Avaliação de um teste imunoenzimático competitivo no diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos (Bubalus bubalis)

Evaluation of a competitive enzyme immunoassay for the serological diagnosis of brucellosis in buffaloes (Bubalus bubalis)

Avaliação de um teste imunoenzimático competitivo no diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos

(Bubalus bubalis)¹

Luis A. Mathias², Lucila F. Chaves³, Raul J. S. Girio² e C. Del Fava⁴

ABSTRACT.- Mathias L.A., Chaves L.F., Girio R.J.S. & Del Fava C. 1998. [ Evaluation of a competitive enzyme immunoassay for the serological diagnosis of brucellosis in buffaloes (Bubalus bubalis). ] Avaliação de um teste imunoenzimático competitivo no diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos (Bubalus bubalis). Pesquisa Veterinária Brasileira 18(3/4):111-114. Depto Med. Veterinária Preventiva, FCAVJ-Unesp, Jaboticabal, SP 14870-000, Brazil.

The competitive enzyme immunoassay (CEIA) for the serological diagnosis of brucellosis in buffaloes (Bubalus bubalis) was evaluated by comparing its results with those obtained by the complement fixation test (CFT) and rose Bengal test (RBT). Four hundred and seventy-seven sera were tested by CEIA and RBT, and 465 of these were tested by CFT. Sera with a titre equal to or higher than 1/4 in CFT and CEIA were considered as positive. To determine the relative sensitivity and specificity of CEIA, animals with a positive result to RBT and to CFT were considered as diseased, and animals with a negative result to both of those tests were considered as non diseased. Sera with disagreeing results for both of these tests were excluded from the analysis. The results showed an agreement of 97.42% between CEIA and CFT and an agreement of 95.39% between CEIA and RBT. The relative sensitivity of CEIA was 100% and its relative specificity 98.55%. These data show that the performance of CEIA little differed from the one of the other two tests, suggesting that CEIA may be an useful tool for the serological diagnosis of brucellosis in buffaloes.

INDEX TERMS: Brucellosis, Bubalus bubalis, serological diagnosis, competitive enzyme immunoassay.

RESUMO.- O trabalho teve por objetivo avaliar o teste imunoenzimático competitivo (CEIA) para uso no diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos (Bubalus bubalis), comparando seus resultados com aqueles obtidos na reação de fixação de complemento (CFT) e no teste rosa Bengala (RBT). Foram examinados 477 soros por meio do CEIA e do RBT e 465, desses mesmos soros, por meio da CFT. Na CFT e no CEIA, soros com títulos maiores ou iguais a 1/4 foram considerados positivos. Para a determinação da sensibibilidade e da especificidade relativas do CEIA, foram considerados como doentes os animais com resultados positivos no RBT e na CFT e sãos os animais com resultados negativos nesses dois testes. Soros com resultados discordantes nesses duas provas foram eliminados da análise. Os resultados apontaram uma concordância de 97,42% entre o CEIA e a CFT e uma concordância de 95,39% entre o CEIA e o RBT. A sensibilidade relativa do CEIA foi de 100% e a especificidade relativa do teste foi de 98,55%. Esses dados mostram que o desempenho do CEIA diferiu pouco do desempenho dos outros dois testes, sugerindo que o mesmo pode constituir um recurso útil para o diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos.

TERMOS DE INDEXAÇÃO: Brucelose, Bubalus bubalis, diagnóstico sorológico, teste imunoenzimático competitivo.

INTRODUÇÃO

A brucelose é uma importante enfermidade que, entre outras espécies animais, pode atingir os búfalos (Bubalus bubalis). A maioria dos estudos a respeito da infecção nessa espécie animal tem sido feita em países da Ásia, que concentra a maior população mundial dessa espécie, porém muitos aspectos da enfermidade não são plenamente conhecidos, sendo que geralmente os procedimentos para diagnóstico e controle da enfermidade em bubalinos são adotados com base no conhecimento que se tem da infecção em bovinos.

Assim como em bovinos, um dos pilares em que se sustentam os programas de controle da doença é o diagnóstico. Daí a importância de se avaliar técnicas que possam permitir um diagnóstico seguro da enfermidade.

Embora não haja um volume muito grande de publicações a respeito do diagnóstico da infecção em búfalos, a maioria das técnicas sorológicas usualmente empregadas no diagnóstico da brucelose tem sido avaliada. Dentre essas técnicas, podem ser mencionadas o teste rosa Bengala (Aliev et al. 1983, Mathias & Pinto 1983, Nicoletti 1992), a reação de fixação de complemento (Mathias & Pinto 1983, Nicoletti 1992), provas de soroaglutinação (Soni 1978, Mathias & Pinto 1983, Nicoletti 1992), prova do anel do leite (Pat & Panigrahi 1965, Soni 1978) e dot-ELISA (Chand et al. 1988).

O teste imunoenzimático competitivo, que foi desenvolvido mais recentemente, ainda não foi avaliado para o diagnóstico da brucelose em búfalos. Há alguns trabalhos na literatura, com algumas variações de técnica, mas a maioria deles para uso no diagnóstico da brucelose bovina. Mathias et al. (1993) avaliaram esse teste em bovinos e observaram que ele foi capaz de detectar a presença de anticorpos em todos os 74 soros de bovinos dos quais havia sido isolada Brucella abortus, e apresentou especificidade de 99,95% quando usado para testar soros de animais livres da infecção.

Uma vez que o teste imunoenzimático competitivo tem demonstrado bom desempenho no diagnóstico da brucelose em bovinos e que ainda não foi utilizado para o diagnóstico dessa infecção em búfalos, no presente trabalho, pretendeu-se avaliar esse teste para uso no diagnóstico sorológico da brucelose bubalina.

MATERIAL E MÉTODOS

Soros examinados

Foram testados 477 soros de búfalos, através do teste rosa Bengala e do teste imunoenzimático competitivo. Quatrocentos e sessenta e cinco desses soros foram também testados por meio da reação de fixação de complemento. Os soros foram colhidos de fêmeas bubalinas adultas aparentemente sadias, na região do Vale do Ribeira, Estado de São Paulo.

Teste rosa Bengala

O teste foi realizado conforme recomendação de Garcia-Carrillo (1982), usando antígeno de Brucella abortus amostra 1119/3.

Reação de fixação de complemento

Utilizou-se a microtécnica com incubação a 37^oC nas duas fases da reação, com cinco unidades hemolíticas 50% de complemento, conforme recomendam Alton et al. (1988). Como antígeno, foi usada suspensão de B. abortus amostra 1119/3 inativada pelo calor, e como complemento foi usado soro de cobaia.

Teste imunoenzimático competitivo

Esse teste foi realizado conforme descrito por MacMillan et al. (1990). Os conjugados foram preparados com anticorpos monoclonais, produzidos pelo clone de hibridomas BM-40 (Greiser-Wilke et al. 1985), conjugados com peroxidase.

O antígeno consistiu de lipopolissacáride de B. abortus amostra 99, extraído pelo método água quente-fenol quente (Baker & Wilson 1965).

O substrato utilizado foi o peróxido de hidrogênio e como cromógeno utilizou OPD (O-phenylenediamine, Sigma Chemical Company-USA). A leitura da densidade ótica foi feita em um aparelho Titertek Multiskan, em comprimento de onda de 450 nm.

Análise estatística

Para verificar se houve independência entre os resultados das provas, utilizou-se o teste de X². Para efetuar essa análise, os resultados foram classificados em positivos ou negativos. Tanto para a reação de fixação de complemento como para o teste imunoenzimático competitivo, considerou-se como positivo o soro com título maior ou igual a 1/4.

Cálculo da concordância

A concordância entre dois testes foi calculada por meio da seguinte fórmula:

Determinação da sensibilidade e da especificidade

Para a determinação da sensibilidade e da especificidade relativas do teste imunoenzimático competitivo, foram considerados doentes os animais com resultados positivos no teste rosa Bengala e na reação de fixação de complemento e sãos os animais com resultados negativos nessas duas provas. Os soros cujos resultados nessas duas provas eram discordantes entre si foram eliminados da análise, conforme recomendam Martin et al. (1987). Para o cálculo, foram empregadas as seguintes fórmulas:

RESULTADOS

Comparando-se os resultados do teste imunoenzimático competitivo (CEIA) com aqueles obtidos através da reação de fixação de complemento (CFT), observa-se que dos 403 soros que não apresentaram título na CFT, 397 também não apresentaram título no CEIA e seis soros apresentaram título 1/4, enquanto que dos 402 soros que não apresentaram título no CEIA, 400 apresentaram resultado negativo na RFC. Dos sete soros com título 1/2 na CFT, três não apresentaram título e quatro apresentaram título 1/4 no CEIA. Dos 63 soros positivos no CEIA, 53 apresentaram resultado positivo na CFT, e dos 55 soros positivos nessa prova, apenas dois apresentarm resultado negativo no CEIA. Para os soros positivos, observa-se uma relação direta entre os títulos das duas provas, embora tendo sido mais frequente a ocorrência de títulos mais elevados na CFT (Quadro 1).

A concordância entre os dois testes foi de 97,42%, e o teste de X² mostrou, com 99% de confiança, haver dependência entre esses resultados.

A comparação entre os resultados do CEIA e o do teste rosa Bengala (RBT) pode ser vista no Quadro 2. Nota-se que, dos 426 soros negativos no RBT, 17 apresentaram título no CEIA, sendo 16 deles apresentaram título 1/4 e um apresentou título 1/8. De dez soros com título 1/8 no CEIA, apenas um apresentou resultado negativo no RBT. Todos os soros com título a partir de 1/16 no CEIA foram positivos quando testados pelo RBT. Dos 414 soros negativos no CEIA, cinco apresentaram resultado positivo no RBT. Quarenta e seis dos soros examinados apresentaram resultado positivo em ambos os testes.

A concordância observada entre o CEIA e o RBT foi de 95,39%, tendo sido observada dependência entre os resultados dos dois testes (P < 0,01).

Comparando os resultados do CEIA com a combinação dos resultados da CFT e do RBT (Quadro 3), constatou-se que os 42 soros com resultados positivos na CFT e no RBT também apresentaram resultado positivo no CEIA, o que implica em uma sensibilidade relativa de 100%, ao passo que dos 413 soros com resultados negativos naqueles dois testes, 407 também apresentaram resultado negativo no CEIA, implicando em uma especificidade relativa de 98,55%. O teste de X² revelou haver dependência (P < 0,01) entre os resultados do CEIA e a combinação dos resultados dos outros dois testes.

DISCUSSÃO

O diagnóstico sorológico constitui uma das principais bases em que se apóiam os programas de controle da brucelose. Dessa forma, a disponibilidade de métodos confiáveis de diagnóstico é fundamental para o sucesso de tais programas.

Por essa razão, uma diversidade muito grande de testes sorológicos tem sido avaliada para uso no diagnóstico dessa enfermidade, embora haja poucos estudos a respeito do diagnóstico em búfalos.

No presente trabalho, utilizaram-se os testes rosa Bengala (RBT) e fixação de complemento (CFT) para avaliar o teste imunoenzimático competitivo (CEIA).

A eficácia do RBT no diagnóstico da brucelose bubalina foi constatada por alguns autores. De acordo com Aliev et al. (1983), que estudaram animais infectados experimentalmente, esse foi o melhor teste para detectar infecções recentes. Nicoletti (1992) observou que o RBT foi capaz de indentificar todas as búfalas infectadas.

A utilidade da CFT também tem sido verificada. Mathias & Pinto (1983) concluíram que esse teste mostrou-se confiável para uso no diagnóstico sorológico da brucelose em búfalos, e Nicoletti (1992) verificou que a CFT pôde detectar anticorpos em todas as búfalas das quais foi isolada Brucella. Nesses dois trabalhos os autores observaram que a CFT apresentou resultados positivos em soros nos quais estavam ausentes anticorpos aglutinantes, sugerindo baixa especificidade do teste. É importante considerar que naqueles trabalhos foi empregada macrotécnica de fixação de complemento, com incubação a frio na primeira fase da reação e com uma quantidade menor de unidades de complemento (os primeiros autores usaram 2,5 unidades hemolíticas 50%, e o segundo usou 2,0 unidades), teste esse que proporciona maiores títulos e, provavelmente, maior sensibilidade, ao passo que no presente trabalho empregou-se a microtécnica com incubação a quente nas duas fases da reação e 5,0 unidades hemolíticas de complemento.

No presente trabalho, observou-se concordância de 97,42% e de 95,39% entre o CEIA e os testes de fixação de complemento e rosa Bengala, respectivamente. Ao se usar a combinação dos resultados desses dois últimos testes para avaliar o CEIA, observou-se sensibilidade relativa de 100% e especificidade relativa de 98,55%, devendo-se mencionar que os poucos resultados discrepantes foram observados com títulos ao redor do limiar de positividade dos testes.

O teste imunoenzimático competitivo foi desenvolvido após a disponibilidade da técnica de preparação de anticorpos monoclonais, e algumas variações do teste têm sido publicadas na literatura, mas principalmente para uso no diagnóstico da brucelose bovina, não havendo trabalhos usando essa técnica para o diagnóstico da infecção em búfalos. Avaliando, para o diagnóstico da infecção em bovinos, a mesma técnica empregada no presente trabalho, Mathias et al. (1993) observaram uma sensibilidade de 100% ao testar 74 soros de bovinos dos quais havia sido isolada B. abortus, e uma especificidade de 99,95% ao testar 2.118 soros de bovinos livres da infecção. A comparação com esses dados mostra que o desempenho do CEIA para diagnóstico da infecção em búfalos difere pouco do desempenho do teste para o diagnóstico em bovinos, sugerindo que essa técnica pode representar um recurso útil para o diagnóstico da brucelose nessa espécie animal.

• Aliev E.A., Sadikohov S.F., Gadzhiev. G.Z. & Koikova F.G. 1983. Diagnosis of brucellosis in buffaloes. Veterinariya, Moscow, 11: 69-71. (Vet. Bull., 1984, 54(2-3): 77, Abstract 422)
• Alton G.G., Jones L.M., Angus R.D. & Verger J.M. 1988. Techniques for the brucellosis laboratory. Institut National de la Recherche Agronomique, Paris. 190 p.
• Baker P.J. & Wilson J.B. 1965. Hypoferremia in mice and its application to the bioassay of endotoxin. J. Bacteriol. 90(4): 903-910.
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• Garcia-Carrillo C. 1982. Pruebas suplementarias para el diagnóstico de la brucellosis. Nota técnica no. 25, Centro Panamericano de Zoonosis, Ramos Mejia. 29 p.
• Greiser-Wilke I., Moennig V., Thon D. & Rauterk. 1985. Characterization of monoclonal antibodies against Brucella melitensis Zbl. Vet. Med. B 32: 616-627.
• MacMillan A.P., Greiser-Wilke I., Moennig V. & Mathias L.A. 1990. A competition enzyme immunoassay for brucellosis diagnosis. Dtsch. Tierärztl. Wschr. 97(2): 83-85.
• Martin S. W., Meek A. H. & Willeberg P. 1987. Veterinary epidemiology. Principles and methods. Iowa State University Press, Ames. 343 p.
• Mathias L.A., MacMillan A.P., Greiser-Wilke I. & Moennig V. 1993. Sensitivity and specificity of a competitive enzyme immunoassay in the serodiagnosis of bovine brucellosis. Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci. 30: 205-209.
• Mathias L. A. & Pinto A. A. 1983. Serological diagnosis of brucellosis in water buffaloes (Bubalus bubalis): comparison among complement fixation, serum agglutination and rose Bengal plate test. Int. J. Zoon. 10: 122-126.
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• Soni J.L. 1978. Suitability of different serological tests for diagnosis of brucellosis in buffaloes (Bubalus bubalis). Indian J. Anim. Sci. 48(12): 873-881.

¹

Aceito para publicação em 14 de abril de 1998.

²

Depto Medicina Veterinária Preventiva, FCAV-Unesp, Campus de Jaboticabal, Rod. Carlos Tonanni Km 5, Jaboticabal, SP 14870-000.

³

Aluna do Curso de Medicina Veterinária da FCAVJ-Unesp, Jaboticabal, SP.

⁴

Instituto de Zootecnia, Caixa Postal 60, Nova Odessa, SP 13460-000.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  03 Set 1999
• Data do Fascículo
  Jul 1998

Histórico

• Aceito
  14 Abr 1998