Acessibilidade / Reportar erro

Impacto do tipo de incontinência urinária sobre a qualidade de vida de usuárias do Sistema Único de Saúde no Sudeste do Brasil

Effect of the type of urinary incontinence on the quality of life of patients in the public healthcare system in Southeastern Brazil

Resumos

OBJETIVO:

Identificar o impacto da incontinência urinária (IU) sobre a qualidade de vida (QV), comparar os escores dos domínios de QV em mulheres com incontinência de esforço (IUE), bexiga hiperativa (BH) e incontinência mista (IUM) e estabelecer a associação entre o tipo clínico de IU e o impacto sobre a QV.

MÉTODOS:

Foram coletadas informações sobre idade, índice de massa corpórea (IMC) e comorbidades de 181 mulheres incontinentes atendidas em serviço público. O King's Health Questionnaire (KHQ) foi aplicado e as pacientes foram divididas, de acordo com a autoavaliação do impacto da incontinência, em dois grupos, cujos escores dos domínios do KHQ foram comparados pelo teste de Mann-Whitney. De acordo com os sintomas, as mulheres foram divididas nos grupos IUE, BH e IUM, e os escores do KHQ foram comparados pelos testes de Kruskal-Wallis e de Dunn. As razões de chances (OR) de a mulher reportar pior impacto da IU na QV foram estimadas por modelo logístico binário. As variáveis de controle foram faixa etária, IMC e número de comorbidades.

RESULTADOS:

Observou-se diferença significante entre os dois grupos de autoavaliação do impacto da IU para todos os domínios do KHQ. O grupo IUM apresentou piores escores que o grupo IUE para todos os domínios, e o grupo BH, para limitações de atividades diárias e físicas. Houve diferença significante entre as chances de as mulheres dos grupos IUE e IUM reportarem pior impacto de IU na QV (OR=2,9; p=0,02).

CONCLUSÃO:

Assim como em outras populações de serviços especializados, a IUM foi o subtipo mais comum, e a perda urinária comprometeu de forma moderada/grave a QV, afetando o domínio limitações das atividades diárias com maior intensidade. A análise ajustada mostrou que mulheres com IUM apresentam chance aproximadamente três vezes maior de reportarem pior impacto sobre a QV que aquelas com IUE.

Incontinência urinária; Incontinência urinária de urgência; Incontinência urinária por estresse; Qualidade de vida; Saúde da mulher; Sistema Único de Saúde; Brasil


PURPOSE:

To identify the impact of urinary incontinence (UI) on quality of life (QoL), to compare the scores of QoL domains in women with stress urinary incontinence (SUI), overactive bladder (OAB) and mixed incontinence (MUI) and to establish the association between the clinical type of UI and the impact on QoL.

METHODS:

Data of 181 incontinent women attended at a public hospital were collected regarding age, body mass index (BMI) and co-morbidities. King's Health Questionnaire (KHQ) was applied and patients were classified into two groups according to the self-assessment of incontinence impact. KHQ scores were compared by the Mann-Whitney test. Depending on their urinary symptoms, women were divided into SUI, OAB and MUI groups and their scores in the KHQ domains were compared by the Kruskal-Wallis and Dunn tests. The odds ratio (OR) of a woman reporting a worse effect of UI on QoL was estimated using the binary logistic model. The control variables were: age, BMI and number of co-morbidities.

RESULTS:

A significant difference was found between the two groups of self-assessment of UI impact for all KHQ domains. The MUI group showed worse scores than the SUI group for all domains, and OAB group, for limitation of physical and daily activities. There was a significant difference between the odds of the women in the SUI and MUI groups reporting worse effects of UI on QoL (OR=2.9; p=0.02).

CONCLUSION:

As reported at other reference services, MUI was the most commom type, and urinary loss had a moderate/major impact on QoL, affecting mainly role limitations domain. The adjusted analysis showed that women with MUI had almost three times greater odds of reporting worse impact on QoL than women with SUI.

Urinary incontinence; Urinary incontinence, urge; Urinary incontinence, stress; Quality of life; Women's health; Unified Health System; Brazil


Introdução

A incontinência urinária (IU) é a disfunção do assoalho pélvico definida clinicamente como o sintoma de qualquer perda involuntária de urina, sendo mais comum em mulheres1Haylen B, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogyn J. 2010;21(1):5-26.. Estudos nacionais têm estimado diferentes prevalências de IU, variando de 5,8 a 32,2%, de acordo com a população estudada, faixa etária, característica do estudo (populacional ou baseado em serviços de saúde) e abordagem metodológica2Tamanini JT, Lebrão ML, Duarte YA, Santos JL, Laurenti R. Analysis of the prevalence of and factors associated with urinary incontinence among elderly people in the Municipality of São Paulo, Brazil: SABE Study (Health, Wellbeing and Aging). Cad Saúde Pública. 2009;25(8):1756-62.

Brito LG, Brito LM, Chein MB, Malheiros ES, Duarte TB, Pinto-Neto AM. Stress urinary incontinence in climacteric women in a northeastern Brazilian municipality: a household survey. Int Urogynecol J. 2012;23(5):639-45.

Araujo MP, Takano CC, Girão MJ, Sartori MG. Pelvic floor disorders among indigenous women living in Xingu Indian park, Brazil. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(9):1079-84.
- 5Virtuoso JF, Menezes EC, Mazo GZ. [Risk factors for urinary incontinence in elderly women practicing physical exercises]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2015;37(2):82-6. Portuguese..

Tem grande impacto negativo sobre a qualidade de vida (QV), afetando o contato social, a atividade laborativa, a higiene e a vida sexual das mulheres6Pinto JM, Neri AL. Factors associated with low life life satisfaction in community-dwelling elderly: FIBRA Study. Cad Saúde Pública. 2013;29(12):2447-58. , 7Kwon BE, Kim GY, Son YJ, Roh YS, You MA. Quality of life of women with urinary incontinence: a systematic literature review. Int Neurourol J. 2010;14(3):133-8.. Traz, também, custos relacionados ao uso de absorventes e fraldas geriátricas, além de medicamentos, tendo impacto sobre o orçamento familiar. Onera, além disso, o sistema de saúde, devido à demanda de consultas para diagnóstico e internações para tratamento cirúrgico8Tang DH, Colayco DC, Khalaf KM, Piercy J, Patel V, Globe D, et al. Impact of urinary incontinence on healthcare resource utilization, health-related quality of life and productivity in patients with overactive bladder. BJU Int. 2014;113(3):484-91..

A IU pode ser classificada clinicamente em três tipos principais: incontinência urinária de esforço (IUE), bexiga hiperativa (BH) e incontinência mista (IUM). A avaliação do impacto de cada subtipo de IU sobre a QV tem sido objeto de vários estudos, com resultados discordantes. Para alguns, não há diferença entre os três subtipos no que se refere ao impacto na QV, sendo mais importante a gravidade da perda9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. , 1010 Barentsen JA, Visser E, Hofstetter H, Maris AM, Dekker JH, de Bock GH. Severity, not type, is the main predictor of decreased quality of life in elderly women with urinary incontinence: a population-based study as part of a randomized controlled trial in primary care. Health Qual Life Outcomes. 2012;10:153. , enquanto outros sugerem não haver diferença entre IUM e urge-incontinência (UI), mas entre cada uma delas e IUE, já que pacientes com IUE seriam menos dependentes de sua perda urinária porque a mesma ocorre em situações previsíveis, sendo, portanto, evitáveis1111 Dooley Y, Lowenstein L, Kenton K, FitzGerald M, Brubaker L. Mixed incontinence is more bothersome than pure incontinence subtypes. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2008;19(10):1359-62.

12 Lasserre A, Pelat C, Guéroult V, Hanslik T, Chartier-Kastler E, Blanchon T, et al. Urinary incontinence in French women: prevalence, risk factors, and impact on quality of life. Eur Urol. 2009;56(1):177-83.
- 1313 Frick AC, Huang AJ, Van den Eeden SK, Knight SK, Creasman JM, Yang J, et al. Mixed urinary incontinence: greater impact on quality of life. J Urol. 2009;182(2):596-600.. A IUM foi relacionada à pior qualidade de vida em estudos de diversos países, comparada às demais disfunções1414 Firdolas F, Onur R, Deveci SE, Rahman S, Sevindik F, Acik Y. Effect of urinary incontinence and its subtypes on quality of life of women in Eastern Turkey. Urology. 2012;80(6):1221-6.

15 Minassian VA, Devore E, Hagan K, Grodstein F. Severity of urinary incontinence and effect on quality of life in women by incontinence type. Obstet Gynecol. 2013;121(5):1083-90.

16 Coyne KS, Zhou Z, Thompson C, Versi E. The impact on health-related quality of life of stress, urge and mixed urinary incontinence. BJU Int. 2003;92(7):731-5.

17 Schimpf MO, Patel M, O'Sullivan DM, Tulikangas PK. Difference in quality of life in women with urge urinary incontinence compared to women with stress urinary incontinence. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(7):781-6.
- 1818 Asoglu MR, Selcuk S, Cam C, Cogendez E, Karateke A. Effects of urinary incontinence subtypes on women's quality of life (including sexual life) and psychosocial state. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2014;176:187-90.. Os domínios da QV mais afetados também têm variado de acordo com os estudos e com o tipo de disfunção.

As diferenças entre esses estudos podem ser explicadas por variações populacionais, caso o trabalho tenha sido feito em ambiente comunitário ou hospitalar, e por abordagens metodológicas distintas, principalmente em relação ao diagnóstico - clínico ou feito através do estudo urodinâmico - e à mensuração da QV1919 Herrmann V, Di Sessa RG, Ricceto CL, Morais SS, Castro EB, Juliato CR. [Correlation of the International Consultation on Incontinence Questionaire: Urinary Incontinence/Short Form to Urodynamic diagnosis in women with urinary incontinence]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(1):16-20. Portuguese..

Existem vários instrumentos para avaliar a QV relacionada à IU, sendo os três mais recomendados, por suas qualidades psicométricas: o Kings's Health Questionnaire (KHQ), o International Conference on Incontinence Questionnaire-Short Form (ICQ-SF) e o Incontinence-Specific Quality of Life Instrument (I-QOL)2020 Hewison A, McCaughan D, Watt I. An evaluative review of questionnaires recommended for the assessment of quality of life and symptom severity in women with urinary incontinence. J Clin Nurs. 2014;23(21-22):2998-3011. .

O KHQ, desenvolvido na Inglaterra para quantificar o impacto específico da IU sobre a QV, é considerado de fácil aplicação e já foi traduzido e validado para uso no Brasil2121 Tamanini JTN, D'Ancona CAL, Botega NJ, Rodrigues Netto N Jr. [Validation of the Portuguese version of the King's Health Questionnaire for urinary incontinent women]. Rev Saúde Pública. 2003;37(2):203-11. Portuguese.. É composto por 26 perguntas, sendo que a primeira avalia a autopercepção de saúde em geral e a segunda, o impacto da incontinência sobre a vida da paciente. As demais identificam os vários sintomas urinários apresentados pela mulher e avaliam o impacto da IU sobre os diferentes domínios de QV (limitações das atividades diárias, físicas e sociais, comprometimento das relações pessoais, do sono e da disposição e as medidas de gravidade da incontinência urinária). Todas as perguntas participam na formação de escores que variam de 0 a 100, sendo que, quanto maior o valor, maior o impacto desfavorável sobre a QV.

Existem alguns estudos brasileiros avaliando a QV específica relacionada à IU, a maioria de caráter descritivo e com populações pequenas2222 Silva L, Lopes MH. [Urinary incontinence in women: reasons for not seeking treatment]. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(1):72-8. Portuguese.

23 Faria CA, Menezes AM, Rodrigues AO, Ferreira AL, Bolsas CN. [Urinary incontinence and nocturia: prevalence and impact on quality of life in elderly women in a Primary Health Care Unit]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(1):17-25. Portuguese.

24 Bomfim IQ, Soutinho RS, Araújo EM. [Quality of life of women with urinary incontinence assisted in the public and private health system]. UNOPAR Cient Ciênc Biol Saúde. 2014;16(1):19-24. Portuguese.

25 Rett MT, Simões JA, Herrmann V, Gurgel MSC, Morais SS. [Women's life quality after physical therapy treatment for stress urinary incontinence]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2007;29(3):134-40. Portuguese.
- 2626 Pitangui AC, Silva RG, Araújo RC. [Prevalence and impact of urinary incontinence on the quality of life of institutionalized elderly women]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(4):619-26. Portuguese.. Pacientes atendidas em unidades básicas de saúde do Sudeste mostraram maior prevalência de incontinência mista, de acordo com o KHQ2222 Silva L, Lopes MH. [Urinary incontinence in women: reasons for not seeking treatment]. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(1):72-8. Portuguese. , 2323 Faria CA, Menezes AM, Rodrigues AO, Ferreira AL, Bolsas CN. [Urinary incontinence and nocturia: prevalence and impact on quality of life in elderly women in a Primary Health Care Unit]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(1):17-25. Portuguese. . No estudo de Campinas, cuja média de idade foi 44,3 anos, os domínios do KHQ mais afetados foram percepção geral de saúde, impacto da incontinência, limitações das atividades diárias e limitações físicas; o menos afetado foi limitações sociais2222 Silva L, Lopes MH. [Urinary incontinence in women: reasons for not seeking treatment]. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(1):72-8. Portuguese. . Em Niterói, para idosas de uma unidade básica de saúde, os escores mais elevados, denotando maior comprometimento, foram sono/disposição, percepção geral de saúde e impacto da incontinência. O menos afetado foi igualmente o de limitações sociais2323 Faria CA, Menezes AM, Rodrigues AO, Ferreira AL, Bolsas CN. [Urinary incontinence and nocturia: prevalence and impact on quality of life in elderly women in a Primary Health Care Unit]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(1):17-25. Portuguese. .

Já na cidade de Maceió, em postos de saúde e clínicas particulares, ainda que os domínios afetados com maior e menor intensidade tenham sido os mesmos que aqueles encontrados no Sudeste, o tipo de IU mais comum foi a IUE2424 Bomfim IQ, Soutinho RS, Araújo EM. [Quality of life of women with urinary incontinence assisted in the public and private health system]. UNOPAR Cient Ciênc Biol Saúde. 2014;16(1):19-24. Portuguese. .

Mulheres encaminhadas para tratamento fisioterápico da IUE atendidas em serviço terciário no Sudeste2525 Rett MT, Simões JA, Herrmann V, Gurgel MSC, Morais SS. [Women's life quality after physical therapy treatment for stress urinary incontinence]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2007;29(3):134-40. Portuguese. apresentaram piores escores para os domínios limitações das atividades diárias e limitações físicas, ao passo que idosas institucionalizadas no Nordeste mostraram maior impacto no domínio sono e energia e na escala de medidas de gravidade2626 Pitangui AC, Silva RG, Araújo RC. [Prevalence and impact of urinary incontinence on the quality of life of institutionalized elderly women]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(4):619-26. Portuguese.. Em ambos os grupos de pacientes, o domínio menos afetado foi limitações sociais.

O objetivo deste estudo foi descrever a QV em pacientes com IU e identificar o impacto dos três subtipos, controlando para idade, índice de massa corporal (IMC) e número de comorbidades, fatores apontados na literatura como associados à QV em mulheres9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. , 2727 Coyne KS, Wein A, Nicholson S, Kvasz M, Chen CI, Milsom I. Comorbidities and personal burden of urgency urinary incontinence: a systematic review. Int J Clin Pract. 2013;67(10):1015-33. .

Métodos

Foi realizado um estudo transversal, no período de junho de 2010 a fevereiro de 2013. As pacientes foram selecionadas no ambulatório de Uroginecologia do Hospital Universitário Antonio Pedro (HUAP), em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. O hospital faz parte da Universidade Federal Fluminense (UFF) e é referência para a Região Metropolitana II do estado. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HUAP/UFF.

Foram incluídas no estudo mulheres com queixa de IU e capacidade cognitiva preservada e excluídas aquelas com infecções urinárias de repetição, dor uretral ou vesical e nefrolitíase. As pacientes que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e foram convidadas a preencher o KHQ ou, caso solicitassem, a responderem ao questionário lido pelo pesquisador. De acordo com a escala de sintomas urinários do questionário, foram divididas nos três grupos de estudo. O grupo IUE (grupo 1) foi composto por mulheres que referiam perda de urina somente durante os esforços e/ou atividade física. O grupo BH (grupo 2) foi composto por pacientes que apresentavam o sintoma de urgência, associada ou não à UI, frequência ou noctúria, sem perda urinária aos esforços. Já o grupo IUM (grupo 3) foi composto por mulheres que se queixavam simultaneamente de perda aos esforços e de UI1Haylen B, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogyn J. 2010;21(1):5-26..

As respostas à segunda pergunta do KHQ ("Quanto você acha que o seu problema de bexiga afeta sua vida?") se referem à autoavaliação específica do impacto da perda sobre a vida da mulher e têm como possibilidade de respostas "nem um pouco", "um pouco", "moderadamente" e "muito". Considerou-se que as pacientes que escolheram as duas primeiras opções reportavam menor impacto da IU sobre a QV, e as demais, maior impacto, e esses dois grupos assim formados foram utilizados para análise.

As variáveis idade, peso, altura e comorbidades foram aferidas diretamente com a paciente, por meio de questionário estruturado. Para fins de estratificação, foram consideradas idosas as mulheres com mais de 60 anos2828 Parahyba MI, Simões CC. [Disability prevalence among the elderly in Brazil]. Ciênc Saúde Coletiva. 2006;11(4):967-74. Portuguese. .

O IMC foi calculado pela fórmula peso/altura2Tamanini JT, Lebrão ML, Duarte YA, Santos JL, Laurenti R. Analysis of the prevalence of and factors associated with urinary incontinence among elderly people in the Municipality of São Paulo, Brazil: SABE Study (Health, Wellbeing and Aging). Cad Saúde Pública. 2009;25(8):1756-62. e as mulheres foram classificadas em obesas (IMC ≥30), com sobrepeso (IMC ≥25), com peso normal (IMC ≥18,5 e <25) e baixo peso (IMC <18,5)2929 World Health Organization. Obesity - preventing and managing the global epidemic: report of a WHO Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 894). .

Análise estatística

Foram estimadas as prevalências dos níveis de autoavaliação do impacto da incontinência sobre a QV, identificadas através da segunda pergunta do KHQ, e calculados escores médios referentes a cada domínio do KHQ, tanto para as mulheres que reportaram maior impacto (respostas "moderadamente" e "muito") quanto para aquelas com menor impacto da IU na QV (respostas "nem um pouco" e "um pouco"). Para comparar os escores dos domínios do KHQ entre esses dois grupos de mulheres, empregou-se o teste de Mann-Whitney.

Foi estimado também o percentual de mulheres pertencentes a cada um dos três subtipos de disfunção (Grupos IUE, BH e IUM) e os escores médios relativos aos domínios do KHQ foram calculados para cada um deles. A comparação desses escores foi realizada utilizando o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis, seguido pelo teste de comparações múltiplas de Dunn.

Para estabelecer a associação entre o subtipo de disfunção e a chance de a mulher reportar maior impacto da IU sobre a QV, utilizou-se o modelo logístico binário, considerando tanto a análise bruta quanto ajustada. Na análise ajustada, foram consideradas como variáveis de controle a faixa etária, o IMC e o número de comorbidades. A partir desses modelos, foram estimadas medidas de razão de chance (odds ratio - OR) de a mulher reportar maior impacto da IU na QV. Para avaliar a significância dos efeitos do subtipo de disfunção e das demais variáveis sobre desfecho de estudo (impacto da IU na QV), utilizou-se o teste de Wald, considerando o nível de significância de 5%.

Todas as análises estatísticas foram realizadas com o uso do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) for Windows, versão 20.0.

Resultados

A Tabela 1 apresenta as principais características clínicas das 181 mulheres com queixas de IU que satisfizeram os critérios de inclusão do estudo. Dessas mulheres, 53,0% eram idosas, cerca de 80% eram obesas ou tinham sobrepeso e 71,8% apresentavam pelo menos uma comorbidade. O subtipo de incontinência urinária mais frequente foi a IUM.

Tabela 1.
Distribuição das pacientes segundo a faixa etária e as suas características clínicas (n=181 mulheres)

Para 77,3% do total de mulheres, a IU afetava moderadamente ou muito a sua vida. A comparação entre os grupos com maior e menor impacto da IU no que se refere aos escores para os domínios do KHQ encontram-se na Tabela 2. As médias dos escores foram maiores no domínio relacionado às atividades diárias (61,9), no grupo moderado/grave, e no domínio relacionado às emoções (30,1), para o grupo nenhum/leve. Em todos os domínios, a diferença entre os grupos foi significativa, sendo as maiores relativas aos domínios limitações das atividades diárias e relações pessoais.

Tabela 2.
Escores médios para cada domínio do King's Health Questionnaire, segundo a autoavaliação do impacto da incontinência urinária sobre a qualidade de vida e tipo clínico de incontinência urinária

Os escores dos domínios do KHQ diferiram de acordo com o subtipo de IU e foram mais elevados entre as mulheres com incontinência mista (Tabela 2).

Os maiores escores para o grupo IUM foram encontrados nos domínios limitações das atividades diárias (média de 60,1), emoções (média de 57,0) e relações pessoais (média de 57,0). Para o grupo BH, o maior escore foi o do domínio emoções (média de 42,0) e, para as mulheres do grupo IUE, o domínio mais afetado foi limitações das atividades diárias (média de 37,8).

Considerando o teste de comparações múltiplas, observou-se que existem diferenças significativas nos escores de todos os domínios do KHQ entre os grupos IUE e IUM (Tabela 2). As maiores diferenças foram para os escores dos domínios relações pessoais e emoções.

Apenas para os escores das limitações de atividades diárias e de limitações físicas, observaram-se também diferenças significativas entre os grupos BH e IUM (Tabela 2). Não houve diferença significante entre os escores dos grupos BH e IUE.

Ao avaliar a associação dos subtipos de incontinência urinária com a QV, na análise bruta, observou-se diferença significante da chance de as mulheres do grupo IUM reportarem pior impacto da IU na QV, comparativamente a das mulheres do grupo IUE. Desse modo, a chance de as mulheres do grupo IUM reportarem maior impacto da IU na QV é 2,8 vezes maior do que a das mulheres do grupo IUE. Não se verificou diferença significante entre as chances de as mulheres dos grupos IUE e BH reportarem pior impacto da IU na QV (Tabela 3).

Tabela 3.
Associação entre o grupo de disfunção e o impacto da incontinência urinária sobre a qualidade de vida, segundo as análises bruta e ajustada

Na análise ajustada, ao controlar pela faixa-etária, IMC e número de comorbidades, continuou havendo diferença estatisticamente significante entre as chances de as mulheres com IUE e IUM reportarem maior impacto de IU na QV (OR=2,9; p=0,02) e ausência de diferença entre as mulheres dos grupos IUE e BH. As demais variáveis de controle não apresentaram associação significativa com o impacto da IU na QV, em ambas as análises (Tabela 3).

Discussão

As pacientes que participaram deste estudo, realizado num centro de referência para investigação e tratamento da IU, eram em sua maioria mulheres idosas, que apresentavam como subtipo mais comum a IUM e referiam impacto moderado/grave da IU sobre a sua vida. Além disso, a prevalência de comorbidades como hipertensão e diabetes, consideradas fatores que impactam negativamente a QV relacionada à saúde, foi de 71,8%. Essa população apresentava características semelhantes às de outros serviços especializados, frequentados por mulheres que consideram que a perda urinária compromete mais a sua QV - e que, portanto, estão mais motivadas a procurar tratamento para a sua condição - e onde a IUM é também o subtipo mais comum2 , 9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. , 1212 Lasserre A, Pelat C, Guéroult V, Hanslik T, Chartier-Kastler E, Blanchon T, et al. Urinary incontinence in French women: prevalence, risk factors, and impact on quality of life. Eur Urol. 2009;56(1):177-83. , 1313 Frick AC, Huang AJ, Van den Eeden SK, Knight SK, Creasman JM, Yang J, et al. Mixed urinary incontinence: greater impact on quality of life. J Urol. 2009;182(2):596-600.. Já os estudos na população geral apontam para uma maior prevalência de IUE e para um menor impacto sobre a QV, além de refletirem as várias populações com suas características genéticas, culturais e diferentes níveis de escolaridade4Araujo MP, Takano CC, Girão MJ, Sartori MG. Pelvic floor disorders among indigenous women living in Xingu Indian park, Brazil. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(9):1079-84. , 6Pinto JM, Neri AL. Factors associated with low life life satisfaction in community-dwelling elderly: FIBRA Study. Cad Saúde Pública. 2013;29(12):2447-58. , 1111 Dooley Y, Lowenstein L, Kenton K, FitzGerald M, Brubaker L. Mixed incontinence is more bothersome than pure incontinence subtypes. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2008;19(10):1359-62. , 1515 Minassian VA, Devore E, Hagan K, Grodstein F. Severity of urinary incontinence and effect on quality of life in women by incontinence type. Obstet Gynecol. 2013;121(5):1083-90..

As versões do questionário KHQ para os diferentes idiomas têm sido utilizadas em populações institucionalizadas2626 Pitangui AC, Silva RG, Araújo RC. [Prevalence and impact of urinary incontinence on the quality of life of institutionalized elderly women]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(4):619-26. Portuguese., atendidas em serviços de referência30 30 Arañó P, Rebollo P, González-Segura Alsina D. [Assessment of the health-related quality of life impact in female with mixed urinary incontinence]. Actas Urol Esp. 2009;33(4):410-5. Spanish. e unidades de atenção primária2424 Bomfim IQ, Soutinho RS, Araújo EM. [Quality of life of women with urinary incontinence assisted in the public and private health system]. UNOPAR Cient Ciênc Biol Saúde. 2014;16(1):19-24. Portuguese. . Com a sua utilização no ambulatório de Uroginecologia do HUAP, observamos que mulheres com IUM apresentaram escores de impacto sobre a QV mais elevados do que aquelas com IUE em todos os domínios e também que pacientes com IUM têm escores mais elevados para os domínios limitações das atividades diárias (LAD) e limitações físicas (LF) que aquelas com BH.

Independentemente da população estudada e do instrumento utilizado, tem sido demonstrado que os sintomas de IUM estão relacionados a piores escores de impacto específico da incontinência sobre a QV quando comparada com IUE, embora seja controverso se há diferença entre IUM e UI e entre IUE e UI2Tamanini JT, Lebrão ML, Duarte YA, Santos JL, Laurenti R. Analysis of the prevalence of and factors associated with urinary incontinence among elderly people in the Municipality of São Paulo, Brazil: SABE Study (Health, Wellbeing and Aging). Cad Saúde Pública. 2009;25(8):1756-62. , 4Araujo MP, Takano CC, Girão MJ, Sartori MG. Pelvic floor disorders among indigenous women living in Xingu Indian park, Brazil. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(9):1079-84. , 6Pinto JM, Neri AL. Factors associated with low life life satisfaction in community-dwelling elderly: FIBRA Study. Cad Saúde Pública. 2013;29(12):2447-58. , 9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. , 1010 Barentsen JA, Visser E, Hofstetter H, Maris AM, Dekker JH, de Bock GH. Severity, not type, is the main predictor of decreased quality of life in elderly women with urinary incontinence: a population-based study as part of a randomized controlled trial in primary care. Health Qual Life Outcomes. 2012;10:153. , 1616 Coyne KS, Zhou Z, Thompson C, Versi E. The impact on health-related quality of life of stress, urge and mixed urinary incontinence. BJU Int. 2003;92(7):731-5. , 1717 Schimpf MO, Patel M, O'Sullivan DM, Tulikangas PK. Difference in quality of life in women with urge urinary incontinence compared to women with stress urinary incontinence. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(7):781-6. .

Em grande parte desses trabalhos, as pacientes foram separadas nos grupos IUE, IUM e UI, de acordo com diagnóstico clínico. É importante salientar que essa não é a padronização de nomenclatura da ICS/IUGA1Haylen B, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogyn J. 2010;21(1):5-26. para definição dos subtipos de IU, cujas recomendações foram seguidas no presente estudo. De acordo com essa classificação, mulheres com UI podem tanto estar no grupo IUM quanto no grupo BH, e isso pode dificultar a identificação de diferenças no impacto desses subtipos de IU sobre a QV.

A imprevisibilidade da UI, levando a paciente a situações constrangedoras em domicílio ou nos vários ambientes que frequenta, associada à perda aos esforços, pode trazer mais limitações para as mulheres que os sintomas isolados, e isso pode ser a justificativa para os piores escores apresentados pelas mulheres com IUM. Além disso, portadoras de IU utilizam várias modalidades para enfrentá-la e gerenciá-la, com o objetivo de reduzir o impacto sobre a rotina diária3131 Volkmer C, Monticelli M, Reibnitz KS, Brüggemann OM, Sperandio FF. [Female urinary incontinence: a systematic review of qualitative studies]. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2703-15. Portuguese.. Tais atitudes de prevenção tomadas pela paciente com somente BH ou IUE poderiam facilitar o maior controle sobre os seus sintomas ao ficar próxima ao banheiro, no caso de apresentar BH, ou ao contrair a musculatura perineal no momento do esforço, no caso da IUE, conseguindo diminuir o impacto da incontinência sobre as suas atividades.

No grupo IUM, os domínios de QV que sofreram maior impacto foram limitações das atividades diárias, emoções e relações pessoais. Tais resultados são semelhantes aos do estudo de Bomfim et al.2424 Bomfim IQ, Soutinho RS, Araújo EM. [Quality of life of women with urinary incontinence assisted in the public and private health system]. UNOPAR Cient Ciênc Biol Saúde. 2014;16(1):19-24. Portuguese. que compararam a QV de pacientes atendidas no SUS e em serviços privados em Maceió (AL) utilizando também o KHQ e encontraram maior impacto negativo nas primeiras, sendo também afetados os domínios limitações de atividades diárias e emoções, além das atividades físicas. O domínio menos afetado foi limitações sociais em ambos os cenários de atendimento. Por outro lado, estudo multicêntrico realizado na Espanha em mulheres com IUM mostrou que os domínios do KHQ mais afetados foram as medidas de gravidade, as limitações físicas e das atividades diárias3030 Arañó P, Rebollo P, González-Segura Alsina D. [Assessment of the health-related quality of life impact in female with mixed urinary incontinence]. Actas Urol Esp. 2009;33(4):410-5. Spanish. .

A diferença encontrada esses estudos pode se dever à diferença entre as populações amostradas, seja do ponto de vista de local de seleção de pacientes, seja do ponto de vista geográfico. Fatores culturais podem ter influência sobre a maneira de a mulher lidar com a IU, levando-a a subestimar o problema e evitar abordá-lo com membros da própria família ou com os profissionais de saúde, por um lado, ou tendo atitudes positivas e expectativa de obter cura ou resposta positiva para o seu problema. Com isso, é possível que os domínios de QV sejam afetados diversamente em cada grupo populacional estudado3131 Volkmer C, Monticelli M, Reibnitz KS, Brüggemann OM, Sperandio FF. [Female urinary incontinence: a systematic review of qualitative studies]. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2703-15. Portuguese..

A perda involuntária de urina, muitas vezes imprevisível ou incontrolável, pode trazer para a mulher dificuldades em realizar as suas atividades diárias, domiciliares ou não, laborativas, domésticas ou de programas de vida saudável, no caso da atividade física, levando à interrupção frequente das mesmas. Tal fato pode também acentuar o estresse durante o trabalho e ter reflexos sobre o estado emocional da mulher. Além disso, os escores elevados do domínio emoções, também demonstrado por Frick et al.1313 Frick AC, Huang AJ, Van den Eeden SK, Knight SK, Creasman JM, Yang J, et al. Mixed urinary incontinence: greater impact on quality of life. J Urol. 2009;182(2):596-600., podem refletir a ansiedade e o temor de não conseguir controlar a micção involuntária e as sensações de vergonha e frustração quando a mesma acontece.

Por outro lado, a vida social pode sofrer menos impacto da incontinência seja pelo suporte do grupo social a que a paciente pertence, seja pela possibilidade de programar esse tipo de atividade e o local onde se realizará, permitindo à mulher conhecer de antemão a disponibilidade de banheiros, que lhe permitam conforto para impedir a perda ou minorar os seus efeitos.

O comprometimento do domínio relações pessoais denota a influência da perda urinária sobre o relacionamento familiar e sexual. Dentre as mulheres do grupo IUM, 50,8% mantinham atividade sexual. A perda urinária pode ocorrer durante a penetração e orgasmo, e pacientes que apresentaram tal sintoma mostraram piores escores de QV também em outros estudos1818 Asoglu MR, Selcuk S, Cam C, Cogendez E, Karateke A. Effects of urinary incontinence subtypes on women's quality of life (including sexual life) and psychosocial state. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2014;176:187-90. , 3232 Espuña Pons M, Puig Clota M. Coital urinary incontinence: impact on quality of life as measured by the King's Health Questionnaire. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2008;19(5):621-5.. O temor da IU no momento da relação sexual gera ansiedade, levando à diminuição da libido, além de poder ser fonte de atritos no relacionamento com o parceiro, o que se reflete nos escores dos domínios emoções e relacionamento pessoal (RP).

A IUM também tem sido relacionada ao maior impacto sobre a QV, principalmente quando comparada com a IUE, em estudos que utilizam outros questionários validados para a sua avaliação, que têm o seu próprio método para cálculo de escores e diferentes formas de abordagem. Os domínios mais acometidos são as atividades físicas diárias, viagens e deslocamentos, sensação de frustração, aborrecimento e de vergonha, entre outros9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. , 1010 Barentsen JA, Visser E, Hofstetter H, Maris AM, Dekker JH, de Bock GH. Severity, not type, is the main predictor of decreased quality of life in elderly women with urinary incontinence: a population-based study as part of a randomized controlled trial in primary care. Health Qual Life Outcomes. 2012;10:153. , 1212 Lasserre A, Pelat C, Guéroult V, Hanslik T, Chartier-Kastler E, Blanchon T, et al. Urinary incontinence in French women: prevalence, risk factors, and impact on quality of life. Eur Urol. 2009;56(1):177-83. , 1616 Coyne KS, Zhou Z, Thompson C, Versi E. The impact on health-related quality of life of stress, urge and mixed urinary incontinence. BJU Int. 2003;92(7):731-5. , 1717 Schimpf MO, Patel M, O'Sullivan DM, Tulikangas PK. Difference in quality of life in women with urge urinary incontinence compared to women with stress urinary incontinence. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(7):781-6. .

No presente estudo, a avaliação da associação entre os subtipos de IU e o seu impacto específico sobre a QV evidenciou que as mulheres com IUM tinham 2,8 vezes mais chance de referirem impacto da incontinência moderado/grave que aquelas com IUE, embora não tenha sido demonstrada diferença na comparação entre os grupos IUM versus BH e IUE versus BH, mesmo após serem controladas as variáveis que, segundo a literatura, estão associadas a pior QV relacionada à saúde. O menor número de participantes com diagnósticos clínicos de IUE e BH e a classificação utilizada podem ter diminuído a possibilidade de detectarmos possíveis diferenças nas comparações entre esses subtipos.

Em mulheres na população geral norte-americana, a análise ajustada para fatores como idade, raça e gravidade da incontinência mostrou que pacientes com IUM tinham 2,5 vezes mais chance de apresentar maior impacto em vários domínios de QV do que pacientes com IUE, mas não encontraram diferença entre os demais grupos1313 Frick AC, Huang AJ, Van den Eeden SK, Knight SK, Creasman JM, Yang J, et al. Mixed urinary incontinence: greater impact on quality of life. J Urol. 2009;182(2):596-600.. Resultados similares foram encontrados no estudo de coorte de enfermeiras americanas (Nurses' Health Study)1515 Minassian VA, Devore E, Hagan K, Grodstein F. Severity of urinary incontinence and effect on quality of life in women by incontinence type. Obstet Gynecol. 2013;121(5):1083-90., onde a gravidade da IU e o tipo misto foram fatores associados com maior impacto na qualidade de vida. Mesmo que essas populações sejam substancialmente diferentes e que os questionários e desenhos de estudo utilizados tenham sido outros, a semelhança desses resultados com aqueles por nós obtidos é digna de nota.

A aplicação de vários questionários para avaliação da QV geral e da QV relacionada a IU em mulheres europeias mostrou, após ajuste das covariáveis, que não somente o subtipo IUM estava relacionado ao maior impacto específico da IU sobre a QV, mas também a idade e a presença de comorbidades, entre outros9Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81. . Esses resultados diferem dos nossos, já que idade, IMC e número de comorbidades não mostraram, seja na análise bruta, seja na ajustada, maior risco de referir impacto específico da IU moderado ou grave. Apesar da diferença entre as populações do nosso estudo e a europeia, e da variabilidade dentro do estudo europeu, conduzido em 15 países, ambos concordam que a IUM está associada a uma maior chance de as pacientes reportarem que o incômodo causado pela perda urinária é moderado/grave.

Barentsen et al.1010 Barentsen JA, Visser E, Hofstetter H, Maris AM, Dekker JH, de Bock GH. Severity, not type, is the main predictor of decreased quality of life in elderly women with urinary incontinence: a population-based study as part of a randomized controlled trial in primary care. Health Qual Life Outcomes. 2012;10:153. , na Holanda, após ajustarem para os confundidores (dentre os quais idade e IMC), observaram que a IUM está associada a piores escores de QV no domínio saúde emocional do questionário utilizado por eles, e que o principal fator associado a maior impacto sobre a QV geral e específica para IU é a severidade da perda.

O presente estudo tem como ponto forte o fato de ter estimado o efeito dos tipos de IU, através da análise multivariada, em um grupo de mulheres brasileiras. Não foram encontradas análises com ajustes para fatores de confundimento em outros estudos nacionais.

A principal limitação é o tamanho amostral, além do fato de ter sido realizado em centro de referência, o que dificulta sua generalização, pois se trata de uma amostra com características diferenciadas. No entanto, os resultados, principalmente em relação à IUM, foram semelhantes a estudos realizados em diferentes cenários epidemiológicos, colaborando para a consistência dos achados.

Referências

  • 1
    Haylen B, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogyn J. 2010;21(1):5-26.
  • 2
    Tamanini JT, Lebrão ML, Duarte YA, Santos JL, Laurenti R. Analysis of the prevalence of and factors associated with urinary incontinence among elderly people in the Municipality of São Paulo, Brazil: SABE Study (Health, Wellbeing and Aging). Cad Saúde Pública. 2009;25(8):1756-62.
  • 3
    Brito LG, Brito LM, Chein MB, Malheiros ES, Duarte TB, Pinto-Neto AM. Stress urinary incontinence in climacteric women in a northeastern Brazilian municipality: a household survey. Int Urogynecol J. 2012;23(5):639-45.
  • 4
    Araujo MP, Takano CC, Girão MJ, Sartori MG. Pelvic floor disorders among indigenous women living in Xingu Indian park, Brazil. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(9):1079-84.
  • 5
    Virtuoso JF, Menezes EC, Mazo GZ. [Risk factors for urinary incontinence in elderly women practicing physical exercises]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2015;37(2):82-6. Portuguese.
  • 6
    Pinto JM, Neri AL. Factors associated with low life life satisfaction in community-dwelling elderly: FIBRA Study. Cad Saúde Pública. 2013;29(12):2447-58.
  • 7
    Kwon BE, Kim GY, Son YJ, Roh YS, You MA. Quality of life of women with urinary incontinence: a systematic literature review. Int Neurourol J. 2010;14(3):133-8.
  • 8
    Tang DH, Colayco DC, Khalaf KM, Piercy J, Patel V, Globe D, et al. Impact of urinary incontinence on healthcare resource utilization, health-related quality of life and productivity in patients with overactive bladder. BJU Int. 2014;113(3):484-91.
  • 9
    Monz B, Chartier-Kastler R, Hampel C, Samsioe G, Hunskaar S, Espuna-Pons M, et al. Patient characteristics associated with quality of life in European women seeking treatment for urinary incontinence: results from PURE. Eur Urol. 2007;51(4):1073-81.
  • 10
    Barentsen JA, Visser E, Hofstetter H, Maris AM, Dekker JH, de Bock GH. Severity, not type, is the main predictor of decreased quality of life in elderly women with urinary incontinence: a population-based study as part of a randomized controlled trial in primary care. Health Qual Life Outcomes. 2012;10:153.
  • 11
    Dooley Y, Lowenstein L, Kenton K, FitzGerald M, Brubaker L. Mixed incontinence is more bothersome than pure incontinence subtypes. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2008;19(10):1359-62.
  • 12
    Lasserre A, Pelat C, Guéroult V, Hanslik T, Chartier-Kastler E, Blanchon T, et al. Urinary incontinence in French women: prevalence, risk factors, and impact on quality of life. Eur Urol. 2009;56(1):177-83.
  • 13
    Frick AC, Huang AJ, Van den Eeden SK, Knight SK, Creasman JM, Yang J, et al. Mixed urinary incontinence: greater impact on quality of life. J Urol. 2009;182(2):596-600.
  • 14
    Firdolas F, Onur R, Deveci SE, Rahman S, Sevindik F, Acik Y. Effect of urinary incontinence and its subtypes on quality of life of women in Eastern Turkey. Urology. 2012;80(6):1221-6.
  • 15
    Minassian VA, Devore E, Hagan K, Grodstein F. Severity of urinary incontinence and effect on quality of life in women by incontinence type. Obstet Gynecol. 2013;121(5):1083-90.
  • 16
    Coyne KS, Zhou Z, Thompson C, Versi E. The impact on health-related quality of life of stress, urge and mixed urinary incontinence. BJU Int. 2003;92(7):731-5.
  • 17
    Schimpf MO, Patel M, O'Sullivan DM, Tulikangas PK. Difference in quality of life in women with urge urinary incontinence compared to women with stress urinary incontinence. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2009;20(7):781-6.
  • 18
    Asoglu MR, Selcuk S, Cam C, Cogendez E, Karateke A. Effects of urinary incontinence subtypes on women's quality of life (including sexual life) and psychosocial state. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2014;176:187-90.
  • 19
    Herrmann V, Di Sessa RG, Ricceto CL, Morais SS, Castro EB, Juliato CR. [Correlation of the International Consultation on Incontinence Questionaire: Urinary Incontinence/Short Form to Urodynamic diagnosis in women with urinary incontinence]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2013;35(1):16-20. Portuguese.
  • 20
    Hewison A, McCaughan D, Watt I. An evaluative review of questionnaires recommended for the assessment of quality of life and symptom severity in women with urinary incontinence. J Clin Nurs. 2014;23(21-22):2998-3011.
  • 21
    Tamanini JTN, D'Ancona CAL, Botega NJ, Rodrigues Netto N Jr. [Validation of the Portuguese version of the King's Health Questionnaire for urinary incontinent women]. Rev Saúde Pública. 2003;37(2):203-11. Portuguese.
  • 22
    Silva L, Lopes MH. [Urinary incontinence in women: reasons for not seeking treatment]. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(1):72-8. Portuguese.
  • 23
    Faria CA, Menezes AM, Rodrigues AO, Ferreira AL, Bolsas CN. [Urinary incontinence and nocturia: prevalence and impact on quality of life in elderly women in a Primary Health Care Unit]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(1):17-25. Portuguese.
  • 24
    Bomfim IQ, Soutinho RS, Araújo EM. [Quality of life of women with urinary incontinence assisted in the public and private health system]. UNOPAR Cient Ciênc Biol Saúde. 2014;16(1):19-24. Portuguese.
  • 25
    Rett MT, Simões JA, Herrmann V, Gurgel MSC, Morais SS. [Women's life quality after physical therapy treatment for stress urinary incontinence]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2007;29(3):134-40. Portuguese.
  • 26
    Pitangui AC, Silva RG, Araújo RC. [Prevalence and impact of urinary incontinence on the quality of life of institutionalized elderly women]. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(4):619-26. Portuguese.
  • 27
    Coyne KS, Wein A, Nicholson S, Kvasz M, Chen CI, Milsom I. Comorbidities and personal burden of urgency urinary incontinence: a systematic review. Int J Clin Pract. 2013;67(10):1015-33.
  • 28
    Parahyba MI, Simões CC. [Disability prevalence among the elderly in Brazil]. Ciênc Saúde Coletiva. 2006;11(4):967-74. Portuguese.
  • 29
    World Health Organization. Obesity - preventing and managing the global epidemic: report of a WHO Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. (WHO Technical Report Series, 894).
  • 30
    Arañó P, Rebollo P, González-Segura Alsina D. [Assessment of the health-related quality of life impact in female with mixed urinary incontinence]. Actas Urol Esp. 2009;33(4):410-5. Spanish.
  • 31
    Volkmer C, Monticelli M, Reibnitz KS, Brüggemann OM, Sperandio FF. [Female urinary incontinence: a systematic review of qualitative studies]. Ciênc Saúde Coletiva. 2012;17(10):2703-15. Portuguese.
  • 32
    Espuña Pons M, Puig Clota M. Coital urinary incontinence: impact on quality of life as measured by the King's Health Questionnaire. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct. 2008;19(5):621-5.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2015

Histórico

  • Recebido
    19 Maio 2015
  • Aceito
    23 Jun 2015
Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br