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Adaptação cultural para o Brasil da escala Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD* * Extraído da dissertação "Tradução e Adaptação Cultural para o Brasil da escala Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD", Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal de São Carlos, 2013.

Resumos

Objetivo: Traduzir e adaptar culturalmente para o Brasil a escala Pain Assessment inAdvanced Dementia(PAINAD). Método: O processo de adaptação cultural do instrumento seguiu a metodologia de um referencial teórico, realizada em cinco etapas: tradução para o português brasileiro, versão consensual das traduções, retrotradução para o idioma original, revisão por um comitê de especialistas na área do instrumento e pré-teste de equivalência. Na última etapa o instrumento foi avaliado e aplicado por 27 profissionais da saúde. Resultados: A Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada foi adaptada culturalmente para o Brasil e apresentou equivalência semântica com o original, além de clareza, aplicabilidade e fácil compreensão dos itens do instrumento. Conclusão: Este processo permitiu assegurar as propriedades psicométricas como confiabilidade e validade de conteúdo da referida escala.


Medição da dor
; Demência; Estudos de validação



Objective: To translate and culturally adapt to Brazil the scale Pain Assessment inAdvanced Dementia(PAINAD).Method: The cultural adaptation process followed the methodology of a theorical reference, in five steps: translation to Brazilian Portuguese, consensual version of translations, back-translation to the original language, revision by a committee of specialists in the field and a equivalency pre-test. The instrument was assessed and applied by 27 health professionals in the last step. Results: The Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada was culturally adapted to Brazil and presented semantic equivalency to the original, besides clarity, applicability and easy comprehension of the instrument items. Conclusion: This process secured the psychometric properties as the reliability and content validity of the referred scale.


Pain measurement
; Dementia; Validation studies



Objetivo:Traducir y adaptar culturalmente para Brasil la escala Pain Assessment in Advanced Dementia(PAINAD). Método: El proceso de adaptación cultural del instrumento utilizó la metodología de un referencial teórico, realizada en cinco etapas: traducción para el portugués - brasileño, versión consensual de las traducciones, retro-traducción para el idioma original, revisión por un comité de expertos en el área del instrumento y prueba piloto de equivalencia. En la última etapa, el instrumento fue evaluado y aplicado por 27 profesionales de la salud. Resultados: La Escala de Evaluación del Dolor en Demencia Avanzada fue adaptada culturalmente para Brasil y mostró equivalencia semántica con la original, así como claridad, aplicabilidad y fácil comprensión de los elementos del instrumento. Conclusión: Este proceso garantizó las propiedades psicométricas tales como confiabilidad y la validez de contenido de esa escala.


Dimensión del dolor
; Demencia; Estudios de validación



Introdução

No processo demencial as pessoas podem deixar de interpretar sensações, como as dolorosas, muitas vezes por não serem capazes de recordar a sua dor ou por não serem capazes de comunicar verbalmente aos seus cuidadores, o que torna mais difícil sua detecção e mensuração, caracterizando sua avaliação como um problema a ser considerado nesses pacientes(101 1.Horgas AL. Assessing pain in older adults with dementia. New York: University College of Nursing; 2007

02 2.Horgas AL, Elliott AF, Marsiske M. Pain assessment in persons with dementia: relationship between self-report and behavioral observation. J Am Geriatr Soc. 2009;57(1):126-32
-303 3.Lorenzet IC, Santos FC, Souza PMR, Gambarro RC, Coelho S, Cendoroglo MS. Avaliação da dor em idosos com demência: tradução e adaptação transcultural do instrumento PACSLAC para a língua portuguesa. Rev Bras Med. 2011;68(4):129-33).

No entanto, nos processos demenciais graves, expressões não verbais e mudanças de comportamento tornam-se mais frequentes. As alterações comportamentais em pacientes com demência grave frequentemente são entendidas como sintomas da doença de base, quando podem ser uma manifestação de dor(303 3.Lorenzet IC, Santos FC, Souza PMR, Gambarro RC, Coelho S, Cendoroglo MS. Avaliação da dor em idosos com demência: tradução e adaptação transcultural do instrumento PACSLAC para a língua portuguesa. Rev Bras Med. 2011;68(4):129-33). Nestes casos, retraimento social, agressão, agitação psicomotora ou mudanças de humor podem ser manifestações da presença de dor(404 4.Herr K. Pain assessment strategies in older patients. J Pain. 2011;12(3 Suppl 1):S3-S13).

O manejo inadequado da dor em pessoas com demência grave é frequentemente atribuído às dificuldades inerentes para sua avaliação(505 5.Horgas AL, Elliott AF. Pain assessment and management in persons with dementia. Nurs Clin North Am.2004;39(3):593-606). Os achados apontam para as dificuldades entre os profissionais da saúde de reconhecimento da dor e da sua avaliação em idosos com comprometimento cognitivo(606 6.McAuliffe L, Nay R, O’Donnell M, Fetherstonhaugh D. Pain assessment in older people with dementia: literature review. J Adv Nurs. 2009;65(1):2-10).

Frente a essa realidade, estudiosos têm buscado soluções para o melhor manejo da dor nesta fragilizada população, encontrando-as na elaboração de instrumentos de medida específicos, com base na observação de comportamentos que permitem identificar e avaliar a dor em pacientes não comunicativos(404 4.Herr K. Pain assessment strategies in older patients. J Pain. 2011;12(3 Suppl 1):S3-S13). No cenário clínico a avaliação por meio de instrumento é fundamental para a identificação de intervenções e para a avaliação da eficácia das estratégias escolhidas, evitando assim a subjetividade e possibilitando adequado controle da dor(707 7.Nascimento LA, Kreling MCGD. Avaliação da dor como quinto sinal vital: opinião de profissionais de enfermagem. Acta Paul. Enferm. 2011;24(1):50-4).

Na literatura mundial foram encontrados doze instrumentos que se propõem a avaliar a dor em pessoas com demência grave publicados até o ano de 2013, sendo eles: Abbey Pain Scale(808 8.Abbey J, Piller N, De Bellis A, Esterman A, Parker D, Giles L, et al. The Abbey pain scale: a 1-minute numerical indicator for people with end-stage dementia. Int J Palliat Nurs. 2004;10(1):6-13); CNPI – Checklist of Nonverbal Pain Behaviors(909 9.Feldt KS. The checklist of nonverbal pain indicators (CNPI). Pain Manag Nurs. 2000; 1(1):13-21), CPAT – Certified Nursing Assistant Pain Assessment Tool(1010.Cervo FA, Raggi RP, Bright-Long LE, Wright WK, Rows G, Torres AE, et al. Use of the Certified Nursing Assistant Pain Assessment Tool (CPAT) in nursing home residents with dementia. Am J Alzheimers Dis Other Demen. 2007;22(2):112-9); DOLOPLUS-2(1111.Lefebvre-Chapiro S. The DOLOPLUS® -2 scale: evaluating pain in the elderly. Eur J Palliat Care. 2001;8(5):191-4); MPS – Mahoney Pain Scale(1212.Mahoney AEJ, Peters L. The Mahoney Pain Scale: examining pain and agitation in advanced dementia. Am J Alzheimers Dis Other Demen. 2008;23(3):250-61); MOBID – Mobilization-Observation-Behavior-Intensity-Dementia Pain Scale(1313.Husebo BS, Strand LI, Moe-Nilssen R, Husebo SB, Snow AL, Ljunggren AE. Mobilization-Observation-Behavior-Intensity-Dementia Pain Scale (MOBID): development and validation of a nurse-administered pain assessment tool for use in dementia. J Pain Symptom Manage. 2007;34(1):67-80) e MOBID-2(1414.Husebo BS, Strand LI, Moe-Nilssen R, Husebo SB, Ljunggren AE. Pain in older persons with severe dementia. Psychometric properties of the Mobilization–Observation-Behaviour-Intensity-Dementia (MOBID-2) Pain Scale in a clinical setting. Scand J Caring Sci. 2010;24(2):380-91); NOPPAIN – Non-communicative Patient’s Pain Assessment Instrument(1515.Snow AL, Webwe JB, O’Malley KJ, Cody M, Beck C, Bruera E, et al. NOPPAIN: a nursing assistant-administered pain assessment instrument for use in dementia. Dement Geriatr Cogn Disord. 2004;17(3):240-6); PACSLAC – Pain Assessment Checklist for Seniors With Limited Ability to Communicate(1616.Fuchs-Lacelle S, Hadjistavropoulos T. Development and preliminary validation of the Pain Assessment Checklist for Seniors with Limited Ability to Communicate (PACSLAC). Pain Manage Nurs. 2004;5(1):37-49); PADE – Pain Assessment for the Dementing Elderly(1717.Villanueva MR, Smith TL, Erickson JS, Lee AC, Singer CM. Pain Assessment for the Dementing Elderly (PADE): reliability and validity of a new measure. J Am Med Dir Assoc. 2003;4(1):1-8); PAINAD – Pain Assessment in AdvancedDementia(1818.Warden V, Hurley AC, Volicer L. Development and psychometric evaluation of the Pain Assessment in Advanced Dementia (PAINAD) scale. J Am Med Dir Assoc. 2003;4(1):9-15), PAINE – Pain Assessment in Non communicative Elderly Persons(1919.Cohen-Mansfield J. Pain Assessment in Noncommunicative Elderly persons - PAINE. Clin J Pain. 2006;22(6):569-75) e ADD – Assessment of Discomfort in Dementia(2020.Kovach CR, Weissman DE, Griffie J, Matson S, Muchka S. Assessment and treatment of discomfort for people with late-stage dementia. J Pain Symptom Manage.1999;18 (6):412-9).

Apenas dois destes instrumentos foram adaptados culturalmente para o Brasil, o instrumento PACSLAC(303 3.Lorenzet IC, Santos FC, Souza PMR, Gambarro RC, Coelho S, Cendoroglo MS. Avaliação da dor em idosos com demência: tradução e adaptação transcultural do instrumento PACSLAC para a língua portuguesa. Rev Bras Med. 2011;68(4):129-33) e o NOPPAIN(2121.De Araújo RS, Pereira LV. Versão brasileira do Instrumento de Avaliação da Dor em Paciente Não Comunicativo (NOPAIN): equivalência conceitual, de itens e semântica. Cad Saúde Pública 2012;28(10):1985-92), mas não foram validados para o português brasileiro.

A Escala Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD mostrou boa validade e confiabilidade, pois o instrumento foi capaz de detectar diferenças na dor associada com condições diferentes ou por administração de análgesicos.

Essa escala é baseada na avaliação do estado fisiológico e comportamentos, como a respiração; vocalização; expressão facial; linguagem corporal e consolabilidade, com pontuação que varia de 0 a 2 para cada uma das cinco áreas avaliadas, na qual 0 (zero) equivale a menor intensidade e 2 (dois) a maior intensidade. É uma ferramenta simples, fácil de ser aplicada e apresenta uma lista de definições de cada um de seus itens. Sua pontuação total varia de 0 a 10 pontos baseada em uma escala padrão de dor. Os autores propõem a interpretação dessa pontuação da seguinte forma: 1 a 3 pontos considera-se dor leve; 4 a 6 pontos considera-se dor moderada e de 7 a 10 pontos considera-se dor severa(1818.Warden V, Hurley AC, Volicer L. Development and psychometric evaluation of the Pain Assessment in Advanced Dementia (PAINAD) scale. J Am Med Dir Assoc. 2003;4(1):9-15).

Devido à carência de instrumentos para avaliação da dor em idosos com demência grave adaptados e validados para o Brasil, esta pesquisa teve como objetivo adaptar culturalmente para o Brasil o instrumento PAINAD.

Método

Trata-se de um estudo metodológico de tradução e adaptação cultural para a língua portuguesa de um instrumento de avaliação da dor em pessoas com demência grave denominado Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD, original do idioma inglês.

O processo de adaptação cultural do instrumento PAINAD seguiu a metodologia proposta por Guillemin, Bombardier e Beaton(2222.Guillemin F, Bombardier C, Beaton D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. J Clin Epidemiol. 1993;46(12):1417-32) muito utilizada para esse tipo de estudo. Esta proposta compreende cinco etapas:

1ª – Tradução do instrumento PAINAD para o português brasileiro

Realização da tradução do instrumento PAINAD do idioma original, o inglês, para o idioma alvo, o português brasileiro. Foi realizada por dois tradutores independentes, fluentes no idioma original da escala e com experiências em traduções; uma tradutora tinha como a língua materna a inglesa. Uma tradução de boa qualidade pode ser garantida quando executada por pelo menos dois tradutores independentes, pois permite a identificação de erros e interpretações divergentes de termos ambíguos no idioma original.

2ª – Versão consensual da PAINAD na língua portuguesa (brasileira)

Essa etapa foi obtida após a realização da comparação entre as duas versões traduzidas buscando um consenso sobre o melhor significado para as palavras no idioma português brasileiro, e foi denominada como PAINAD-VCP (Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada – Versão Consensual em Português).

3ª – Retrotradução da versão consensual na língua portuguesa do instrumento PAINAD

A versão consensual em português brasileiro, o PAINAD-VCP, foi submetida à tradução para o idioma original do instrumento, a língua inglesa (retrotradução), por três tradutores bilíngues fluentes e qualificados que trabalharam de forma independente e não participaram da primeira etapa do estudo. Esta etapa permitiu a comparação com o original e a eventual detecção de erros e discrepâncias na tradução, melhorando a qualidade da versão final.

4ª – Comitê de especialistas – validação de conteúdo

O comitê foi multidisciplinar, composto por seis especialistas com conhecimento nas duas línguas, especialistas na área a que se refere o instrumento, com conhecimento metodológico sobre construção de questionários e escalas. O comitê teve como uma das funções verificar a equivalência semântica, idiomática, conceitual e experimental, entre a versão original PAINAD e a versão consensual em português PAINAD-VCP, sugerir modificações ou eliminar itens considerados ambíguos, redundantes e inadequados, evitando a linguagem coloquial, proporcionando assim uma versão mais funcional e compreensível para a população alvo.

A análise da validade de conteúdo dos elementos da PAINAD – VCP foi realizada por meio da escala de Likert de 1 (um) a 4 (quatro) pontos para cada item, sendo que: 1= não equivalente, 2= pouco equivalente, 3= equivalente e 4= muito equivalente. Após foi utilizado o cálculo do índice de validade de conteúdo (IVC), em que todos os juízes devem estar de acordo com a avaliação do item como sendo válido em seu conteúdo (IVC=1). No caso de seis ou mais, recomenda-se uma taxa não inferior a 0,78(2323.Lynn MR. Determination and quantification of content validity. Nurs Rev. 1986; 35(6):382-5-2424.Alexandre NMC, Coluci MZO. Validade de conteúdo nos processos de construção e adaptação de instrumentos de medidas. Ciênc Saúde Coletiva. 2011;16(7):3061-68). Na análise das três retraduções, a porcentagem de concordância entre os especialistas foi o direcionador da escolha da melhor versão.

A avaliação por especialistas resultou na versão final da retrotradução e na versão pré-final do instrumento em português brasileiro, nomeado PAINAD–Br, as quais foram encaminhadas aos autores da escala PAINAD original, como forma de garantir que todas as etapas tivessem sido rigorosamente seguidas.

5ª – Pré-teste de validação semântica

Esta etapa foi realizada por meio da aplicação do instrumento por 27 profissionais da saúde (enfermeiros, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas) em idosos com diagnóstico de doença de Alzheimer grave, residentes de duas instituições de longa permanência e internados em um hospital no momento da coleta de dados, de duas cidades localizadas no interior do Estado de São Paulo.

Todos os participantes, após avaliarem os pacientes e pontuar a escala PAINAD-Br, responderam ao questionário geral que avalia a compreensibilidade e clareza da escala. Os 27 participantes foram divididos em 3 grupos de 9 pessoas, de acordo com a categoria profissional, e responderam a um instrumento específico de clareza dos itens (todos os itens da escala foram distribuídos em 3 subséries). Quando pertinente, os participantes puderam sugerir modificações para melhor compreensão da escala. A elaboração desses instrumentos foi baseada no que é utilizado pelas pesquisadoras do grupo DISABKIDS(2525.DISABKIDS Group. Pilot test manual. Hamburgo: The DISABKIDS Group; 2002).

Essa divisão em grupos e subséries dos itens permitiu garantir a fidedignidade das respostas, pois uma análise detalhada de todos os itens do instrumento, quanto a seu entendimento e clareza por um mesmo profissional pode se constituir em uma exaustiva tarefa(2525.DISABKIDS Group. Pilot test manual. Hamburgo: The DISABKIDS Group; 2002).

Aspectos Éticos

O presente trabalho foi submetido e aprovado conforme parecer nº 143.366, de 13/11/2012 pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos, respeitando a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde que traz as diretrizes para pesquisas que envolvem seres humanos. Para a realização desta etapa foram seguidos os padrões de pesquisa com seres humanos, e todos os profissionais e todos os responsáveis pelos idosos, participantes da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, assegurando a condição de estrita confidencialidade dos seus nomes.

Resultados

O instrumento PAINAD foi adaptado culturalmente para o português do Brasil. As duas versões traduzidas para o português brasileiro foram comparadas pelos pesquisadores para a obtenção da Versão Consensual em Português Brasileiro do Instrumento PAINAD, o PAINAD-VCP. Essa comparação visou facilitar a tradução conceitual e literária simultaneamente, além de garantir o melhor significado para as palavras no idioma português brasileiro. As três retrotraduções do PAINAD-VCP para a língua inglesa apresentaram grande semelhança com o instrumento PAINAD original em inglês.

As retrotraduções e o PAINAD-VCP foram encaminhados para o comitê de seis especialistas, etapa considerada de fundamental importância para a obtenção de um instrumento que contemple todas as características do instrumento original adaptado à cultura em que está sendo inserido. O comitê de especialistas foi composto por dois fisioterapeutas, duas enfermeiras, um médico neurologista e um psicólogo professor mestre em Linguística.

Foram realizadas modificações na PAINAD-VCP de acordo com as decisões tomadas pelo comitê de especialistas, priorizando o significado dos termos e garantindo as equivalências semântica, idiomática, experimental e conceitual do instrumento adaptado. Algumas palavras foram substituídas pelo seu sinônimo e alguns itens foram gramaticalmente adaptados, sem alterar o seu significado, com o propósito de obter um item mais adequado e compreensível.

O Índice de Validade de Conteúdo, o número absoluto e a porcentagem, obtidos por meio das análises de concordância dos especialistas nos 75 itens do instrumento – estes se referem aos primeiros 40 itens da escala relacionados aos itens de avaliação dos comportamentos de dor e a aos 35 itens revisados relacionados à definição dos itens da escala – estão apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Índices de Validade de Conteúdo (IVC), número absoluto de itens (n) e a porcentagem equivalente - Brasil, 2013

Pode ser observado na Tabela 1 o resultado da proporção de concordância entre os especialistas: 83% (62) dos itens apresentaram IVC ≥ 0,75, ou seja, alcançaram equivalência de conteúdo e 17% (13) dos itens apresentaram IVC ≤ 0,75, necessitando de uma revisão, segundo as sugestões formuladas pelos juízes para se chegar a um consenso. Após minuciosa análise realizada pelos pesquisadores obteve-se a versão pré-final em português da escala PAINAD, denominada Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada – PAINAD-Br.

Tabela 2
Caracterização quanto ao sexo e à idade dos pacientes avaliados, assim como a condição no momento da observação, patologias associadas e intensidade da dor na PAINAD-Br - Brasil, 2013

As três retrotraduções foram analisadas independentemente pelos especialistas, os quais escolheram os itens que possuíam palavras iguais ou mais próximas da versão original, ou seja, que apresentaram maior equivalência semântica com os construtos da versão original PAINAD.

Após a análise dos especialistas, a versão pré-final PAINAD-Br foi submetida ao pré-teste, como mencionado na metodologia, que consistiu na sua aplicação por 27 profissionais de saúde, os quais, por sua vez, observaram pacientes com diagnóstico médico de demência grave e os avaliaram no que se refere à presença e intensidade da dor.

A tarefa de aplicação da PAINAD-Br foi realizada em diferentes momentos. A observação dos pacientes ocorreu quando estavam sendo realizados cuidados básicos diários e outros quando estavam em repouso. A distribuição dos pacientes que foram observados na aplicação da escala PAINAD-Br pelos profissionais de saúde está demonstrada na Tabela 2. Os profissionais avaliaram os pacientes por cerca de 5 minutos e o tempo de preenchimento da escala PAINAD-Br foi em média de 2 a 3 minutos.

Em todos os momentos de observações realizadas nos pacientes, todos eles apresentaram pontuações indicativas de dor com intensidade de leve a severa, podendo ser detectada por meio da escala de PAINAD-Br.

A Tabela 3 refere-se à análise do questionário de compreensão geral da escala. Observa-se que o instrumento PAINAD-Br foi considerado pela maior parte dos profissionais das diferentes categorias como muito bom e de fácil compreensão, sem dificuldade em aplicá-lo e com questões muito importantes para avaliar a dor do paciente.


Tabela 3
Resultados da avaliação dos profissionais, entrevistas sobre a clareza da escala PAINAD-Br - Brasil, 2013

Ao responderem o instrumento específico, que constitui um conjunto de itens da escala para avaliar a clareza de tais itens, observa-se que não houve dificuldades entre os enfermeiros. Em relação aos técnicos de enfermagem, um deles (33,3%) apresentou dificuldade em um item referente à respiração Respiração de Cheyne-Stokes, no entanto, ao ler a definição do item proposta pela escala, compreendeu o seu significado. Na definição do item referente à vocalização negativa Nenhuma é caracterizada por fala ou vocalização de qualidade neutra ou agradável gerou dúvidas para uma técnica de enfermagem (33,3%), que não conseguiu diferenciar fala de vocalização. Neste caso, a pesquisadora necessitou explicar a esta profissional o significado de vocalização, que é a ação de emitir voz sem pronunciar palavras.

Da mesma forma, o item referente à expressão facial careta, um fisioterapeuta (33,3%) inicialmente considerou-o não claro e após a leitura da sua definição, o mesmo ficou compreensível. Na definição do item referente à linguagem corporal Puxar ou empurrar para longe é caraterizado por resistência à aproximação ou aos cuidados. A pessoa tenta se desvencilhar abruptamente, com força, ou empurra você para longe, uma fisioterapeuta (33,3%) relatou que o termo se desvencilhar abruptamente não estava claro e sugeriu que fosse trocado por soltar-se rapidamente. Sendo assim, desvencilhar abruptamente foi substituído por seu sinônimo soltar-se rapidamente.

Esta etapa teve a finalidade de avaliar a clareza e compreensão de cada um dos seus itens e suas definições e também registrar as sugestões para as dificuldades apresentadas quanto à compreensão dos itens do instrumento. Após analisados os resultados desta fase, procedeu-se com as alterações necessárias para adequar o instrumento a um melhor nível de compreensão. A partir disto originou-se a versão final da PAINAD- Br (Quadro 1).

Quadro 1

Versão final da Escala de Avaliação de Dor em Demência Avançada PAINAD-Br. - Brasil, 2013


Discussão

A dor deixou de ser entendida como uma simples sensação para ser, hoje, reconhecida como uma experiência sensorial muito complexa, modificada pelas características da memória, das expectativas e das emoções de cada um. A partir dessas características subjetivas do fenômeno doloroso acredita-se que provenham as dificuldades de sua avaliação, especificamente em situações de alterações cognitivas, uma vez que para uma avaliação adequada faz-se necessário que o indivíduo relembre e compare situações de dores já vivenciadas, exigindo-lhe funções cognitivas preservadas de modo a verbalizar, por exemplo, a localização, intensidade e outras características de sua dor(202 2.Horgas AL, Elliott AF, Marsiske M. Pain assessment in persons with dementia: relationship between self-report and behavioral observation. J Am Geriatr Soc. 2009;57(1):126-32).

Sendo assim, a avaliação da dor no idoso é considerada um desafio aos profissionais de enfermagem, que têm o compromisso de diagnosticar e intervir para o seu alívio. Para isto, torna-se imprescindível ferramentas que auxiliem neste processo complexo que é a avaliação do fenômeno álgico(606 6.McAuliffe L, Nay R, O’Donnell M, Fetherstonhaugh D. Pain assessment in older people with dementia: literature review. J Adv Nurs. 2009;65(1):2-10). Escalas de observação do comportamento do paciente como a expressão facial, a linguagem corporal e vocalizações, frente à dor, aparecem como a melhor estratégia e uma técnica interessante e confiável para a detecção da dor em pacientes com demência grave(505 5.Horgas AL, Elliott AF. Pain assessment and management in persons with dementia. Nurs Clin North Am.2004;39(3):593-606).

Os instrumentos de medida são elementos chaves para refinar a comunicação entre quem sente e quem trata a dor. É evidente que o sucesso da avaliação da dor em idosos com demência depende da implementação de uma ferramenta de avaliação adequada para esta população(606 6.McAuliffe L, Nay R, O’Donnell M, Fetherstonhaugh D. Pain assessment in older people with dementia: literature review. J Adv Nurs. 2009;65(1):2-10).

Os estudos apontaram que o instrumento PAINAD é clinicamente útil e confiável para medir a dor a partir da observação de comportamentos que expressam dor, podendo ser utilizado por profissionais de diferentes níveis de formação após treinamento para o uso da escala. A escala PAINAD foi também traduzida e validada em idiomas como alemão(2626.Schuler MS, Becker S, Kaspar R, Nikolaus T, Kruse A, Basler HD. Psychometric properties of the German “Pain Assessment in Advanced Dementia Scale” (PAINAD-G) in nursing home residents. J Am Med Dir Assoc. 2007;8(6):388-95), holandês(2727.Zwakhalen SMG, Hamers JPH, Berger MPF. The psychometric quality and clinical usefulness of three pain assessment tools for elderly people with dementia. Pain. 2006; 126(1-3):210-20), chinês(2828.Lin PC, Lin LC, Shyu YIL, Hua MS. Chinese version of the Pain Assessment in Advanced Dementia Scale: initial psychometric evaluation. J Adv Nurs. 2010; 66(10):2360-8), italiano(2929.Costardi D, Rozzini L, Costanzi C, Ghianda D, Franzoni S, Padovani A, et al. The Italian version of the Pain Assessment in Advanced Dementia (PAINAD) scale. Arch Gerontol Geriatr. 2007;44(2):175-80) e português de Portugal(3030.Batalha LMC, Duarte CIA, Rosário RAF, Costa MFSP, Pereira VJR, Morgado TMM. Adaptação cultural e propriedades psicométricas da versão portuguesa da escala Pain Assessment in Advanced Dementia. Rev Enferm Ref (Coimbra). 2012;3(8):7-16). Em todas as versões mostrou ser um instrumento com altas correlações e níveis adequados de validade de construto e confiabilidade interna.

Como citado anteriormente, são poucos os instrumentos para avaliação da dor em idosos com demência grave, adaptados e validados para o português brasileiro. No entanto, não basta apenas traduzir um instrumento original de uma língua para outra cultura, é necessário adaptá-lo culturalmente à população alvo e para isso deve-se seguir um rigor metodológico com critérios para manter a equivalência entre as versões original e a adaptada ao novo idioma.

Conclusão

O instrumento PAINAD foi adaptado à cultura brasileira. A aplicação do instrumento para avaliar a dor em pessoas com demência grave possibilita melhorar a qualidade de vida destas pessoas, proporcionando uma oferta de cuidado humanizado à medida que a dor pode ser detectada e manejada adequadamente.

Concluímos que os resultados deste estudo demonstram que a versão PAINAD-Br manteve a equivalência semântica, idiomática, conceitual e cultural, segundo a avaliação do comitê de especialistas e pela participação dos profissionais de saúde, confirmando a validade de face e de conteúdo do instrumento.

Estudos de validação de construtos e confiabilidade, avaliando as propriedades psicométricas do instrumento são necessários para que o instrumento PAINAD-Br possa ser disponibilizado na cultura brasileira e assim possa ser utilizado por pesquisadores brasileiros para estudos de mensuração da dor em pessoas com déficit cognitivo grave, assim como ser implementado na prática diária dos profissionais de saúde para o manejo adequado da dor.

  • *
    Extraído da dissertação "Tradução e Adaptação Cultural para o Brasil da escala Pain Assessment in Advanced Dementia – PAINAD", Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal de São Carlos, 2013.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq

À Universidade Federal de São Carlos – UFSCar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    17 Jan 2014
  • Aceito
    01 Abr 2014
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