Acessibilidade / Reportar erro

Abuso de Álcool após Síndrome Coronariana Aguda: Avaliação Prospectiva no Estudo ERICO

Resumos

Fundamento:

Alguns estudos identificaram que o abuso de álcool contribui para o desenvolvimento de doença cardiovascular, em particular doença arterial coronariana. Tal relação, no entanto, é controversa.

Objetivo:

Investigar a relação entre abuso de álcool após síndrome coronariana aguda (SCA) na Estratégia de Registro de Insuficiência Coronariana (ERICO).

Métodos:

146 participantes do ERICO responderam questionários estruturados e foram submetidos a avaliações laboratoriais nas condições basais e 30 dias e 180 dias após SCA. Aplicou-se o Questionário AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test) para avaliar o consumo prejudicial de álcool nos 12 meses anteriores à SCA (entrevista 30 dias após a SCA) e seis meses após a SCA.

Resultados:

As frequências de abuso de álcool foram 24,7% e 21,1% nos 12 meses anteriores à SCA e seis meses após, respectivamente. Os fatores de risco cardiovascular mais significativos associados com alto risco de abuso de álcool 30 dias após o evento agudo foram: sexo masculino (88,9%), tabagismo atual (52,8%) e hipertensão (58,3%). Seis meses após o evento agudo, os resultados mais significativos foram replicados em regressão logística para a associação de abuso de álcool e indivíduos mais jovens [35-44 anos, RC multivariada: 38,30 (IC 95%: 1,44-1012,56); e 45-54 anos, RC multivariada: 10,10 (IC 95%: 1,06-96,46)] e fumantes [fumantes atuais, RC multivariada: 51,09 (IC 95%: 3,49-748,01); e ex-fumantes, RC multivariada: 40,29 (IC 95%: 2,37-685,93)].

Conclusão:

Indivíduos com menos de 54 anos e fumantes apresentaram uma significativa relação com consumo prejudicial de álcool, a despeito do subtipo de SCA.


Background:

Some studies have indicated alcohol abuse as one of the contributors to the development of cardiovascular disease, particularly coronary heart disease. However, this relationship is controversial.

Objective:

To investigate the relationship between post-acute coronary syndrome (ACS) alcohol abuse in the Acute Coronary Syndrome Registry Strategy (ERICO Study).

Methods:

146 participants from the ERICO Study answered structured questionnaires and underwent laboratory evaluations at baseline, 30 days and 180 days after ACS. The Alcohol Use Disorders Identification Test (AUDIT) was applied to assess harmful alcohol consumption in the 12 months preceding ACS (30 day-interview) and six months after that.

Results:

The frequencies of alcohol abuse were 24.7% and 21.1% in the 12 months preceding ACS and six months after that, respectively. The most significant cardiovascular risk factors associated with high-risk for alcohol abuse 30 days after the acute event were: male sex (88.9%), current smoking (52.8%) and hypertension (58.3%). Six months after the acute event, the most significant results were replicated in our logistic regression, for the association between alcohol abuse among younger individuals [35-44 year-old multivariate OR: 38.30 (95% CI: 1.44-1012.56) and 45-54 year-old multivariate OR: 10.10 (95% CI: 1.06-96.46)] and for smokers [current smokers multivariate OR: 51.09 (95% CI: 3.49-748.01) and past smokers multivariate OR: 40.29 (95% CI: 2.37-685.93)].

Conclusion:

Individuals younger than 54 years and smokers showed a significant relation with harmful alcohol consumption, regardless of the ACS subtype.

Alcoholism; Acute Coronary Syndrome; Myocardial Infarction; Alcohol Drinking; Questionnaires


Introdução

A Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou recentemente que a prevalência da dependência de álcool pode chegar a 12% da população adulta. Em portadores de distúrbios mentais, a probabilidade de dependência de álcool pode ser pelo menos duas vezes maior do que aquela de indivíduos sem o distúrbio1World Health Organization (WHO). International guide for monitoring alcohol consumption and related harm. 2000 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf .
http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd...
. A carga não é distribuída de maneira igual entre os países. O consumo de álcool é o principal fator de risco para a carga de doença em países em desenvolvimento e o terceiro mais importante fator de risco nos países desenvolvidos1World Health Organization (WHO). International guide for monitoring alcohol consumption and related harm. 2000 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf .
http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd...
. É importante ressaltar que os padrões de consumo de álcool não foram associados apenas a desfechos agudos de saúde, como danos físicos2Greenfield TK. Individual risk of alcohol-related disease and problems. In: Heather N, Peters TJ, Stockwell T, eds. International handbook of alcohol dependence and problems - Part IV: drinking patterns and types of alcohol problem. Chichester: John Wiley & Sons Ltd; 2001.p.413-38.,3Rossow I, Amundsen A. Alcohol abuse and suicide: a 40-year prospective study of Norwegian conscripts. Addiction. 1995;90(5):685-91., mas também a doenças crônicas, como a doença arterial coronariana (DAC)4. Alguns estudos até identificam o abuso de álcool como fator contribuinte para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV), particularmente DAC4Britton A, McKee M. The relation between alcohol and cardiovascular disease in Eastern Europe: explaining the paradox. J Epidemiol Commun Health. 2000; 54(5):328-32.

Puddey IB, Rakic V, Dimmitt SB, Beilin LJ. Influence of pattern of drinking on cardiovascular disease and cardiovascular risk factors: a review. Addiction. 1999; 94 (5):649-63.

Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.

Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.

Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.
-9Corrao G, Rubbiati L, Bagnardi V, Zambon A, Poikolainen K. Alcohol and coronary heart disease: a meta-analysis. Addiction. 2000; 95(10): 1505-23.. Tal relação, no entanto, é controversa8Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.. Embora efeitos benéficos da ingestão moderada de álcool tenham sido descritos, o álcool pode tornar-se um fator de risco para DAC se seu padrão de consumo for caracterizado como do tipo “binge drinking” ou beber pesado episódico, definido como mais de cinco doses para os homens e quatro para as mulheres em uma única ocasião1World Health Organization (WHO). International guide for monitoring alcohol consumption and related harm. 2000 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf .
http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd...
,6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.

Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.

Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.
-9Corrao G, Rubbiati L, Bagnardi V, Zambon A, Poikolainen K. Alcohol and coronary heart disease: a meta-analysis. Addiction. 2000; 95(10): 1505-23..

Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, o álcool é também considerado fator de risco que contribui principalmente para a carga de outras doenças crônicas, como a cirrose hepática e vários tipos de câncer1World Health Organization (WHO). International guide for monitoring alcohol consumption and related harm. 2000 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf .
http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd...
.

Assim, este estudo teve por objetivo avaliar o consumo perigoso e prejudicial de álcool e os sintomas de dependência após 30 dias e 180 dias de um evento coronariano agudo em participantes do estudo ERICO (Estratégia de Registro de Insuficiência Coronariana)1010 Goulart AC, Santos IS, Sitnik D, Staniak HL, Fedeli LM, Pastore CA, et al. Design and baseline characteristics of a coronary heart disease prospective cohort: two-year experience from the strategy of registry of acute coronary syndrome study (ERICO study). Clinics (Sao Paulo). 2013; 68 (3):431-4..

Materiais e Métodos

Delineamento do estudo e população

Este sub-estudo avaliou o consumo perigoso e prejudicial de álcool e os sintomas de dependência em uma subamostra do estudo ERICO, uma coorte prospectiva, em andamento desde 2009, que incluiu potenciais participantes com SCA admitidos no Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU-USP), na cidade de São Paulo, Brasil1010 Goulart AC, Santos IS, Sitnik D, Staniak HL, Fedeli LM, Pastore CA, et al. Design and baseline characteristics of a coronary heart disease prospective cohort: two-year experience from the strategy of registry of acute coronary syndrome study (ERICO study). Clinics (Sao Paulo). 2013; 68 (3):431-4..

Após assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido, os pacientes com diagnóstico confirmado de SCA [infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST), infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (IAMSSST) ou angina instável (AI)] foram convidados a participar deste sub-estudo 30 dias após o evento agudo. Os critérios de elegibilidade foram: idade ≥ 18 anos, diagnóstico confirmado de SCA e habilidade para entender e falar português. O tratamento usual para SCA não mudou e os procedimentos atenderam aos padrões éticos aprovados pelo Conselho de Revisão Institucional do HU-USP.

Os critérios de exclusão tiveram por base um questionário de triagem psicológica elaborado a partir da Entrevista Clínica Estruturada para transtornos mentais (Structured Clinical Interview for DSM Disorders - SCID-I)1111 Spitzer MB, Robert L, Gibbon M, Gibbons W, Janet BW. Structured clinical interview for DSM-IV-TR Axis I Disorders, Research Version, Non-patient Edition. (SCID-I/NP). New York: Biometrics Research/ New York State Psychiatric Institute;2002. [cited 2013 August 21]. Available from: http://www.scid4.org/index.html .
http://www.scid4.org/index.html...
, para identificar indivíduos com distúrbios psicóticos, esquizofrenia ou distúrbio bipolar, e ainda um teste baseado no Mini-Exame do Estado Mental (MMSE)1212 Lourenço RA, Veras RP. Mini mental State Examination: psychometric characteristics in elderly outpatients. Rev Saude Publica. 2006; 40(4):712-9., para excluir os indivíduos com comprometimento cognitivo ou demência 30 dias após o evento agudo.

Seguimentos de 30 dias e 180 dias

Todos os participantes que atendiam aos critérios de elegibilidade responderam ao questionário e foram submetidos a avaliações clínicas e laboratoriais, incluindo avaliação para depressão usando a versão brasileira-portuguesa do Questionário sobre a Saúde do Paciente (PHQ-9), composto de nove questões para avaliar humor depressivo e anedonia, baseado na quarta edição do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM-IV). O PHQ-9 atribui pontos a cada um dos nove critérios DSM-IV [de “0” (nunca) a “3” (quase todos os dias)], variando o escore total de 0 a 27, tendo sido aplicado neste estudo nas condições basais, e 30 dias e 180 dias após a SCA1313 Kroenke K, Spitzer RL, Williams JBW. The PHQ-9 Validity of a brief depression severity measure. J Gen Intern Med.2001;16(9):606-13.,1414 Osório FL, Mendes AV, Crippa A, Loureiro SR. Study of the discriminative validity of the PHQ-9 and PHQ-2 in a sample of Brazilian women in the context of primary health care. Perspect Psychiatr Care. 2009; 45(3): 216-27..

Além disso, o consumo perigoso e prejudicial de álcool e os sintomas de dependência foram avaliados usando-se o Questionário AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test) para identificação de problemas relacionados ao uso de álcool em uma entrevista pessoal e outra telefônica, 30 dias e 180 dias após a SCA, respectivamente1515 Lima CT, Freire ACC, Silva AP, Teixeira RM, Farrell M ,Prince M. Concurrent and construct validity of the AUDIT in an urban Brazilian sample. Alcohol. 2005; 40 (6): 584-9.. É importante ressaltar que, 30 dias após a SCA, os participantes foram perguntados sobre abuso de álcool nos últimos 12 meses, e, na entrevista 180 dias após a SCA, foram perguntados sobre mudanças em seus padrões de consumo de álcool nos seis meses seguintes à SCA.

Definição da síndrome coronariana aguda

Definiu-se infarto do miocárdio (IM) como a presença de sintomas consistentes com isquemia cardíaca nas 24 horas anteriores à chegada ao hospital e níveis de troponina I acima do percentil 99, com coeficiente de variação teste-específico <10%1616 Luepker RV, Apple FS, Christenson RH, Crow RS, Fortmann SP, Goff D ,et al. Case definitions for acute coronary heart disease in epidemiology and clinical research studies: a statement from the AHA Council on Epidemiology and Prevention; AHA Statistics Committee; World Heart Federation Council on Epidemiology and Prevention; the European Society of Cardiology Working Group on Epidemiology and Prevention; Centers for Disease Control and Prevention; and the National Heart, Lung, and Blood Institute. Circulation. 2003;108(20):2543-9.,1717 Thygesen K, Alpert JS, White HD, Joint ESC/ACCF/AHA/WHF Task Force for the Redefinition of Myocardial Infarction. Universal definition of myocardial infarction. Eur Heart J. 2007;28 (20):2525-38.. Definiu-se IAMCSST como a presença de critérios de IM mais um dos seguintes: (a) supradesnivelamento do segmento ST persistente ≥ 1 mm em duas derivações eletrocardiográficas ou (b) a presença de um novo ou presumivelmente novo bloqueio de ramo esquerdo. Definiu‑se IAMSSST como a presença de critérios de IM, mas não de IAMCSST. O diagnóstico de AI requereu a presença de sintomas consistentes com isquemia cardíaca nas 24 horas anteriores à admissão hospitalar, ausência de critérios de IM e pelo menos um dos seguintes: (a) história de DAC; (b) teste de estratificação positivo para DAC (invasivo ou não); (c) alterações transitórias do segmento ST ≥ 0,5 mm em duas derivações contíguas, nova inversão da onda T ≥ 1 mm, e/ou pseudonormalização de ondas T previamente invertidas; (d) troponina I > 0,4 ng/ml (que garante um nível de troponina I acima do percentil 99 a despeito do kit usado); ou (e) concordância diagnóstica de dois médicos independentes.

Definição de abuso de álcool

Com base no escore AUDIT que varia de 1 a 40, consideraram-se os seguintes pontos de corte para a análise principal: ≤ 7, consumo de álcool de baixo risco; e ≥ 8, abuso de álcool de alto risco1818 Lykouras L, Rontos I, Rontos K, Katsaras A, Markoulis T, Papasteriades E, et al. Detecting alcohol-related problems among general hospital patients with heart disease. Psychother Psychosom.2001;70(1): 25-9.

19 Mendoza-Sassi RA, Béria JU. Prevalence of alcohol use disorders and associated factors: A population-based study using AUDIT in southern Brazil. Addiction. 2003; 98(6):799-804.
-2020 Barbor FT, Higgins-Biddle JC, Saunders JB, Monteiro MG. AUDIT: The Alcohol use disorder identification test. Guidelines for use in primary care. 2nd ed. Washington (DC):World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Dependence. 2001 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd...
.

Na análise secundária, avaliou-se o AUDIT nos seguintes três domínios:

  1. Consumo perigoso de álcool (1-7 pontos) - caracterizado como um padrão que aumenta o risco de consequências prejudiciais para o usuário e/ou outros. Esses padrões são importantes em saúde pública, a despeito da ausência de qualquer distúrbio atual no usuário;

  2. Consumo prejudicial de álcool (8-19 pontos) – refere‑se ao consumo de álcool que possa resultar em consequências para a saúde física e mental. Alguns também consideram as consequências sociais do dano causado pelo álcool;

  3. Sintomas de dependência de álcool (≥ 20 pontos) - um grupo de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos, que podem se desenvolver após uso repetido de álcool. Tipicamente, tais fenômenos incluem um forte desejo de consumir álcool, comprometimento do controle de seu uso, beber persistente, a despeito das consequências prejudiciais, maior prioridade dada ao consumo do que a outras atividades e obrigações, aumento da tolerância ao álcool e uma reação física de abstinência ao se descontinuar o uso da substância1818 Lykouras L, Rontos I, Rontos K, Katsaras A, Markoulis T, Papasteriades E, et al. Detecting alcohol-related problems among general hospital patients with heart disease. Psychother Psychosom.2001;70(1): 25-9.

    19 Mendoza-Sassi RA, Béria JU. Prevalence of alcohol use disorders and associated factors: A population-based study using AUDIT in southern Brazil. Addiction. 2003; 98(6):799-804.
    -2020 Barbor FT, Higgins-Biddle JC, Saunders JB, Monteiro MG. AUDIT: The Alcohol use disorder identification test. Guidelines for use in primary care. 2nd ed. Washington (DC):World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Dependence. 2001 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
    http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd...
    .

Dois psicólogos treinados administraram todos os questionários durante o seguimento.

Análise estatística

As características basais dos participantes, incluindo os subtipos de SCA, foram classificadas de acordo com os sintomas de abuso de álcool avaliados pelo Questionário AUDIT, com os seguintes pontos de corte sugeridos na literatura1919 Mendoza-Sassi RA, Béria JU. Prevalence of alcohol use disorders and associated factors: A population-based study using AUDIT in southern Brazil. Addiction. 2003; 98(6):799-804.

20 Barbor FT, Higgins-Biddle JC, Saunders JB, Monteiro MG. AUDIT: The Alcohol use disorder identification test. Guidelines for use in primary care. 2nd ed. Washington (DC):World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Dependence. 2001 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd...
-2121 Viana CM, Andrade HL. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset of psychiatric disorders in the São Paulo Metropolitan Area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34(3):249-60.: ≤ 7, consumo de álcool de baixo risco; e ≥ 8, dependência ou abuso de álcool de alto risco1818 Lykouras L, Rontos I, Rontos K, Katsaras A, Markoulis T, Papasteriades E, et al. Detecting alcohol-related problems among general hospital patients with heart disease. Psychother Psychosom.2001;70(1): 25-9.

19 Mendoza-Sassi RA, Béria JU. Prevalence of alcohol use disorders and associated factors: A population-based study using AUDIT in southern Brazil. Addiction. 2003; 98(6):799-804.
-2020 Barbor FT, Higgins-Biddle JC, Saunders JB, Monteiro MG. AUDIT: The Alcohol use disorder identification test. Guidelines for use in primary care. 2nd ed. Washington (DC):World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Dependence. 2001 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd...
. Além disso, as características basais foram classificadas de acordo com os domínios do AUDIT (consumo perigoso de álcool, consumo prejudicial de álcool e sintomas de dependência de álcool).

As variáveis categóricas foram analisadas pelo teste do qui‑quadrado, enquanto as contínuas, pelos testes t de Student ou de Mann-Whitney, dependendo de sua distribuição. Além disso, realizou-se regressão logística multivariada ajustada para potenciais confundidores (ou que tivessem um valor de p < 0,2 na análise univariada) identificados aos 30 dias para avaliar as razões de chance (RC) com intervalos de confiança (IC) a 95% para a possível associação de alguns fatores de risco cardiovascular (FRCV) clássicos com o abuso de álcool 180 dias após o evento agudo. Todos os testes com valor de p < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos. O programa SPSS, versão 19.0, foi usado para as análises estatísticas.

Resultados

Casuística

Dos 225 pacientes com diagnóstico confirmado de SCA (IAMCSST, IAMSSST ou AI) e incluídos no estudo principal, 146 (64,9%) foram arrolados no presente sub-estudo. Aos 180 dias, 142 (63%) foram avaliados, tendo quatro morrido no período.

As razões para não inclusão neste estudo foram morte precoce (16/225, 7,1%) nos primeiros 30 dias e ultrapassagem do tempo limite para a entrevista (63/209, 30,1%).

Avaliação do abuso de álcool durante o seguimento

Seguimento de 30 dias

As características basais de todos os 146 participantes do estudo principal foram descritas de acordo com o abuso de álcool, tendo por base a informação obtida do AUDIT (Tabela 1) em uma entrevista pessoal 30 dias após a SCA. A frequência do abuso de álcool foi 24,7% no primeiro período, refletindo o padrão de consumo nos 12 meses anteriores à SCA.

Tabela 1
Características basais de 146 participantes do sub-estudo de abuso/dependência de álcool do estudo ERICO, de acordo com a presença de consumo prejudicial de álcool 30 dias após evento coronariano agudo

A média do escore AUDIT global foi 4,8, sendo maior nos homens do que nas mulheres (6,3 vs. 2,0, p ≤ 0,001). Além disso, a frequência de abuso de álcool (escore ≥ 8) foi maior nos homens do que nas mulheres (88,9% vs. 11,1%, p = 0001) e nos fumantes atuais em comparação aos ex-fumantes e não fumantes (52,8% vs. 38,9% vs. 8,3%, p = 0,004) e pacientes hipertensos (58,3%, p = 0,03) (Tabela 1). Interessante notar que a amostra com abuso de álcool sugerida pelo AUDIT mostrou uma frequência estatisticamente mais baixa de FRCV clássicos, como dislipidemia, diabetes e sedentarismo, se comparada à de indivíduos sem abuso de álcool, mas sem significado estatístico (Tabela 1). A frequência do abuso de álcool não diferiu entre os subtipos de SCA durante o seguimento (Figura 1).

Figura 1
Consumo de álcool sugestivo de abuso de álcool detectado pelo AUDIT em subamostra do estudo ERICO. AI: angina instável; IAMCSST: infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST; IAMSSST: infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST

Aos 30 dias, associações estatisticamente significativas foram observadas entre os aspectos sociodemográficos e FRCV e cada item dos domínios do AUDIT, exceto para as questões 7 (“Sentimento de culpa após beber”) e 8 (“Esquecimentos após o uso”) do domínio “Consumo prejudicial de álcool”. Em geral, alta frequência de respostas positivas foi observada entre homens e fumantes (Tabela 2). É interessante notar mais altas frequências de respostas positivas para a questão 5 (“Aumento da importância da bebida”) do domínio “Sintomas de dependência” entre indivíduos com IAMCSST em comparação aos demais subtipos de SCA (Tabela 2). Maiores frequências de respostas positivas foram ainda observadas nos participantes com hipertensão, diabetes, dislipidemia e estilo de vida sedentário em comparação àqueles sem tais comorbidades nos três domínios, em particular no domínio “Sintomas de dependência” e “Consumo prejudicial de álcool” (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição de respostas positivas de acordo com as características basais e domínios do AUDIT 30 dias após evento coronariano agudo na subamostra de 146 participantes do estudo ERICO

Seguimento de 180 dias

Seis meses após o evento agudo, observou-se leve redução na frequência de abuso de álcool, que foi 21,1% entre os 142 sobreviventes ao final do seguimento. Além disso, a média do escore AUDIT foi quase a mesma (3,8) para toda a amostra, sendo a seguinte por sexo: homens, 5,1; e mulheres, 1,6. Os resultados mais significativos observados aos 30 dias foram replicados na nossa regressão logística após 180 dias, para associação de abuso de álcool e indivíduos mais jovens [35-44 anos, RC multivariada: 38,30 (IC 95%: 1,44-1012,56); e 45‑54 anos, RC multivariada: 10,10 (IC 95%: 1,06-96,46)] e fumantes [fumantes atuais, RC multivariada: 51,09 (IC 95%: 3,49-748,01); e ex-fumantes, RC multivariada: 40,29 (IC 95%: 2,37-685,93)] (Tabela 3).

Tabela 3
Fatores associados a abuso/dependência de álcool avaliados por logística regressão do resultado do AUDIT em 142 participantes do estudo ERICO 180 dias após o evento coronariano agudo

Depressão versus abuso de álcool durante o seguimento

Nesta subamostra, não se observou associação estatística entre depressão e uso de álcool após análise multivariada durante o seguimento.

Análises de sensibilidade

Em análises adicionais, comparamos os participantes do estudo ERICO que foram excluídos (79) ou não completaram todo o seguimento (quatro mortes entre 30 e 180 dias após o evento agudo) com aqueles que completaram o seguimento de 180 dias (142). Os indivíduos que foram seguidos por seis meses após o evento agudo neste sub-estudo tinham um nível de escolaridade mais elevado (9-11 anos de educação formal: 59,9% vs. 56,1, p = 0,04), e a maioria era de etnia autorrelatada branca ou parda (96,4% vs. 89%, p = 0,03) e tinha um estilo de vida mais sedentário (63,8% vs. 81,5%, p = 0,006) do que aqueles não seguidos (Tabela 4). Além disso, comparando‑se os participantes deste sub‑estudo de abuso de álcool (146) com a população do estudo ERICO (820), os primeiros apresentavam um nível de escolaridade mais elevado (≥ 11 anos de educação formal: 12,3% vs. 6,8%, p = 0,02) sendo, em sua maioria, casados (69,2% vs. 59,6%, p = 0,03). Além disso, as frequências de diabetes (30,8% vs. 41,2%, p = 0,02) e de estilo de vida sedentário (64,8% vs. 73,0%, p = 0,05) foram mais baixas do que as encontradas na população do estudo ERICO. Finalmente, detectou-se uma alta proporção de IAMCSST (36,3% vs. 26,5%, p = 0,02) neste sub-estudo (Tabela 5).

Tabela 4
Comparação das características basais de 142 indivíduos do sub-estudo de abuso de álcool do estudo ERICO, 180 dias após SCA, e de 83 indivíduos não acompanhados
Tabela 5
Comparação das características basais de 146 participantes do sub-estudo de abuso de álcool e da população do estudo ERICO

Discussão

Este sub-estudo mostrou que três de cada dez pacientes apresentavam alto risco para abuso de álcool. A frequência de abuso de álcool foi de 24,7% aos 30 dias após SCA, diminuindo 4% após seis meses. Como esperado, maior frequência de abuso de álcool foi observada nos homens, indivíduos mais jovens e fumantes.

Dados de um estudo brasileiro de base populacional, o São Paulo Megacity Mental Health Survey, realizado com 5.037 indivíduos na cidade de São Paulo, relatou uma prevalência global de abuso de álcool ao longo da vida de 9,8%. Em uma análise estratificada por sexo, observou-se maior prevalência de abuso de álcool entre os homens (16,4% vs. 4,0%) com base no DSM-VI e no WHO-Composite International Diagnostic Interview (WMH-CIDI)2121 Viana CM, Andrade HL. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset of psychiatric disorders in the São Paulo Metropolitan Area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34(3):249-60..

Outro estudo brasileiro de base hospitalar avaliou 345 portadores de SCA (206 com IM e 139 com AI) quanto a fatores sociodemográficos e tabagismo, depressão (PrimeMD e Inventário de Depressão de Beck - BDI) e ansiedade (State‑Trait Anxiety Inventory for Adults - STAI), e consumo de álcool (AUDIT). O estudo relatou escores AUDIT mais baixos para ambos os sexos em comparação aos nossos. À semelhança dos nossos achados, aquele estudo não encontrou qualquer associação entre consumo de álcool e depressão2222 Perez GH, Nicolau JC, Romano BW, Laranjeira R. Depression and acute coronary syndromes: gender-related differences. Arq Bras Cardiol. 2005:85:319-26..

Com relação aos FRCV, os participantes com maior risco de abuso de álcool tiveram maior frequência de tabagismo e menores frequências de hipertensão, dislipidemia, diabetes e sedentarismo quando comparados àqueles com menor risco. No entanto, analisando-se cada item separadamente, associações significativas foram observadas com alguns comportamentos de “binge drinking” nos domínios do AUDIT, tais como “aumento da importância da bebida” e “beber pela manhã”, e ainda com tabagismo, sedentarismo, hipertensão, diabetes e até o subtipo de SCA. Após seis meses, alto risco de abuso de álcool permaneceu entre indivíduos mais jovens (≤ 54 anos) e fumantes.

A relação entre consumo de álcool e DCV, particularmente DAC, é controversa4Britton A, McKee M. The relation between alcohol and cardiovascular disease in Eastern Europe: explaining the paradox. J Epidemiol Commun Health. 2000; 54(5):328-32.

Puddey IB, Rakic V, Dimmitt SB, Beilin LJ. Influence of pattern of drinking on cardiovascular disease and cardiovascular risk factors: a review. Addiction. 1999; 94 (5):649-63.

Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.

Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.

Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.
-9Corrao G, Rubbiati L, Bagnardi V, Zambon A, Poikolainen K. Alcohol and coronary heart disease: a meta-analysis. Addiction. 2000; 95(10): 1505-23.,2323 Ronksley PE, Brien SE, Turner BJ, Mukamal KJ, Ghali WA. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2011;342:d671..

Alguns estudos sugeriram que um consumo de álcool leve a moderado possa ter um impacto favorável na morbimortalidade por cardiopatia isquêmica6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.

Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.
-8Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.. No entanto, o efeito cardioprotetor da bebida desaparece com o consumo pesado (padrão “binge drinking”)6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.

Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.
-8Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.. Russel e col.6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31. testaram um modelo linear de dose‑resposta para a associação entre padrões de consumo e IM6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.. Um menor risco de IM associou-se com o consumo de menos de 4,55 doses por dia para homens (IC 95%: 2,77 – 7,18) e menos de 3,08 doses por dia para mulheres (IC 95%: 1,35 – 5,16), e esse risco aumentou quando tais pontos de corte eram excedidos. O risco de IM aumentou com a duplicação das doses, a despeito do sexo6Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31..

O estudo PRIME (Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction) investigou o efeito dos padrões de consumo de álcool na cardiopatia isquêmica para a Irlanda do Norte e a França em 9.778 homens com idade entre 50 e 59 anos, sem cardiopatia isquêmica nas condições basais, durante 10 anos7Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.. Após análise multivariada para os FRCV clássicos e o centro, as razões de risco para eventos coronarianos duros (IM incidente e morte coronariana) em comparação com usuários regulares de álcool foram 1,97 (IC 95%: 1,21 – 3,22) para o padrão “binge drinking”, 2,03 (IC 95%: 1,41 – 2,94) para os que nunca bebem, e 1,57 (IC 95%: 1,11 – 2,21) para antigos usuários para toda a coorte. Apenas o vinho associou-se a um risco menor para eventos coronarianos duros, a despeito do país7Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077..

Uma revisão sistemática, incluindo mais de 4.000 estudos e investigando a relação entre consumo de álcool e alguns desfechos de DCV, descreveu um efeito de dose-resposta demonstrado pelo mais baixo risco de mortalidade por DAC com uma a duas doses por dia2323 Ronksley PE, Brien SE, Turner BJ, Mukamal KJ, Ghali WA. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2011;342:d671..

Outra revisão sistemática incluindo 44 estudos observacionais (caso-controle ou coorte) relatou um risco relativo de consumo de álcool em relação ao risco de cardiopatia isquêmica. As análises incluíram 957.684 participantes, tendo‑se encontrado substancial heterogeneidade de estudos, o que dificultou a confirmação de qualquer efeito cardioprotetor do uso de álcool na cardiopatia isquêmica para todos os usuários, mesmo em baixos níveis de consumo8Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60..

A fisiopatologia dos efeitos cardioprotetores da maioria das bebidas alcoólicas pode dever-se a uma elevação na lipoproteína de alta densidade e à capacidade de o álcool evitar a agregação plaquetária e aumentar a fibrinólise; um efeito favorável aumentado pelo vinho tinto2424 Constant J. Alcohol, ischemic heart disease, and the French paradox. Coron Artery Dis. 1997;8(10):645-9..

Limitações

O consumo de álcool não foi avaliado com um questionário alimentar específico. No entanto, usou-se um instrumento muito confiável para triar o abuso/dependência de álcool1616 Luepker RV, Apple FS, Christenson RH, Crow RS, Fortmann SP, Goff D ,et al. Case definitions for acute coronary heart disease in epidemiology and clinical research studies: a statement from the AHA Council on Epidemiology and Prevention; AHA Statistics Committee; World Heart Federation Council on Epidemiology and Prevention; the European Society of Cardiology Working Group on Epidemiology and Prevention; Centers for Disease Control and Prevention; and the National Heart, Lung, and Blood Institute. Circulation. 2003;108(20):2543-9.. No presente estudo, dois psicólogos bem treinados e experientes entrevistaram nossos pacientes. A presença de um psiquiatra durante o estudo, no entanto, poderia ter contribuído para detectar novos casos de abuso de álcool ou até depressão.

Descobrimos algumas significativas diferenças na frequência de alguns fatores sociodemográficos, como nível de escolaridade, etnia autorrelatada e estado civil, assim como alguns FRCV, como diabetes e sedentarismo, comparando‑se participantes do sub-estudo de abuso de álcool com não participantes. Importante notar que a maioria dessas características está muito sujeita ao viés da memória e não interferiu no padrão de abuso de álcool nas nossas principais análises.

Além disso, a extensão de generalização de tais achados é limitada devido ao pequeno tamanho da amostra de um único centro. Assim, não se pode descartar a possibilidade de viés de seleção.

Conclusões

Encontramos alta frequência de abuso de álcool, que permaneceu por seis meses, a despeito da SCA. Evidenciou‑se perigoso consumo de álcool entre indivíduos mais jovens (35-54 anos) e fumantes. No presente estudo, o padrão de consumo “binge drinking” foi observado entre fumantes, indivíduos com estilo de vida sedentário, hipertensão, diabetes e IAMCSST.

  • Fontes de financiamento
    O presente estudo foi financiado por FAPESP.
  • Vinculação acadêmica
    Este artigo é parte da Dissertação de Mestrado de Abner Morilha pela Universidade de São Paulo (USP).

References

  • 1
    World Health Organization (WHO). International guide for monitoring alcohol consumption and related harm. 2000 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf .
    » http://whqlibdoc.who.int/hq/2000/who_msd_msb_00.4.pdf
  • 2
    Greenfield TK. Individual risk of alcohol-related disease and problems. In: Heather N, Peters TJ, Stockwell T, eds. International handbook of alcohol dependence and problems - Part IV: drinking patterns and types of alcohol problem. Chichester: John Wiley & Sons Ltd; 2001.p.413-38.
  • 3
    Rossow I, Amundsen A. Alcohol abuse and suicide: a 40-year prospective study of Norwegian conscripts. Addiction. 1995;90(5):685-91.
  • 4
    Britton A, McKee M. The relation between alcohol and cardiovascular disease in Eastern Europe: explaining the paradox. J Epidemiol Commun Health. 2000; 54(5):328-32.
  • 5
    Puddey IB, Rakic V, Dimmitt SB, Beilin LJ. Influence of pattern of drinking on cardiovascular disease and cardiovascular risk factors: a review. Addiction. 1999; 94 (5):649-63.
  • 6
    Russell M, Chul Chu B, Banerjee A, Fan AZ, Trevisan M, Dorn JM et al. Drinking Patterns and Myocardial Infarction: A Linear Dose-Response Model. Alcohol Clin Exp Res. 2009; 33(2): 324-31.
  • 7
    Ruidavets JB, Ducimetière P, Evans A, Montaye M, Haas B, Bingham A, et al. Patterns of alcohol consumption and ischaemic heart disease in culturally divergent countries: the Prospective Epidemiological Study of Myocardial Infarction (PRIME).BMJ. 2010; 341: c6077.
  • 8
    Roerecke M, Rehm J. The cardioprotective association of average alcohol consumption and ischaemic heart disease: a systematic review and meta-analysis. Addiction. 2012; 107(7): 1246-60.
  • 9
    Corrao G, Rubbiati L, Bagnardi V, Zambon A, Poikolainen K. Alcohol and coronary heart disease: a meta-analysis. Addiction. 2000; 95(10): 1505-23.
  • 10
    Goulart AC, Santos IS, Sitnik D, Staniak HL, Fedeli LM, Pastore CA, et al. Design and baseline characteristics of a coronary heart disease prospective cohort: two-year experience from the strategy of registry of acute coronary syndrome study (ERICO study). Clinics (Sao Paulo). 2013; 68 (3):431-4.
  • 11
    Spitzer MB, Robert L, Gibbon M, Gibbons W, Janet BW. Structured clinical interview for DSM-IV-TR Axis I Disorders, Research Version, Non-patient Edition. (SCID-I/NP). New York: Biometrics Research/ New York State Psychiatric Institute;2002. [cited 2013 August 21]. Available from: http://www.scid4.org/index.html .
    » http://www.scid4.org/index.html
  • 12
    Lourenço RA, Veras RP. Mini mental State Examination: psychometric characteristics in elderly outpatients. Rev Saude Publica. 2006; 40(4):712-9.
  • 13
    Kroenke K, Spitzer RL, Williams JBW. The PHQ-9 Validity of a brief depression severity measure. J Gen Intern Med.2001;16(9):606-13.
  • 14
    Osório FL, Mendes AV, Crippa A, Loureiro SR. Study of the discriminative validity of the PHQ-9 and PHQ-2 in a sample of Brazilian women in the context of primary health care. Perspect Psychiatr Care. 2009; 45(3): 216-27.
  • 15
    Lima CT, Freire ACC, Silva AP, Teixeira RM, Farrell M ,Prince M. Concurrent and construct validity of the AUDIT in an urban Brazilian sample. Alcohol. 2005; 40 (6): 584-9.
  • 16
    Luepker RV, Apple FS, Christenson RH, Crow RS, Fortmann SP, Goff D ,et al. Case definitions for acute coronary heart disease in epidemiology and clinical research studies: a statement from the AHA Council on Epidemiology and Prevention; AHA Statistics Committee; World Heart Federation Council on Epidemiology and Prevention; the European Society of Cardiology Working Group on Epidemiology and Prevention; Centers for Disease Control and Prevention; and the National Heart, Lung, and Blood Institute. Circulation. 2003;108(20):2543-9.
  • 17
    Thygesen K, Alpert JS, White HD, Joint ESC/ACCF/AHA/WHF Task Force for the Redefinition of Myocardial Infarction. Universal definition of myocardial infarction. Eur Heart J. 2007;28 (20):2525-38.
  • 18
    Lykouras L, Rontos I, Rontos K, Katsaras A, Markoulis T, Papasteriades E, et al. Detecting alcohol-related problems among general hospital patients with heart disease. Psychother Psychosom.2001;70(1): 25-9.
  • 19
    Mendoza-Sassi RA, Béria JU. Prevalence of alcohol use disorders and associated factors: A population-based study using AUDIT in southern Brazil. Addiction. 2003; 98(6):799-804.
  • 20
    Barbor FT, Higgins-Biddle JC, Saunders JB, Monteiro MG. AUDIT: The Alcohol use disorder identification test. Guidelines for use in primary care. 2nd ed. Washington (DC):World Health Organization, Department of Mental Health and Substance Dependence. 2001 [cited 2013 August 21]. Available from: http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
    » http://whqlibdoc.who.int/hq/2001/who_msd_msb_01.6a.pdf
  • 21
    Viana CM, Andrade HL. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset of psychiatric disorders in the São Paulo Metropolitan Area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34(3):249-60.
  • 22
    Perez GH, Nicolau JC, Romano BW, Laranjeira R. Depression and acute coronary syndromes: gender-related differences. Arq Bras Cardiol. 2005:85:319-26.
  • 23
    Ronksley PE, Brien SE, Turner BJ, Mukamal KJ, Ghali WA. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2011;342:d671.
  • 24
    Constant J. Alcohol, ischemic heart disease, and the French paradox. Coron Artery Dis. 1997;8(10):645-9.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Jul 2014
  • Revisado
    18 Nov 2014
  • Aceito
    26 Dez 2014
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br