Acessibilidade / Reportar erro

Sobre a reforma fiscal

On fiscal reform

RESUMO

Para estabilizar os preços internos, o governo está propondo uma reforma fiscal. Mas esta reforma não deve violar a equivalência ricardiana de modo que o peso da dívida não recaia inteiramente sobre quem não possui dívida, mas paga pelo aumento dos impostos.

PALAVRAS-CHAVE:
Gasto público; inflação; estabilização

ABSTRACT

To stabilize the domestic prices, the government is proposing a fiscal reform. But this reform must not violate the Ricardian equivalence so that the burden of the debt does not fall entirely on those who do not possess debt but pays for the increase in taxes.

KEYWORDS:
Government expenditures; inflation; stabilization

O ministro Marcílio e sua equipe viam o déficit fiscal, que seria coberto pelas emissões monetárias, como o principal fator gerador da inflação brasileira. Para estabilizar os preços, propunham uma reforma fiscal, isto é, o governo pretendia reduzir suas necessidades de caixa e, por conseguinte, diminuir as monetizações, aumentando suas receitas.

Alguém perguntaria: por que o governo não reduzia suas despesas ou combinava redução de gastos com aumento de receitas para diminuir as necessidades de caixa? Talvez os efeitos multiplicadores de uma contração dos gastos sejam perversos para a economia, não somente negativos. Além do mais, não é o déficit primário (gastos menos despesas), mas o déficit financeiro (igual ao serviço da dívida pública) que preocupava o governo.

Um aumento de receitas, via acréscimo da carga tributária, não causaria contração da atividade econômica? Provavelmente sim, e o mais interessante quanto a isso é que o governo criaria um mecanismo, que não aqueles citados na literatura, que contrariaria o Teorema de Equivalência de Ricardo.

O teorema diz que cobrir as necessidades de caixa através da venda de títulos ao público é equivalente a cobrança de impostos - os títulos não são considerados riqueza. Isso porque a venda de títulos da dívida pública hoje leva com ela a obrigação de pagar juros amanhã, implicando aumento futuro da carga de impostos. Se os cidadãos levam em conta esse futuro aumento de impostos, então não considerarão os títulos como riqueza.1 1 Uma elegante exposição deste argumento é apresentada em Barro, R. J. (1974) “Are government bonds net wealth?”, Journal of Political Economy, 82: 1095-117, 1974.

Ora, se todos, credores e não-credores do governo, pagássemos mais impostos para o governo devolver - na forma de juros - a seus credores, então a equivalência entre títulos e impostos deixaria de existir; os títulos da dívida pública seriam considerados riqueza para aqueles que os possuíssem. Em outras palavras, ocorreria um processo de redistribuição de rendas - processo este que esvaziaria os bolsos da população não-credora do governo e abarrotaria os cofres dos credores.

Portanto, o que a sociedade brasileira deve esperar de uma reforma fiscal é que não contrarie o Teorema de Equivalência de Ricardo na forma discutida acima. Se o acréscimo de receita é inevitável, então que o governo crie mecanismos que sejam capazes de atrair a faixa não-contributiva de cidadãos ou que aumente os impostos de sua população credora ou ambos - seria inadmissível que o ônus da dívida pública recaísse sobre a população contributiva não-credora do governo.

  • 1
    Uma elegante exposição deste argumento é apresentada em Barro, R. J. (1974) “Are government bonds net wealth?”, Journal of Political Economy, 82: 1095-117, 1974.
  • 2
    JEL Classification: H50; E31.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 1993
Centro de Economia Política Rua Araripina, 106, CEP 05603-030 São Paulo - SP, Tel. (55 11) 3816-6053 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: cecilia.heise@bjpe.org.br