Acessibilidade / Reportar erro

Fluxos e refluxos de capital para a América Latina: a outra face da reestruturação das economias centrais* * Tradução de Rosa Maria Marques, do original em espanhol.

Capital flows in and out of Latin America: the other face of the restructuration of the central economics

RESUMO

As economias latino-americanas têm enfrentado cenários muito diferentes no que diz respeito ao acesso a recursos financeiros externos. Escassez de fundos durante a década de 1950, um aumento substancial na oferta de fluxos financeiros por bancos internacionais privados durante a década de 1970 e novamente um estágio de condições restritivas desde 1982. O trabalho analisa as causas externas que tornaram possíveis essas diferentes situações vinculando-as a condições particulares que ocorrem nos países desenvolvidos. Por exemplo, a estagnação do crescimento industrial que ocorreu nesses países durante a década de 1970 e o déficit externo apresentado pela economia norte-americana podem ajudar a explicar a expansão da oferta de recursos para os países do Terceiro Mundo nessa década. Por outro lado, as mudanças apresentadas pela economia norte-americana desde o final da década de 1970 também podem ajudar a explicar as profundas mudanças na oferta de recursos disponíveis para a América Latina. Algumas referências ao futuro também são tentadas.

PALAVRAS-CHAVE:
Financiamento externo; dívida externa; fluxos internacionais de capital

ABSTRACT

The Latin American economies have faced very different scenarios regarding their access to external financial resources. Scarcity of funds during the 1950s, a substantial increase in the supply of financial flows by private international banks during the 1970s, and again a stage of restrictive conditions since 1982. The work looks at the external causes that made possible these different situations linking them to the particular conditions taking place in the developed countries. For example, the stagnation of industrial growth that took place in these countries during the 1970s and the external deficit showed by the US economy can help to explain the expansion in the supply of funds available to Third World countries during that decade. On the other hand, the changes showed by the US economy since the end 1970s can also help to explain the deep changes in the supply of funds available to Latin America. Some references to the future are also attempted.

Keywords:
External financial resources; external debt; international flows of capital

INTRODUÇÃO

As economias latino-americanas passaram por etapas muito distintas quanto às possibilidades de obter recursos financeiros externos. Encontramos desde períodos como o dos anos 1950, de difícil acesso a tais recursos e com rápidos movimentos de ajuste diante de estrangulamentos no setor externo, até situações como as que ocorreram na década de 1970 em que, frente à grande disponibilidade de recursos externos, alguns governos empreenderam processos de abertura comercial e financeira. A partir de 1982, uma nova etapa caracterizada por acesso muito restrito a novos fluxos financeiros, desta vez dentro de um contexto de elevado nível de endividamento externo. Tudo isto leva-nos a refletir acerca da evolução sofrida pela forma de inserção dos países da América Latina no contexto financeiro internacional e a perguntar quais são os fatores que determinam situações tão distintas.

Este trabalho pretende analisar, em particular, as causas externas do rápido processo de endividamento de alguns países da periferia, durante a década de 1970, e da crítica situação que se delineou desde 1982. A ênfase nos fatores externos não implica desconhecer o peso das características internas de cada país - às quais requerem estudo profundo em cada caso - mas sim o reconhecimento de que o grau de acesso aos créditos externos pelo conjunto dos países do Terceiro Mundo está profundamente ligado a mudanças dentro dos próprios países centrais.

Nossa hipótese vincula a acentuada desaceleração industrial das economias centrais durante a década de 1970 e determinadas tendências da economia dos Estados Unidos - perda de competitividade, deficit de suas contas externas e fiscais - com a oferta de recursos financeiros para o Terceiro Mundo. Algumas dessas tendências agiram de maneira contraditória conforme o conjunto de circunstâncias que as acompanhou. O déficit externo dos Estados Unidos contribuiu, por exemplo, no início dos anos setenta - junto com uma política monetária expansiva - para elevar a liquidez internacional e a oferta de recursos para os países da periferia. Na etapa atual, o déficit - em combinação com acentuado desequilíbrio fiscal - converteu-se em poderoso absorvedor dos recursos excedentes do resto do mundo. Esta situação, que reflete mudanças relevantes nas relações entre os Estados Unidos e os demais países industrializados, marca o contexto internacional básico no qual devem desenvolver-se os países da periferia. Daí a importância de compreender sua evolução e transformação.

Iniciaremos, na seção I, com a situação das economias industrializadas desde o pós-guerra e a evolução da competitividade dos Estados Unidos em relação à Europa Ocidental e ao Japão. Observaremos, na seção II, o desenlace. que teve a situação financeira internacional e o papel dos Estados Unidos desde a crise do dólar de 1971 até a situação atual. Na seção III, observaremos a evolução da liquidez internacional e seus efeitos sobre o endividamento dos países do Terceiro Mundo.

I. SITUAÇÃO DOS PAÍSES INDUSTRIALIZADOS

Durante as duas décadas após a Segunda Guerra Mundial, os países industrializados apresentaram um crescimento rápido e sustentado.

A produção industrial de alguns países europeus chegou a mostrar, durante os anos sessenta, as mais altas taxas de crescimento das últimas décadas. Este processo foi acompanhado por um nível sem precedentes de expansão do comércio mundial, viabilizado fundamentalmente por maior intercâmbio de produtos industriais entre os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE).

O rápido crescimento industrial registrado no período foi o resultado de diversos fatores. Os fluxos financeiros dos Estados Unidos para a reconstrução europeia sob os auspícios do Plano Marshall, assim como o processo de integração econômica da Europa Ocidental, contribuíram para a expansão industrial do velho continente. As medidas de liberalização do comércio externo e de redução de tarifas aduaneiras ajudaram a estimular o comércio mundial, em contraposição à situação existente na atual década. Por outro lado, produziu-se rápido avanço na difusão de novas tecnologias com grande crescimento da produtividade nos países da Europa Ocidental e Japão.

Outro fator que auxiliou, até fins dos anos sessenta, para o rápido processo de crescimento, foi a existência de preços baixos em alguns mercados-chaves. Os baixos preços do petróleo viabilizaram um tipo de crescimento econômico baseado no uso de tecnologias intensivas em energia, enquanto o preço dos cereais revela quedas em termos reais durante essa década. Por outro lado, os salários reais mostram níveis de aumento similares aos registrados na produtividade.

Em princípios da década seguinte, o crescimento dos países industrializados começou a mostrar sinais inequívocos de enfraquecimento. Como se pode ver no Quadro 1, durante 1971-80, houve uma desaceleração substancial no crescimento da produção industrial para os quatro países observados. Essa desaceleração já se iniciara durante 1970-71, isto é, antes do primeiro aumento nos preços do petróleo.

Quadro 1:
Comércio Mundial e Produção Industrial de Alguns Países Industrializados

Há diferentes explicações acerca das causas da desaceleração sofrida pelas economias ocidentais desde o início da década de 1970. Autores pertencentes a distintas concepções econômicas, porém, parecem concordar em apontar como elemento de peso uma queda na taxa de lucro, com seus efeitos adversos sobre a taxa de investimento.

Do ponto de vista do FMI, os países industrializados e especialmente os europeus estão ainda vivendo as consequências de uma explosão dos salários, particularmente forte durante o período 1969-1975. Segundo essa instituição, os salários europeus do setor industrial cresceram nesse período a uma taxa anual de 6,5%, enquanto o produto por hora trabalhada cresceu somente 4,5%. “O crescimento de 2% ao ano nos custos com mão-de-obra durante esse período foi muito prejudicial para os lucros das empresas manufatureiras, de forma que a recomposição de margens de lucro adequadas vai requerer que o salário real aumente menos que a produtividade durante alguns anos” (FMI, 1982)Fundo Monetário Internacional. (1982) “World Economic Outlook”, Occasional Paper, n. 9. .

A redução dessa suposta divergência entre os níveis de salários e o crescimento da produtividade parece haver exercido influência importante sobre as políticas de ajuste que se implementaram nos países industrializados a partir da segunda crise do petróleo. O Quadro 2 nos mostra, desde 1979, taxas negativas de crescimento do salário real para o Grupo dos Dez. Para 1983, o Fundo Monetário destaca que ainda persistiam nos países industrializados baixas taxas de rentabilidade e de formação de capital, devido, em parte, a que a grande transferência de renda do capital para o trabalho, que ocorrera desde fins dos anos sessenta até princípios dos anos setenta, ainda não havia sido totalmente revertida (FMI, 1983)Fundo Monetário Internacional (1983) “World Economic Outlook”, Occasional Paper, n. 21. .

Quadro 2:
Evolução do Salário Real(1) nos Países Industrializados

De outro ponto de vista, alguns defensores da teoria francesa da regulação enfatizam também a dificuldade que apresentam as relações salariais nas. economias centrais. Dentro deste enfoque, a crise que estas economias vêm apresentando nos últimos anos aparece também como um conflito entre a reestruturação tecnológica e a modificação das relações salariais. Mas a rigidez que apresentam estas relações tem raiz - mais que no caráter restritivo das convenções coletivas - na extrema especialização do trabalho e da maquinaria, orientados para a produção em massa, o que inviabiliza a capacidade de competir. Daí decorre que a generalização de equipamentos flexíveis e a ampliação das responsabilidades dos trabalhadores levariam a uma nova relação salarial, na qual os assalariados tenderiam a operar com equipamentos suscetíveis de responder imediatamente a mudança na demanda (ver Conde, 1987Conde, R. (1987) “Modalidades de Integración del Capital y Crisis Internacional”, Economía, Teoria y Práctica, Universidad Autónoma de México, Num. extraordinário 1. ).

Para o caso específico dos Estados Unidos, Robert Reich assinala a existência de um freio à reestruturação tecnológica, via protecionismo do Governo, o qual tem contribuído para preservar a velha base industrial desse país - de produção padronizada e em massa - e não incentivou uma resposta à concorrência internacional através da implantação do sistema de produção flexível.

O outro elemento que queremos destacar - além da desaceleração industrial das economias centrais a partir dos anos setenta - é a diferença substancial nos níveis de produtividade dos Estados Unidos em relação ao resto do mundo no pós-guerra e a gradual redução dessa diferença frente ao maior avanço na produtividade dos países europeus e Japão durante as duas décadas seguintes (ver Quadro 3). A consequente erosão da competitividade industrial dos Estados Unidos contribuiu para a deterioração de sua posição comercial. Isto ocasionou, em princípios da década de setenta, uma expressiva perda da confiança internacional no dólar.

Quadro 3:
Alguns Indicadores de Países Desenvolvidos 1950-70

Esta situação poderia ser contrastada com a assinalada por Hicks em 1953Hicks, J. (1953) “The Long Run Dollar Problem “, Oxford Economic Papers, vol. -S, n. 2, junho. . Em artigo publicado nesse ano, em Oxford Economic Papers, Hicks salienta que a escassez de dólares era o principal problema internacional daquela época. Vincula-o a um aumento maior da produtividade dos Estados Unidos - em relação ao resto do mundo - que ocorreu durante a década de 1940, cujos efeitos haviam sido pouco examinados pelos economistas tradicionais. Explica que se a produtividade global no país A cresce mais que no país B, haverá pressões para reduzir salários em B, mas além disso é importante determinar em que ramos específicos aconteceu esse aumento. Por exemplo, se esse aumento se dá em produtos que competem com exportações de B, e se os salários não variam em ambos os países, os preços desses produtos em A baixarão e, portanto, cairá a demanda de A de exportações de B e este último apresentará déficit externo. :É assim que países antes compradores de B, que organizaram a produção segundo novos métodos, podem tornar-se concorrentes de B. “Quando isto ocorre em grande escala, a liderança é conquistada por novos centros.” Hicks se refere às relações entre o Reino Unido e os Estados Unidos assinalando que a partir de um certo momento o crescimento da produtividade no primeiro país foi menor que no segundo, que produziu dificuldades monetárias - manejáveis, de início, mas muito sérias depois. Com a primeira escassez do dólar, nos anos vinte, uma desvalorização moderada poderia ter resolvido o problema. Em troca, já em 1953, era necessário reduzir os salários britânicos para que as manufaturas inglesas fossem competitivas com as dos Estados Unidos. “Por isto a desvalorização de 1949 fracassou. Foi estabelecida para melhorar o balanço de pagamentos sem realizar um sacrifício real, já que quando os preços das mercadorias importadas começaram a crescer, os salários seguiram esse aumento e a desvalorização foi ineficaz” (Hicks, 1953)Hicks, J. (1953) “The Long Run Dollar Problem “, Oxford Economic Papers, vol. -S, n. 2, junho. .

Quando Hicks escreveu isto em 1953Hicks, J. (1953) “The Long Run Dollar Problem “, Oxford Economic Papers, vol. -S, n. 2, junho. , não pensou que este processo poderia estar começando a modificar-se, de forma a encontrarmos na década de 1970 uma situação de crise de confiança no dólar e de abundância internacional desta moeda. A balança comercial dos Estados Unidos deteriorou-se durante os anos sessenta até tornar-se deficitária em 1971 (pela primeira vez, no século XX). Desde então, as taxas de crescimento da produtividade vêm mostrando tendência declinante e menor que as registradas pela Europa e Japão (Thurow, 1986). O Quadro 4 nos oferece um panorama comparativo da taxa de crescimento da produtividade para o período 1977-1983.1 1 É certo que, a partir de 1979, o salário real tende a cair nos Estados Unidos (com exceção de 1982) e em um nível mais pronunciado que no resto dos países industrializados (ver Quadro 2). Seguindo o raciocínio de Hicks, poderíamos dizer que isto seguramente ajudou a contrabalançar o menor crescimento relativo da produtividade durante esses anos, mas a custo de uma redução no nível de vida interna de difícil implementação como estratégia de longo prazo.

Quadro 4:
Produtividade Manufatureira em Diversos Países

A preocupação crescente sobre a evolução sofrida pela competitividade industrial dos Estados Unidos deu lugar, próximo ao fim da década de 1970, ao que se conheceu nesse país como o Debate Industrial. Autores como Reich ou Thurow (1984Thurow, L. (1984) The Case for Industrial Policies, Center for National Policy, Washington, janeiro. ) apontaram que frente à erosão da competitividade era necessário empreender um processo de industrialização. A preocupação pela referência histórica da decadência inglesa aparece repetidamente no debate já que, “enquanto o Japão representa a ameaça futura, a decadência da Inglaterra constitui o fantasma de um passado que se deseja não reproduzir” (Fajnzylber, 1986Fajnzylber, F. (1986) “El Debate Industrial en Estados Unidos. Entre el Desafio Japonés y el Espectro de Inglaterra”, Crisis y Regulación Estatal: Dilemas de Política en América Latina y Europa, Grupo Editor Latinoamericano, 1986. ).2 2 Ver este autor para uma análise do Debate Industrial.

O desequilíbrio externo do setor industrial norte-americano agravou-se nos últimos anos quando - como veremos na próxima seção - o déficit comercial deste país cresceu a níveis sem precedentes, especialmente com o Japão. A visão da atual administração dos Estados Unidos, assim como de outros autores, é de que este acentuado aumento do desequilíbrio comercial não reflete uma deterioração relativa do setor industrial desse país. Segundo essa perspectiva, responde basicamente a mudanças na situação macroeconômica permitidas pela acentuada valorização do dólar durante o período de 1980-1985 e pelo maior crescimento apresentado pelos Estados Unidos em alguns anos em relação ao resto dos países industrializados (Reinhart, 1986Reinhart, V. (1986) “Macroeconomic Influences on the US-Japan Trade Imbalance”, Federal Reserve Bank on New York Ouarterly Review, Spring, vol. 11, n. 1. ). Os próximos anos dirão qual é o verdadeiro peso destas variáveis macroeconômicas. Isto é, se com a reversão das mesmas é possível neutralizar o desequilíbrio externo ou se este está além disso, ligado à situação do setor produtivo. O certo é que, apesar da desvalorização sofrida pelo dólar, a partir de 1985, o saldo da balança comercial desse país continuou a deteriorar-se até o presente.

OS ESTADOS UNIDOS CONTINUAM IMPONDO SUAS REGRAS DE JOGO NO TERRENO FINANCEIRO

Ao finalizar a Segunda Guerra Mundial, as relações financeiras internacionais foram regulamentadas através do sistema de Bretton Woods que, ao refletir a hegemonia econômica dos Estados Unidos, baseou-se no dólar como moeda principal de reserva e de uso comercial.

Esse papel especial do dólar como moeda de reserva oferecia uma contradição intrínseca que foi apontada por Triffin (1968Triffin, R. 1968) El Sistema Monetario Internacional, Buenos Aires: Amorrortu Editores. ) e que chegaria a ter especial relevância para o sistema financeiro internacional dos anos 1970. Triffin ressaltou que, se os Estados Unidos mostrassem um déficit muito grande em seu balanço de pagamentos, haveria aumento da liquidez internacional e a longo prazo, enfraquecimento do dólar e instabilidade no sistema financeiro internacional. Se, ao contrário, os Estados Unidos deflacionassem sua economia para reduzir seu déficit, isto levaria a um fortalecimento do dólar, mas às custas de uma limitação do crescimento mundial, devido a uma insuficiência da liquidez. A solução frente a este dilema consistiria, segundo Triffin, na criação de meios alternativos de liquidez, através de uma reforma monetária internacional.3 3 Em artigo recente, Triffin volta a insistir sobre a necessidade dessa reforma. “Ao contrário dos distintos ministros, governadores e representantes do Grupo dos Dez, eu continuo considerando essencial uma reforma fundamental do sistema monetário internacional. O principal obstáculo (para esta reforma) continua sendo a resistência dos Estados Unidos em abandonar seu privilégio tradicional, que considero uma maldição oculta, de financiar seus déficits internacionais e orçamentários com as próprias promissórias. . . Face à falta de acordo americano, é provável que outros países, cedo ou tarde, assumam a iniciativa a fim de diminuir a excessiva dependência com respeito às extravagâncias de um dólar de papel, flutuante e inconversível.” Triffin (1987).

Durante os anos cinquenta e sessenta, a economia norte-americana levou adiante, sem maiores problemas, seu papel de país com moeda de reserva. Além disso, a partir do pós-guerra, ocorreram importantes transferências de capital dos Estados Unidos para a Europa através de empréstimos oficiais e de investimentos diretos. O déficit do balanço de pagamentos dos EUA foi inicialmente bem aceito, já que o crescimento do comércio internacional requeria uma expansão da liquidez.

Até 1971, a crescente desconfiança na estabilidade do dólar produziu fluxos especulativos contra essa moeda. O governo dos Estados Unidos decidiu suspender sua convertibilidade por ouro em agosto de 1971, bem como realizar uma desvalorização em dezembro deste ano.

Como Triffin havia assinalado, o crescente déficit do balanço de pagamentos dos Estados Unidos levou à rápida expansão das reservas monetárias mundiais e ao enfraquecimento do dólar. Colocou-se então a modificação do sistema financeiro sob regras que reduzissem a capacidade de criação de reservas mundiais por parte de um só país.4 4 Em 1972, cria-se o Comitê dos 20 para analisar novas medidas de regulação do sistema financeiro internacional, entre elas a gradual substituição do dólar como moeda de reserva pelos Direitos Especiais de Saque. Mas o dramático aumento nos preços do petróleo, em 1973, interveio em auxílio do dólar e da manutenção do poder financeiro dos Estados Unidos.

A crise do petróleo produziu um abalo na estrutura mundial de pagamentos e gerou um aumento na demanda internacional de dólares. Essa era a moeda em que se pagava a maioria das novas obrigações; por isso, a pressão contra ela tendeu a desaparecer. Por outro lado, os excedentes dos países árabes se mantiveram predominantemente em dólares, já que esses países, que se encontravam com um aumento abrupto em suas reservas, não tinham muitas alternativas de colocação das mesmas. Com exceção da Inglaterra, cuja divisa era fraca, só os Estados Unidos ofereciam um mercado de capitais adequado para manejar tais excedentes. Para Solomon (1977Solomon, R. (1977) “The International Monetary System: 1945-1976”, An lnsiders View, New York, Harper and Row Publishers. ), “a crise do petróleo e a emergência dos excedentes da OPEP, junto com déficits em outras partes, fez com que os países se sentissem mais tranquilos sobre suas reservas em dólares”. A partir daí, as autoridades dos Estados Unidos continuaram impondo suas regras de jogo com mais facilidade no campo financeiro internacional. Não só a ideia de uma reforma monetária para substituir o papel do dólar pelos Direitos Especiais de Saque não prosperou, como posteriormente foram dados passos importantes para a desmonetização do ouro.5 5 Numa reunião anual do Fundo, em 1975, concordou-se em abolir o preço oficial do ouro e com o fim do uso obrigatório desse metal nas transações com essa instituição. Além disso, ficou estabelecido que um sexto das posses de ouro fosse devolvido aos países-membros, em proporção às suas cotas, enquanto outro sexto fosse vendido no mercado. Isto causou grande queda no preço de mercado do ouro até fins de 1975.

Durante os cinco anos que se seguiram ao estabelecimento do mecanismo de câmbios flutuantes, o governo dos Estados Unidos mostrou pouca preocupação pelas variações internacionais na cotação do dólar. Seu déficit no balanço de pagamentos aumentou significativamente durante 1977 e 1978, o que levou a uma queda importante na cotação dessa moeda. Em fins de 1978, no entanto, iniciava-se uma reviravolta estratégica na política internacional desse país, com a implantação de um programa anti-inflacionário, seguido, em 1979, por restrições monetárias que produziram aumentos significativos sobre a taxa de juros. Desde então, essas taxas tornaram-se positivas em termos reais, num processo que se acentuou com o forte aumento do déficit fiscal, ocorrido a partir de 1981.

Com a política monetária restritiva seguida pelo governo norte-americano, cumpriram-se inicialmente algumas das previsões de Triffin quanto ao fortalecimento do dólar e quanto a uma certa limitação no crescimento do resto das economias ocidentais. Mas a peculiaridade da nova situação foi que, conjuntamente a uma política de valorização monetária, implementou-se uma forte expansão do déficit fiscal, que fez com que o saldo negativo da balança comercial desse país não só não se reduzisse, como aumentasse fortemente.6 6 A valorização do dólar entre 1980-85 afetou não só quantitativamente a evolução das exportações e importações, mas também sua estrutura. Do lado das exportações, o setor mais afetado foi o de produtos agrícolas, dadas as lutas travadas com a CEE. Pelo lado das importações, houve queda relevante na participação do petróleo e de produtos derivados e acentuado aumento em bens de capital e veículos, diante do notável avanço das vendas japonesas.

Na atual década observam-se mudanças importantes nas relações externas dos Estados Unidos, tanto a nível comercial quanto financeiro. O déficit comercial alcançou níveis sem precedentes, que chegaram a 150 bilhões de dólares em 1986. As exportações de serviços, que serviam tradicionalmente para contrabalançar o déficit comercial, de modo a manter certo equilíbrio com o Exterior, permitiram manter um superavit em conta corrente até 1981. Mas a situação se modificou desde então, ante o avanço do déficit comercial e redução dos ativos líquidos no Exterior. O resultado foi um déficit recorde de 140 bilhões de dólares em conta corrente em 1986.7 7 A conta corrente do balanço de pagamentos dos Estados Unidos é negativa durante o período 1977-78, assim como a partir de 1982. O que muda essencialmente é a forma de seu financiamento. Entre 1977-78 o déficit em conta corrente é agravado pela saída líquida de capitais privados, devendo ambos ser financiados por transações oficiais, tais como a compra de dólares pelos bancos oficiais de outros países. A partir de 1982, o déficit em conta corrente, que aumenta acentuadamente a cada ano, passou a ser crescentemente financiado por fluxos líquidos de capital privado, que passaram de 45 bilhões de dólares negativos, em 1982, para 24 bilhões positivos em 1983 (ver Federal Reserve Bank of New York Quarterly Review, verão, 1984, vol. 9, n. 2).

Por outro lado, junto com o fortalecimento do dólar, produziu-se mudança fundamental na posição financeira dos Estados Unidos. Nos quatro anos que se seguiram a 1981, o país passou de credor a devedor líquido do resto do mundo, como consequência de uma reversão histórica no crescimento dos ativos norte-americanos no Exterior. A forma que adotou o financiamento do déficit fiscal e em conta corrente produziu uma redução das aplicações financeiras externas. Isto levou a uma situação muito diferente da que ocorria até o final dos anos setenta. Por um lado, houve aumento muito importante nos fluxos de capital estrangeiro aos Estados Unidos, passando de uma média de 50 bilhões de dólares anuais, em 1971-81, para 123 bilhões em 1984 (ver Quadro 5). Até 1982, esses capitais foram reciclados dos Estados Unidos para o Exterior fundamentalmente através de empréstimos concedidos pelos bancos comerciais. Mas, como se pode ver no Quadro 5, desde 1982, produziu-se uma acentuada redução dos empréstimos concedidos ao Exterior por estes bancos, aliás, sentido na própria carne pelos devedores latino-americanos. O crescimento explosivo nos Estados Unidos do déficit orçamentário e em conta corrente produziu um aumento na demanda interna de crédito - tanto pública como privada - que passou a ser crescentemente financiada com fluxos líquidos de capital privado oriundos do resto do mundo. Esta redução notável na reciclagem externa dos capitais que entram nos Estados Unidos coincidiu no tempo com a crise externa declarada pelo México, em 1982, e cabe perguntar se não existiu relação de causa e efeito entre ambos os fenômenos.

Quadro 5:
Ativos e Passivos Externos dos Estados Unidos

Como salienta Triffin, os Estados Unidos deixam de cumprir seu papel tradicional de “banqueiro mundial” - só 13% dos ingressos de capital recebido por esse país são reciclados em 1984 (Triffin, 1987)Triffin, R. (1987) “Para Rectificar el Escándalo Monetario Mundial”, El Comercio Exterior, vol. 37, n. 3, México, março. - para chegar a um endividamento líquido de 108 bilhões de dólares nesse ano.

O deficit orçamentário foi incentivado pela redução dos impostos internos realizados à luz da teoria da oferta e pela elevação dos gastos militares. Sobre este último aspecto, pode-se dizer que os novos fatores econômicos reforçaram o caráter estratégico norte-americano, pois permitiram elevar o gasto militar com recursos provenientes do Exterior e, ao mesmo tempo, manter seu predomínio no aparato financeiro (Bittar, 1985Bittar, S. (1985) “La desconcertante recuperación de la hegemonía de Estados Unidos”, El Sistema Internacional y América Latina: una Nueva Era de Hegemonía Norteamericana?, Edición de Luis Maira, Grupo Editor Latinoamericano. ).

Como assinala Susan Strange (1976Strange, S. (1976) International Economic Relations of the Western World: 1959-1971, vol. 2, Oxford, Oxford University Press. ), a crise do dólar de princípios dos anos setenta demonstrou a continuação do papel financeiro dominante dos Estados Unidos. Mesmo tendo o sistema sofrido algumas modificações, o poder deste país para estabelecer tendências monetárias sobre os outros governos não diminuiu. Por outro lado, questões básicas como as relativas ao uso e manejo das reservas, a direção do sistema financeiro e a disciplina dos operadores do mercado ficaram sem resolução, já que não se estabeleceu uma autoridade monetária que controlasse a liquidez internacional. Essa ausência de regras e a consolidação do dólar como moeda de reserva deram aos Estados Unidos maior liberdade para postergar seu próprio ajuste e para transferir para outros países os decorrentes efeitos. Em outras palavras: “O movimento em direção a taxas de câmbio flutuantes e o fim da convertibilidade do dólar por ouro permitiram às autoridades norte-americanas abandonar a posição nervosa e defensiva a que se viram obrigadas no início da década de 1960, quando o presidente Kennedy devia combinar seus temores acerca de uma guerra nuclear com suas preocupações sobre o balanço de pagamentos dos Estados Unidos” (Solomon, 1977Solomon, R. (1977) “The International Monetary System: 1945-1976”, An lnsiders View, New York, Harper and Row Publishers. ).

III. A EVOLUÇÃO DA LIQUIDEZ INTERNACIONAL E OS EMPRÉSTIMOS AOS PAÍSES DA PERIFERIA

a) Determinantes externos fundamentais do rápido endividamento de alguns países periféricos

Durante a década de 1950, os países latino-americanos enfrentaram uma escassez crônica de divisas em função de baixas reservas e de um limitado crescimento de suas exportações. Por isso, apesar da utilização repetida de financiamento compensatório, as importações da área cresceram muito lentamente em termos reais (2,5% por ano) (Devlin, 1978)Devlin, R. (1978a) “External Finance and Comercial Banks”, Cepal Review, primeiro semestre, . Nessa década, ocorreram no mundo ocidental certas condições que incentivaram os investimentos privados diretos para os países em desenvolvimento. O acelerado crescimento das empresas multinacionais, numa etapa de rápida expansão da produtividade industrial, e as políticas de substituição implementadas nos países em desenvolvimento levaram estas empresas à busca de novas oportunidades rentáveis de inversão em lugares fechados ao comércio.

As soluções por parte dos países latino-americanos de programas de auxílio - como os concedidos pelos Estados Unidos para a Europa no pós-guerra - não encontraram maior eco nas autoridades desse país até fins dos anos cinquenta. Em 1961, implementou-se a Aliança para o Progresso, como decorrência da decisão dos Estados Unidos de aumentar os programas de auxílio para a América Latina, objetivando contrabalançar a influência da revolução cubana. Os fluxos oficiais converteram-se na fonte principal de recursos financeiros líquidos para os países periféricos durante a primeira metade da década de 1960 (ver Quadro 6). Os investimentos diretos e, em menor grau, os créditos de exportação são as rubricas mais importantes dentro dos fluxos privados.

Quadro 6:
Evolução das Principais Fontes de Financiamento Externo da América Latina 1960-1981

Na segunda metade dos anos sessenta, tornaram-se mais expressivos os problemas do balanço de pagamentos dos Estados Unidos e manifestou-se crescente pressão para reduzir os gastos externos não militares. Iniciou-se, então, o questionamento sobre a efetividade política do auxílio norte-americano aos países atrasados. No final da década de 1960, pôde-se observar o estancamento nos fluxos oficiais e o crescimento significativo dos fluxos privados.

Durante os anos setenta produziu-se uma mudança no caráter e na direção dos empréstimos internacionais. Desde o início da década, alguns países, como Brasil e México, começaram a obter créditos significativos dos bancos multinacionais, A dívida dos países em desenvolvimento com os bancos mais do que dobrou entre 1970 e 1973, alcançando 35 bilhões de dólares. Medidos a partir dos anúncios de novos créditos, tais fluxos cresceram de 1 bilhão, em 1971, para 4,5 bilhões em 1973. Os novos créditos concentraram-se, especialmente, em quatro países latino-americanos: Brasil, México, Peru e Argentina (Dod, 1981Dod, D. (1981) “Bank Lending to Developing Countries”, Federal Reserve Bulletin, setembro, ). Isto significa que o endividamento de países periféricos com os bancos privados internacionais cresceu significativamente antes do primeiro grande aumento nos preços do petróleo como reflexo das condições do mercado financeiro internacional. Este processo de endividamento foi rapidamente potencializado pelo surgimento dos petrodólares. Os fluxos bancários passaram de 20% do total de fluxos líquidos de capital para a América Latina, em 1970, para 57%, em 1979. Enquanto isso, a participação do financiamento oficial diminuiu de um máximo de 60%, em 1961-65, para 10%, em 1977-79.8 8 O investimento privado direto é outra das rubricas que teve diminuída sua participação relativa no total da afluência de recursos para a América Latina, passando de 33% em 1966-70 para 22% em 1977-81.

Em outros termos, como é amplamente conhecido, a estrutura dos fluxos de capital para a América Latina mudou notavelmente durante os anos setenta, aumentando a participação das fontes privadas e, dentro dessas, do endividamento em relação ao investimento privado direto.

O que determinou este acentuado endividamento de alguns países latino-americanos com os bancos privados internacionais? Resposta às necessidades desses países, acentuadas pelos maiores déficits provenientes do choque do petróleo? Foram essas necessidades que determinaram que os bancos emprestassem para países anteriormente impensáveis como possíveis devedores? Por que concordaram em satisfazer essa demanda nos anos setenta e não nas décadas anteriores, quando os países latino-americanos deveriam realizar ajustes quase imediatos em suas economias, diante de pressões oriundas do setor externo?

A resposta a essas perguntas pode fornecer pistas importantes para compreender a evolução futura dos mercados de crédito internacional para os países periféricos. Parece difícil crer que o motor impulsionador dos fluxos de capital do mercado de euromoedas haja sido a maior demanda desses recursos. Todavia, autores como Heller (1979Heller, J. (1979) “Assessing Euromarket Growth: Why the Market is Demand Determined “, Euromoney, fevereiro. ) destacaram que essa expansão está determinada predominantemente pela demanda de créditos, já que foram as taxas de juros mais elevadas nos euromercados que originaram o déficit de pagamentos dos Estados Unidos e o crescimento da liquidez internacional. Esta é uma abordagem otimista, já que indica - uma vez superada a crise da dívida - que um aumento futuro na demanda de crédito internacional, por parte dos países periféricos, voltaria a gerar novos créditos dos bancos para estes países.

Mayer (1980Mayer, H. (1980) “Creación de Crédito y Liquidez en el Sector Bancario Internacional”, Boletín CEMLA, vol. 26, n. 5, setembro-outubro. ), ao contrário, salienta que o rápido crescimento do crédito bancário internacional durante os anos setenta foi o resultado da criação de liquidez internacional, consequência esta do déficit do balanço de pagamentos dos Estados Unidos e não sua causa, como destaca Heller. Isto é coerente com Pedro Kuczynski, diretor da First Boston Corporation, que assinala que o euromercado está dominado pelo dólar. Como virtual extensão do sistema monetário dos Estados Unidos, tende a refletir rapidamente os efeitos da política monetária desse país (Kuczynski, 1983)Kuczynski, P. (1983) Latin American Debt, World Affairs. .9 9 O BPI destaca, ao analisar a situação dos euromercados, em 1977: “Nesse ano o déficit do balanço de pagamentos dos Estados Unidos, juntamente com outras forças expansivas, tendeu a aumentar a oferta de recursos disponíveis nos mercados internacionais e se criaram condições muito favoráveis para os devedores. Felizmente, ao menos para os prestamistas, a demanda de créditos externos respondeu positivamente” (BPI, Relatório Anual, n. 48).

Cremos que o crescimento dos fluxos de capital dirigidos para o Terceiro Mundo, durante a década passada, e sua reversão na atual, foi determinado predominantemente por mudanças na oferta dos mesmos, ou seja, na situação existente nos países centrais cuja liderança financeira é exercida pelos Estados Unidos. O rápido crescimento das exportações de capital deste país teve um impacto importante sobre o nível das reservas monetárias mundiais. As reservas oficiais, que haviam crescido moderadamente até fins dos anos sessenta, chegaram a triplicar durante o período 1970-72.10 10 A taxa anual de crescimento foi de 2,3% na década de 1950 e de 3,1% na de 1960. Este processo e as regulamentações bancárias estabelecidas nos Estados Unidos, durante os anos sessenta, contribuíram para o desenvolvimento dos euromercados e para a expansão das atividades dos bancos privados internacionais fora de seus países de origem.11 11 Fixaram-se limites às taxas de juros sobre depósitos de menos de 100.000 dólares e tentou-se frear o déficit do balanço de pagamentos através da imposição de limites nos créditos bancários a não residentes. Esta última disposição, que impedia os empréstimos externos a partir das agências centrais dos bancos nos Estados Unidos, levou a que estes fizessem operações com recursos obtidos nos euromercados, a partir de suas filiais internacionais.

O papel fundamental da oferta de recursos no processo de endividamento dos países em desenvolvimento foi também enfatizado por autores como Killick (1981Killick, T. (1981) “Euromarket Recycling of OPEC Surpluses: Fact or Myth?”, The Banker, Londres, janeiro. ). “É um erro considerar os fluxos de capital como uma resposta compensatória a um gap financeiro dos países deficitários. O tamanho desse gap está determinado pela disponibilidade de financiamento, já que os países que não podem pedir emprestado o de que necessitam estão obrigados a restringir suas exportações . . . Há uma tendência a confundir demanda com oferta e empréstimos bancários com necessidades de pagamento. Os comentaristas destacam que a existência de maiores empréstimos é uma evidência de que os bancos respondem à demanda dos países deficitários. Naturalmente não se ouve falar da impossibilidade de muitos países em desenvolvimento de obter esses empréstimos.”

A especial conjuntura internacional que se apresentou desde o início dos anos setenta, caracterizada por veloz aumento na liquidez e pela ausência de mecanismos inerentes ao sistema para o controle da mesma, estimulou um processo de rápido endividamento de alguns países periféricos. A eliminação da convertibilidade do dólar permitiu aos Estados Unidos expandir seu déficit externo e financiá-lo através de maiores saídas de capital. Mas o grande aumento dos fundos disponíveis para países do Terceiro Mundo, que teve lugar nesses anos, não foi um fenômeno puramente monetário; esteve, antes, ligado à situação produtiva dos países centrais. O déficit que apresentam as contas externas dos Estados Unidos reflete um processo de deterioração de sua competitividade em relação a outros países. Por outro lado, as tendências recessivas observadas nesses países, desde o início dos anos setenta, geraram uma queda nas demandas internas de crédito, o que aumentou a liquidez dos bancos e os levou a buscar novos clientes nos países periféricos.12 12 “Num período no qual se estancou o crescimento do crédito interno pela queda da demanda de financiamento dos investimentos das principais empresas. . . a espetacular expansão dos empréstimos internacionais foi fundamental para manter o crescimento sustentado da lucratividade dos principais bancos americanos, especialmente dos doze que representam dois terços das atividades bancárias no Exterior” (Comitê de Relações Externas do Senado dos Estados Unidos, 1977). Por isso, talvez, Stallings (1979Stallings, B. (1979) “Euromarkets, Third World Countries and the International Political Economy “. Trabalho apresentado na conferência “Social and Political Challenges to the New International Economic Order”. ) coloque que os anos setenta constituíram para os bancos um desses períodos especiais em que houve acumulação de capital excedente porque as taxas de lucro se encontravam ameaçadas, levando as empresas multinacionais a reduzir seus investimentos e suas demandas de crédito - tanto na Europa quanto nos Estados Unidos.

b) Mudanças na direção e características atuais dos fluxos de capital

A partir de 1973, os depósitos dos países árabes contribuíram para elevar a liquidez disponível pelos bancos privados internacionais. O nível destes depósitos não se manteve constante ao longo do período seguinte, mas cresceu marcadamente nos anos posteriores aos dos choques do petróleo para, logo em seguida, cair. Em 1974 e 1979-80, produziu-se um grande aumento nos depósitos líquidos dos países da OPEP. Nos anos seguintes, com a reacomodação na distribuição dos excedentes mundiais, esses depósitos caíram, como se pode ver no Quadro 7, no período de 1975-78 e a partir de 1981.

Quadro 7:
Fluxos de Depósitos Líquidos dos Países da OPEP aos Bancos dos Países Desenvolvidos( 1)

Durante 1977-78, a queda dos depósitos dos países da OPEP foi compensada por um substancial déficit no balanço de pagamentos dos Estados Unidos, que se converteram nesses anos na principal fonte internacional de liquidez. Isto contribuiu sabidamente para a expansão do endividamento dos países em desenvolvimento. “Em particular as políticas expansionistas seguidas pelos países industrializados em 1977-78, e especialmente a política monetária dos Estados Unidos, foram altamente responsáveis pelo mercado de devedores que existiu desde 1977 e que tornou difícil, tanto aos bancos quanto aos países promitentes, manterem-se nos limites adequados. Essa emergência do mercado de devedores e o subsequente aumento nos preços do petróleo prepararam o caminho para os problemas atuais da dívida internacional (Banco de Pagamentos Internacionais, BPI, Relatório Anual, n. 55).

A situação tornou-se diametralmente distinta no decorrer da década atual, como consequência de mudanças nas políticas macroeconômicas dos países centrais e de um aprofundamento nas tendências recessivas que pareciam incentivar relações mais estreitas entre as mesmas. A recessão que ocorreu nestes países entre 1980-82 levou a uma queda importante nos preços das matérias-primas, processo que se agravou diante do auge das tendências protecionistas. 13 13 Para o caso da América Latina, estimou-se (ver lglesias, 1984) que, se a relação de preços de intercâmbio se tivesse mantido aos níveis similares aos de 1980, e se os tipos de juros continuassem nos níveis vigentes no momento em que se contraiu o grosso da dívida, a região teria disponíveis 25 bilhões de dólares adicionais em 1983, o que lhe teria permitido cumprir seus compromissos externos, sem comprimir dramaticamente suas importações e o nível de atividade interna. Com o aumento nos Estados Unidos da demanda interna de crédito - como consequência do déficit orçamentário e da forma de financiá-lo - esse país passou de principal fonte internacional de liquidez a principal receptor de fundos internacionais. Os países periféricos são os mais afetados por esta brusca mudança na situação devedora deste país e no comportamento dos bancos norte-americanos, que reduzem seus ativos líquidos e sua participação nos euromercados. Esta vai sendo crescentemente aumentada pelos bancos japoneses.14 14 Em fins de 1985, cinco dos dez maiores bancos internacionais, de acordo com seus ativos, eram japoneses. Isto foi incentivado pelo excesso de poupança interna sobre o investimento que o Japão apresenta e pela forte valorização que sofreu o iene nos últimos anos.

Do ponto de vista da origem do superavit mundial, também apareceram modificações fundamentais na década atual. A redução nos preços do petróleo, que ocorreu neste período, e o avanço da competitividade internacional do Japão permitiram que este país deslocasse a OPEP como principal fonte de recursos excedentes. Assim, as exportações japonesas de capital alcançaram 65,5 bilhões de dólares em 1985 e foram dirigidas fundamentalmente para os Estados Unidos, através de uma grande participação dos bancos japoneses.

Estas mudanças na direção dos fluxos de capital têm sido acompanhadas por modificações nas características de sua reciclagem. Os países da OPEP - sem um setor bancário desenvolvido - colocavam seus recursos fundamentalmente em depósitos bancários a taxas de juros flutuantes. Isto lhes permitiu utilizar a experiência dos bancos internacionais que realizavam empréstimos vinculados, de risco compartilhado pelos grandes tomadores do momento: os países do Terceiro Mundo. Além disso, permitiu-lhes não ficarem deslocados num período de fortes aumentos nas taxas de juros. Em contraste com este padrão de investimento seguido pela OPEP, a reciclagem dos excedentes japoneses ocorreu fundamentalmente através de bônus ou outros instrumentos financeiros (securities). É assim que, em 1985, 79% do financiamento internacional tomou a forma de instrumentos financeiros (bônus, certificados de depósito, eurobônus etc.), enquanto só os 21 % restantes corresponderam a créditos vinculados (em 1980, a relação era·exatamente a inversa). Isto significa que durante os anos oitenta se está produzindo um novo desenvolvimento do mercado de capitais que, à luz de inovações financeiras que fazem com que uma parte crescente dos fluxos internacionais - e ainda dos que ocorrem internamente nos países centrais -, tome a forma de transações em papéis financeiros e não em empréstimos bancários.

A veloz expansão apresentada pelo mercado de bônus nos últimos anos coincide com a decisão dos bancos de não continuar reciclando recursos para os países periféricos - estes países sempre tiveram acesso a este mercado e com um aumento das relações dos países industrializados entre si. Em consequência, os primeiros estão ficando crescentemente marginalizados do mercado financeiro internacional. Além de sua participação quase nula nos novos empréstimos, neles continuam a dominar as relações tradicionais com os bancos, enquanto nos países centrais estão se produzindo profundas modificações nas relações entre estes últimos e os tomadores de crédito.

É interessante deter-se brevemente para observar como evoluíram as relações entre os maiores países latino-americanos e os bancos internacionais. Durante a década de setenta, devido à grande liquidez do mercado, os bancos estavam em condições de lhes oferecer amplos empréstimos com baixas taxas de juros. A dívida latino-americana desse período foi contraída em um contexto de expansão e competitividade entre bancos internacionais que desejavam participar do lucrativo mercado que ofereciam os países do Terceiro Mundo. Isto fez com que, em determinados períodos, existisse o que se chamou um “mercado de devedores”, onde os governos latino-americanos desfrutaram de uma capacidade de negociação desconhecida anteriormente: não apareciam, então, cláusulas que condicionassem os empréstimos, os níveis de spread ou margens de lucros bancários foram, por um momento, não muito maiores que os cobrados aos devedores de países industrializados; os prazos foram ampliados, não se estabeleceram cláusulas precisas que contemplassem claramente situações de suspensão de pagamentos. Além disso, os bancos chegaram a descuidar da avaliação do risco em países já fortemente endividados e assumiram a nível global a tese de que países não quebram. Em alguns casos, permitiu-se continuar emprestando por motivos essencialmente ideológicos ou de apoio a um funcionário oficial, como foi o caso de Martínez de Hoz na Argentina.

Esta situação de relativa e curta “bonança”, na relação de alguns governos devedores latino-americanos com os bancos internacionais, coincidiu com a especial conjuntura internacional, à qual já nos referimos. Muitos analistas, contudo, chegaram a considerar que isto respondia a uma realidade de amplo alcance, que marcava uma nova era nas relações da América Latina com o resto do mundo. Falou-se, por exemplo, em “tendências de longo prazo do sistema mundial, que estavam produzindo uma ampliação do campo de manobra dos países latino-americanos . . . porque a expansão da liquidez internacional havia enfraquecido a disciplina financeira tradicionalmente exercida pelo FMI e porque o progressivo enfraquecimento da hegemonia americana havia deslocado o centro de decisões da potência anteriormente hegemônica a um grupo de países centrais. . . Portanto, havia chegado a hora de formular uma teoria da independência que desse mais importância à ampliação da liberdade de manobra internacional de nosso país” (Ferrer, 1979Ferrer, A. (1979) Notas para una Teoría de la Independencia “, Comercio Exterior, vol. 29, n. 8.).

Outros autores destacaram, referindo-se à década de 1970, que o conceito de dependência financeira continuava sendo válido só para o caso daqueles países cujo acesso à liquidez internacional permanecia restrita (Griffith-Jones, 1985Griffith-Jones, S. (1985) “The International Environment “, Griffith-Jones, S. & Harvey, C. World Prices and Development, Londres, Gower. ).

Como se pode observar, entretanto, essas visões otimistas estão sendo confrontadas pela nova realidade dos anos oitenta e por suas dramáticas mudanças. Quando o conjunto dos bancos decidiu interromper seus empréstimos à área, em 1982, as negociações do pagamento da dívida foram lideradas por poucos grandes bancos internacionais. A consequente deterioração nas condições de crédito foi acompanhada por aumentos no custo da dívida - fortes encargos sobre a taxa Libor, altas comissões - que para Devlin constituem uma renda monopolista.

O surgimento de um mercado de capitais não competitivo, com forte poder de negociação por parte desses bancos que controlam o acesso ao crédito dos países endividados, tirou destes países não só a capacidade de manobra externa, como também interna, e que a não condicionalidade existente nas negociações da década passada se converteu na absoluta vinculação presente entre as renegociações e a obtenção de acordos favoráveis com o FMI.

Temos nos ocupado em destacar a relação existente entre certas tendências que apresentam as economias centrais, especialmente os Estados Unidos, e o endividamento líquido dos países periféricos.

Uma das ideias de caráter geral, que poderia derivar-se da análise anterior, é que na medida em que nos países centrais a produtividade não crescesse rápido o suficiente para fazer frente às demandas salariais, caberia esperar-se que estes países implementassem políticas recessivas - com altas taxas de juros - que limitassem esse crescimento salarial. Se aceitarmos a hipótese de que o protecionismo contribui para frear a reestruturação tecnológica e o crescimento da produtividade, a expansão que o mesmo está tendo em alguns países centrais e, especialmente, nos Estados Unidos, estará nos indicando a continuidade de políticas recessivas e de altas taxas de juros para evitar - como destaca o FMI - que os salários se expandam mais que a produtividade. Este processo se verá, além disso, potencializado dentro dos Estados Unidos, na medida em que sua competitividade internacional continuar mostrando sinais de erosão.

As autoridades norte-americanas - como já assinalamos - deram uma resposta diferente aos déficits da balança comercial apresentados por este país durante as décadas de 1970 e 1980. No primeiro caso, o déficit externo foi acompanhado de políticas expansivas que contribuíram para elevar a liquidez internacional e que tornaram os Estados Unidos, em poucos anos, o mais importante exportador de capitais. Na década de 1980, o crescente déficit comercial, assim como o fiscal, não estão sendo financiados por políticas expansivas, mas através de recursos provenientes do Exterior atraídos pelas altas taxas de juros. Esta mudança na política monetária dos Estados Unidos, que teve lugar a partir de 1979, coincidiu, no tempo, com uma etapa de queda do salário real nesse país.

Se estas hipóteses forem corretas e tivermos que pensar na permanência de uma situação recessiva - com altas taxas de juros - por um período não claramente previsível, seus efeitos para os países periféricos serão adversos, tanto pelo peso que as taxas de juros exercem sobre o serviço da dívida externa quanto pela situação dos preços dos produtos primários já severamente afetados pela recessão dos países centrais.

Por outro lado, é muito possível que as políticas· monetárias restritivas tendam a consolidar a tendência atual de expansão das relações financeiras entre os países industrializados e de marginalização dos. países periféricos. Paradoxalmente, as economias periféricas altamente endividadas têm-se tornado muito mais dependentes das políticas macroeconômicas que estão ocorrendo nos países centrais.

Ante· o reconhecimento de que os bancos privados deixaram de ser uma fonte voluntária de acesso a capital para os países de Terceiro Mundo, alguns funcionários oficiais da área expressaram suas esperanças no papel futuro das agências oficiais internacionais como fornecedores de crédito.

Em um boletim recente, contudo, o banco Morgan destaca que não se devem criar ilusões acerca da generosidade dos governos dos países industrializados, tampouco esperar-se uma grande expansão no financiamento proveniente das agências internacionais ou organismos de crédito para exportação. O financiamento multilateral está limitado pela incapacidade dos Estados Unidos de contribuir com um aumento significativo, dados seus problemas fiscais, e pela resistência de outros países em cobrir essa lacuna (World Financial Markets, setembro 1986). Além disso, os recursos líquidos concedidos pelo FMI em 1986 foram negativos, devido a uma queda importante nos empréstimos concedidos pela instituição.

A atual situação da dívida do Terceiro Mundo, todavia, está conduzindo a desequilíbrios maciços que não podem manter-se por muito tempo. O futuro imediato parece mostrar uma situação instável em relação ao volume de saída de recursos dos países periféricos. Tudo parece indicar que a solução será política, isto é, que estará fora das presentes regras do jogo. Mas, em todo caso, só servirá para fazer frente aos mais angustiantes problemas atuais e não para que os países endividados voltem a entrar no circuito de recepção de fluxos de capital.

Isto indica a importância que assume, dentro da América Latina, o desenvolvimento de um mercado interno de capitais que atue como fonte genuína de financiamento do investimento e do crescimento. Lamentavelmente, esse mercado tem sofrido de forma profunda os efeitos do processo de endividamento e da incerteza gerada por crescente falta de credibilidade nas moedas locais. Tal falta de credibilidade está determinando um piso ao nível das taxas internas de juros, com o objetivo de evitar a especulação financeira nos ativos externos. Por outro lado, o aumento do déficit fiscal dos governos, para fazer frente ao pagamento dos serviços da dívida externa, está gerando profundas distorções macroeconômicas. O enxugamento de moeda realizado como resposta a esse déficit contribui para elevar as taxas de juros, tornando mais atrativa a colocação de recursos em ativos financeiros líquidos do que em investimentos produtivos de maior prazo e risco. Não é aqui o lugar para desenvolver um diagnóstico e estratégias para o setor financeiro interno dos países latino-americanos, mas sim para assinalar que a situação de abundância de fluxos internacionais que ocorreu nos anos setenta respondeu a uma situação muito especial vivida pelos países centrais, situação que dificilmente voltará a repetir-se, o que obriga a uma profunda modificação da realídade latino-americana.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • Banco de Pagos Internacionales - BPI. (1983) Fifth Third Annual Report, Basle.
  • Bittar, S. (1985) “La desconcertante recuperación de la hegemonía de Estados Unidos”, El Sistema Internacional y América Latina: una Nueva Era de Hegemonía Norteamericana?, Edición de Luis Maira, Grupo Editor Latinoamericano.
  • Comité de Relaciones Exteriores del Senado de Estados Unidos, (1977) La Deuda Internacional, los Bancos y la Política Exterior de Estados Unidos. Subcomité de Política Exterior.
  • Conde, R. (1987) “Modalidades de Integración del Capital y Crisis Internacional”, Economía, Teoria y Práctica, Universidad Autónoma de México, Num. extraordinário 1.
  • Devlin, R. (1978a) “External Finance and Comercial Banks”, Cepal Review, primeiro semestre,
  • Devlin, R. (1978b.) External Finance and Comercial Banks”, Cepal Review, primeiro semestre,
  • Devlin, R. (1982) “La Banca Privada Internacional y la Deuda Latinoamericana “, Cono Sur, vol. 5.
  • Devlin, R. (1983) “Renegociación de la Deuda Latinoamericana. Un Análisis dei Poder Monopólico de la Banca”, Revista de La Cepal, vol, 20, agosto.
  • Dod, D. (1981) “Bank Lending to Developing Countries”, Federal Reserve Bulletin, setembro,
  • Federal Reserve Bank of New York Quarterly Review, vol. 9, n. 2, verão, 1984.
  • Fajnzylber, F. (1986) “El Debate Industrial en Estados Unidos. Entre el Desafio Japonés y el Espectro de Inglaterra”, Crisis y Regulación Estatal: Dilemas de Política en América Latina y Europa, Grupo Editor Latinoamericano, 1986.
  • Ferrer, A. (1979) Notas para una Teoría de la Independencia “, Comercio Exterior, vol. 29, n. 8.
  • Fundo Monetário Internacional. (1982) “World Economic Outlook”, Occasional Paper, n. 9.
  • Fundo Monetário Internacional (1983) “World Economic Outlook”, Occasional Paper, n. 21.
  • Griffith-Jones, S. (1985) “The International Environment “, Griffith-Jones, S. & Harvey, C. World Prices and Development, Londres, Gower.
  • Heller, J. (1979) “Assessing Euromarket Growth: Why the Market is Demand Determined “, Euromoney, fevereiro.
  • Hicks, J. (1953) “The Long Run Dollar Problem “, Oxford Economic Papers, vol. -S, n. 2, junho.
  • Kuczynski, P. (1983) Latin American Debt, World Affairs.
  • Killick, T. (1981) “Euromarket Recycling of OPEC Surpluses: Fact or Myth?”, The Banker, Londres, janeiro.
  • Mayer, H. (1980) “Creación de Crédito y Liquidez en el Sector Bancario Internacional”, Boletín CEMLA, vol. 26, n. 5, setembro-outubro.
  • Organización para la Cooperación y el desarrollo Económico - OECD, (1981) Economic Outlook, n. 30, dezembro.
  • Reinhart, V. (1986) “Macroeconomic Influences on the US-Japan Trade Imbalance”, Federal Reserve Bank on New York Ouarterly Review, Spring, vol. 11, n. 1.
  • Solomon, R. (1977) “The International Monetary System: 1945-1976”, An lnsiders View, New York, Harper and Row Publishers.
  • Stallings, B. (1979) “Euromarkets, Third World Countries and the International Political Economy “. Trabalho apresentado na conferência “Social and Political Challenges to the New International Economic Order”.
  • Strange, S. (1976) International Economic Relations of the Western World: 1959-1971, vol. 2, Oxford, Oxford University Press.
  • Thurow, L. (1984) The Case for Industrial Policies, Center for National Policy, Washington, janeiro.
  • Triffin, R. 1968) El Sistema Monetario Internacional, Buenos Aires: Amorrortu Editores.
  • Triffin, R. (1978) “Gold and the Dollar Crisis”, Essays in International Finance, n. 132, dezembro.
  • Triffin, R. (1987) “Para Rectificar el Escándalo Monetario Mundial”, El Comercio Exterior, vol. 37, n. 3, México, março.
  • UNCTAD (1981) Trade and Development Report.
  • 1
    É certo que, a partir de 1979, o salário real tende a cair nos Estados Unidos (com exceção de 1982) e em um nível mais pronunciado que no resto dos países industrializados (ver Quadro 2). Seguindo o raciocínio de Hicks, poderíamos dizer que isto seguramente ajudou a contrabalançar o menor crescimento relativo da produtividade durante esses anos, mas a custo de uma redução no nível de vida interna de difícil implementação como estratégia de longo prazo.
  • 2
    Ver este autor para uma análise do Debate Industrial.
  • 3
    Em artigo recente, Triffin volta a insistir sobre a necessidade dessa reforma. “Ao contrário dos distintos ministros, governadores e representantes do Grupo dos Dez, eu continuo considerando essencial uma reforma fundamental do sistema monetário internacional. O principal obstáculo (para esta reforma) continua sendo a resistência dos Estados Unidos em abandonar seu privilégio tradicional, que considero uma maldição oculta, de financiar seus déficits internacionais e orçamentários com as próprias promissórias. . . Face à falta de acordo americano, é provável que outros países, cedo ou tarde, assumam a iniciativa a fim de diminuir a excessiva dependência com respeito às extravagâncias de um dólar de papel, flutuante e inconversível.” Triffin (1987Triffin, R. (1987) “Para Rectificar el Escándalo Monetario Mundial”, El Comercio Exterior, vol. 37, n. 3, México, março. ).
  • 4
    Em 1972, cria-se o Comitê dos 20 para analisar novas medidas de regulação do sistema financeiro internacional, entre elas a gradual substituição do dólar como moeda de reserva pelos Direitos Especiais de Saque.
  • 5
    Numa reunião anual do Fundo, em 1975, concordou-se em abolir o preço oficial do ouro e com o fim do uso obrigatório desse metal nas transações com essa instituição. Além disso, ficou estabelecido que um sexto das posses de ouro fosse devolvido aos países-membros, em proporção às suas cotas, enquanto outro sexto fosse vendido no mercado. Isto causou grande queda no preço de mercado do ouro até fins de 1975.
  • 6
    A valorização do dólar entre 1980-85 afetou não só quantitativamente a evolução das exportações e importações, mas também sua estrutura. Do lado das exportações, o setor mais afetado foi o de produtos agrícolas, dadas as lutas travadas com a CEE. Pelo lado das importações, houve queda relevante na participação do petróleo e de produtos derivados e acentuado aumento em bens de capital e veículos, diante do notável avanço das vendas japonesas.
  • 7
    A conta corrente do balanço de pagamentos dos Estados Unidos é negativa durante o período 1977-78, assim como a partir de 1982. O que muda essencialmente é a forma de seu financiamento. Entre 1977-78 o déficit em conta corrente é agravado pela saída líquida de capitais privados, devendo ambos ser financiados por transações oficiais, tais como a compra de dólares pelos bancos oficiais de outros países. A partir de 1982, o déficit em conta corrente, que aumenta acentuadamente a cada ano, passou a ser crescentemente financiado por fluxos líquidos de capital privado, que passaram de 45 bilhões de dólares negativos, em 1982, para 24 bilhões positivos em 1983 (ver Federal Reserve Bank of New York Quarterly Review, verão, 1984, vol. 9, n. 2).
  • 8
    O investimento privado direto é outra das rubricas que teve diminuída sua participação relativa no total da afluência de recursos para a América Latina, passando de 33% em 1966-70 para 22% em 1977-81.
  • 9
    O BPI destaca, ao analisar a situação dos euromercados, em 1977: “Nesse ano o déficit do balanço de pagamentos dos Estados Unidos, juntamente com outras forças expansivas, tendeu a aumentar a oferta de recursos disponíveis nos mercados internacionais e se criaram condições muito favoráveis para os devedores. Felizmente, ao menos para os prestamistas, a demanda de créditos externos respondeu positivamente” (BPI, Relatório Anual, n. 48).
  • 10
    A taxa anual de crescimento foi de 2,3% na década de 1950 e de 3,1% na de 1960.
  • 11
    Fixaram-se limites às taxas de juros sobre depósitos de menos de 100.000 dólares e tentou-se frear o déficit do balanço de pagamentos através da imposição de limites nos créditos bancários a não residentes. Esta última disposição, que impedia os empréstimos externos a partir das agências centrais dos bancos nos Estados Unidos, levou a que estes fizessem operações com recursos obtidos nos euromercados, a partir de suas filiais internacionais.
  • 12
    “Num período no qual se estancou o crescimento do crédito interno pela queda da demanda de financiamento dos investimentos das principais empresas. . . a espetacular expansão dos empréstimos internacionais foi fundamental para manter o crescimento sustentado da lucratividade dos principais bancos americanos, especialmente dos doze que representam dois terços das atividades bancárias no Exterior” (Comitê de Relações Externas do Senado dos Estados Unidos, 1977Comité de Relaciones Exteriores del Senado de Estados Unidos, (1977) La Deuda Internacional, los Bancos y la Política Exterior de Estados Unidos. Subcomité de Política Exterior.).
  • 13
    Para o caso da América Latina, estimou-se (ver lglesias, 1984) que, se a relação de preços de intercâmbio se tivesse mantido aos níveis similares aos de 1980, e se os tipos de juros continuassem nos níveis vigentes no momento em que se contraiu o grosso da dívida, a região teria disponíveis 25 bilhões de dólares adicionais em 1983, o que lhe teria permitido cumprir seus compromissos externos, sem comprimir dramaticamente suas importações e o nível de atividade interna.
  • 14
    Em fins de 1985, cinco dos dez maiores bancos internacionais, de acordo com seus ativos, eram japoneses. Isto foi incentivado pelo excesso de poupança interna sobre o investimento que o Japão apresenta e pela forte valorização que sofreu o iene nos últimos anos.
  • *
    Tradução de Rosa Maria Marques, do original em espanhol.
  • 16
    JEL Classification: F34; H63.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 1990
Centro de Economia Política Rua Araripina, 106, CEP 05603-030 São Paulo - SP, Tel. (55 11) 3816-6053 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: cecilia.heise@bjpe.org.br