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Sofrimento Moral na Estratégia de Saúde da Família: vivências desveladas no cotidiano* * Vivência do Sofrimento Moral na Estratégia de Saúde da Família: visão dos profissionais, 2015, Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais.

Resumos

Objetivo

Compreender as vivências de Sofrimento Moral expressas no cotidiano da Estratégia de Saúde da Família.

Método

Trata-se de um estudo de caso com abordagem qualitativa, realizado entre os meses de agosto a outubro de 2014, cujo cenário foi um município de Minas Gerais. Participaram 28 profissionais das equipes de saúde da família. Os dados foram coletados por meio de entrevistas com roteiro semiestruturado, observação, técnica projetiva e, submetidos à análise de conteúdo temática.

Resultados

Os resultados apontaram que as questões rotineiras do serviço de saúde levam os profissionais a vivenciarem uma prática desafiadora ao lidarem diariamente com situações que contradizem seus preceitos éticos capazes de comprometer a qualidade do trabalho tornando-se disparadores de Sofrimento Moral.

Conclusão

As vulnerabilidades sociais, como violência doméstica e condições socioeconômicas precárias, além das fragilidades organizacionais do Sistema de Saúde, foram os principais geradores de Sofrimento Moral. Assim, considera-se necessária a reflexão ampliada sobre a temática por parte dos trabalhadores da Estratégia de Saúde da Família, com intuito de propiciar a minimização de vivências de sofrimento e uma prática profissional em consonância com seus valores éticos.

Estratégia de Saúde da Família; Ética; Dano Moral


Objective

Understanding the Moral Suffering experiences expressed in the daily life of the Family Health Strategy.

Method

This is a case study with a qualitative approach, conducted between August and October 2014 in a municipality of Minas Gerais. The sample was represented by 28 professionals of family health teams. Data were collected through interviews with semi-structured questionnaires, observation, projective technique and submitted to thematic content analysis.

Results

The results indicate that routine issues of the health care system lead professionals to experience a challenging practice in dealing with daily situations that contradict their ethical precepts and can compromise the quality of work, becoming triggers of Moral Distress.

Conclusions

Social vulnerabilities such as domestic violence, poor socioeconomic conditions and organizational weaknesses of the health system were the main triggers of Moral Distress. Therefore, it is necessary to amplify this reflection by workers of the Family Health Strategy, aiming to encourage the minimization of suffering experiences, considering their ethical values.

Family Health Strategy; Ethics; Moral damage


Objetivo

La comprensión de las experiencias de Sufrimiento Moral expresadas en la vida cotidiana de la Estrategia Salud de la Familia.

Método

Es un estudio de caso con un enfoque cualitativo, realizado entre agosto y octubre de 2014, cuyo escenario fue un municipio de Minas Gerais. Con la asistencia de 28 profesionales de los equipos de salud de la familia. Los datos fueron recolectados a través de entrevistas con, la observación, la técnica semiestructurada proyectiva y sometidos a análisis de contenido temático.

Resultados

Los resultados mostraron que los problemas de servicio de salud de rutina conducen los profesionales experimentar una práctica difícil en el trato diario con situaciones que contradicen sus preceptos éticos que pueden comprometer la calidad del trabajo por lo que es desencadena el sufrimiento moral.

Conclusión

Las vulnerabilidades sociales como la violencia doméstica y las malas condiciones socioeconómicas a través de los puntos débiles de la organización del sistema de salud fueron los principales generadores de sufrimiento moral. Por lo tanto, considera que es necesario ampliar la reflexión sobre el tema de los trabajadores del Estrategia Salud de la Familia, con el objetivo de fomentar la minimización de sufrir experiencias y la práctica profesional en consonancia con sus valores éticos.

Estrategia Salud de la Familia; Ética; Daño Moral


Introdução

A Atenção Primária à Saúde (APS) consiste, preferencialmente, no primeiro contato dos usuários para a construção de planos terapêuticos baseados no vínculo e na continuidade do cuidado. Este ponto de atenção à saúde é caracterizado pelo desenvolvimento de atividades clínicas de alta complexidade e por ações longitudinais, que visam assegurar a integralidade da assistência (11. Lavras C. Atenção Primária à Saúde e a organização de redes regionais de atenção à saúde no Brasil. Saúde soc. 2011;20 (4):867-874.).

No Brasil, a APS é organizada pela Estratégia de Saúde da Família (ESF), que tem como finalidade produzir uma atuação pautada em modelos assistenciais e gerenciais, voltados para o atendimento das necessidades dos usuários, com ênfase na promoção da saúde e na prevenção de agravos. Sendo assim, propõe atenção à saúde centrada na família, considerando o ambiente em que vivem e o espaço em que se constroem as relações (22. Oliveira, MAC, Pereira IC. Atributos essenciais da Atenção Primária e a Estratégia Saúde da Família. Rev. bras. enferm. 2013 Sept.;66(n.spe):158-64.).

A ESF se pauta em quatro atributos essenciais: o acesso de primeiro contato, a longitudinalidade, a integralidade e a coordenação do cuidado; reconhecidos como eixos estruturantes do processo de atenção a saúde, associados à qualidade dos serviços, à efetividade e eficiência de suas intervenções (22. Oliveira, MAC, Pereira IC. Atributos essenciais da Atenção Primária e a Estratégia Saúde da Família. Rev. bras. enferm. 2013 Sept.;66(n.spe):158-64.-33. Lima EFA, Sousa AI, Primo CC, Leite FMC, Lima RCD, Maciel ELN. An assessment of primary care attributes from the perspective of female healthcare users. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2015 June; 23(3):553-559. ).

Mediante essas premissas, as ações da ESF devem se realizar de forma articulada e em sincronia com os serviços da Rede de Atenção à Saúde, a fim de responder às demandas de forma integrada. Contudo, requer esforço da equipe em atuar, de forma planejada, em conformidade com os determinantes da saúde, para prover melhores condições de vida a indivíduos, famílias e comunidade (44. Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2010 Aug; 15(5): 2297-2305. ).

Nessa perspectiva, a ESF tem contribuído para a reorganização do modelo de atenção a saúde, haja vista a adoção de novos comportamentos por profissionais e usuários (55. Junges JR, Zobolli ELCP, Patussi MP, Schaefer R, Nora CRD. Construção e validação do instrumento “Inventário de problemas éticos na atenção primária em saúde”. Revista Bioética. 2014;22(2):309-17.). Entretanto, os profissionais lidam frequentemente, com situações que limitam e dificultam a efetividade dos princípios da APS. Esta realidade pode acarretar nas equipes de saúde a vivência de Sofrimento Moral (SM).

O Sofrimento Moral pode ser entendido como dor ou angústia que afeta a mente, corpo ou relações interpessoais no ambiente de trabalho, em resposta a uma situação na qual o profissional reconhece sua responsabilidade moral diante dos conflitos e faz um julgamento a respeito da conduta correta a ser tomada. Entretanto, se vê impedido de colocá-la em prática, devido a constrangimentos, que impedem sua participação moral (66. Dalmolin GL, Lunardi VL, Lunardi Filho WD. O sofrimento moral dos profissionais de enfermagem no exercício da profissão. Rev. Enferm. UERJ, 2009 Jan/Mar.;17(1):35-60. ).

Os aspectos desencadeadores do SM estão associados a dificuldades do cotidiano de trabalho, tais como, a organização do serviço, as políticas organizacionais, que influenciam no exercício do poder, a baixa autonomia profissional, restrições de tempo e de recursos, e altos níveis de responsabilidade (77. Huffman DM, Rittenmeyer L. How professional nurses working in hospital environments experience moral distress: a systematic review. Crit Care Nurs Clin North Am. Knirsch CA, Jain NL, Pablos-Mendez A, Friedman C, Hripcsak. 2012;24(1):91-100.).

Os trabalhadores da saúde desenvolvem o SM quando têm que fazer escolhas difíceis entre, seguir as regras ou seguir a sua consciência. Portanto, o SM desencadeia sintomas de estresse tradicionais negativos que ocorrem devido a situações que envolvem dimensões éticas, nas quais o profissional sente que não é capaz de preservar todos os seus interesses e valores (88. Gomes D, Ramos FRS. Ética e comprometimento do profissional da saúde pós-reestruturação produtiva numa região metropolitana do sul do Brasil. Interface (Botucatu), Botucatu. 2014 Jun; 18(49):289-300.).

O SM pode ser descrito também como um distanciamento entre as convicções da pessoa e suas ações, traduzindo-se em aflições psicológicas, ocasionadas por sentimentos dolorosos (99. Barlem E, Lunardi V, Tomaschewski J, Lunardi G, Lunardi Filho W, Schwonke C. Moral distress: challenges for an autonomous nursing professional practice. Revista da Escola de Enfermagem da USP. 2013;47(2):506-510. -1010. Lunardi VL, Barlem ELD, Bulhosa MS, Santos SSC, Lunardi Filho WD, Silveira RS, Bao ACP, Dalmolin GL. Sofrimento Moral e a dimensão ética do trabalho da enfermagem. Rev. Brasileira Enfermagem. Jul-Ago/2009;62(4):599-603.). Desta forma, o SM apresenta implicações para a vida dos trabalhadores de saúde, tanto na dimensão pessoal, com sinais emocionais e físicos, como na dimensão profissional, relacionadas à satisfação no trabalho e até o abandono da profissão (1111. Dalmolin GL, Lunardi VL, Lunardi, GL, Barlem, ED, Silveira RS. Sufrimiento moral y síndrome de burnout: ¿Están relacionados esos dos fenómenos en los trabajadores de enfermería? Revista Latino-Am. Enfermagem. 2014;22(1):35-42. ).

Nesse contexto, cabe ressaltar a escassez de trabalhos que abordam o tema, principalmente na APS evidenciando, portanto a necessidade de estudos que explorem, com maior profundidade, as vivências do SM no cotidiano de profissionais da Estratégia de Saúde da Família, numa perspectiva interdisciplinar.

Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi compreender as vivências de Sofrimento Moral expressas no cotidiano da Estratégia de Saúde da Família.

Método

Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, cujo método de investigação empregado foi o de estudo de caso.

A pesquisa qualitativa permite imergir de forma mais profunda nas relações, nos processos e fenômenos, o que corresponde ao universo de significados, sentidos, crenças, valores, atitudes e aspirações(1212. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 13ª ed. São Paulo: Hucitec; 2013.). Nesse sentido, visa captar os diferentes significados de uma experiência vivenciada, auxiliando a compreensão do indivíduo no contexto da ESF.

O estudo de caso consiste em uma estratégia de pesquisa que estuda eventos dentro de seu contexto de vida real, sendo compreendido como o delineamento mais adequado para a investigação de um caso contemporâneo, dentro de seu contexto real, onde o limite entre estes não são claramente definidos (1313. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5ª ed. Porto Alegre: Bookman; 2015.).

Esse estudo foi desenvolvido entre os meses de agosto a outubro de 2014, com quatro equipes de Saúde da Família, de um município situado no interior do estado de Minas Gerais.

Para a coleta de dados, foram utilizados como instrumentos: a observação; a entrevista com roteiro semiestruturado e a realização da técnica projetiva, por meio de uma história em quadrinhos, intitulada “SOFRIMENTO MORAL”. A estratégia foi elaborada pelos núcleos de pesquisa: PRAXIS – trabalho, cidadania, saúde e Enfermagem – (PEN/UFSC) - Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina; Núcleo de estudos e pesquisas em Enfermagem/Saúde (NEPS) - Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e o Núcleo de Pesquisa Administração em Enfermagem (NUPAE) - Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais – (UFMG) (Figura 1).

Assim, uma história em quadrinhos foi apresentada aos participantes da pesquisa, ilustrando um dia de trabalho do profissional de saúde, de forma a inferir o conceito de SM. A história teve o intuito de apresentar o conceito de SM de forma lúdica, mediante o resgate de vivências. Após a apresentação, solicitou-se aos participantes que respondessem a questão norteadora: “Narre uma situação vivenciada por você no cotidiano de trabalho, que o levou a algum tipo de angústia - desconforto – sofrimento”.

A utilização da referida técnica visou estimular a percepção acerca da temática e facilitar o acesso dos participantes aos conteúdos inconscientes e, ainda, oportunizar a expressão de suas subjetividades (1414. Maffezzolli FEC, Ribeiro CM, Lima TMVV, Semprebom E, Prado, PHM, Mady EB. Reflexões sobre o Uso de Técnicas Projetivas na Condução de Pesquisas Qualitativas em Marketing. PMKT – Revista Brasileira de Pesquisa de Marketing, Opinião e Mídia. 2009;3:37-48.).

Figura 1
Florianópolis, 2013

Os participantes do estudo foram médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde - ACS’s, totalizando 28 profissionais, sendo eles: três médicos, quatro enfermeiras, três técnicos de enfermagem e 18 ACS’s.

Como critério de inclusão, estabeleceu-se que os profissionais atuassem na ESF do município por um tempo mínimo de um ano, por acreditar que esse período de vivência permitiria aos profissionais o estabelecimento de relações mais próximas e significativas, no contexto da ESF e, ainda, maior familiaridade com as rotinas e as normas do serviço.

Para a análise dos dados utilizou-se a técnica de Análise de Conteúdo de Laurence Bardin, “que procura conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça” (1515. Bardin L. Análise de conteúdo. Edição Revista e Atualizada. Lisboa: Edições 70; 2009.). As categorias surgiram após a indagação da questão norteadora e da interpretação da figura 1. Para tanto, as entrevistas foram transcritas na íntegra e analisadas seguindo as seguintes fases: pré – análise; exploração do material; tratamento dos resultados; inferência e interpretação (1515. Bardin L. Análise de conteúdo. Edição Revista e Atualizada. Lisboa: Edições 70; 2009.).

Para o desenvolvimento deste estudo, as autoras seguiram as normas e diretrizes para pesquisas brasileiras, que envolvam seres humanos, de acordo com a Resolução CNS 466/2012. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, sob o parecer nº 749.142 e pelo município, cenário desse estudo, por meio de Carta de Anuência.

Todos os participantes foram informados a respeito dos objetivos do estudo e ao concordarem em participar, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE.

De forma a garantir o anonimato dos participantes, optou-se por utilizar códigos que os representassem, na apresentação dos resultados, a saber: enfermeiros (E); médicos (M), técnicos de enfermagem (TE) e agentes comunitários de saúde (ACS), seguidas de numerações, de acordo com a sequência das entrevistas. Exemplificando: primeira enfermeira entrevistada - E1; terceiro médico entrevistado – M3.

Resultados

Para compreender as vivências de Sofrimento Moral, no cotidiano de profissionais da Estratégia de Saúde da Família, as autoras obtiveram a categoria: “Vivências de Sofrimento Moral nas práticas de saúde, no contexto da Estratégia de Saúde da Família”, a partir da análise das situações narradas, com a utilização da história em quadrinhos e do conteúdo das entrevistas.

Assim, os depoimentos permitiram identificar situações do cotidiano dos integrantes da equipe de Saúde da Família, que comprometiam a qualidade do trabalho e que desencadeavam vivências de SM, como: dificuldade em atender às demandas que se apresentam no trabalho; questões relacionadas à infraestrutura (material, Rede Assistencial de Saúde e equipe multiprofissional) e exigências impostas ao trabalhador da ESF.

“Vivências de Sofrimento Moral nas práticas de saúde no contexto da Estratégia de Saúde da Família”

As vivências de SM apontadas pelos participantes relacionaram-se às vulnerabilidades sociais que os usuários da unidade de saúde estão expostos e as fragilidades do sistema de saúde enfrentadas pelos profissionais da ESF. Assim, para destacar estas experiências, foram estabelecidas duas subcategorias.

Na subcategoria As vulnerabilidades sociais como fenômeno gerador de Sofrimento Moral os participantes revelaram deparar frequentemente com situações de conflitos familiares, relacionadas à violência doméstica e a questões socioeconômicas desfavoráveis.

“Então, essas coisas, de violência, psicológica, agressiva, a gente tem muito na ESF, mais é uma situação que eu não posso fazer nada! Ela(a paciente) pegou aquela confiança em mim, eu acho que se eu tirar essa confiança que ela tem em mim, a situação fica pior.” [...] se acontecer alguma coisa comigo, eu vou te passar o telefone da minha irmã, você liga pra ela? [...] mas eu não quero que você faça nenhuma denúncia [...].” (ACS3)

“Como a minha área tem mais idoso, eu passei por situação do filho bater na mãe, sabe, aí por fim eu tive que chamar até a assistente social pra ir lá porque estava demais, eu não conseguia mais sozinha.” (ACS 4)

“Uma dificuldade importante que eu acho é a questão socioeconômica, que às vezes atrapalha bastante você seguir um tratamento. Eu sei que o melhor é esse medicamento, eu sei que o melhor é esse exame, mas não tem como eu fazer, porque o serviço não disponibiliza e o paciente não tem condição nenhuma de comprar.” (M2)

As vulnerabilidades sociais e a ausência de intersetorialização são citadas como obstáculos frente à tomada de decisão.

“A gente sabe que tem uma legislação que norteia, mas ai a gente fica dependendo de outros setores que não tomam as devidas providências e a gente fica sozinho pra poder resolver essas situações e muitas vezes chega num determinado ponto que meu conhecimento também é limitado, eu não tenho mais conhecimento e ai são situações que ficam paradas porque a gente num tem mais como resolver”. (E3)

“A gente sabe que tem que resolver, mas às vezes a gente é impedido pelo próprio paciente. E o que que agente faz? A gente tem que respeitar porque se não nem a gente mais faz visita na casa deles. Então tem hora que a gente omite. E, é, complicado, porque você sabe aquela realidade e não pode fazer nada.” (ACS 3)

A subcategoria Fragilidades do Sistema de Saúde e sua relação com as vivências de Sofrimento Moral revelou vivências de SM pelos profissionais da ESF, referentes às fragilidades do Sistema de Saúde.

“Teve uma paciente, tinha 4 meses e ela estava com insuficiência respiratória, sabe? Chiando, chiando, e a mãe veio e não tinha micronebulizador pra usar. Ai tá, mandamos pro hospital, o médico do hospital pegou e falou:“ela está gemente só porque ela está cansadinha, está com dorzinha no corpo” [...]“gente, menina com esforço respiratório!!” não tinha nada, num tinha mais o que eu fazer aqui, entendeu? Não tinha nem um outro remédio, não tinha bombinha, [...] não tinha pediatra lá embaixo, que também era um outro recurso que a gente tinha. O carro da prefeitura a gente só conseguiu pra levar, ela num tinha como voltar. Ela preferiu num ir, porque ela falou assim “M3 como que eu vou ficar lá, vou voltar como?”(M2)

“As grandes dificuldades são as dificuldades inerentes ao Sistema Único de Saúde, que geralmente é o grande limitador pelo fato da escassez de recursos e demora pra tramitação de exames, cirurgias. Então, isso acaba angustiando o paciente e acaba atrasando os diagnósticos pelo profissional” (M1)

“Às vezes, acontece falta de algum material, por exemplo, de desinfecção. E a gente acaba agindo de forma inadequada pra não parar o atendimento, né” (E2)

“A gente vê alguns casos também que não são pra gente, que são encaminhados pra fora e não temos esse retorno.. Então muitas vezes a gente encontra um pouco dessa dificuldade também, de o paciente está voltando, pra onde que ele saiu, pro ponto de partida dele, da saúde básica.” (TE2)

Sentimentos negativos, de impotência ou frustração, associados ao sentimento de culpa também foram amplamente citados pelos profissionais.

“[...] eu sei o que é melhor, eu sei que isso seria o mais fácil pra paciente também, mas num posso fazer nada.” (M2)

“Quando a gente está tentando providenciar alguma coisa que você sabe que precisa, que a pessoa tá precisando daquilo ali na hora e que isso não é viabilizado, dá certa angústia mesmo.” (E3)

“Aí, da uma sensação de impotência, né? Eu não posso fazer nada, mãos atadas”. (M2)

Discussão

A atenção à saúde nos espaços territoriais tem possibilitado aos trabalhadores uma experiência jamais vivenciada no interior dos hospitais e serviços ambulatoriais. No cenário da ESF, profissionais e usuários são sujeitos ativos, onde compartilham espaços comunitários e subjetividades. Nas relações de intersubjetividades, o vínculo se estabelece e delineia novo contorno às relações interpessoais.

Nesta perspectiva, os encontros assistenciais são permeados pelas subjetividades dos indivíduos, por suas vulnerabilidades e formas de enfrentamento (1616. Pinto, AGA, Jorge MSB. Prática clinica na estratégia saúde da família: relações entre equipes e usuários no território urbano. Revista Eletrônica Gestão & Saúde. 2015;6(2):1514-29.).

No presente estudo, os participantes trouxeram suas vivências assistenciais tensionadas pelas vulnerabilidades sociais as quais os usuários estavam expostos. Com base no conteúdo das falas, as autoras inferem que o ACS está mais exposto a isto, uma vez que o mesmo reside na comunidade onde trabalha, sendo não apenas trabalhador, mas também vizinho dos usuários aos quais faz visitas domiciliárias mensais.

O ACS é percebido pela população e pela equipe de saúde da família como um indivíduo imprescindível à consolidação do modelo de reorganização do Sistema Único de Saúde. O ACS tem particularidades de pertencimento à comunidade da qual se torna referência, além de ser um profissional ativo, para motivar a população ao protagonismo social e ao cuidado à saúde (1717. Baralhas M, Pereira MAO. Prática diária dos agentes comunitários de saúde: dificuldades e limitações da assistência. Rev. bras. enferm. 2013 Junho, 66(3):358-365. ).

Com efeito, o vínculo apresenta uma conotação relacionada à representação que profissionais da ESF têm sobre os sujeitos e as atividades relacionadas ao cuidado de saúde. Neste sentido, estudo acerca da Política de Humanização na APS (1818. Nora CRD, Junges JR. Humanization policy in primary health care: a systematic review. Rev. Saúde Pública [online]. 2013 Dec;47(6):1186-1200 ), evidenciou o trabalho realizado pela equipe interdisciplinar como uma importante ferramenta, para construção de relações de confiança e amizade baseadas no vínculo, capazes de aproximar os profissionais com a realidade vivenciada pelo usuário.

No entanto, essa aproximação pode contribuir com o aparecimento de contradições relacionadas às crenças, valores, ideais e formas de viver de cada um, o que conforma as peculiaridades das questões éticas que ocorrem na APS (1919. Lima AC, Morales, DA, Zoboli ELCP, Sartório NA. Problemas éticos na Atenção Básica: A visão de enfermeiros e médicos. Rev. Cogitare Enferm. 2009 Set,14(2):294-303).

A equipe de Saúde da Família vivencia no cotidiano de suas práticas, situações limite como pobreza, desigualdade social, violência, abandono e doença, dentre outras, que favorece o aparecimento de sentimentos de frustração, impotência e de angústia, relatados pelos participantes deste estudo.

Estudo realizado no sul do Brasil (2020. Briese G, Lunardi VL, Azambuja EP, Kerber NPC. O Sofrimento Moral dos Agentes Comunitários de Saúde. Cienc Cuid Saude 2015 Abr/Jun;14(2):1035-1042 ), a respeito da vivência do SM pelos profissionais de saúde, apontou que a experiência deste fenômeno está intimamente relacionada à proximidade com a comunidade e ao conhecimento dos problemas e situações de vulnerabilidade social, a falta de estabelecimento de limites aos usuários, proximidade com as famílias, o conhecimento de suas intimidades e práticas do “descuidado da saúde”, coadunando com os achados deste estudo.

Vale ressaltar que o processo de SM pode ser entendido como uma situação na qual a pessoa reconhece sua responsabilidade moral diante das situações problemáticas julga a forma correta de agir, mas por impedimentos ou constrangimentos de ordem institucional, ou profissional sente-se incapaz de tomar uma decisão correta e considera como inadequada sua participação moral, podendo ser acometido por sintomas físicos, como dor ou angústia que afeta o corpo ou a mente (99. Barlem E, Lunardi V, Tomaschewski J, Lunardi G, Lunardi Filho W, Schwonke C. Moral distress: challenges for an autonomous nursing professional practice. Revista da Escola de Enfermagem da USP. 2013;47(2):506-510. -1010. Lunardi VL, Barlem ELD, Bulhosa MS, Santos SSC, Lunardi Filho WD, Silveira RS, Bao ACP, Dalmolin GL. Sofrimento Moral e a dimensão ética do trabalho da enfermagem. Rev. Brasileira Enfermagem. Jul-Ago/2009;62(4):599-603.).

Estudo acerca da violência doméstica contra a mulher (2121. Fonseca RMGS, Leal AERB, Skubs T, Guedes RN, Egry EY. Domestic violence against women from the perspective of the community health agent. Rev Latino-am Enfermagem 2009 Nov/Dez;17(6):974-80.) mostrou que o ACS é o trabalhador que tem maior proximidade e vínculo com os usuários e, portanto, vivencia mais de perto seus problemas e vicissitudes da população, no território adscrito. Assim, o estudo prescreve a necessidade de capacitação para os ACS’s e outros profissionais, para as ações voltadas às questões de gênero, que se relacionam com a violência contra a mulher, empoderando, desta forma, as diretrizes do SUS.

Em relação às narrativas que expressam fragilidades no sistema de saúde, percebe-se que problemas relacionados à organização do trabalho, envolvendo questões estruturais da ESF como: precariedade de aparatos para atendimentos de urgência e emergência; escassez de respaldo dos setores responsáveis para discutir e resolver os problemas evidenciados e insuficiência de equipamentos, medicamentos e transportes são apontados como impasses à qualidade do serviço e têm implicações éticas, tanto para os profissionais, quanto para os usuários dos serviços de saúde e se tornam fonte preeminente de SM (99. Barlem E, Lunardi V, Tomaschewski J, Lunardi G, Lunardi Filho W, Schwonke C. Moral distress: challenges for an autonomous nursing professional practice. Revista da Escola de Enfermagem da USP. 2013;47(2):506-510. -1010. Lunardi VL, Barlem ELD, Bulhosa MS, Santos SSC, Lunardi Filho WD, Silveira RS, Bao ACP, Dalmolin GL. Sofrimento Moral e a dimensão ética do trabalho da enfermagem. Rev. Brasileira Enfermagem. Jul-Ago/2009;62(4):599-603.).

Metassíntese desenvolvida na APS (1818. Nora CRD, Junges JR. Humanization policy in primary health care: a systematic review. Rev. Saúde Pública [online]. 2013 Dec;47(6):1186-1200 ) condiz com o presente estudo, haja vista ter evidenciado a insuficiência de equipamentos e recursos materiais nas unidades, como interferência negativa na continuidade da assistência, gerando condições de trabalho desfavoráveis. Além disso, apontou a inexistência de uma Rede de Atenção à Saúde eficiente, como entrave para que o cuidado seja, de fato, humanizado.

Os participantes desse estudo revelaram, por meio de seus depoimentos, tanto nas entrevistas como na apresentação de narrativas relacionadas à figura elucidativa sobre o conceito de SM, a realidade de uma prática profissional desafiadora, em que expressar o cuidado em sua forma mais sublime, parece ser paradoxal, quando a essência da atitude de aliviar o sofrimento do outro perde espaço, para a sua própria angústia, intrínseca ao trabalho da equipe de saúde (1010. Lunardi VL, Barlem ELD, Bulhosa MS, Santos SSC, Lunardi Filho WD, Silveira RS, Bao ACP, Dalmolin GL. Sofrimento Moral e a dimensão ética do trabalho da enfermagem. Rev. Brasileira Enfermagem. Jul-Ago/2009;62(4):599-603.). Nesta perspectiva, um passo mobilizador para a reversão da vivência silenciosa do SM seria desvelar os problemas e desafios éticos a que estão expostos os profissionais da APS.

Integrar a equipe de Saúde da Família significa responsabilizar-se pela população de uma área adscrita, e acompanhá-la ao longo do tempo, em seu percurso de vida, o que implica desafios para a prática profissional ética. As equipes desempenham funções que ultrapassam a tradicional resposta às necessidades de saúde e desenvolvem ações contínuas, singulares e ativas, com base no estabelecimento de vínculo, relação de acolhimento e corresponsabilização para com a população, enfatizando a atenção integral.

Portanto, quando o profissional percebe dificuldades em lidar com as situações que comprometem a ética no ambiente de trabalho, abrem-se espaços para o SM, que se manifesta pela incoerência entre as ações profissionais e convicções pessoais, traduzindo-se em desequilíbrios psicológicos denotando sentimentos dolorosos. Diante deste cenário, o profissional que vivencia situações de sofrimento moral e se sente impotente diante dos problemas emergentes, pode chegar a optar pela mudança de local de trabalho, como uma estratégia de preservar seus valores, em um novo contexto de atuação (88. Gomes D, Ramos FRS. Ética e comprometimento do profissional da saúde pós-reestruturação produtiva numa região metropolitana do sul do Brasil. Interface (Botucatu), Botucatu. 2014 Jun; 18(49):289-300.).

A criação de espaços para descrição e discussão de situações que envolvam vivência de SM é essencial em qualquer ponto de atenção à saúde. O envolvimento das coordenações e chefias, principalmente no que diz respeito às questões relacionadas a recursos humanos e materiais, pode garantir um ambiente de trabalho saudável e produtivo (1010. Lunardi VL, Barlem ELD, Bulhosa MS, Santos SSC, Lunardi Filho WD, Silveira RS, Bao ACP, Dalmolin GL. Sofrimento Moral e a dimensão ética do trabalho da enfermagem. Rev. Brasileira Enfermagem. Jul-Ago/2009;62(4):599-603.).

Compreender histórias reais acerca da vivência de questões éticas, no cotidiano do serviço e suas implicações para os personagens envolvidos, possibilitou uma reflexão em relação a essa temática, ainda pouco discutida nas práticas e ações da saúde. Os relatos recorrentes de fragilidades no sistema de saúde demonstraram que os profissionais participantes enfrentavam diariamente situações que contradizem seus preceitos éticos, o que possibilitou maior visibilidade ao SM.

No entanto, o presente estudo, dada a complexidade da temática abordada, não se prestou à generalização, uma vez que as autoras se debruçaram à população participante, para conhecer como vivenciava o SM. Assim, estudos devem ser realizados, numa perspectiva interdisciplinar, a fim de que outros fenômenos silenciosos, que resultem em SM, sejam desvelados.

Conclusão

Os resultados desta pesquisa mostraram que os trabalhadores das ESF participantes vivenciavam o SM em seu cotidiano de trabalho. As vulnerabilidades sociais, como violência doméstica e condições socioeconômicas precárias, além das fragilidades organizacionais do Sistema de Saúde, foram os principais disparadores de sofrimento moral.

Tais situações não condizem com os princípios do Sistema Único de Saúde, denotando uma agressão aos direitos individuais e coletivos e à dignidade humana. Portanto, representaram implicações éticas para os profissionais dos serviços de saúde que, neste estudo, expressaram sentimentos de impotência e até de culpa por não conseguirem disponibilizar assistência integral à sua população.

Os resultados apontam, portanto, para a importância de se estimular práticas assistenciais e gerenciais éticas nos serviços de saúde, a fim de minimizar o Sofrimento Moral.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2015
  • Aceito
    14 Nov 2015
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