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Relevância de um cirurgião vascular qualificado e práticas hospitalares otimizadas na patência a longo prazo das fístulas arteriovenosas: um estudo prospectivo

Resumo

Introdução:

Fístulas arteriovenosas (FAV) são os melhores acessos vasculares para hemodiálise, mas sua taxa de falhas permanece alta. Poucos estudos abordaram o papel das habilidades do cirurgião vascular e das práticas hospitalares. Nosso objetivo foi avaliar esses fatores, com a hipótese de que as habilidades do cirurgião e as práticas hospitalares teriam um papel importante nas taxas de falhas primárias e perviedade em 12 meses, respectivamente.

Métodos:

Este foi um estudo de coorte prospectivo de um único centro, realizado de março de 2005 a março de 2017. Apenas os pacientes incidentes foram incluídos. Um único cirurgião fez todas as FAVs, seja no antebraço (inferior) ou no cotovelo (superior). As definições de acesso vascular estavam de acordo com o Consórcio Norte-Americano de Acesso Vascular.

Resultados:

Estudamos 113 FAVs (65% inferiores) de 106 pacientes (39% diabéticos, 58% começaram com cateter). O tempo até a primeira conexão foi de 21,5 dias (RI: 14 - 31). Apenas 14 FAV (12,4%) tiveram falha primária e 18 falharam durante o primeiro ano. A taxa de patência funcional primária foi de 80,9% (SE 4,1), enquanto a taxa de permeabilidade primária não assistida, que incluiu FP, foi de 70,6% (4,4). A regressão logística mostrou que o diabetes (OR = 3,3, 95% IC 1,38 - 7,88, p = 0,007) e localização no antebraço (OR = 3,03, 95% IC 1,05 - 8,76, p = 0,04) foram preditores de falha da FAV. A patência das FAVs inferior e superior foi semelhante em não-diabéticos, enquanto a perviedade em diabéticos com FAV inferior foi menor que 50%. (p = 0,003).

Conclusões:

Nossos resultados sugerem que uma FAV duradoura e adequada é viável em quase todos os pacientes. As habilidades do cirurgião e das práticas hospitalares podem ter um papel importante no resultado a longo prazo da FAV.

Palavras-chave:
Fístula Arteriovenosa; Enfermagem em Nefrologia; Grau de Desobstrução Vascular

Abstract

Introduction:

Arteriovenous fistulas (AVF) are the best hemodialysis vascular accesses, but their failure rate remains high. Few studies have addressed the role of the vascular surgeon's skills and the facility's practices. We aimed to study these factors, with the hypothesis that the surgeon's skills and facility practices would have an important role in primary failure and patency rates at 12 months, respectively.

Methods:

This was a single-center, prospective cohort study carried out from March 2005 to March 2017. Only incident patients were included. A single surgeon made all AVFs, either in the forearm (lower) or the elbow (upper). Vascular access definitions were in accordance with the North American Vascular Access Consortium.

Results:

We studied 113 AVFs (65% lower) from 106 patients (39% diabetics, 58% started with catheter). Time to first connection was 21.5 days (IR: 14 - 31). Only 14 AVFs (12.4%) underwent primary failure and 18 failed during the first year. Functional primary patency rate was 80.9% (SE 4.1) whereas primary unassisted patency rate, which included PF, was 70.6% (4.4). Logistic regression showed that diabetes (OR = 3.3, 95%CI 1.38 - 7.88, p = .007) and forearm location (OR = 3.03, 95CI% 1.05 - 8.76, p = 0.04) were predictors of AVF failure. Patency of lower and upper AVFs was similar in non-diabetics, while patency in diabetics with lower AVFs was under 50%. (p = 0.003).

Conclusions:

Results suggest that a long-lasting, suitable AVF is feasible in almost all patients. The surgeon's skills and facility practices can have an important role in the long term outcome of AVF.

Keywords:
Arteriovenous Fistula; Nephrology Nursing; Vascular Patency

Introdução

Sabe-se que as fístulas arteriovenosas (FAV) apresentam maiores taxas de perviedade e menos complicações que os enxertos arteriovenosos e os cateteres venosos centrais11 Huber TS, Carter JW, Carter RL, Seeger JM. Patency of autogenous and polytetrafluoroethylene upper extremity arteriovenous hemodialysis accesses: a systematic review. J Vasc Surg 2003;38:1005-11.. Portanto, todas as diretrizes clínicas favoreceram seu uso desde 1997.22 NKF-DOQI clinical practice guidelines for vascular access. National Kidney Foundation-Dialysis Outcomes Quality Initiative. Am J Kidney Dis 1997;30:150-91.

3 Tordoir J, Canaud B, Haage P, Konner K, Basci A, Fouque D, et al. EBPG on Vascular Access. Nephrol Dial Transplant 2007:ii88-117.
-44 Polkinghorne KR, Chin GK, MacGinley RJ, Owen AR, Russell C, Talaulikar GS, et al. KHA-CARI Guideline: vascular access - central venous catheters, arteriovenous fistulae and arteriovenous grafts. Nephrology (Carlton) 2013;18:701-5.

A principal armadilha da FAV é a alta incidência de insuficiência primária e incapacidade de desenvolver55 Rooijens PP, Tordoir JH, Stijnen T, Burgmans JP, Smet de AA, Yo TI. Radiocephalic wrist arteriovenous fistula for hemodialysis: meta-analysis indicates a high primary failure rate. Eur J Vasc Endovasc Surg 2004;28:583-9.. Há muitos fatores que contribuem para a insuficiência da FAV: idade, sexo feminino, diabetes e localização da FAV, podem ser mencionados como muito relevantes. O papel das características do caso e a localização da FAV têm sido amplamente avaliada e recentemente resumidos em uma revisão sistemática66 Al-Jaishi AA, Oliver MJ, Thomas SM, Lok CE, Zhang JC, Garg AX, et al. Patency rates of the arteriovenous fistula for hemodialysis: a systematic review and meta-analysis. Am J Kidney Dis 2014;63:464-78.. No entanto, dois fatores importantes também devem ser levados em conta: a experiência do cirurgião vascular e as chamadas "práticas hospitalares", como capacitação da equipe de enfermagem, tempo até a primeira canulação, vigilância do acesso vascular por uma equipe dedicada, etc.

A importância desses fatores tem sido reconhecida nos últimos anos77 Lee T, Mokrzycki M, Moist L, Maya I, Vazquez M, Lok CE; North American Vascular Access Consortium. Standardized definitions for hemodialysis vascular access. Semin Dial 2011;24:515-24.. No entanto, existem poucos estudos que descrevam a atividade de apenas um cirurgião. Além disso, o fator cirurgião vascular é geralmente estudado isoladamente das práticas hospitalares. Não temos conhecimento de nenhum estudo que tenha avaliado os dois fatores em conjunto e um único cirurgião operando com a mesma equipe durante toda a duração do estudo.

Com o objetivo de estudar esses fatores, propomos a seguinte hipótese de trabalho: 1) As habilidades do cirurgião teriam um papel relevante na falha primária, e 2) As práticas hospitalares teriam um papel importante na taxa de patência primária funcional durante o primeiro ano de uso da FAV.

Apresentamos os resultados obtidos por um único cirurgião vascular com o mesmo equipamento e equipe durante um período de 12 anos. Os principais desfechos foram taxa de falha primária e taxa de patência primária funcional durante o período. O desfecho secundário foi a influência dos principais fatores de risco na taxa de permeabilidade primária não assistida.

Métodos

Este foi um estudo prospectivo, realizado segundo a Declaração de Helsinque. O banco de dados incluiu apenas novos pacientes consecutivos - de março de 2005 a março de 2017 - cujas primeiras FAV foram feitas nas extremidades superiores pelo mesmo cirurgião vascular. Quando uma FAV apresentava insuficiência primária e um novo acesso era feito, a última só foi incluída se estivesse na outra extremidade superior, pois não podemos excluir uma modificação da vasculatura da primeira extremidade, mesmo se a FAV funcionasse por algumas horas. Os critérios de exclusão foram: a) com menos de 16 anos, b) distúrbios de coagulação antes de iniciar a diálise, c) acesso vascular que não seja uma FAV autóloga na extremidade superior.

O local e o tipo de acesso vascular foram inteiramente selecionados por um cirurgião vascular sênior, com dez anos de experiência antes do início do estudo. Uma fístula radio-cefálica (inferior) no punho foi a primeira opção para a criação da FAV. Uma fístula braquiocefálica (superior) foi escolhida se uma FAV radio-cefálica não pudesse ser confeccionada.

A decisão foi tomada com base apenas nos critérios clínicos e exame físico. Os acessos da FAV foram realizados através de uma técnica "látero-lateral". No punho, a extremidade distal da veia foi ligada, criando uma anastomose funcional de lado a lado. Antes da ligação, a extremidade distal foi usada para introduzir um cateter fino (2 mm de diâmetro e 45 cm de comprimento) para infundir uma solução mista de heparina (5000 UI) e 500cc de solução salina a fim de expandir a veia e a artéria e verificar a permeabilidade dos vasos venosos. Na fístula braquiocefálica, a veia cubital mediana e o ramo comunicante entre sistemas profundos e superficiais foram sempre ligados, enquanto o fluxo da veia eferente foi preservado.

O recém-criado acesso foi acompanhado em intervalos de uma semana pelo nefrologista sênior. Um exame físico sistemático foi realizado em cada consulta. Depois de coletar informações essenciais, foi realizado um exame detalhado da anastomose e do corpo da fístula, focado principalmente no tremor e no pulso. Não houve critério pré-estabelecido para a primeira canulação. A data e a técnica foram sempre escolhidas pelo nefrologista sênior, com base em um exame físico completo. A maturidade da fístula foi definida como o tempo desde a criação do acesso até a canulação da mesma, avaliada pelo nefrologista sênior. Antes da primeira punção, um técnico experiente foi designado exclusivamente para conectar a FAV durante os primeiros três meses. Na primeira sessão, o sangue foi bombeado a no máximo 150 mL/min. Se o paciente tivesse um cateter, a primeira canulação seria com uma agulha 17G somente para retorno venoso.

Foram utilizadas as seguintes definições: Falha de Acesso Vascular Imediata (falha primária, FP), em que o acesso não teve sopro ou tremor imediatos ou foram perdidos dentro de 72 horas da confecção77 Lee T, Mokrzycki M, Moist L, Maya I, Vazquez M, Lok CE; North American Vascular Access Consortium. Standardized definitions for hemodialysis vascular access. Semin Dial 2011;24:515-24.; A Patência Funcional Primária (PFP) foi o tempo desde a primeira canulação bem-sucedida de duas agulhas até qualquer primeira intervenção (endovascular ou cirúrgica) para manter ou restaurar o fluxo sanguíneo ou chegar ao final do período do estudo88 Sidawy AN, Gray R, Besarab A, Henry M, Ascher E, Silva M Jr, et al. Recommended standards for reports dealing with arteriovenous hemodialysis accesses. J Vasc Surg 2002;35:603-10.. Patência não-assistida primária, foi o tempo de criação ou confecção do acesso até qualquer primeira intervenção (endovascular ou cirúrgica) para manter ou restaurar o fluxo sanguíneo, ou chegar ao final do período de estudo77 Lee T, Mokrzycki M, Moist L, Maya I, Vazquez M, Lok CE; North American Vascular Access Consortium. Standardized definitions for hemodialysis vascular access. Semin Dial 2011;24:515-24..

Análise estatística: Os dados foram relatados como média e intervalo de confiança de 95% (IC), mediana e intervalo interquartil (II), ou porcentagem e frequência, conforme apropriado. Analisamos a associação independente entre insuficiência da FAV no primeiro ano após a sua confecção e fatores de risco selecionados: diabetes (DM), sexo feminino, localização da FAV (superior ou inferior) e uso de cateter no momento da confecção da FAV por análise de regressão logística univariada. Se o odds ratio (OR) não ajustado fosse significativo para um fator de risco, o mesmo era utilizado como uma covariável para analisar os fatores de risco remanescentes por meio de regressão logística multivariada. Estimamos a patência funcional primária e as taxas de patência primárias não assistidas e seus erros-padrão (EP) com a análise de Kaplan Meier e as comparamos com o teste de log-rank. Fizemos os cálculos com a ferramenta de análise de dados do Microsoft Office Excel (tm) e o software livre Epidat 4.2.99 Epidat: programa para análisis epidemiológico de datos. Versión 4.2, julio 2016. Santiago de Compostella: Consellería de Sanidade, Xunta de Galicia; Medellín: Organización Panamericana de la salud (OPS-OMS) / Universidad CES; 2016. Nós definimos significância como um valor p bilateral < 0,05.

Resultados

Nós incluímos 106 dos 132 pacientes. Com exceção de 4 aborígenes, todos os pacientes eram caucasianos. A Tabela 1 mostra as principais características demográficas dos pacientes. Era uma população de alto risco, com alta porcentagem de diabéticos, anêmicos graves e hipoalbuminêmicos quando a diálise foi iniciada. Além disso, 58% da amostra iniciaram hemodiálise com cateter temporário.

Tabela 1
Características demográficas

O tempo entre o encaminhamento ao cirurgião e a criação do acesso foi de 10 a 20 dias. O tempo mediano para a primeira punção foi de 21,5 dias, II 14-31. O tempo de canulação de fístulas com e sem falha não diferiu. Conforme esperado, a idade do paciente influenciou a proporção de falhas. Pacientes com idade acima de 65 anos tiveram 46% de falha na FAV, enquanto pacientes mais jovens tiveram 24% de falha na FAV (OR: 2,64, IC 95%: 0,98-7,12; p = 0,051).

Apenas 14 das 113 FAVs (12,4%) apresentaram falha primária. As outras 99 FAVs foram canuladas. Deste grupo, 18 falharam durante o primeiro ano de uso. Então, a taxa de PFP - que não inclui FP - foi de 80,9% (SE = 4,1).

Como mostrado na Tabela 2, a taxa de permeabilidade primária não assistida aos 12 meses (que incluiu FP) foi de 70,6%, apesar da alta incidência de diabéticos (39%) e FAV inferiores (65%). Na análise de regressão logística, que também compreendeu as FAV da FP, o diabetes foi um forte preditor independente de falha da FAV na análise univariada: OR = 3,3, IC 95% 1,38-7,88, p = 0,007. A localização da FAV no antebraço (inferior) ajustada pela DM também se mostrou altamente significativa: OR = 3,03, IC 95%; 1,05 - 8,76, p = 0,04. A diferença na taxa de patência entre DM e não-DM também foi altamente significativa. Em pacientes não DM, as taxas de patência dos FAV inferiores e superiores foram semelhantes. Por outro lado, a taxa de permeabilidade de pacientes com DM com FAV inferiores foi inferior a 50%.

Tabela 2
Taxas de patência

Discussão

Os resultados deste estudo prospectivo e de longo prazo sugerem que, apesar de trabalhar com uma população de alto risco, é possível alcançar uma baixa taxa de FP e uma alta taxa de PFP em quase todos os pacientes em hemodiálise.

É geralmente aceito que o cirurgião vascular é determinante no sucesso da FAV1010 Goodkin DA, Pisoni RL, Locatelli F, Port FK, Saran R. Hemodialysis vascular access training and practices are key to improved access outcomes. Am J Kidney Dis 2010;56:1032-42.

11 Farber A, Imrey PB, Huber TS, Kaufman JM, Kraiss LW, Larive B, et al.; HFM Study Group. Multiple preoperative and intraoperative factors predict early fistula thrombosis in the Hemodialysis Fistula Maturation Study. J Vasc Surg 2016;63:163-70.e6.
-1212 Regus S, Almási-Sperling V, Rother U, Meyer A, Lang W. Surgeon experience affects outcome of forearm arteriovenous fistulae more than outcomes of upper-arm fistulae. J Vasc Access 2017;18:120-5.. No entanto, existem relatos que recusam a influência da experiência do cirurgião vascular1313 Joseph Lo Z, Tay WM, Lee Q, Chua JL, Tan GW, Chandrasekar S, et al. Predictors of radio-cephalic arteriovenous fistulae patency in an Asian population. J Vasc Access 2016;17:411-6.

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Um documento de 2003 do DOPPS concluiu que o treinamento e a experiência da equipe podem ser importantes para o sucesso quando se trata de canulação e manutenção de uma FAV2323 Rayner HC, Pisoni RL, Gillespie BW, Goodkin DA, Akiba T, Akizawa T, et al.; Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study. Creation, cannulation and survival of arteriovenous fistulae: data from the Dialysis Outcomes and Practice Patterns Study. Kidney Int 2003;63:323-30.. Com base nesses resultados, nossa instituição estabeleceu claramente todos os procedimentos relacionados ao manuseio de FAV. Como demonstrado em um estudo de 20052424 Asif A, Cherla G, Merrill D, Cipleu CD, Briones P, Pennell P. Conversion of tunneled hemodialysis catheter-consigned patients to arteriovenous fistula. Kidney Int 2005;67:2399-406., uma abordagem proativa e organizada poderia resultar em acessos vasculares otimizados para a maioria dos pacientes. Após a criação da FAV, todos os pacientes eram acompanhados semanalmente pelo nefrologista sênior, que avaliava o progresso da fístula - ou falha precoce - com base no exame físico. Apenas um dos dois técnicos mais habilidosos canulou uma nova FAV durante o primeiro trimestre. Depois disso, outro técnico foi designado para puncionar exclusivamente a mesma FAV. No entanto, se o acesso vascular fosse considerado "muito difícil", a primeira pessoa designada continuaria a lidar exclusivamente com aquela FAV. Acreditamos que esse manuseio individualizado de cada FAV poderia explicar nossa alta taxa de permeabilidade funcional, que se compara favoravelmente com relatos anteriores66 Al-Jaishi AA, Oliver MJ, Thomas SM, Lok CE, Zhang JC, Garg AX, et al. Patency rates of the arteriovenous fistula for hemodialysis: a systematic review and meta-analysis. Am J Kidney Dis 2014;63:464-78.,2222 Huijbregts HJ, Bots ML, Moll FL, Blankestijn PJ; CIMINO members. Hospital specific aspects predominantly determine primary failure of hemodialysis arteriovenous fistulas. J Vasc Surg 2007;45:962-7.. Quando este estudo começou, o momento ideal para a primeira canulação de uma FAV ainda não havia sido determinado2525 Basile C, Casucci F, Lomonte C. Timing of first cannulation of arteriovenous fistula: time matters, but there is also something else. Nephrol Dial Transplant 2005;20:1519-20.. O KDOQUI recomendou esperar 4-6 semanas44 Polkinghorne KR, Chin GK, MacGinley RJ, Owen AR, Russell C, Talaulikar GS, et al. KHA-CARI Guideline: vascular access - central venous catheters, arteriovenous fistulae and arteriovenous grafts. Nephrology (Carlton) 2013;18:701-5., mas os resultados do DOPPS não concordaram com esta recomendação baseada em opinião2626 Saran R, Dykstra DM, Pisoni RL, Akiba T, Akizawa T, Canaud B, et al. Timing of first cannulation and vascular access failure in haemodialysis: an analysis of practice patterns at dialysis facilities in the DOPPS. Nephrol Dial Transplant 2004;19:2334-40.. Nosso estudo não pode responder a essa pergunta. Podemos apenas mencionar que, embora 75% das FAVs tenham sido canuladas de 0 a 31 dias após sua confecção, apenas 18 das 99 FAVs (18,2%) falharam durante o primeiro ano, sugerindo que uma longa espera pode não ser necessária. Estudos recentes também concordaram com isso e sugerem que a canulação precoce não está associada à falha precoce2727 Wilmink T, Hollingworth L, Stevenson T, Powers S. Is early cannulation of an arteriovenous fistula associated with early failure of the fistula? J Vasc Access 2017;18:92-7.. Em vez disso, acredita-se que o estresse de cisalhamento na parede e a hiperplasia neointimal sejam fatores-chave para a falha precoce2828 Roy-Chaudhury P, Arend L, Zhang J, Krishnamoorthy M, Wang Y, Banerjee R, et al. Neointimal hyperplasia in early arteriovenous fistula failure. Am J Kidney Dis 2007;50:782-90.,2929 Remuzzi A, Bozzetto M, Brambilla P. Is shear stress the key factor for AVF maturation? J Vasc Access 2017;18:10-4.. Sugerimos que múltiplos fatores de risco desempenham um papel importante durante este período crítico e enfatizamos a necessidade de mais investigação.

Ao planejar o acesso vascular, as preferências dos pacientes também devem ser consideradas. Já foi demonstrado que mesmo os pacientes dependentes de cateter de longo prazo preferem o acesso vascular autólogo2424 Asif A, Cherla G, Merrill D, Cipleu CD, Briones P, Pennell P. Conversion of tunneled hemodialysis catheter-consigned patients to arteriovenous fistula. Kidney Int 2005;67:2399-406.. No presente estudo, todos os nossos pacientes incidentes preferiram a FAV autóloga após informações completas e adequadas. Este estudo também mostrou uma alta permeabilidade primária sem assistência após 12 meses. No entanto, os pacientes diabéticos tiveram uma taxa de falha mais alta, especialmente se o acesso vascular estava no punho, o que concorda com um estudo anterior3030 Huijbregts HJ, Bots ML, Wittens CH, Schrama YC, Moll FL, Blankestijn PJ; CIMINO study group. Hemodialysis arteriovenous fistula patency revisited: results of a prospective, multicenter initiative. Clin J Am Soc Nephrol 2008;3:714-9.. Segundo opiniões de especialistas3131 Palmes D, Kebschull L, Schaefer RM, Pelster F, Konner K. Perforating vein fistula is superior to forearm fistula in elderly haemodialysis patients with diabetes and arterial hypertension. Nephrol Dial Transplant 2011;26:3309-14.,1818 Kim JJ, Gifford E, Nguyen V, Kaji AH, Chisum P, Zenget A, et al. Increased use of brachiocephalic arteriovenous fistulas improves functional primary patency. J Vasc Surg 2015;62:442-7., a primeira opção em pacientes com DM deve ser o acesso vascular no antebraço. Esta opção diminui o número potencial de FAV do paciente e aumenta a probabilidade de síndrome de roubo. Um exame de ultrassonografia com Doppler (US) completo antes da cirurgia poderia diminuir essa probabilidade3232 Ferring M, Claridge M, Smith SA, Wilmink T. Routine preoperative vascular ultrasound improves patency and use of arteriovenous fistulas for hemodialysis: a randomized trial. Clin J Am Soc Nephrol 2010;5:2236-44.. De acordo com as diretrizes atuais, o USD deve ser realizado antes e durante o período de maturação para auxiliar a equipe de trabalho a tomar decisões sobre quais vasos utilizar, monitorar a maturação, e quando e onde a FAV deve ser canulada. Portanto, reconhecemos que a falta de exame Doppler de um grupo controle constitui as principais limitações do nosso trabalho. Além disso, nossa definição de maturidade da FAV é limitada à nossa avaliação clínica. O principal destaque do estudo atual é que um único cirurgião operou com a mesma equipe durante toda a duração do estudo.

Em conclusão, nosso estudo sugere que uma fístula arteriovenosa viável e permeável a longo prazo é factível em quase todos os pacientes em hemodiálise. Um cirurgião vascular habilidoso e uma equipe de hemodiálise experiente e comprometida têm um papel importante na consecução desse objetivo.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer Florencia Elie e Lucia Siga por seu excelente apoio administrativo.

Carola Savage nos ajudou com seu conhecimento especializado de Inglês.

Todo o financiamento do estudo veio de nossa própria unidade. Os autores declaram não terem tido qualquer apoio financeiro.

Parte desse trabalho foi apresentada como pôster no Congresso Mundial de Nefrologia da ISN em 2017.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    11 Jun 2018
  • Aceito
    29 Dez 2018
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