas como um todo teve uma lenta e gradual ascensão à agenda governamental. Sistemas de cotas raciais em universidade públicas tornaram-se um assunto de discussão nacional no início dos anos 2000, quando o estado do Rio de Janeiro aprovou a Lei Estadual 3.708/2001. A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) tornou-se uma das primeiras universidades públicas no Brasil a experienciar tensões resultantes da implementação de ações afirmativas, mas para além de implementação de modelo top-bottom, como aconteceu no Rio de Janeiro, políticas autônomas foram implementadas pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e pela Universidade de Brasília (UnB) (Santos, 2012Santos, A. P. (2012). Itinerário das ações afirmativas no ensino superior público brasileiro: Dos ecos de Durban à lei das cotas. Revista de CiênciasHumanas, 8(2), 289-317.). Somente quase uma década após as primeiras experiências, resultando de uma longa tradição de pressão social e do reconhecimento, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) (na presidência durante os anos de 2003 a 2016), de questões referentes à promoção da igualdade racial (Lima, 2010Lima, M. (2010). Desigualdades raciais e políticas públicas: Ações afirmativas no governo Lula. Novos estudos - CEBRAP, 29(2), 77-95.), o Congresso aprovou a Lei 12.711/2012, a qual, embora seja um importante marco para as políticas de cotas étnico-raciais, define primeiramente um sistema de cotas sociais, reservando 50% das vagas de graduação nas instituições federais de ensino superior para estudantes oriundos de escolas públicas, e, dentro desta cota, estabelece um recorte étnico-racial, reservando porcentagens determinadas de acordo com o censo de cada região, para estudantes negros e indígenas.

Em termos gerais, a Constituição Federal de 1988 representa um marco embrionário do reconhecimento da questão da igualdade racial no Brasil, mas uma aproximação mais decisiva entre os movimentos sociais negros e o governo federal somente iniciou-se na segunda metade dos anos 1990. Durante a Presidência de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), a questão da igualdade racial foi reconhecida, mas políticas públicas redistributivas não foram de fato implementadas, um cenário que foi avançado durante a administração do PT, quando o desenho das políticas públicas passou a ser mais impactado, muito a partir da inserção formal de representações sociais na estrutura do governo federal, culminando com a Lei 12.711/2012 (Lima, 2010Lima, M. (2010). Desigualdades raciais e políticas públicas: Ações afirmativas no governo Lula. Novos estudos - CEBRAP, 29(2), 77-95.).

Tanto o processo federal mais amplo quanto o caso específico da UFPel ocorrem em um cenário no qual as instituições, por si só, dificilmente iriam implementar política redistributivas que afetam o status quo e expõem seus próprios vieses. Rosa, Nunes, e Larré (2017Rosa, R. R. G., Nunes, G. H. L., & Larré, R. B. (2017) As Ações Afirmativas na Universidade Federal de Pelotas: Políticas públicas, institucionalização e democratização da educação superior. In D. Mato. (Org.), Educación superior y pueblos indigenas y afrodescendientes en América Latina: Políticas y prácticas de inclusión, democratización e interculturalización. Buenos Aires, Argentina: Eduntref.) descrevem o lento processo de institucionalização de políticas de ações afirmativas na UFPel e aludem ao cenário no qual a implementação ocorre, citando o “racismo institucional” (p. 228) ainda presente. Durante o processo de ascensão da questão das ações afirmativas à lista de assuntos seriamente considerados pelos tomadores de decisão da Universidade, movimentos estudantis tentavam levantar a questão racial desde a segunda metade dos anos 2000, enquanto debates sobre ações afirmativas em universidades tornavam-se um tópico de interesse nacional. De acordo com a pesquisa de Rodrigues (2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.), informantes relatam que, antes do advento da Lei 12.711/2012, a questão era ignorada pelas autoridades da Universidade, ressaltando que a pressão social e principalmente dos movimentos estudantis deve ser reconhecida como principal elemento indutor da adoção das políticas e do seu desenho específico. Mais do que somente aplicar a lei, a UFPel foi pressionada a tomar ações mais decisivas, aplicando a porcentagem completa estabelecida pela Lei, já em 2014, e implementando políticas autônomas desde então.

Ainda que a cidade de Pelotas tenha uma rica história cultural e de ativismo político pelo movimento social negro (Ávila & Oliveira, 2019Ávila, C. S; & Oliveira, W. J. F. (2009). Negros em movimento, o movimento dos negros. A mobilização negra em Pelotas 1987-2007. In Anais do 27ºCongreso de la asociación latinoamericana de sociologia, Buenos Aires, Argentina.), minorias étnicas e raciais estavam virtualmente ausentes da UFPel antes da implementação das políticas de ações afirmativas. O foco deste estudo reside na análise de como as narrativas desenvolvidas por atores locais tiveram impacto em romper o viés e a inércia institucional e promoveram a ascensão de uma questão antes ignorada à agenda de uma organização pública. Não necessariamente a condição social da desigualdade tornou-se pior no período em análise; assim, como e por que a questão das ações afirmativas ascendeu à agenda? A hipótese considerada é de que histórias estrategicamente construídas por representantes das minorias étnico-raciais levantaram atenção para a questão e promoveram a conexão da condição social (o problema) com as políticas de ações afirmativas (a solução), em um período em que a questão era politicamente viável, devido à vigência da lei federal. Não apenas a UFPel implementou a política definida pela legislação, mas assumiu um papel mais profundo na promoção de políticas autônomas, como o sistema de cotas na pós-graduação e o processo seletivo específico para estudantes indígenas e quilombolas.

Em consonância com conceitos da literatura sobre formação de agenda, desenvolvidos por Baumgartner e Jones (1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press.), Kingdon (2014Kingdon, J. W. (2014). Agendas, alternatives, and public policies. Melbourne, Australia: Pearson New International Edition.) e Stone (1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., 2012Simon, H. (1979) Comportamento administrativo: Estudo dos processos decisórios nas organizações administrativas (3. Ed.). Rio de Janeiro, RJ: Fundação Getulio Vargas.), argumenta-se aqui que imagem de política, timing e conexões causais tiveram papel fundamental na promoção da ascensão da questão das ações afirmativas à agenda da UFPel. Analisando-se a história pregressa, é pouco provável que esta Universidade tivesse adotado outras políticas de ações afirmativas, além do que era estritamente definido na lei. Representantes de diferentes grupos minoritários promoveram a expansão da questão em um momento em que o tópico das ações afirmativas estava chamando a atenção nacional, construíram uma imagem de política favorável e apresentaram as minorias étnico-raciais como vítimas da desigualdade social, conectando este problema com a solução política mencionada, e culpando um amplo contexto socioeconômico como o vilão. Este estudo de caso torna-se especialmente relevante para a análise do papel de narrativas em processos de produção de políticas públicas, porque pesquisas anteriores indicam que as histórias contadas pelos atores envolvidos tiveram um papel importante na ascensão de uma questão que, de outra forma, dificilmente teria tomado a atenção dos tomadores de decisão (Rodrigues, 2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.; Rosa, Nunes, & Larré, 2017Rosa, R. R. G., Nunes, G. H. L., & Larré, R. B. (2017) As Ações Afirmativas na Universidade Federal de Pelotas: Políticas públicas, institucionalização e democratização da educação superior. In D. Mato. (Org.), Educación superior y pueblos indigenas y afrodescendientes en América Latina: Políticas y prácticas de inclusión, democratización e interculturalización. Buenos Aires, Argentina: Eduntref.); e, para a pesquisa em políticas públicas como um todo, por constituir uma possível inovação no estudo de narrativas e no estudo de uma fase pouco explorada do processo de produção de políticas públicas - a transformação de uma política pública regulamentada no nível federal em uma política institucional, no nível local (Weible & Carter, 2017Weible, C. M., & Carter, D. P. (2017) Advancing Policy Process Research at Its Overlap with Public Management Scholarship and Nonprofit and Voluntary Action Studies. Policy Studies Journal, 45(1), 22-49.).

A “Lei de cotas sociais” determinava a reserva de no mínimo 12,5% de vagas para os destinatários das ações afirmativas, mas a UFPel logo adotou a reserva de 40% que fora apresentada pelos proponentes da questão das ações afirmativas. A arena institucional para a tomada de decisão neste caso foi o Conselho Universitário (CONSUN), que é composto por representantes de diversos grupos da Universidade e da sociedade civil. Defensores das políticas de ações afirmativas apresentaram com sucesso a proposta de uma reserva de 40% das vagas, baseada na história que destacava o papel dos negros na história de Pelotas e apontava as diversas desvantagens socioeconômicas que excluem minorias étnicas e raciais de espaços disputados socialmente, como as universidades públicas. A outra arena de tomada de decisão é o Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão (COCEPE), o qual é constituído somente por representantes da própria instituição e decide sobre questões específicas como as políticas autônomas que foram aprovadas nos anos seguintes. A sequência de políticas implementadas e o conteúdo dos documentos oficiais que as regulamentam sugerem que a questão das ações afirmativas foi objeto de um processo institucional amplo sustentado pelas histórias contadas pelos atores envolvidos. Nem todas as suas demandas resultaram de fato em políticas institucionais, mas a janela política funcionou como um cenário para debate, o qual foi aproveitado pelos proponentes das políticas e resultou em um processo amplo, cujos resultados incluem o avanço de um importante conjunto de políticas de ações afirmativas.

A pesquisa de Rodrigues (2018Rodrigues, D. D. Neto. (2018). Formação de agenda em uma universidade pública: A construção da questão das ações afirmativas. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS.) aplicou conceitos da literatura sobre formação de agenda para analisar o processo em questão, identificando que várias dessas política originam-se de narrativas construídas por representantes do movimento social negro e por outros atores que se uniram a este grupo. O autor identifica um enquadramento quase unânime da questão das ações afirmativas como uma questão de reparação por injustiças passadas. Este “enquadramento da reparação” baseia-se na história causal que conecta a falta de representações negras no ensino superior ao período da escravidão e suas consequências sobre a população negra. Esta narrativa é composta por informação empírica - dados que demonstram a desproporção entre a presença de negros na população geral e a presença de negros nos ambientes do ensino superior - e tom emocional - histórias de pobreza, falta de oportunidades e luta conta o sistema. Essas histórias fizeram grupos antes não envolvidos, como professores universitários e funcionários administrativos da Universidade, engajarem-se junto à coalizão que demandava justiça social na UFPel.

Paralelamente, representantes das demandas dos povos indígenas e quilombolas uniram-se ao movimento negro e adotaram também o “enquadramento da reparação”. O coordenador de ações afirmativas e políticas estudantis da UFPel à época defendeu a causa dos povos indígenas no COCEPE, adotando uma estratégia de narrativa similar, defendendo a ideia de que a sociedade Brasileira possui uma dívida com os povos indígenas e quilombolas e afirmando que se as universidades públicas não abrissem suas portas para estudantes vindos dessas comunidades, eles estariam para sempre excluídos daquele ambiente. O coordenador também argumentou que, devido à sua cultura e modo de vida específicos, estudantes indígenas e quilombolas não estavam em termos de igualdade para concorrer com candidatos do meio urbano ao ingresso na universidade, mediante os critérios usuais de acesso.

Provavelmente a política mais inovadora implementada no processo foi a decisão que, em 2017, definiu a criação de cotas étnico-raciais no nível da pós-graduação. A UFPel tornou-se assim uma das primeiras universidades brasileiras a fazê-lo, acolhendo a narrativa que destacava a ideia de “meritocracia justa” para o ingresso nos programas de pós-graduação. De acordo com o registro dos debates, os empreendedores defenderam a necessidade de adoção de novos padrões de meritocracia e apontaram diversos exemplos de instituições públicas e privadas que estavam implementando políticas de ações afirmativas. O marco regulatório reserva 25% das vagas nos cursos de pós-graduação stricto sensu para negros, indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência.

No caso de maior repercussão relacionado à questão racial na UFPel, acusações de fraude no acesso às cotas raciais, apresentadas por movimentos estudantis, levaram ao cancelamento das matrículas de 26 estudantes do Curso de Medicina da Universidade (Nunes, 2018Nunes, G. H. L. (2018). Autodeclarações e comissões: Responsabilidade procedimental dos/as gestores/as de ações afirmativas. In G. R. M. Dias, & P. R. F. Tavares Jr,. (Orgs.), Heteroidentificação e cotas raciais: Dúvidas, metodologias e procedimentos. Canoas, RS: Instituto Federal Rio Grande do Sul.). Como consequência de debates subsequentes, e seguindo o exemplo de outras universidades, a UFPel adotou critérios mais rigorosos de identificação racial em 2016, criando uma comissão de heteroidentificação responsável pelo controle da identificação racial dos candidatos (Rosa et al., 2017Rosa, R. R. G., Nunes, G. H. L., & Larré, R. B. (2017) As Ações Afirmativas na Universidade Federal de Pelotas: Políticas públicas, institucionalização e democratização da educação superior. In D. Mato. (Org.), Educación superior y pueblos indigenas y afrodescendientes en América Latina: Políticas y prácticas de inclusión, democratización e interculturalización. Buenos Aires, Argentina: Eduntref.). Desde então, a Universidade implementou as diferentes políticas citadas no presente artigo.

Pesquisas anteriores sobre o processo institucional referente às políticas de ações afirmativas da UFPel sugerem que os canais usuais de tomada de decisão desta instituição dificilmente teriam promovido a expansão da questão da igualdade racial, caso os proponentes não tivessem atuado estrategicamente, construindo as histórias que fizeram ascender essas políticas à agenda da Universidade. Na seção seguinte, essas histórias são analisadas de acordo com os marcos teóricos do Narrative Policy Framework

6. RESULTADOS E DISCUSSÃO: ANALISANDO O PAPEL E O IMPACTO DAS NARRATIVAS

Finalmente, nesta seção, narrativas desenvolvidas no processo de produção das políticas de ações afirmativas da UFPel são analisadas e os resultados são discutidos. Primeiramente, pretende-se demonstrar o alinhamento da presente pesquisa com os pressupostos teóricos do NPF; após, os componentes das narrativas são analisados. Pressupostos teóricos básicos do NPF apontam para a construção social da realidade e suportam que variações das construções são relativamente estáveis ao longo tempo, que narrativas de política possuem componentes específicos e identificáveis, operam em três níveis de interação, e que as narrativas realizam um papel fundamental na cognição e na comunicação humana (Jones, 2018Jones, M. D. (2018). Advancing the Narrative Policy Framework? The Musings of a Potentially Unreliable Narrator. Policy Studies Journal, 46(4), 724-746.; Shanahan et al., 2018Shanahan, E. A., Raile, E. D., French, K. A., & McEvoy, J. (2018). Bounded stories. Policy Studies Journal, 46(4), 922-948.). Para além da definição dos três níveis de análise, que é uma característica específica do NPF, esses pressupostos estão implícitos em teorias sobre processos de formação de agenda que compartilham entendimentos similares sobre cognição e processamento de informações (Baumgartner & Jones, 1993Baumgartner, F. R; & Jones, B. D. (1993). Agendas and instability in American politics. Chicago, IL: University of Chicago Press.; Kingdon, 2014Kingdon, J. W. (2014). Agendas, alternatives, and public policies. Melbourne, Australia: Pearson New International Edition.; Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., 2012Simon, H. (1979) Comportamento administrativo: Estudo dos processos decisórios nas organizações administrativas (3. Ed.). Rio de Janeiro, RJ: Fundação Getulio Vargas.). O pressuposto referente à construção social da realidade e a presença de narrativas estrategicamente construídas no processo de produção de políticas públicas são exemplos de desenvolvimentos da literatura sobre formação de agenda que sugerem que “as ideias importam” na produção de políticas públicas, e o NPF pode prover especificações dessa noção geral.

Questões de pesquisa coerentes com a teoria do NPF no nível meso visam abordar “Como os grupos envolvidos constroem narrativas de política?” e “Qual é o efeito das narrativas de política no processo de produção de políticas públicas?”, ambas as quais ajudam a entender como e por que ocorrem as mudanças em políticas públicas. Por este ser um estudo exploratório, foca-se na discussão dessas duas questões gerais. As hipóteses que originaram a pesquisa sugerem que as coalizões envolvidas no processo de produção das políticas de ações afirmativas da UFPel produziram narrativas de política e que essas narrativas influenciaram as regulações oficiais dessas políticas. Ao seguir esses passos preliminares, assegura-se que este estudo está devidamente alinhado com a teoria do NPF; a seguir, as narrativas em si serão analisadas.

Indicativos sugerem que o cenário das narrativas são os espaços institucionais e processuais nos quais as políticas analisadas neste estudo foram discutidas durante sua implementação pela UFPel (2012-2017). Arenas institucionais incluem o CONSUN e o COCEPE. Propostas apresentadas nos anos de 2012 e 2013 foram organizadas pela coalizão denominada “Fórum Cotassim”, a qual incluiu representantes da sociedade civil, movimentos sociais e estudantis e funcionários da própria UFPel. No segundo semestre de 2012, após a aprovação da Lei 12.711/2012, esta coalizão pressionou a UFPel a definir como seria implementada, na Universidade, a política definida na lei. Na reunião de 13 de Novembro de 2012, o “Fórum Cotassim” conquistou o apoio de alguns membros do CONSUN e propôs a reserva de 40% de vagas no nível da graduação para o ingresso de 2013. Nos anos seguintes, propostas foram apresentadas por atores de dentro da própria Universidade, no caso do processo seletivo específico para estudantes indígenas e quilombolas, e também por representantes do movimento social negro, no caso das políticas de ações afirmativas no nível da pós-graduação.

Com a Lei 12.711/2012 regulamentando em termos gerais a política de ações afirmativas em instituições federais de ensino superior, seguiram-se debates na UFPel focando em como a política seria aplicada. A coalizão “Fórum Cotassim” atuou como o herói que apresentou demandas para a administração central da Universidade e indicativos sugerem que essas demandas viriam dar forma às políticas de ações afirmativas da UFPel. Histórias identificadas nesta pesquisa são congruentes com narrativas apresentadas pelo movimento social negro em outros contextos, como debates nacionais mais amplos, uma vez que os atores interessados estão envolvidos em um processo fluido, atuando tanto na UFPel como em outros cenários6 6 Por exemplo, a Resolução 05/2017, do CONSUN, acolhe narrativas registradas na Ata 03/2017 (Recuperado de https://wp.ufpel.edu.br/scs/files/2017/04/ATA-03.2017-CONSUN.pdf), quando o Presidente da instituição nacional EDUCAFRO (Recuperado de https://www.educafro.org.br/site/) foi um dos representantes da coalizão local. . Uma pequena porção das narrativas apresenta um vilão, identificado em diferentes casos como a sociedade, o Estado ou as universidades, indicando que a maioria das universidades brasileiras não tinha dedicado-se efetivamente à promoção da inclusão social. Todas as narrativas apresentam os negros e as comunidades indígenas e/ou quilombolas como vítimas de um contexto socioeconômico que as exclui de espaços sociais prestigiados como as universidades públicas.

O roteiro mais comum identificado nas narrativas analisadas foi a “História de Controle e Desamparo”, presente em narrativas que destacam a histórica posição de vulnerabilidade a que estão expostas as populações negra, indígena e quilombola, na sociedade brasileira, uma situação que durante décadas foi considerada insuperável, mas que estava finalmente sujeita à mudança. Todos os empreendedores entrevistados contaram histórias contendo um arco dramático que descreve as consequências da escravidão e da segregação econômica que ainda impactam essas populações, e conectam este problema à solução na forma das políticas de ações afirmativas. O próximo roteiro mais comumente utilizado é o da “Conspiração”, presente em uma parcela menor das narrativas, o qual descreve uma história na qual um pequeno grupo tem controlado o acesso à educação superior, em seu próprio benefício, durante a maior parte da história Brasileira.

Conectados a esses roteiros, estão os mecanismos causais pelos quais se aponta a culpa para os grupos que se beneficiam dessa situação. A estratégia mais comum identificada foi a utilização do mecanismo de causa inadvertida, o qual conecta o argumento segundo o qual a situação de desigualdade é resultante de negligência, descuido ou omissão, ou seja, sem culpar os vilões diretamente. Uma porção considerável das narrativas aplica mecanismos de causa mecânica e intencional. O mecanismo de causa mecânica aponta que ações não intencionais produzem indiretamente consequências previstas por aqueles que estão no controle. Os agentes intermediários podem não ter a intenção específica de oprimir minorias étnicas e raciais, mas independentemente de sua vontade, suas ações estão programadas para perpetuar desigualdades; o mecanismo de causa intencional define que ações propositais executadas por atores determinados causam o problema, consistindo neste caso de opressão e conspiração, uma estratégia que foi utilizada menos comumente nas narrativas em análise.

Personagens e moral da história podem ser compreendidas de forma mais direta, porém identifica-se maior complexidade na disposição de roteiros e estratégias. O Quadro 1 apresenta exemplos específicos de trechos de narrativas identificadas conforme os tipos propostos pela teoria do NPF. A partir desses indicativos, sugere-se que o roteiro da “História de Controle e Desamparo” pode estar ligado teoricamente aos mecanismos causais que expressam “posições mistas”, ou seja, aqueles que não definem as consequências de uma condição social indesejada como sendo puramente acidentais ou conscientemente planejadas, enquanto que a estratégia da “Conspiração” pode ser ligada aos mecanismos de causa que expressam “posições fortes” (Stone, 1989Stone, D. (1989). Causal stories and the formation of policy agendas. Political Science Quarterly, 104(2), 281-300., pp. 284-285).

Quadro 1
Componentes das narrativas

A comparação entre as narrativas e os documentos oficiais revela que as histórias contadas durante o processo afetaram e deram forma às políticas de ações afirmativas da UFPel. Quando a Universidade implementou sua primeira política de cotas no nível da graduação, seguiu a proposta do “Fórum Cotassim” de aplicar uma reserva de 40%, ao invés de simplesmente seguir o mínimo exigido pela Lei 12.711/2012.

O Quadro a seguir contém trechos da Ata nº 06/2012, de 13 de Novembro de 2012, a qual registra as discussões que ocorrem durante a reunião do CONSUN que baseou a decisão do principal órgão de decisão da UFPel sobre os detalhes da implementação do sistema de cotas. O documento descreve que os representantes do movimento negro apresentaram uma narrativa organizada que apresentava a população negra como a vítima de desvantagens socioeconômicas estruturais. A Ata também documenta que diversos membros do Conselho também apresentaram suas opiniões sobre a questão, tanto a favor, quanto contra a proposta da reserva de 40%. Narrativas dos oponentes utilizaram um enquadramento que destacava o impacto da proposta, defendendo que a Universidade não estava preparada para receber tantos estudantes destinatários das ações afirmativas; um ator oponente apresentou os negros como “beneficiários” de uma política pública, um enquadramento que é veemente rejeitado pelo movimento negro. Após as discussões, o CONSUN aprovou a proposta de 40%, considerando explicitamente as deliberações desta reunião (Quadro 2).

Quadro 2
Implementação da Lei 12.711/2012

Sobre a criação de vagas especiais para estudantes indígenas e quilombolas, a narrativa apresentou a própria administração da Universidade como o herói, se aprovasse a proposta; o roteiro apresentou um arco dramático afirmando que se a Universidade não garantisse oportunidades especiais para estudantes dessas comunidades, indígenas e quilombolas não teriam condições de acessar a educação superior. O documento oficial subsequente (Resolução 15/2015, do COCEPE) cita esses argumentos e cria dez vagas específicas para estudantes indígenas e quilombolas, com um processo seletivo específico para seu ingresso (Quadro 3).

Quadro 3
Processo Seletivo Específico para estudantes Indígenas e Quilombolas

Em sua política de ação afirmativas mais inovadora até então, a UFPel criou um sistema de cotas étnico-raciais no nível da pós-graduação, acolhendo narrativas apresentada no Conselho Universitário por representantes do movimento social negro. Histórias registradas na Ata oficial referente afirmam que instituições de diferentes áreas estavam adotando políticas de ações afirmativas e que as universidades Brasileiras deveriam adotar “novos padrões de meritocracia”. Informantes mencionam a escassez de representantes negros entre os professores da Universidade e conectam esta situação com a política proposta. A Resolução 05/2017, do CONSUN, é o documento oficial mais rico em dados para esta análise, demonstrando a imagem acolhida institucionalmente, não só no que diz respeito à política da pós-graduação em si, mas também ao “enquadramento da reparação”, afirmando que políticas de ações afirmativas “não são concessões do Estado” e que a Universidade como um todo irá se beneficiar da promoção da diversidade (Quadro 4).

Quadro 4
Sistema de cotas em cursos de Pós-Graduação

O último documento oficial analisado nesta seção é a Resolução 16/2017, do CONSUN, a qual regulamenta a política de permanência de ingressantes na pós-graduação por meio de ações afirmativas. Neste caso, a base de dados deste estudo não provê indicativos tão substanciais de que a política regulamentada foi influenciada pelas narrativas, quanto nos casos anteriores. A questão da permanência estudantil, como um todo, esteve presente nas narrativas construídas nos documentos de arquivo analisados, mas menções específicas à política adotada são realizadas somente nas entrevistas conduzidas após a implementação, nas quais os informantes analisam o processo retroativamente (Quadro 5).

Quadro 5
Política de permanência de ingressantes na Pós-Graduação por meio de ações afirmativas

Mesmo que os resultados dispostos no Quadro 5 demonstrem menos indicativos de que as narrativas influenciaram a decisão oficial, ainda é evidente que a questão da permanência estudantil foi construída como parte do debate maior sobre ações afirmativas na UFPel. Documentos e entrevistas que compõem a base da dados deste estudo não contém tantos indicativos de que a decisão foi moldada pelas narrativas, quanto nos outros casos. Ainda assim, a referência institucional de que as políticas de ações afirmativas constituem um processo amplo dentro da Universidade corrobora a noção de que esta questão política esteve sujeita a um processo de maior escopo do que simplesmente a obrigação de implementar o sistema definido na legislação, além de revelar que a questão das ações afirmativas permeia diferente espaços institucionais. A literatura sobre formação de agenda usualmente destaca que espaços processuais como esses são populados por histórias contadas pelos atores envolvidos, e o NPF, ao apresentar ferramentas empíricas para o estudo dessas histórias, traz um potencial de inovação para pesquisas nessas áreas. Com o presente artigo, espera-se ter contribuído para a apresentação deste quadro, trazendo um exemplo relevante de sua aplicação a um objeto empírico determinado.

7. CONCLUSÃO

Questões centrais para o presente estudo giram em torno da ocorrência de narrativas de política e seu papel no processo de produção de políticas que foi analisado. Análise e resultados indicam que histórias construídas neste processo correspondem ao conceito de “narrativa de política”, à medida que, nos documentos e entrevistas examinados, pode-se identificar os componentes de narrativas desenvolvidos na teoria do NPF, e que essas histórias influenciaram os documentos oficiais subsequentes.

A principal contribuição deste artigo constitui-se pela tentativa de impulsionar pesquisas que apliquem o NPF no Brasil. Este quadro tem gradativamente despertado a atenção de pesquisadores da área de políticas públicas e apresenta desenvolvimentos interessantes para pesquisas neste campo, dispondo de ferramentas para pesquisas tanto quantitativas quanto qualitativas e oferecendo meios práticos para o estudo empírico das mudanças em políticas públicas. No contexto desta edição especial, o NPF apresenta alternativas para o estudo específico de conceitos da literatura sobre formação de agenda e provê aos pesquisadores uma nova abordagem para a análise de narrativas, em um ambiente onde o pós-positivismo tradicionalmente exerce marcada influência. A integração de métodos quantitativos e qualitativos pode ajudar pesquisadores a analisar e compreender o papel das histórias que aparecem comumente no mundo contemporâneo, em ambientes da política e da cultura em geral.

Em épocas de fake news e «pós-verdade», histórias, discursos e narrativas são sem dúvida utilizados como ferramentas poderosas para a manipulação política. Analisar a construção estratégica das narrativas e dos processos cognitivos que as sustentam pode ser uma de tantas formas pelas quais a ciência tenta compreender movimentos globais que abalaram o mundo político em tempos recentes e impactaram diretamente a produção de políticas públicas. Porém, antes de realizar esses objetivos maiores, o NPF deve ser devidamente introduzido e testado em diferentes cenários, para assim consolidar seu papel como uma plataforma para analisar narrativas em diferentes contextos geográficos, institucionais e socioeconômicos. Para confirmar sua capacidade de transferência e generalização, a aplicação do NPF em diferentes cenários deve ser sustentada, o que foi testado e discutido neste artigo.

Atendendo a um aspecto importante para a validação científica, dedicou-se atenção especial à observação de padrões de confiabilidade da pesquisa qualitativa - credibilidade, transferência, dependência e confirmação. Entende-se que o presente estudo atende a esses padrões, por utilizar uma base de dados que foi previamente validada no ambiente acadêmico e aplicar uma metodologia similar a outros estudos que utilizam o NPF, como o de O’Leary et al. (2014)O’Leary, R., Borland, R., Stockwell, T., &MacDonald, M. (2017). Claims in vapour device (e-cigarette) regulation: A Narrative Policy Framework analysis. International Journal Of Drug Policy, 44, 31-40., por exemplo.

Uma possível limitação do artigo é que, pelas escolhas referentes ao desenho da pesquisa, a base de dados não é apresentada de forma mais sistematizada. Esta escolha deve-se ao desenho da formulação do artigo, pelo qual entendeu-se que a apresentação de um panorama do NPF e de aspectos convergentes com a literatura sobre formação de agenda seria tão importante para o estudo quando a pesquisa empírica. Pretende-se no futuro realizar estudos qualitativos e quantitativos aplicando o NPF, analisando processos de produção de políticas públicas em outros cenários e explorando intersecções com as teorias de formação de agenda.

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  • 1
    Recuperado de http://portal.ufpel.edu.br
  • 2
    Pelotas é a quarta maior cidade do Rio Grande do Sul, com mais de 340.000 habitantes.
  • 3
    O clássico estudo “Capitalismo e Escravidão no Brasil Meridional”, do sociólogo e ex-Presidente Brasileiro Fernando Henrique Cardoso, foi realizado tendo a cidade de Pelotas como base para análise empírica (Cardoso, 2003Cardoso, F. H. (2003). Capitalismo e escravidão no Brasil meridional: O negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul(5. Ed.) Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.)
  • 4
    Revisões compreensivas e aplicações empíricas dos níveis de análise podem ser encontradas em Jones e McBeth (2010, p. 343-346), Shanahan et al. (2013, pp. 456-457), Kirkpatrick e Stoutenborough (2018) - sobre pesquisas no nível micro -, Ney (2014) - sobre conexões entre os níveis meso e macro - e Peterson (2018) - sobre inovações no nível macro.
  • 5
    Remanescentes das comunidades dos quilombos, caracterizados segundo critérios de autoatribuição: trajetória histórica própria, relações territoriais específicas, ancestralidade negra e resistência à escravidão (Decreto 4.887, 2003, Presidência da República do Brasil. Recuperado de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/D4887.htm).
  • 6
    Por exemplo, a Resolução 05/2017, do CONSUN, acolhe narrativas registradas na Ata 03/2017 (Recuperado de https://wp.ufpel.edu.br/scs/files/2017/04/ATA-03.2017-CONSUN.pdf), quando o Presidente da instituição nacional EDUCAFRO (Recuperado de https://www.educafro.org.br/site/) foi um dos representantes da coalizão local.
  • [Versão traduzida]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    01 Nov 2019
  • Aceito
    20 Ago 2020
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