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Caracterização de leveduras isoladas da vagina e sua associação com candidíase vulvovaginal em duas cidades do sul do Brasil

Characterization of yeasts isolated from the vagina and their association with vulvovaginal candidíasis in two cities of the South of Brazil

Resumos

OBJETIVOS: avaliar a distribuição de espécies de leveduras isoladas da vagina em duas localidades do sul do Brasil e comparar o perfil de suscetibilidade in vitro destas leveduras a antifúngicos usados na prática clínica. MÉTODOS: todas as mulheres atendidas entre janeiro e junho de 2004 para exames rotineiros de amostras vaginais, independente de serem sintomáticas ou não, foram incluídas neste estudo. Foram excluídas as que apresentavam imunodeficiências como AIDS ou outras infecções genitais. Amostras de conteúdo vaginal dessas mulheres (Jaraguá do Sul - SC (n=130) e Maringá - PR (n=97)) foram cultivadas. As leveduras isoladas foram identificadas e submetidas ao teste de suscetibilidade aos antifúngicos fluconazol, nistatina e anfotericina B. RESULTADOS: a freqüência de cultura positiva para levedura foi semelhante nas duas localidades, aproximadamente 24%. Candida albicans foi a espécie prevalente, mas sua freqüência diferiu: em SC correspondeu a 77,4% das leveduras e foi a mais freqüente tanto nas mulheres sintomáticas quanto nas assintomáticas. Já no PR foi 50,0%, com predomínio mais evidente nos casos sintomáticos. Observamos altos índices de suscetibilidade ao fluconazol e anfotericina B, porém 51,1% das leveduras apresentaram suscetibilidade dependente da dose (S-DD) para nistatina. C. albicans mostrou maior tendência de resistência à nistatina (52,8% de S-DD) do que as espécies não-albicans (44,4%). CONCLUSÕES: nossos dados mostram diferenças regionais quanto à espécie de levedura em amostras vaginais. Sugerem que a determinação da espécie pode ter implicação clínica, considerando as diferenças quanto à suscetibilidade, principalmente à nistatina, e que poderiam ter importância no manejo da candidíase vulvovaginal.

Leveduras; Candidíase vulvovaginal; Antifúngicos


PURPOSE: to evaluate the distribution of yeast species isolated from the vagina in two cities of the South of Brazil and compare the in vitro susceptibility profile of these yeasts against some antifungals, which are used in clinical routine. METHODS: all women attended from January to June 2004 for vaginal routine examinations, independent of being symptomatic or not were included in the study. Only those who presented immunodeficiency like AIDS or any other genital infection were excluded. Samples of vaginal discharge from the women (Jaraguá do Sul - SC (n=130) and Maringá - PR (n=97)) were cultivated. The yeasts were identified and submitted to the susceptibility test against the antifungals fluconazole, nystatin and amphotericin B. RESULTS: the frequency of positive cultures for yeasts was the same in both cities; C. albicans was the most prevalent species (about 24%), but its frequency was different: in SC it corresponded to 77.4% of the yeasts both in symptomatic and asymptomatic women and in PR it was 50.0% with predominance in symptomatic women. We observed high rates of susceptibility to fluconazole and amphotericin B, but 51.1% of the yeasts presented dose-dependent susceptibility (DDS) to nystatin. C. albicans showed a higher tendency to be nystatin resistant (52.8% DDS) than non-albicans species (44.4%). CONCLUSIONS: our data showed geographic differences among the species of yeasts isolated from the vagina and suggest that this fact has clinical relevance considering the differences in susceptibility, especially regarding nystatin, which could be important for the management of vulvovaginal candidiasis.

Yeasts; Fungi; Antifungal susceptibility; Vulvovaginal candidiasis


ARTIGOS ORIGINAIS

Caracterização de leveduras isoladas da vagina e sua associação com candidíase vulvovaginal em duas cidades do sul do Brasil

Characterization of yeasts isolated from the vagina and their association with vulvovaginal candidíasis in two cities of the South of Brazil

Magda Helena S. H. FerrazzaI; Márcia L. Ferrarezi MalufI; Marcia Edilaine Lopes ConsolaroII; Cristiane Suemi ShinobuII, III; Terezinha Inez Estivalet SvidzinskiII; Márcia Regina Batista

Universidade Estadual de Maringá – Paraná – Brasil

ISetor de Micologia Médica – Laboratório de Ensino e Pesquisa em Análises Clínicas

IICurso de Farmácia

IIIBolsista CNPq – Iniciação Científica (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Terezinha Inez Estivalet Svidzinski R. Júlio Favoretto 35 – Vila Esperança 87020-600 – Maringá – PR Telefone: (44) 261-4809 Fax: (44) 263-1387 e-mail: tiesvidzinski@uem.br

RESUMO

OBJETIVOS: avaliar a distribuição de espécies de leveduras isoladas da vagina em duas localidades do sul do Brasil e comparar o perfil de suscetibilidade in vitro destas leveduras a antifúngicos usados na prática clínica.

MÉTODOS: todas as mulheres atendidas entre janeiro e junho de 2004 para exames rotineiros de amostras vaginais, independente de serem sintomáticas ou não, foram incluídas neste estudo. Foram excluídas as que apresentavam imunodeficiências como AIDS ou outras infecções genitais. Amostras de conteúdo vaginal dessas mulheres (Jaraguá do Sul - SC (n=130) e Maringá - PR (n=97)) foram cultivadas. As leveduras isoladas foram identificadas e submetidas ao teste de suscetibilidade aos antifúngicos fluconazol, nistatina e anfotericina B.

RESULTADOS: a freqüência de cultura positiva para levedura foi semelhante nas duas localidades, aproximadamente 24%. Candida albicans foi a espécie prevalente, mas sua freqüência diferiu: em SC correspondeu a 77,4% das leveduras e foi a mais freqüente tanto nas mulheres sintomáticas quanto nas assintomáticas. Já no PR foi 50,0%, com predomínio mais evidente nos casos sintomáticos. Observamos altos índices de suscetibilidade ao fluconazol e anfotericina B, porém 51,1% das leveduras apresentaram suscetibilidade dependente da dose (S-DD) para nistatina. C. albicans mostrou maior tendência de resistência à nistatina (52,8% de S-DD) do que as espécies não-albicans (44,4%).

CONCLUSÕES: nossos dados mostram diferenças regionais quanto à espécie de levedura em amostras vaginais. Sugerem que a determinação da espécie pode ter implicação clínica, considerando as diferenças quanto à suscetibilidade, principalmente à nistatina, e que poderiam ter importância no manejo da candidíase vulvovaginal.

Palavras-chave: Leveduras; Candidíase vulvovaginal; Antifúngicos

ABSTRACT

PURPOSE: to evaluate the distribution of yeast species isolated from the vagina in two cities of the South of Brazil and compare the in vitro susceptibility profile of these yeasts against some antifungals, which are used in clinical routine.

METHODS: all women attended from January to June 2004 for vaginal routine examinations, independent of being symptomatic or not were included in the study. Only those who presented immunodeficiency like AIDS or any other genital infection were excluded. Samples of vaginal discharge from the women (Jaraguá do Sul - SC (n=130) and Maringá - PR (n=97)) were cultivated. The yeasts were identified and submitted to the susceptibility test against the antifungals fluconazole, nystatin and amphotericin B.

RESULTS: the frequency of positive cultures for yeasts was the same in both cities; C. albicans was the most prevalent species (about 24%), but its frequency was different: in SC it corresponded to 77.4% of the yeasts both in symptomatic and asymptomatic women and in PR it was 50.0% with predominance in symptomatic women. We observed high rates of susceptibility to fluconazole and amphotericin B, but 51.1% of the yeasts presented dose-dependent susceptibility (DDS) to nystatin. C. albicans showed a higher tendency to be nystatin resistant (52.8% DDS) than non-albicans species (44.4%).

CONCLUSIONS: our data showed geographic differences among the species of yeasts isolated from the vagina and suggest that this fact has clinical relevance considering the differences in susceptibility, especially regarding nystatin, which could be important for the management of vulvovaginal candidiasis.

Keywords: Yeasts; Fungi; Antifungal susceptibility; Vulvovaginal candidiasis

Introdução

A candidíase vulvovaginal (CVV) é inflamação da mucosa genital, que compromete principalmente vulva e vagina, desenvolve-se em decorrência de infecção por leveduras, as quais podem ser habitantes normais dessas mucosas. A CVV está entre os principais problemas ginecológicos que afetam mulheres em idade reprodutiva, atingindo milhares de pessoas no mundo todo. Sua prevalência parece ter aumentado nos últimos anos: a freqüência de CVV entre pacientes atendidas no ambulatório de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro aumentou gradativamente em quatro décadas, evoluindo de 0,5% em 1968 para 22,5% em 1998, época em que se tornou a causa mais comum de infecção vaginal1.

Estima-se que cerca de 75% das mulheres adultas apresentem pelo menos um episódio de vulvovaginite fúngica em sua vida, sendo que destas, 40 a 50% vivenciam novos surtos e 5% tornam-se recorrentes (CVVR). Por outro lado, estudos indicam que 20 a 25% das mulheres saudáveis e completamente assintomáticas apresentam culturas de secreção vaginal positivas para leveduras2.

Segundo Sobel2, 80 a 90% dos casos de CVV são devidos à espécie Candida albicans e 10 a 20% a outras espécies chamadas C. não-albicans (C. tropicalis, C. glabrata, C. krusei, C. parapsilosis). Entretanto, tem sido observado aumento na freqüência de isolamento de leveduras C. não-albicans em algumas populações. A maior preocupação reside no fato de que essas outras espécies, em geral, tendem a ser mais resistentes aos antifúngicos.

As leveduras são carreadas para a vagina por meio de processo de autotransmissão a partir da região perianal, tendo como fonte a microbiota normal do próprio intestino ou a troca com o parceiro por via sexual. Entretanto, estes microrganismos costumam permanecer abrigados na mucosa vaginal apenas como colonizantes e, uma vez encontrando condições apropriadas, aceleram o processo de multiplicação e expressam fatores de virulência, culminado com a invasão da mucosa e ocasionando a CVV sintomática3.

Geralmente a CVV se desenvolve quando o pH vaginal diminui devido ao aumento da quantidade de glicogênio, principalmente no período pré-menstrual2. Rosa e Rumel4 associaram a vulvovaginite por Candida com ciclos menstruais regulares. Outros fatores considerados predisponentes para o desenvolvimento de CVV incluem: diabete melito e uso de antibióticos de largo espectro, de corticóides e de anticoncepcionais orais. Parecem contribuir também gravidez, hábitos higiênicos e vestuário inadequado, como roupas muito justas ou de fibras sintéticas5. Contudo, a fisiopatogenia da CVV constitui intrincado mecanismo que envolve também a resposta do hospedeiro, além da espécie de levedura isolada, fatores que ainda não estão totalmente esclarecidos6.

Para o tratamento de CVV têm sido empregados os agentes imidazólicos e triazólicos, entre eles fluconazol, miconazol, clotrimazol, itraconazol e cetoconazol, além dos agentes poliênicos (nistatina e algumas formulações contendo anfotericina B). Contudo, não há consenso sobre a superioridade de um em relação ao outro, o que se deve, em parte, às dificuldades de aplicação de uma metodologia padronizada para teste de suscetibilidade in vitro e conseqüente escassez de publicações sobre as atividades dos antifúngicos mais utilizados7. Existem também muitas dúvidas quanto à aplicabilidade clínica dos resultados obtidos em testes de suscetibilidade aos antifúngicos realizados in vitro, pois há dificuldade na comprovação da correlação desses resultados com a eficácia terapêutica.

Tendo em vista estas considerações, o presente trabalho teve como objetivo avaliar e comparar a distribuição de leveduras C. albicans e C. não-albicans isoladas da vagina em Jaraguá do Sul - SC e em Maringá - PR, bem como determinar a suscetibilidade in vitro de algumas destas leveduras a antifúngicos usados na prática clínica.

Pacientes e Métodos

Este é um trabalho experimental prospectivo realizado com amostras de conteúdo vaginal obtidas de mulheres oriundas do serviço público de saúde (SUS) atendidas em duas localidades do sul do Brasil. Participaram 130 pacientes atendidas no Laboratório Santa Helena da cidade de Jaraguá do Sul - SC e 97 no Laboratório de Ensino e Pesquisa em Análises Clínicas (LEPAC) da Universidade Estadual de Maringá, Maringá - PR. Todas as mulheres que compareceram a um dos dois laboratórios para realização de exames laboratoriais rotineiros, no período entre janeiro e junho de 2004, foram convidadas a participar do estudo, autorizando a realização de cultura para leveduras. As voluntárias eram encaminhadas por médicos de unidades básicas de saúde para submeter-se a exames laboratoriais do conteúdo vaginal, independente de apresentarem ou não sintomas de CVV. Foram excluídas as pacientes que apresentaram história prévia de doença associada com imunodeficiência, inclusive AIDS, ou outra infecção no trato genital. Os resultados apresentados são referentes às 55 que tiveram cultura positiva para leveduras. Cada paciente, após ser esclarecida sobre a pesquisa, expressou seu consentimento por escrito como exigido pela Comissão de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (parecer nº 013/2002). Todas responderam questionário padronizado que continha informações relacionadas com sintomas de candidíase vulvovaginal8,9.

A população de estudo foi dividida em dois grupos, conforme os critérios definidos por Lopes-Consolaro et al.8: assintomáticas: mulheres com ausência de sintomas (corrimento característico, prurido vulvovaginal, ardência vulvovaginal, disúria e dispaurenia) (grupo AS); sintomáticas: mulheres que apresentaram dois ou mais desses sintomas (grupo S1).

O item corrimento característico (branco flocoso ou leitoso) foi classificado como presente ou ausente por um profissional da saúde (biomédica), no momento da coleta das amostras, conforme o descrito por Odds et al.9.

Amostras cérvico-vaginais foram coletadas com auxílio de swab vaginal e espéculo vaginal descartável (Vagispec) e imediatamente semeadas em placas de Petri contendo meio de cultura Sabouraud Dextrose Ágar (SDA-Merck) acrescido de 100 mg/mL de cloranfenicol. As placas foram incubadas a 25ºC por até cinco dias10. As amostras com crescimento de leveduras e que haviam sido colhidas no Laboratório Santa Helena foram enviadas ao LEPAC para identificação das mesmas. Um pool das colônias crescidas foram subcultivadas em CHROMagar Candida® (Probac, França) para investigação da pureza da cultura e cor das colônias. As leveduras crescidas neste meio seletivo diferencial foram identificadas de acordo com a metodologia clássica: características macromorfológicas, micromorfologia em ágar fubá, capacidade de produzir tubo germinativo, além de provas bioquímicas e fisiológicas como assimilação e fermentação de carboidratos, assimilação de nitrogênio e produção da enzima urease10.

A concentração inibitória mínima (CIM) de cada antifúngico foi determinada pelo método da microdiluição em caldo, de acordo com as normas de padronização publicadas no documento M-27T pelo National Committee for Clinical Laboratory Standards (NCCLS)11. Os antifúngicos testados foram nistatina, fluconazol e anfotericina B.

Resultados

A freqüência de cultura positiva para leveduras em Jaraguá do Sul - SC foi de 31 pacientes (23,8%), das quais 6 foram assintomáticas e 25 sintomáticas. Em 77,4% dos casos positivos foi isolado C. albicans (24/31) e as espécies C. não-albicans se distribuíram como segue: 13,0% C. glabrata (4/31), 6,4% C. guilhermondii (2/31) e 3,2% C. parapsilosis (1/31). A distribuição dessas leveduras de acordo com os grupos de sintomas pode ser observada na Tabela 1.

Em Maringá - PR, a freqüência de cultura positiva para leveduras foi de 24 pacientes (24,7%), das quais 15 foram assintomáticas e 9 sintomáticas. Em 50,0% dos casos positivos foi isolado C. albicans (12/24) e as espécies C. não-albicans se distribuíram como segue: 20,8% C. guilhermondii (5/24), 8,3% Rhodutorula sp (2/24), 8,3% C. lusitaneae (2/24), 4,2% C. tropicalis (1/24), 4,2% Trichosporon asahii (1/24) e 4,2% C. glabrata (1/24). A distribuição dessas leveduras de acordo com os grupos de sintomas pode ser observada na Tabela 1.

Teste de suscetibilidade aos antifúngicos foi realizado em 45 leveduras, as quais apresentaram condições de cultivos compatíveis com as exigências para a execução do teste. A variação da concentração inibitória mínima foi de 0,25 a 16,0 µg/mL para o fluconazol: 2,0 a 8,0 µg/mL para nistatina e 0,25 a 1,0 µg/mL para anfotericina B. A Tabela 2 mostra a distribuição desses resultados conforme a espécie de levedura.

Não foram observados isolados resistentes a nenhum dos antifúngicos testados, anfotericina B também não apresentou resultados intermediários ou suscetibilidade dependente da dose (S-DD). A Tabela 3 mostra a distribuição dos isolados sensíveis e intermediários em relação ao fluconazol e nistatina. Foi elevada a freqüência de S-DD para a nistatina, particularmente entre as cepas de C. albicans (52,8%).

Discussão

No presente estudo, C. albicans foi a levedura mais freqüente nas duas populações. Em SC representou 77,4% dos isolados, ao passo que no PR essa porcentagem foi de 50,0%. Segundo Corsello et al.12, alguns estudos mostram que a distribuição das espécies de leveduras no sítio vaginal é variável. Esses autores consideram tais resultados discordantes entre si e atribuem o fato a variações metodológicas. Contudo, a discrepância observada neste estudo é intrigante, uma vez que para as duas populações foi seguido o mesmo protocolo, executado pela mesma equipe. Assim, nossos achados parecem sugerir que entre os fatores epidemiológicos deva ser considerada também a variação conforme a localização geográfica. Salientamos que Rosa e Rumel4 obtiveram freqüência de 96% para C. albicans em material vaginal obtido em outra população de SC. Por outro lado é possível admitir que em Maringá esteja se confirmando a tendência de aumento no isolamento de leveduras C. não-albicans, como em outras populações7,13. Lopes-Consolaro et al.8 já haviam encontrado resultados semelhantes em outro estudo realizado nesta cidade.

Houve diferenças também no que se refere ao isolamento de leveduras conforme o quadro clínico. Em SC, C. albicans foi a mais prevalente nas duas condições clínicas, ao passo que no PR, o predomínio foi mais evidente nos casos sintomáticos (6/9) do que nas assintomáticas (6/15). Lope-Consolaro et al.8 e Dan et al.13 também associaram a presença de sintomas de CVV com o isolamento de C. albicans e de outras espécies de leveduras com a ausência de sintomas. Outros autores também têm associado espécies C. não-albicans à ausência de sintomas ou a vulvovaginites brandas2,3.

Vários autores descrevem C. glabrata como a segunda levedura mais freqüente, precedida apenas por C. albicans14. Em SC isto também ocorreu, porém no PR esta levedura não foi isolada, reforçando a hipótese da variabilidade regional.

O tratamento da CVV normalmente é empírico, porém as recidivas freqüentes refletem preocupação desde longa data quanto à eficácia desses tratamentos. Além disso, muitas pacientes não respondem à terapêutica inicial. Nesse sentido justifica-se a investigação quanto à possível resistência das leveduras aos antifúngicos. Contudo, havia controvérsia em relação à relevância clínica dos resultados obtidos com testes de sensibilidade in vitro aos antifúngicos antes de surgirem as normas de padronização preconizadas pelo NCCLS e publicadas no documento M27-A11. Esta padronização foi aceita universalmente devido a sua elevada correlação com os efeitos biológicos in vivo, entretanto sua aplicação clínica ainda é restrita. Embora sua utilização rotineira em laboratórios de análises clínicas seja limitada pelo elevado custo e execução técnica trabalhosa, é empregada em atividades de pesquisa, contribuindo para ampliar os conhecimentos sobre a expectativa com o tratamento das candidíases.

De modo geral, as leveduras por nós estudadas exibiram altos índices de sensibilidade aos três antifúngicos testados (Tabelas 2 e 3), coincidindo com o descrito por Ribeiro et al.15, que realizaram o primeiro estudo brasileiro sobre suscetibilidade in vitro com leveduras isoladas de amostras vaginais.

Confirmando a boa expectativa em relação ao fluconazol, observou-se que esta droga foi eficiente mesmo em pequenas concentrações e sua CIM foi a que exibiu maior variação (0,25 a 16,0 µg/mL). Além disso, conforme a Tabela 3, não se observou S-DD em nenhuma das amostras de C. albicans e, nas de C. glabrata, somente 1/5 (20%) mostrou sensibilidade intermediária a esta droga.

Por outro lado, foi encontrada alta freqüência de leveduras S-DD para nistatina, totalizando 23 isolados (51,1%), sendo 19 C. albicans (86,6%) e 4 C. não-albicans. Estes dados indicam a necessidade de doses terapêuticas mais elevadas desta droga para atingir resposta clínica satisfatória. Resultados semelhantes quanto à ausência de resistência de leveduras vaginais e alta freqüência de isolados S-DD para nistatina foram obtidos por Lopes-Consolaro et al.16. É importante salientar que a nistatina é droga antifúngica largamente utilizada em formulações tópicas, é de baixo custo e está disponível no serviço público. Nossos dados refletem a baixa expectativa terapêutica com nistatina observada pelas pacientes nos últimos anos.

Todas as 45 leveduras testadas foram sensíveis à anfotericina B, o que era de se esperar, uma vez que este antifúngico é um dos mais eficazes disponíveis no mercado. Este medicamento é empregado algumas vezes em formas farmacêuticas de uso tópico com atividade unicamente local nas mucosas, porém apresenta alta toxicidade e sua indicação deveria ser restrita às infecções sistêmicas.

Nossos resultados, aliados aos de Ribeiro et al.15, poderiam sugerir que a dificuldade no tratamento da CVV não estaria somente relacionada à suscetibilidade das leveduras aos antifúngicos. É possível observar uma tendência das espécies C. não-albicans de dependerem de maiores concentrações de antifúngicos para serem inibidas. Esse dado fica claro considerando principalmente C. glabrata diante do fluconazol. Notar que essa espécie é freqüentemente associada com resistência aos antifúngicos também em infecções urinárias e sistêmicas, que costumam ser mais bem estudadas do que CVV.

Observou-se, portanto, neste estudo que existem variações na freqüência de isolamento de leveduras C. albicans e C. não-albicans em diferentes populações e que, apesar de as mesmas serem sensíveis aos antifúngicos testados, há indicação de menor sensibilidade em face da nistatina, cuja dose deve ser bem avaliada na terapêutica. Já o fluconazol parece ser a droga de escolha para o tratamento clínico, abrangendo todas as espécies de leveduras envolvidas em CVV. Assim, nossos dados nos levam a sugerir que a confirmação laboratorial, incluindo a identificação das espécies fúngicas e testes de suscetibilidade a antifúngicos, poderia contribuir no manejo da CVV, levando em conta diferenças encontradas quanto às espécies isoladas em diferentes populações e a resposta diferenciada destas leveduras aos antifúngicos mais empregados na prática clínica.

Agradecimentos

Os autores agradecem à equipe do Laboratório Santa Helena pelo auxílio na coleta das amostras biológicas. A estudante Cristiane Suemi Shinobu recebe bolsa do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica PIBIC/CNPq.

Recebido em: 5/11/2004

Aceito com modificações em: 14/2/2005

Trabalho financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) processo nº 474542/2003-3

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  • Endereço para correspondência

    Terezinha Inez Estivalet Svidzinski
    R. Júlio Favoretto 35 – Vila Esperança
    87020-600 – Maringá – PR
    Telefone: (44) 261-4809 Fax: (44) 263-1387
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jul 2005
    • Data do Fascículo
      Fev 2005

    Histórico

    • Recebido
      05 Nov 2004
    • Aceito
      14 Fev 2005
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