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Fatores determinantes das exportações brasileiras para a CE: uma análise prospectiva dos impactos da ampliação do espaço econômico

Determining factors of Brazilian exports to the European Community

RESUMO

O artigo discute os impactos que a unificação dos mercados da Comunidade Europeia de 1993 pode ter sobre as exportações brasileiras de manufaturados. Embora o foco esteja no impacto da Europa-92, a análise também abrange os efeitos do processo mais amplo de expansão do espaço econômico europeu, com a formação da Zona Econômica Europeia (ZEE), entre a CE e a AELC (Associação Europeia de Livre Comercio), bem como inevitável integração da CE com a Europa Oriental. A principal constatação é que a redução de NBTs decorrentes da Europa-92 e a formação da ZEE terá um efeito líquido positivo nas exportações de manufaturados brasileiros. No entanto, também se argumenta que o Brasil está ameaçado tanto pelos efeitos indiretos derivados de alguns aspectos da harmonização de políticas quanto pela possibilidade de ser discriminado pelos parceiros da CE mais favorecidos dos países ACP e pela periferia da Europa.

PALAVRAS-CHAVE:
Comércio internacional; integração econômica; união europeia

ABSTRACT

The article discusses the impacts the unification of EC markets from 1993 may have upon Brazilian manufactured exports. Although the focus falls on the impact of Europe-92, the analysis also encompasses the effects of the broader process of expansion of the European economic space, with the formation of the European Economic Zone (EEZ), between the EC and EFTA, as well as EC’s inevitable integration with Eastern Europe. The main finding is that the reduction of NBTs stemming both from Europe-92 and the formation of the EEZ will have a net positive effect on Brazilian manufactured exports. However, it is also argued that Brazil is threatened both by indirect effects derived from some aspects of policy harmonization, as well as by the possibility of being discriminated against by more favoured EC partners of the ACP and the periphery of Europe.

KEYWORDS:
Trade; economic integration; European union

1. INTRODUÇÃO

A constituição do chamado mercado único da CE - Comunidade Europeia - a partir de 1º. de janeiro de 1993, com a implementação do Single European Act - a que se faz referência neste trabalho como Europa 92 - pretende instituir o livre movimento de bens, serviços, capital e trabalho na CE, promovendo importantes transformações não só nas economias dos países-membros, como também em suas relações comerciais com o resto do mundo. Este artigo discute os impactos dessas transformações sobre as exportações brasileiras, fazendo referência não apenas àqueles diretamente decorrentes da Europa 92, como também aos prováveis efeitos do processo paralelo de maior integração do espaço econômico da CE com a AELC e, como parece natural, com a Europa oriental. Como o foco do trabalho recai sobre o processo de integração na Europa, não se faz alusão aos possíveis efeitos da reforma da Política Agrícola Comum, que podem vir a ser importantes para o Brasil.

O trabalho está organizado em quatro seções, além desta introdução, e um anexo. A seção 2 explora os efeitos econômicos da Europa 92 sobre a CE e seus possíveis reflexos sobre terceiros parceiros. A terceira apresenta estimativas dos impactos da criação do mercado único sobre as exportações brasileiras de produtos industriais. A seção 4 analisa as ameaças associadas a variações de política externa da CE no processo de expansão do espaço econômico europeu. Procura-se explorar especialmente as ameaças decorrentes de aumento da proteção e discriminação por parte da CE contra as exportações brasileiras que podem acompanhar a criação do mercado único na Europa dos 12. Na última seção se resumem as principais conclusões obtidas a partir da análise elaborada nas anteriores. Finalmente, o Anexo Técnico ANEXO TÉCNICO 1. Descrição da metodologia adotada A metodologia utilizada neste trabalho permite quantificar os efeitos de criação e desvio de comércio da Europa 92 sobre as importações da CE de nove setores- ISIC (31) a (39) - de produtos industriais provenientes do Brasil. A Criação de Comércio para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é determinada de acordo com a seguinte equação21 (1) C C i = I D C E i · V R C E · E R i i=setores ISIC 31 a 39, onde: (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 199022, (VRCE)=Variação da renda real na CE após 1993. Existem diversas estimativas para o crescimento adicional da renda da CE em decorrência da unificação do mercado, merecendo destaque especial as estimativas elaboradas pela Comissão da CE (metodologias microeconômica e macroeconômica) e por Baldwin (1989) e (ERi)=Elasticidade renda da demanda por importações da CE de produtos industriais do Brasil no setor (i). Diversas dificuldades foram enfrentadas para estimar a verdadeira elasticidade renda para cada setor (i).23 A alternativa encontrada foi a construção de intervalos para valores prováveis a partir das principais estimativas da elasticidade renda das importações de países membros da CE disponível na literatura econômica. É importante destacar que se procedeu à escolha das elasticidades renda procurando evitar que os resultados de criação de comércio pudessem ser considerados exageradamente otimistas. Os limites mínimo e máximo fixados para a elasticidade renda em cada setor ISIC (31) a (39) respeitam a ordem de grandeza das estimativas obtidas na literatura. Além disso, vale ressaltar que se deu maior ênfase às estimativas referentes aos países membros com maior participação nas importações em relação ao total importado pela CE. Esse processo resulta no intervalo de variação da elasticidade renda utilizado nas simulações entre 0,5 a 3,0. Os intervalos de “E Ri” em cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A2. É importante notar que a aplicação do método descrito acima possibilita a construção de um intervalo mínimo e máximo de criação de comércio para cada setor ISIC (31) a (39). No que diz respeito à quantificação dos efeitos de Desvio de Comércio da Europa 92 sobre importações da CE de produtos industriais provenientes do Brasil, a metodologia oferece duas alternativas distintas. A primeira usa estimativas da Comissão da CE para a redução de importações da CE de produtos do resto do mundo em virtude da integração do mercado. Já a segunda é elaborada através da elasticidade preço das importações da CE e da estimativa da Comissão da CE para a variação no preço intra-CE devido ao mercado único. A primeira alternativa admite que o Desvio de Comércio para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é calculado da seguinte forma: (2) D C i = I D C E i · V I C E R M i para i=setores ISIC 31 a 39, onde: (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 1990, (VICERMi)=Variação percentual nas importações da Comunidade de bens do setor (i) produzidos extra-CE. A Comissão da CE estimou a redução percentual nas importações da Comunidade de bens produzidos extra-CE para classes NACE-CLIO (R44) 13 a 51. Utilizando a correspondência entre as nomenclaturas NACE-CLIO (R44) e ISIC (2-dígitos) elaborada por Teixeira (1992a)24 é possível obter intervalos para VICERMi em cada setor ISIC (31) a (39). O processo de escolha do limite mínimo e máximo de cada intervalo consistiu basicamente em utilizar as maiores estimativas de redução das importações da CE de bens produzidos extra-CE - elaboradas pela Comissão da CE para setores NACE-CLIO (R44) - nos respectivos setores ISIC (31) a (39). Os intervalos selecionados para cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A4. Adicionalmente, cabe destacar que a aplicação dessa primeira alternativa permite a construção de um intervalo mínimo e máximo de desvio de comércio para cada setor ISIC (31) a (39). A segunda alternativa de cálculo do Desvio de Comércio admite que esse efeito para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é determinado de acordo com a seguinte equação: (3) D C = I D C E i · V P R i · E P i i=setores ISIC 31 a 39 onde: (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 1990, (VPRi)=Variação no preço relativo intra-CE no setor i devido à Europa 92 e (EPi)=Elasticidade preço da demanda por importações ela CE ele produtos industriais do Brasil no setor (i). O processo de escolha dos limites mínimo e máximo cio intervalo ele variação da redução nos preços relativos intra-CE para cada setor ISIC (31) a (39) foi semelhante ao utilizado para obter o intervalo de variação ela redução de importações da CE descrito acima. Isto é, em primeiro lugar foi necessário observar a redução de preços intra-CE estimada pela Comissão da CE para as seções NACE-CLIO (R44) 13 a 51. Em seguida, utilizando a correspondência NACE-CLIO (R44)-ISIC, escolheu-se para cada setor ISIC (31) a (39) o maior valor dentre aqueles estimados para a correspondente seção NACE-CLIO (R44). Os intervalos selecionados para cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A5. As mesmas dificuldades encontradas para estimar as elasticidades renda (ERi) impediram o cálculo das elasticidades preço (EPi) de produtos industriais brasileiros importados pela CE agregados na classificação NACE-CLIO (R44) ou ISIC 2-dígitos. A alternativa que restou para avaliar a ordem de grandeza dessas elasticidades foi a construção de intervalos a partir das principais estimativas da elasticidade preço das importações de países membros da CE disponíveis na literatura econômica. A escolha do limite mínimo e máximo para cada setor ISIC (31) a (39) respeita a ordem de grandeza das estimativas obtidas na literatura. Tal processo resulta no intervalo de variação das elasticidades preço utilizadas nas simulações entre -0, 1 e -3,3. Estes, para cada setor ISIC (31) a (39), podem ser observados na Tabela A2. Do mesmo modo que na primeira alternativa, a aplicação do método proposto na segunda permite a construção de um intervalo mínimo e máximo para o desvio de comércio em cada setor ISIC (31) a (39). EFEITO LÍQUIDO DE CRIAÇÃO OU DESVIO DE COMÉRCIO DA EUROPA 92 SOBRE IMPORTAÇÕES DA CE DE PRODUTOS INDUSTRIAIS BRASILEIROS A metodologia proposta indica uma forma de quantificar o efeito de Criação de Comércio e oferece duas alternativas para o cálculo do efeito de Desvio de Comércio. Dois casos distintos podem ser elaborados para estimar o efeito líquido da Europa 92 sobre as importações da CE de produtos industriais brasileiros nos setores ISIC (31) a (39). O primeiro compara os limites mínimo e máximo dos intervalos de criação de comércio com os limites mínimo e máximo de desvio de comércio obtidos através da primeira alternativa de cálculo.25 No segundo caso se confrontam os mesmos limites mínimo e máximo de criação de comércio com os limites mínimo e máximo de desvio de comércio calculados a partir da segunda alternativa proposta.26 Em cada caso se elaboraram três simulações que diferem de acordo com a hipótese sobre o impacto da Europa 92 sobre a evolução do crescimento da renda da CE no médio prazo. A simulação I supõe crescimento adicional da renda de 4,5%, enquanto tal valor na simulação 2 é de 9,0%. Já a simulação 3 adota a hipótese otimista de crescimento extra de 18,0%. Os resultados obtidos no estudo do 1º Caso estão descritos na Tabela A6, enquanto aqueles derivados do 2º Caso estão na Tabela A7. Finalmente, cabe notar que essas estimativas do efeito líquido obtido devem ser tratadas como apenas indicativas do valor absoluto dos efeitos da Europa 92 sobre o Brasil, uma vez que não são conhecidas as verdadeiras elasticidade renda, elasticidade preço e redução das importações da CE relativas especificamente aos produtos industriais brasileiros. Desse modo, os intervalos apresentados devem ser entendidos como a ordem de magnitude desse efeito. Adicionalmente, também permitem observar a tendência, em cada setor ISIC (31) a (39), de criação ou desvio líquido de comércio da Europa 92 sobre as importações da Comunidade de produtos industriais provenientes do Brasil. detalha a metodologia utilizada para quantificar os efeitos de criação e desvio de comércio da Europa 92 sobre as exportações brasileiras de produtos industriais.

2. EFEITOS ECONÔMICOS DA EUROPA 92

A análise da evolução da CE desde sua formação em 1957 revela que o avanço do processo de integração comercial dos países membros é um fato incontestável. As razões que levaram esses países a avançar no sentido da fase final de criação do mercado único, com a implementação da Europa 92, derivam de efeitos benéficos provenientes de ganhos de eficiência, estáticos e dinâmicos, da integração econômica entre países.

Os efeitos estáticos derivam diretamente dos ganhos de eficiência decorrentes da realocação dos fatores de produção existentes, após a eliminação de barreiras não-tarifárias. Em condições razoáveis de competição, tais ganhos permitem a redução dos preços de produção, aumentando a competitividade internacional e a renda real da região integrada. O resultado do processo deverá consistir no crescimento do comércio intrarregional e na queda das importações de produtos concorrentes do resto do mundo. Paralelamente, admite-se também a possibilidade de algum crescimento do produto, que decorre da plena utilização dos recursos antes ociosos.

Os acordos de integração econômica também geram ganhos dinâmicos de eficiência a partir de investimentos induzidos pelo crescimento do mercado e pelo maior estímulo à competição. Estes, geralmente considerados quantitativamente mais importantes que os efeitos estáticos descritos acima, contribuem significativamente para a exploração de economias de escala na produção e a ampliação da eficiência técnica e da capacidade de inovação tecnológica na região integrada. Por sua importância estratégica, foram esses efeitos a principal justificativa para a decisão de aprofundar o processo de integração europeia como resposta às ameaças competitivas japonesa e norte-americana.

A expectativa de maior exploração de economias de escala na produção decorre do fato de que o surgimento do espaço integrado estimulará firmas que hoje operam abaixo da escala mínima eficiente a ampliar a produção e fazer novos investimentos na reestruturação das fábricas existentes, viabilizando a ampliação da capacidade produtiva e, consequentemente, a obtenção de maiores ganhos de escala. Esse efeito, embora varie substancialmente entre diferentes setores, contribuirá para aumentar a competitividade dos produtores da CE e estimulará o comércio interno à Comunidade. Além disso, também possibilitará o crescimento adicional de seu produto.

A expectativa de aumento de eficiência técnica decorre dos impactos da ampliação do mercado sobre a organização da produção e o processo competitivo na região integrada. O acesso a novos mercados permitirá a maior racionalização da produção, ou seja, possibilitará que as firmas passem a utilizar insumos de modo mais eficiente. Além disso, o ambiente de maior competição também forçará as firmas a eliminar ineficiências para se manter competitivas. Desse modo, é bastante provável que os produtores da CE aumentem sua eficiência e competitividade após a completa implementação do mercado único.

Finalmente, a expectativa de que a unificação do mercado também contribuirá para estimular a velocidade da inovação tecnológica na região está relacionada a diversos efeitos. O primeiro decorre do processo de aprendizado associado à introdução de novas técnicas no processo de reestruturação da fábrica visando ampliar os ganhos de escala. Nos setores onde é necessário investir grande volume de recursos em P&D - pesquisa e desenvolvimento - para possibilitar o avanço tecnológico, existe uma estreita relação entre inovação e ganhos de escala, na medida em que esses ganhos são indispensáveis para viabilizar os altos investimentos em P&D. Outra fonte de estímulo à inovação tecnológica é a maior competição entre as empresas, principalmente em setores de tecnologia avançada, onde firmas que não inovam ficam condenadas a perder mercado.

A análise desses efeitos estáticos e dinâmicos no caso da Europa 92 indica que a unificação do mercado deverá garantir expressiva melhora no desempenho econômico da CE nas próximas décadas. Os principais indicadores dos ganhos decorrentes da integração apontam aumento da competitividade-e consequente queda de preços - dos produtos comunitários e crescimento da renda real da CE.

Esses efeitos foram quantificados pela Comissão da CE utilizando o instrumental microeconômico tradicional.1 1 V. Emerson (1990). A redução média de preços intra-CE, estimada para produtos industriais, é de cerca de 2,0%, sendo os setores mais afetados os de minerais metálicos (ISIC 37), alimentos, bebidas e fumo (ISIC 31) e bens de investimento (ISIC 38). Considerando apenas os efeitos do aumento de competitividade, estimou-se a redução média de importações comunitárias de produtos extra-CE em cerca de 10,0%. Os setores onde a redução de importações se mostrou mais pronunciada são minerais metálicos (ISIC 37), bens de investimento (ISIC 38) e produtos químicos, manufaturados de borracha e plásticos (ISIC 35).2 2 Todos estes resultados foram estimados pela Comissão da CE para setores agregados na classificação NACE-CLJO (R44). Utilizando a correspondência NACE-CLIO (R44)- ISIC Rev. 2 (2-dígitos) elaborada em Teixeira (1992a), é possível observar o impacto da Europa 92 em setores agregados na classificação ISIC. V. Tabela 3, no Anexo. Quanto ao impacto da Europa 92 sobre a evolução do produto da CE, as estimativas sugerem que o crescimento total do PIB comunitário decorrente da unificação do mercado será da ordem de 4,3 a 6,4%, sendo que os efeitos estáticos contribuirão com aproximadamente 2,2 a 2,7% e os dinâmicos com 2,1 a 3,7%.

O estudo da Comissão da CE, entretanto, apesar de reconhecer a grande importância dos aspectos dinâmicos da unificação do mercado, como eliminação de ineficiências e inovação tecnológica, não os incorpora nas estimativas. Na tentativa de corrigir essa importante deficiência das estimativas, Richard Baldwin (1989BALDWIN,R. (1989). “On the growth effect of l992”. NBER Working Paper, no.3119.) tentou quantificar alguns efeitos dinâmicos da Europa 92 sobre o crescimento do produto da Comunidade, incorporando os efeitos da elevação da relação capital/produto decorrente de novos investimentos realizados no contexto da unificação do mercado. Os resultados observados mostram a grande importância dos efeitos dinâmicos no processo de integração, confirmando serem diversas vezes superiores aos estáticos. As estimativas para a evolução do produto da CE no médio prazo3 3 Baldwin (1989) considera médio prazo o período entre oito e doze anos. apontam crescimento entre 2,9 a 260,0%, sendo os efeitos estáticos responsáveis por 2,0 a 6,5% e os dinâmicos por cerca de 0,86 a 253,5%.

Já as estimativas de crescimento no longo prazo indicam que os efeitos dinâmicos poderão aumentar de forma permanente a taxa de crescimento do produto da CE entre 0,3 e 1 ponto percentual. Em termos de valor presente, isso significa afirmar que esses efeitos deverão ampliar o crescimento da CE entre 8,9 e 29,0%. Adicionando aos efeitos dinâmicos as estimativas referentes aos estáticos, observa-se que a Europa 92 poderá resultar no crescimento da CE entre 10,9 e 32,6%.

Parece pouco realista admitir que os impactos do mercado único sobre o produto da CE resultem em taxas de crescimento da ordem de grandeza dos limites superiores dos intervalos estimados por Baldwin (1989BALDWIN,R. (1989). “On the growth effect of l992”. NBER Working Paper, no.3119.). Porém sua contribuição foi importante para sublinhar o fato de que os efeitos da Europa 92 sobre o crescimento da Comunidade serão substanciais e, certamente, superiores aos calculados pela Comissão da CE.

Uma terceira metodologia, que avalia os efeitos da Europa 92 sobre o crescimento do produto e de outras importantes variáveis macroeconômicas, utilizou modelos econométricos.4 4 V. Catinat, Donni & Italianer (1988) e Emerson (1990). Os resultados confirmam os ganhos econômicos da unificação identificados anteriormente, pois em todos os cenários se observa tendência de crescimento sustentado do produto no médio prazo e queda sistemática da inflação. No cenário de pior desempenho macroeconômico, onde não há coordenação de políticas macroeconômicas entre os membros - isto é, cada país conduz as políticas monetária e fiscal de acordo com os interesses nacionais -, a intervenção provoca um crescimento adicional do produto de cerca de 4,5% no médio prazo.5 5 Nesses estudos se considera médio prazo a partir do sexto ano. Este resultado é acompanhado pela redução nos preços ao consumidor e na criação de cerca de 1,9 milhão de empregos. Entretanto, até a realização dos resultados favoráveis no médio prazo, a CE deverá enfrentar custos de ajustamento decorrentes da unificação do mercado em um cenário de baixo crescimento do produto, que se traduzem, por exemplo, na redução de cerca de 570 mil empregos nos dois primeiros anos.

Diversos outros cenários, mais otimistas quanto ao ambiente macroeconômico, foram elaborados supondo a coordenação entre as políticas monetária e fiscal dos países membros. O cenário considerado mais realista pela Comissão da CE admite crescimento adicional do produto da Comunidade no médio prazo de cerca de 7,0%, podendo atingir aproximadamente 9,0% em decorrência da margem de erro existente nas simulações. Nesse contexto, seriam criados 5 milhões de novos empregos e os preços ao consumidor continuariam em queda.

Em suma, os principais métodos quantitativos utilizados para avaliar os impactos da Europa 92 sobre a CE indicam que o mercado único deverá proporcionar ganhos econômicos à Comunidade. Embora os resultados desses diversos métodos divirjam quanto à magnitude dos ganhos, pode-se afirmar com segurança que serão substanciais. Do ponto de vista do interesse deste trabalho, todavia, o que interessa ressaltar é como as transformações decorrentes da Europa 92 devem afetar as relações comerciais da Comunidade com países não membros. E, dada a importância da Comunidade no comércio mundial, esses impactos não devem ser desprezíveis.6 6 Em 1990 as importações da CE (excluídas as intracomunitárias) corresponderam a aproximadamente 17,4% das importações mundiais. V. European Economy no. 46 (1990).

De modo geral, os impactos da Europa 92 sobre o comércio da CE com o resto do mundo dependerão da magnitude dos efeitos dos aumentos de renda e da queda de preços na Comunidade, descritos na seção anterior, sobre as exportações dos terceiros parceiros - os chamados “efeito renda” e “efeito preço”. O efeito renda contribuirá para a criação de comércio7 7 O conceito de criação de comércio é aqui utilizado como o aumento no volume de importações da CE de produtos do resto do mundo. da Comunidade com terceiros parceiros. De acordo com as estimativas descritas acima, espera-se que o crescimento adicional da renda da CE seja elevado, aumentando sua demanda por importações de produtos do resto do mundo. Como os setores mais beneficiados serão aqueles cuja demanda é mais elástica, as maiores oportunidades de ampliação do comércio deverão surgir para países que concentram suas exportações para a Comunidade em produtos com maior elasticidade renda da demanda.

Já o efeito preço, decorrente da tendência de redução dos preços dos produtos na CE, deverá gerar desvio de comércio8 8 O conceito de desvio de comércio deve ser entendido no contexto deste trabalho como a redução no volume de importações da CE de produtos do resto do mundo. da Comunidade com o resto do mundo. É importante notar que a maior competitividade dos produtores da CE, além de dificultar as vendas de produtos de países não membros no mercado da CE, também poderá ampliar a participação de bens produzidos na Comunidade nos mercados de terceiros parceiros.

3. IMPACTOS DA EUROPA 92 SOBRE AS EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS

Ao longo da última década, o bloco formado pelos doze países membros da CE tornou-se um dos mais importantes mercados para produtos brasileiros. Em 1990, as importações da Comunidade de bens provenientes do Brasil foram de cerca de US$ 11,7 bilhões, que corresponderam a mais de 30% do total de vendas do país no exterior.

Utilizando a classificação ISIC é possível observar a distribuição desse total entre produtos primários, semimanufaturados e manufaturados.9 9 ISIC (“International Standard Industrial Classification”) é a classificação de produção das atividades econômicas das Nações Unidas. Em todo o artigo foi utilizada a ISIC Revisão 2. O conjunto de produtos primários é formado pelos setores agrícola, caça, pesca e silvicultura [ISIC (1)] e extrativa mineral [ISIC (2)]. Os produtos semimanufaturados são representados pelo setor de alimentos, bebidas e derivados do fumo [ISIC (31)]. O conjunto de produtos manufaturados é formado pelos setores [ISIC (32) a (39)]. A definição precisa de cada um dos setores é apresentada na Tabela AI do anexo. O Gráfico 1 mostra que os dois primeiros setores, em conjunto, sempre dominaram a pauta de importações da CE de produtos brasileiros nos anos 80. Entretanto, a partir da segunda metade da década, nota-se nítida tendência de crescimento na participação dos manufaturados.

GRÁFICO 1
Importações da CE de Produtos Brasileiros

A participação dos produtos primários mostrou-se bastante estável ao longo de todo o período, correspondendo em média a 27% do total importado pela CE de produtos brasileiros. Em 1990 as vendas do setor foram de aproximadamente US$ 3,2 bilhões, ou 27% do total. Já a parcela de importações da CE de produtos semimanufaturados, que no período de 1980 a 1984 correspondeu em média a cerca de 46% do total, na segunda metade da década apresentou forte tendência declinante. Em 1990 as vendas desses produtos foram de US$ 3,5 bilhões, representando 30% do total de compras da CE de bens provenientes do Brasil. Essa redução na participação dos produtos semimanufaturados pode se explicar em grande parte pelo forte crescimento das vendas de manufaturados do Brasil no mercado da CE. Esses bens, que na primeira metade da década de 80 corresponderam, em média, a cerca de 27% das importações da CE de produtos brasileiros, ampliaram gradualmente sua proporção no total em resposta à depreciação da taxa de câmbio brasileira - seguindo o dólar - em relação ao ECU. Em 1990 as vendas de manufaturados superaram a barreira dos US$ 5 bilhões e corresponderam a cerca de 43% da pauta de importações da CE de produtos provenientes do Brasil.

O Gráfico 2 oferece uma visão geral da composição de importações da CE de produtos industriais brasileiros - definidos como os setores semimanufaturados e manufaturados da classificação ISIC 2-dígitos.10 10 Em 1990 o conjunto dos setores ISIC (31) a (39) correspondeu a cerca de 73% da pauta de importações da CE de produtos brasileiros. Observa-se que apenas quatro setores responderam por cerca de 81% do total de produtos industriais importados pela Comunidade na última década. Esse grupo é composto por alimentos, bebidas e derivados do fumo [ISIC (31)], bens de investimento [ISIC (38)], indústria têxtil, vestuário e calçados [ISIC (32)] e a indústria básica de minerais metálicos [ISIC (37)].

GRÁFICO 2
Estrutura das Exportações Industriais do Brasil para a CE

É interessante notar que esse conjunto é predominantemente composto por produtos intensivos em trabalho ou, como no caso de minerais metálicos, trabalho intensivo complementado por economias de escala na exploração de recursos naturais. O setor de alimentos, bebidas e derivados do fumo [ISIC (31)], durante os últimos dez anos, consolidou-se na principal posição entre os produtos industriais brasileiros importados pela CE. Na última década, contudo, nota-se nítida tendência de redução da participação do setor no conjunto de produtos industriais brasileiros importados pela Comunidade, embora em 1990 ainda tenha atingido mais de 41% do total. Outro setor intensivo em trabalho de destaque é a indústria têxtil, vestuário e calçados [ISIC (32)], onde a proporção das importações no total de produtos industriais brasileiros importados pela CE na última década apresentou grande estabilidade na faixa dos 10%. No caso da indústria básica de minerais metálicos [ISIC (37)], nota-se ligeira tendência ascendente na participação, que atinge aproximadamente 10% em 1990.

O único setor predominantemente intensivo em capital que compõe o grupo dos principais produtos industriais brasileiros importados pela CE é o de bens de investimento [ISIC (38)]. Vale notar que, como foi dito acima, enquanto os outros setores tradicionais reduziram ou mantiveram estável sua participação no total das exportações de produtos industriais brasileiros para a Comunidade, este ampliou significativamente sua participação. De apenas 9% do total em 1980, os bens de investimento em 1990 já superavam a marca dos 18,5%, consolidando a posição de segundo lugar entre os produtos industriais brasileiros importados pela CE.

Outros setores menos importantes na pauta de importações da CE de produtos industriais brasileiros que também apresentaram tendência crescente ao longo da última década são os produtos químicos, manufaturados de borracha e produtos plásticos [ISIC (35)] e manufaturados de papel e derivados [ISIC (34)]. O primeiro, que no início dos anos 80 participava com 3% do total, atingiu a marca dos 7% em 1990. Já o segundo ampliou gradualmente sua proporção no total de produtos brasileiros vendidos à CE, partindo de cerca de 4% em 1980 e chegando a pouco mais de 6% em 1990.

Nos demais setores - manufaturados de madeira e móveis [ISIC (33)], manufaturas de minerais não metálicos [ISIC (36)] e outros produtos manufaturados [ISIC (39)] - a participação no total importado pela CE de produtos industriais brasileiros é praticamente insignificante. Em 1990 esses três setores em conjunto corresponderam a apenas 5% do total.11 11 A fonte desses dados é a Tabela AI do anexo.

De acordo com a análise elaborada na seção 2, nota-se que os impactos da Europa 92 sobre as vendas brasileiras no mercado unificado da CE deverão resultar da interação entre o efeito renda e o efeito preço. Visando estimar o efeito líquido de criação ou desvio de comércio da Europa 92 sobre as importações da CE de produtos industriais brasileiros12 12 A avaliação quantitativa feita aqui está restrita ao universo de produtos industriais. Mudanças no fluxo de comércio de produtos agrícolas dependem mais da reforma na Política Agrícola Comum e dos resultados da Rodada Uruguai do GATT. , foram analisados dois casos que diferem basicamente pela forma de cálculo do efeito de desvio de comércio.13 13 O efeito líquido é definido como a diferença entre a criação de comércio e o desvio de comércio. Assim, quando o efeito líquido for de criação de comércio, significa que o aumento no volume de importações da CE de produtos industriais brasileiros é superior à sua queda. A forma de cálculo das estimativas de criação de comércio e desvio de comércio para cada setor ISIC (31) a (39) no Caso estão detalhadas no anexo. Em cada caso se elaboraram três simulações que utilizam diferentes hipóteses para o crescimento adicional da renda da CE.14 14 As hipóteses utilizadas para o crescimento adicional da renda da CE foram as seguintes: pessimista (4,5%), básico (9,0%) e otimista (18,0%). Vale lembrar que estas hipóteses correspondem a desvios cm relação à tendência de crescimento da CE sem a unificação do mercado, ou seja, indicam a ordem de grandeza do impacto da Europa 92 sobre o produto da Comunidade. Todas as estimativas obtidas estão a preços de 1990. Os principais resultados podem ser observados no Quadro 1.

Quadro 1
Impactos da Europa 92 sobre as exportações brasileiras de produtos industriais

Os resultados obtidos nos dois casos estudados indicam que o efeito líquido da Europa 92 sobre o agregado de importações da CE de produtos industriais do Brasil é de criação de comércio. Isso quer dizer que, em geral, o efeito renda positivo domina o efeito preço negativo, resultando no crescimento das vendas de produtos industriais brasileiros no mercado unificado no médio prazo.15 15 Médio prazo deve ser considerado o período após o sexto ano de implementação do mercado único.

No 1º. Caso, nota-se que a magnitude desse efeito está estimada entre US$ 23 milhões e US$ 2.725 milhões. Estimativas mais realistas são as obtidas com a hipótese básica de crescimento de 9,0% da renda da CE. Nesse caso, a ordem de grandeza da criação líquida de comércio deve se situar no intervalo de US$ 476 milhões a US$ 978 milhões, resultado que representaria acréscimo de 1,5 a 3,1% às exportações brasileiras de 1990.

Já as estimativas obtidas no 2º. Caso indicam que o limite mínimo do efeito líquido de criação de comércio deve ser de cerca de US$ 346 milhões, enquanto o limite máximo pode chegar a até US$ 3.000 milhões. Assim, como no 1º. Caso, parece mais provável que a ordem de grandeza do aumento das importações da CE de produtos industriais brasileiros esteja próxima dos valores obtidos com a hipótese básica de crescimento da Comunidade de 9,0%, ou seja, entre US$ 825 milhões e US$ 1.220 milhões. Tal resultado representaria acréscimo de 2,6 a 3,9% às exportações brasileiras de 1990.

A análise do impacto desagregado pelas classes de produtos industriais ao nível ISIC 2-dígitos revela importantes diferenças setoriais nos efeitos da Europa 92 sobre o desempenho das exportações brasileiras.16 16 Os resultados para o 1º. Caso podem ser vistos na Tabela A6, enquanto aqueles referentes ao 2º. Caso estão na Tabela A7 do anexo. O Gráfico 3 - elaborado a partir dos resultados observados no limite máximo do 1º. Caso, com a hipótese básica de crescimento de 9% da CE no médio prazo - ilustra os diferentes efeitos de criação de comércio e desvio de comércio da Europa 92 sobre cada setor. O Gráfico 4 apresenta o resultado de criação ou desvio líquido de comércio obtidos a partir do Gráfico 3.

GRÁFICO 3
Efeitos de criação e desvio de comércio da Europa 92 sobre as exportações brasileiras

GRÁFICO 4
Efeito líquido da Europa 92 sobre as exportações brasileiras

De acordo com esses resultados, os nove setores estudados podem ser divididos em três grupos. O primeiro reúne os setores onde a tendência de criação líquida de comércio é substancial e é composto pelos setores: alimentos, bebidas e derivados do fumo [ISIC (31)]; bens de investimento [ISIC (38)]; indústria têxtil, vestuário e calçados [ISIC (32)]; produtos químicos, manufaturados de borracha e produtos plásticos [ISIC (35)]; e manufaturados de papel e derivados [ISIC (34)]. No segundo estão aqueles setores onde deve ocorrer criação líquida de comércio, porém em intensidade moderada. Participam desse grupo os manufaturados de madeira e móveis [ISIC (33)], manufaturas de minerais não metálicos [ISIC (36)] e outros produtos manufaturados [ISIC (39)]. O último grupo é composto pela indústria básica de minerais metálicos [ISIC (37)], o único setor onde a possibilidade de desvio líquido de comércio da Europa 92 se apresenta de forma concreta.

Cabe notar finalmente que a estrutura das importações da CE de produtos industriais brasileiros - concentrada em setores onde o efeito renda é superior ao efeito preço - é fundamental para determinar o resultado agregado de criação líquida de comércio da Europa 92 sobre o Brasil. Dos quatro setores que, em conjunto, representaram cerca de 81% das importações da CE de produtos industriais do Brasil em 1990, três possuem o efeito renda superior ao efeito preço.17 17 São eles alimentos, bebidas e fumo [ISIC (31)], bens de investimento [JSJC (38)] e a indústria têxtil, vestuário e calçados [ISIC (32)]. Somente na indústria básica de minerais metálicos o efeito preço é maior que o efeito renda.

4. AMEAÇAS ASSOCIADAS A VARIAÇÕES DE POLÍTICA EXlERNA DA CE NO PROCESSO DE EXPANSÃO DO ESPAÇO ECONÔMICO EUROPEU

Como visto na seção anterior, não existem ameaças diretas ao fluxo agregado de exportações brasileiras para a Comunidade em decorrência do processo de unificação. Contudo o aumento do fluxo de exportações para a CE pode não se verificar, caso venham a ocorrer aumentos concomitantes dos problemas de acesso de produtos de interesse exportador do país ao mercado comunitário. Tais aumentos podem resultar de acomodações complementares ou paralelas ao processo de criação do mercado unificado. No caso das acomodações complementares, o maior risco reside em que o Brasil seja prejudicado em decorrência das alterações requeridas para harmonizar as atuais diferenças marcantes existentes entre países membros da Comunidade quanto (i) ao uso de salvaguardas contra a penetração “excessiva” de importações de produtos específicos, (ii) à concessão de preferências especiais a países específicos e (iii) à incidência de impostos não fronteiriços sobre produtos de interesse exportador brasileiro. Quanto às que ocorrem em paralelo à formação do mercado único, a principal ameaça é a de que a expansão do espaço de integração europeu - em direção à AELC e, em especial, em direção à Europa oriental - resulte em discriminação contra produtos de interesse exportador brasileiro no continente europeu.

Em relação às salvaguardas, o perigo de a harmonização das diferenças nacionais na CE levar a um aumento das restrições existentes para a média da Comunidade nos setores mais “sensíveis” - isto é, naqueles onde é tradicionalmente maior a incidência de salvaguardas - aumenta consideravelmente num quadro em que a Europa 92 seja acompanhada de pressões competitivas sobre esses setores nos países de mão-de-obra mais cara. E esse quadro não é improvável. A constituição do mercado único poderá gerar novas pressões protecionistas em setores de uso intensivo de mão-de-obra, característica marcante das exportações brasileiras para a CE, uma vez que, após a segunda ampliação, a Comunidade passou a se compor de países cujos custos salariais são bastante inferiores aos observados nos membros mais antigos. Assim, espera-se que a Europa 92 estimule investimentos em setores intensivos em trabalho na CE, que deverão ser reorganizados favorecendo áreas onde o custo da mão-de-obra é mais baixo, como por exemplo Grécia e Portugal. O custo desse processo de ajustamento não deve ser minimizado. Como assinalado acima, em cenários não otimistas quanto ao estímulo de políticas fiscal e monetária nos países da Comunidade, a Comissão da CE projeta perda substancial de empregos nos dois primeiros anos após a unificação do mercado. Com o desemprego localizado em vários dos países mais influentes na CE, e na impossibilidade de limitar a competição dos novos membros comunitários, um cenário como este pode resultar em pressões irresistíveis para limitar o comércio com países não membros como medida de alívio dos custos de ajuste.

Isso é particularmente perigoso para o Brasil, uma vez que os índices de incidência de barreiras não tarifárias impostas pela CE sobre produtos brasileiros18 18 Dados elaborados por Pereira (1990) e adaptados por Teixeira (1992) para setores ISIC Rev.2. mostram que, durante os anos 80, os setores mais afetados por elas coincidem com o conjunto de setores com maior valor exportado pelo Brasil para a Comunidade. Além disso, o aumento de problemas de acesso impediria que o Brasil realizasse os ganhos potenciais de ampliação do comércio resultantes da Europa 92, já que os setores onde a magnitude do efeito de criação líquida de comércio é mais elevada são justamente aqueles mais exportados para a CE.

Outra área de risco potencial para o regime de acesso das exportações brasileiras à CE é a das preferências comunitárias, concedidas sob grande multiplicidade de regimes sob o amparo do Artigo 238 do Tratado de Roma.19 19 Para uma revisão abrangente desses regimes, v. Murray (1977). Na esfera estritamente comercial esses regimes preferenciais se caracterizam pela concessão, a distintos grupos de países, de condições de acesso substancialmente mais favoráveis que os genericamente concedidos ao conjunto dos países em desenvolvimento sob o SGP - Sistema Generalizado de Preferências.

O principal desses regimes, em termos de cobertura e concessões unilaterais aos beneficiários, é o regido pelas convenções de Lomé - que favorece as ex-colônias europeias da ACP- África, Caribe e Pacífico, composto hoje por setenta países -, cujas raízes remontam à primeira Convenção de Associação de Iaundê, de 1964, onde se iniciou a redefinição das bases do relacionamento econômico da Comunidade com aqueles países após o movimento de descolonização. Outros regimes importantes são os relativos aos países da bacia do Mediterrâneo, usualmente divididos entre o grupo de acordos junto a países “com vocação europeia” - ou seja, aqueles em que se prevê a integração à CE como ponto culminante do processo de associação, como Turquia, Chipre e Malta - e os de “vocação não europeia”, com os quais a CE celebra acordos de cooperação em que se prevê a eventual formação de ZLCs. Os mais importantes dentre esses últimos são os acordos de cooperação com a Iugoslávia, Israel, os países do Magreb (Argélia, Marrocos e Tunísia) e do Machrek (Egito, Jordânia e Líbano), que preveem acesso livre e não recíproco em manufaturas (exceto têxteis e derivados de petróleo) e certo número de produtos agrícolas não competitivos com a produção comunitária.

A existência desses regimes especiais já representa, naturalmente, uma discriminação contra produtos brasileiros. O perigo adicional é o de que a unificação europeia, ao ser acompanhada pela harmonização de diferentes concessões oferecidas por membros da CE no âmbito desses arranjos preferenciais - especialmente Lomé e os celebrados com países do norte da África -, possa gerar conflitos de interesses que venham a se resolver com pouca atenção aos interesses dos países não associados. No caso do Brasil, o perigo é especialmente importante em relação a Lomé e pode afetar negativamente as condições de acesso de produtos competitivos brasileiros, como ilustra o incidente da revisão das cotas de bananas, do qual resultou a taxação de supridores latino-americanos. Embora, como reflexo do fato de as concessões não serem feitas em setores sensíveis, esses efeitos sejam em geral pequenos, isso pode vir a ser um importante fator de irritação nas relações da CE com países em desenvolvimento, como o Brasil, que venham a sofrer aumento da discriminação hoje existente.

Uma terceira área em que a harmonização de políticas nacionais pode gerar impactos negativos sobre as exportações brasileiras é a dos impostos internos, particularmente a dos altos tributos incidentes sobre produtos tropicais. Dada a grande divergência entre os níveis nacionais de tributação existentes na CE, a harmonização pode se fazer de modo a elevar a média atual, com efeitos negativos sobre a demanda interna por esses produtos. Isso pode ser relevante nos casos do café e do cacau, onde existem níveis relativamente altos de tributação ao consumo.

Finalmente, como notado acima, o futuro do comércio brasileiro com a Europa será profundamente afetado pelas condições em que se realize a provável expansão da integração comercial além do espaço da Europa dos doze. O primeiro passo nessa direção já foi dado com a consolidação formal da EEA-Área Econômica Europeia-, de livre comércio entre a CE e a AELC. Nesse caso, como os países da AELC são economias desenvolvidas e que já possuem acesso livre de tarifas e grande integração comercial à CE, a formação da ZLC não deve ter efeito líquido negativo sobre o comércio brasileiro, pelos mesmos motivos apontados na discussão do impacto da Europa 92, feita acima: os efeitos renda da integração devem superar os eventuais desvios de comércio.

No quadro europeu, o risco maior de impactos negativos sobre as exportações brasileiras de produtos industriais para a CE nos próximos anos decorre de desenvolvimentos nos países do leste da Europa. A curto prazo, o desempenho esperado dessas economias, especialmente o das repúblicas da ex-União Soviética, não é animador. Mesmo os países mais ricos da região, como Polônia, Ucrânia e Rússia, não retomarão trajetória de crescimento sustentado antes de alguns anos. Com crônicos problemas de equilíbrio externo e austeridade doméstica, deverão adotar estratégias agressivas de exportação de manufaturados. Dada a similaridade existente entre a pauta de exportáveis das economias da Europa oriental e as exportações brasileiras de manufaturas e semiprocessados para a Europa ocidental, o impacto desta política de promoção agressiva de exportações sobre as vendas brasileiras para a CE deve ser bastante negativo.

Tal impacto negativo poderia se elevar caso a CE viesse a conceder, como é provável, acesso livre a seus mercados aos países do leste. De fato, a progressiva formação de uma área de livre comércio europeia, com seu núcleo no conjunto CE-AELC, mas absorvendo progressivamente as economias mais desenvolvidas da Europa oriental em uma ZLC europeia, é questão de tempo, que dependerá da velocidade com que se retome o crescimento com estabilidade nessas economias.20 20 Paszynski (1992).

E não se deve subestimar o potencial de crescimento futuro do comércio dessas regiões limítrofes com a CE, caso prossigam em sua atual estratégia de liberalização. O relacionamento comercial das antigas economias comunistas com a CE ainda é extremamente baixo quando comparado ao de países europeus de nível de desenvolvimento similar, mas integrados à Comunidade. A Polônia e a antiga União Soviética vendem cerca de um quarto de suas exportações na CE, enquanto a antiga Iugoslávia vende cerca de dois terços. Além disso, esse percentual não tenderá a cair com a modernização industrial das economias do leste, pela crescente importância do comércio intraindústrias entre países de desenvolvimento industrial similar, como mostra o relacionamento comercial entre a CE e a AELC. Esse grande potencial de criação de comércio entre a CE e a Europa oriental pode apresentar efeitos negativos sobre terceiros supridores de produtos competitivos, como o Brasil. A estimativa desses efeitos, entretanto, ainda requer esforço adicional de pesquisa.

Das conclusões parciais apresentadas acima, pode-se inferir que uma estratégia de ação diplomática para neutralizar as ameaças potenciais existentes deveria (i) manter postura extremamente ativa contra a formação da “Fortaleza Europa”, caracterizada pelo aumento da produção comunitária contra não membros, (ii) buscar aliança com os países da ACP, com os quais temos interesse comum tanto em pressionar a Comunidade no sentido de evitar que a harmonização fiscal tenha efeito deletério sobre a demanda por produtos tropicais, quanto em minimizar o desvio de comércio provocado pela concessão de acesso preferencial à Europa oriental, e (iii) manter um perfil baixo na questão das preferências de Lomé, para facilitar a consolidação dessa aliança.

A lógica dessa proposta se baseia na hipótese de que os ganhos comerciais derivados de evitar tanto o acesso livre de produtos do leste europeu na CE quanto os efeitos negativos do aumento de tributação interna sobre a demanda comunitária por produtos tropicais superem largamente as perdas causadas pela existência (ou mesmo por uma eventual ampliação) das preferências aos países da ACP. Embora carecendo ainda de comprovação empírica, a hipótese se afigura como razoável, tendo em vista: (i) a semelhança das pautas de produtos industriais exportáveis do Brasil e da Europa Oriental; (ii) a baixa elasticidade de oferta dos países da ACP em manufaturados; (iii) o fato de que as preferências de Lomé não se estendem ao conjunto de manufaturados e sofrem erosão com o progresso da liberalização multilateral da CE; e (iv) que o impacto de variações dos impostos internos sobre a demanda de produtos tropicais pode ser substancial.

Essa estratégia deveria ser complementada por aproximação com os países do leste com vistas a promover maior conscientização dos credores e organismos multilaterais sobre a importância de ajuda financeira como coadjuvante do processo de ajuste estrutural. Tal aproximação não somente serviria para amenizar possíveis atritos decorrentes do ativismo contra a concessão de tratamento preferencial à Europa oriental como, se bem-sucedida em seus objetivos, minimizaria a necessidade da adoção de políticas ultra agressivas de exportação por parte desses países e, eventualmente, melhoraria as condições de financiamento externo brasileiro.

5. SUMÁRIO E CONCLUSÕES

Ao longo deste trabalho, argumenta-se que o substancial crescimento da renda e a ampliação da competitividade dos produtos da Comunidade, decorrentes da maior integração, terão efeitos líquidos positivos sobre as exportações brasileiras. As estimativas apresentadas mostram que a Europa 92 deverá estimular substancialmente o crescimento das vendas brasileiras de produtos industriais para a CE. Os setores mais beneficiados em termos absolutos serão os de alimentos, bebidas e fumo; bens de investimento; têxtil, vestuário e calçados; produtos químicos, manufaturados de borracha e produtos plásticos; e manufaturados de papel e derivados. Dependendo de hipóteses sobre o ambiente macroeconômico na CE durante a implementação do mercado único, o incremento de exportações pode se situar entre US$ 23 milhões e US$ 3 bilhões, a ser atingido ao longo de alguns anos. Uma estimativa razoável do valor modal seria da ordem de US$ 1 bilhão, o que representa um acréscimo de cerca de 10% em relação aos valores correntes.

Nota-se também, por outro lado, que esse aumento potencial do fluxo agregado de exportações brasileiras para a CE em decorrência do processo de unificação pode não se verificar, caso venham a ocorrer aumentos concomitantes dos problemas de acesso de produtos de interesse exportador do país ao mercado comunitário. Tais aumentos podem resultar de acomodações complementares ou paralelas ao processo de criação do mercado unificado. No caso das acomodações complementares, o maior risco reside em que o Brasil seja prejudicado em decorrência das alterações requeridas para harmonizar as atuais diferenças marcantes existentes entre países membros da Comunidade quanto (i) ao uso de salvaguardas contra a penetração “excessiva” de importações de produtos específicos, (ii) à concessão de preferências especiais a países específicos e (iii) à incidência de impostos não fronteiriços sobre produtos de interesse exportador brasileiro. Quanto às que ocorrem em paralelo à formação do mercado único, a principal ameaça é a de que a expansão do espaço de integração europeu - em direção à AELC e, em especial, em direção à Europa oriental - resulte em discriminação contra produtos de interesse exportador brasileiro no continente europeu.

Em relação às salvaguardas, o perigo de a harmonização das diferenças nacionais na CE levar a um aumento das restrições existentes para a média da Comunidade nos setores mais “sensíveis” - isto é, naqueles onde é tradicionalmente maior a incidência de salvaguardas - aumenta consideravelmente num quadro em que a Europa 92 seja acompanhada de pressões competitivas sobre esses setores. Isso é particularmente perigoso para o Brasil, pois os setores mais afetados por barreiras não tarifárias na CE coincidem com o conjunto daqueles com maior valor exportado para a Comunidade. Além disso, o aumento de problemas de acesso impediria que o Brasil realizasse os ganhos potenciais de ampliação do comércio resultantes da Europa 92, já que os setores onde a magnitude do efeito de criação líquida de comércio é mais elevada são justamente aqueles com mais exportações para a CE.

A outra área de risco potencial para o regime de acesso das exportações brasileiras à CE é a das preferências comunitárias, que se caracterizam pela concessão, a distintos grupos de países de menor desenvolvimento relativo, nos quais não se inclui o Brasil, de condições de acesso substancialmente mais favoráveis que as genericamente concedidas ao conjunto dos países em desenvolvimento sob o SGP - Sistema Generalizado de Preferências. Os regimes especiais existentes - em especial o regido pelas Convenções de Lomé - já representam, naturalmente, discriminação contra produtos brasileiros. O perigo adicional é o de que a unificação europeia, ao ser acompanhada pela harmonização de diferentes concessões oferecidas por membros da CE no âmbito desses arranjos preferenciais, possa gerar conflitos de interesses que venham a ser resolvidos com pouca atenção aos interesses dos países não associados. Como, sob esses regimes, as concessões tendem a se concentrar fora dos setores sensíveis, onde os beneficiários têm em geral limitado poder de oferta mesmo a médio prazo, os efeitos da discriminação são geralmente pequenos. Mas a ampliação da discriminação pode configurar importante fator de irritação nas relações entre a CE e o Brasil e demais países em desenvolvimento que venham a sofrê-la.

A terceira área em que a harmonização de políticas nacionais pode gerar impactos negativos sobre as exportações brasileiras é a dos impostos internos, particularmente a dos tributos incidentes sobre produtos tropicais. Dada a grande divergência entre os níveis nacionais de tributação existentes na CE, a harmonização pode vir a se fazer de modo a elevar a média atual, com efeitos negativos sobre a demanda interna por esses produtos. Isso pode ser relevante nos casos do café e do cacau, onde existem níveis relativamente altos de tributação ao consumo em certos países.

Finalmente, argumenta-se que o futuro do comércio brasileiro com a Europa será profundamente afetado pelas condições em que se realize a provável expansão da integração comercial além do espaço da Europa dos doze. O primeiro passo nessa direção, a consolidação formal de uma área de livre comércio entre a CE e a AELC, não deve ter efeito líquido negativo sobre o comércio brasileiro. No quadro europeu, o maior risco de impactos negativos sobre as exportações brasileiras para a CE nos próximos anos decorre de desenvolvimentos nos países do leste da Europa, que deverão adotar estratégias agressivas de exportação de manufaturados como parte central de programas de ajuste de seus crônicos problemas de equilíbrio externo. Dada a similaridade existente entre a pauta de exportáveis das economias da Europa oriental e as exportações brasileiras de manufaturas e semiprocessados para a Europa ocidental, o impacto de políticas de promoção agressiva de exportações sobre as vendas brasileiras para a CE deve ser bastante negativo.

Esse impacto negativo poderia se ampliar caso a CE viesse a conceder, como é provável, acesso livre a seus mercados aos países do leste. De fato, a progressiva formação de uma área de livre comércio europeia, com seu núcleo no conjunto CE-AELC, mas absorvendo progressivamente as economias mais desenvolvidas da Europa oriental em uma ZLC europeia, é questão de tempo, que dependerá da velocidade com que se retome o crescimento com estabilidade nessas economias. E o potencial de crescimento futuro do comércio dessas regiões limítrofes com a CE é substancial, caso prossigam em sua atual estratégia de liberalização, com efeitos certamente negativos sobre terceiros supridores de produtos competitivos, corno o Brasil. A estimativa desses efeitos, entretanto, ainda requer esforço adicional de pesquisa.

Das conclusões parciais apresentadas acima, pode-se inferir que uma estratégia de ação diplomática para neutralizar as ameaças potenciais existentes deveria:

  1. manter postura extremamente ativa contra a formação da “Fortaleza Europa”;

  2. buscar aliança com os países da ACP, com os quais temos interesse comum tanto em pressionar a Comunidade no sentido de evitar que a harmonização fiscal tenha efeito deletério sobre a demanda por produtos tropicais quanto em minimizar o desvio de comércio provocado pela concessão de acesso preferencial à Europa oriental; e

  3. manter um perfil baixo na questão das preferências de Lomé, para facilitar a consolidação dessa aliança.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • TEIXEIRA, J. R. (1992b). “A Europa 92 e os impactos sobre importações da CE de produtos manufaturados brasileiros ”. Anais do XX Encontro Nacional de Economia, ANPEC.
  • 1
    V. Emerson (1990EMERSON, M., ed. (1990). The Economics of 1992. Oxford University Press.).
  • 2
    Todos estes resultados foram estimados pela Comissão da CE para setores agregados na classificação NACE-CLJO (R44). Utilizando a correspondência NACE-CLIO (R44)- ISIC Rev. 2 (2-dígitos) elaborada em Teixeira (1992aTEIXEIRA, J. R. (1992a). “A Europa 92 e os impactos sobre importações da CE de produtos manufaturados brasileiros.” Dissertação de mestrado, Departamento de Economia, PUC/RJ.), é possível observar o impacto da Europa 92 em setores agregados na classificação ISIC. V. Tabela 3, no Anexo.
  • 3
    Baldwin (1989BALDWIN,R. (1989). “On the growth effect of l992”. NBER Working Paper, no.3119.) considera médio prazo o período entre oito e doze anos.
  • 4
    V. Catinat, Donni & Italianer (1988CATINAT, M., E. Donni & A. Italianer (1988). “Macroeconomic consequences of the completion of the internal market: the modeling evidence”. Research on the “Costs of Non-Europe” - Basic Findings, vol. 2, Bruxelas: Comissão da CE.) e Emerson (1990EMERSON, M., ed. (1990). The Economics of 1992. Oxford University Press.).
  • 5
    Nesses estudos se considera médio prazo a partir do sexto ano.
  • 6
    Em 1990 as importações da CE (excluídas as intracomunitárias) corresponderam a aproximadamente 17,4% das importações mundiais. V. European Economy no. 46 (1990ANNUAL ECONOMIC REPORT 1990-91. “The European Community in the 1990’s towards economic and monetary union”, European Economy, no. 46, 1990.).
  • 7
    O conceito de criação de comércio é aqui utilizado como o aumento no volume de importações da CE de produtos do resto do mundo.
  • 8
    O conceito de desvio de comércio deve ser entendido no contexto deste trabalho como a redução no volume de importações da CE de produtos do resto do mundo.
  • 9
    ISIC (“International Standard Industrial Classification”) é a classificação de produção das atividades econômicas das Nações Unidas. Em todo o artigo foi utilizada a ISIC Revisão 2. O conjunto de produtos primários é formado pelos setores agrícola, caça, pesca e silvicultura [ISIC (1)] e extrativa mineral [ISIC (2)]. Os produtos semimanufaturados são representados pelo setor de alimentos, bebidas e derivados do fumo [ISIC (31)]. O conjunto de produtos manufaturados é formado pelos setores [ISIC (32) a (39)]. A definição precisa de cada um dos setores é apresentada na Tabela AI do anexo.
  • 10
    Em 1990 o conjunto dos setores ISIC (31) a (39) correspondeu a cerca de 73% da pauta de importações da CE de produtos brasileiros.
  • 11
    A fonte desses dados é a Tabela AI do anexo.
  • 12
    A avaliação quantitativa feita aqui está restrita ao universo de produtos industriais. Mudanças no fluxo de comércio de produtos agrícolas dependem mais da reforma na Política Agrícola Comum e dos resultados da Rodada Uruguai do GATT.
  • 13
    O efeito líquido é definido como a diferença entre a criação de comércio e o desvio de comércio. Assim, quando o efeito líquido for de criação de comércio, significa que o aumento no volume de importações da CE de produtos industriais brasileiros é superior à sua queda. A forma de cálculo das estimativas de criação de comércio e desvio de comércio para cada setor ISIC (31) a (39) no Caso estão detalhadas no anexo.
  • 14
    As hipóteses utilizadas para o crescimento adicional da renda da CE foram as seguintes: pessimista (4,5%), básico (9,0%) e otimista (18,0%). Vale lembrar que estas hipóteses correspondem a desvios cm relação à tendência de crescimento da CE sem a unificação do mercado, ou seja, indicam a ordem de grandeza do impacto da Europa 92 sobre o produto da Comunidade. Todas as estimativas obtidas estão a preços de 1990.
  • 15
    Médio prazo deve ser considerado o período após o sexto ano de implementação do mercado único.
  • 16
    Os resultados para o 1º. Caso podem ser vistos na Tabela A6, enquanto aqueles referentes ao 2º. Caso estão na Tabela A7 do anexo.
  • 17
    São eles alimentos, bebidas e fumo [ISIC (31)], bens de investimento [JSJC (38)] e a indústria têxtil, vestuário e calçados [ISIC (32)].
  • 18
    Dados elaborados por Pereira (1990PEREIRA, L.V. (1990). O Protecionismo dos Países Desenvolvidos e o Acesso de Produtos Brasileiros aos Mercados Externos. IPEA, Série EPICO 18.) e adaptados por Teixeira (1992TEIXEIRA, J. R. (1992b). “A Europa 92 e os impactos sobre importações da CE de produtos manufaturados brasileiros ”. Anais do XX Encontro Nacional de Economia, ANPEC.) para setores ISIC Rev.2.
  • 19
    Para uma revisão abrangente desses regimes, v. Murray (1977MURRAY, T. (1977). Trade Preferences for Developing Countries. Nova York: Wiley.).
  • 20
    Paszynski (1992PASZYNSKI, M. (1992). “The single market and cornmercial relations for non-member countries: views from Eastern Europe and the Soviet Union”, Journal of Development Planning (21).).
  • 21
    O ano-base utilizado em todas as simulações é 1990; logo, os resultados de criação e desvio de comércio estão em preços de 1990.
  • 22
    V. Tabela A1.
  • 23
    A falta de dados impediu a aplicação do método econométrico para estimar equações de importações da CE de produtos industriais brasileiros desagregados nas classificações NACE-CLIO (R44) ou ISIC Rev. 2.
  • 24
    O resultado desta correspondência pode ser visto na tabela A3.
  • 25
    Ou seja, compara os resultados de criação de comércio obtidos na equação (1) com os de desvio de comércio obtidos na equação (2). O limite mínimo de criação de comércio é calculado através da menor estimativa de elasticidade renda, e o limite máximo utiliza a maior estimativa. O limite mínimo de desvio de comércio utiliza a menor estimativa para a redução nas importações extra-CE, e o limite máximo utiliza a maior estimativa.
  • 26
    Ou seja, compara os resultados de criação de comércio obtidos na equação (1) com os de desvio de comércio obtidos na equação (3). Os limites mínimo e máximo de criação de comércio são calculados da mesma forma que no 1º. Caso. O limite mínimo de desvio de comércio utiliza a menor estimativa de redução de preços intra-CE e a menor estimativa de elasticidade preço (módulo). No limite máximo o processo é o inverso.
  • 27
    JEL Classification: F15; F14.

ANEXO TÉCNICO

1. Descrição da metodologia adotada

A metodologia utilizada neste trabalho permite quantificar os efeitos de criação e desvio de comércio da Europa 92 sobre as importações da CE de nove setores- ISIC (31) a (39) - de produtos industriais provenientes do Brasil.

A Criação de Comércio para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é determinada de acordo com a seguinte equação21 21 O ano-base utilizado em todas as simulações é 1990; logo, os resultados de criação e desvio de comércio estão em preços de 1990.

(1) C C i = I D C E i · V R C E · E R i

i=setores ISIC 31 a 39, onde:

  • (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 199022 22 V. Tabela A1. ,

  • (VRCE)=Variação da renda real na CE após 1993. Existem diversas estimativas para o crescimento adicional da renda da CE em decorrência da unificação do mercado, merecendo destaque especial as estimativas elaboradas pela Comissão da CE (metodologias microeconômica e macroeconômica) e por Baldwin (1989BALDWIN,R. (1989). “On the growth effect of l992”. NBER Working Paper, no.3119.) e

  • (ERi)=Elasticidade renda da demanda por importações da CE de produtos industriais do Brasil no setor (i).

Diversas dificuldades foram enfrentadas para estimar a verdadeira elasticidade renda para cada setor (i).23 23 A falta de dados impediu a aplicação do método econométrico para estimar equações de importações da CE de produtos industriais brasileiros desagregados nas classificações NACE-CLIO (R44) ou ISIC Rev. 2. A alternativa encontrada foi a construção de intervalos para valores prováveis a partir das principais estimativas da elasticidade renda das importações de países membros da CE disponível na literatura econômica. É importante destacar que se procedeu à escolha das elasticidades renda procurando evitar que os resultados de criação de comércio pudessem ser considerados exageradamente otimistas.

Os limites mínimo e máximo fixados para a elasticidade renda em cada setor ISIC (31) a (39) respeitam a ordem de grandeza das estimativas obtidas na literatura. Além disso, vale ressaltar que se deu maior ênfase às estimativas referentes aos países membros com maior participação nas importações em relação ao total importado pela CE. Esse processo resulta no intervalo de variação da elasticidade renda utilizado nas simulações entre 0,5 a 3,0. Os intervalos de “E Ri” em cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A2. É importante notar que a aplicação do método descrito acima possibilita a construção de um intervalo mínimo e máximo de criação de comércio para cada setor ISIC (31) a (39).

No que diz respeito à quantificação dos efeitos de Desvio de Comércio da Europa 92 sobre importações da CE de produtos industriais provenientes do Brasil, a metodologia oferece duas alternativas distintas. A primeira usa estimativas da Comissão da CE para a redução de importações da CE de produtos do resto do mundo em virtude da integração do mercado. Já a segunda é elaborada através da elasticidade preço das importações da CE e da estimativa da Comissão da CE para a variação no preço intra-CE devido ao mercado único.

A primeira alternativa admite que o Desvio de Comércio para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é calculado da seguinte forma:

(2) D C i = I D C E i · V I C E R M i

para i=setores ISIC 31 a 39, onde:

  • (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 1990,

  • (VICERMi)=Variação percentual nas importações da Comunidade de bens do setor (i) produzidos extra-CE.

A Comissão da CE estimou a redução percentual nas importações da Comunidade de bens produzidos extra-CE para classes NACE-CLIO (R44) 13 a 51. Utilizando a correspondência entre as nomenclaturas NACE-CLIO (R44) e ISIC (2-dígitos) elaborada por Teixeira (1992aTEIXEIRA, J. R. (1992a). “A Europa 92 e os impactos sobre importações da CE de produtos manufaturados brasileiros.” Dissertação de mestrado, Departamento de Economia, PUC/RJ.)24 24 O resultado desta correspondência pode ser visto na tabela A3. é possível obter intervalos para VICERMi em cada setor ISIC (31) a (39).

O processo de escolha do limite mínimo e máximo de cada intervalo consistiu basicamente em utilizar as maiores estimativas de redução das importações da CE de bens produzidos extra-CE - elaboradas pela Comissão da CE para setores NACE-CLIO (R44) - nos respectivos setores ISIC (31) a (39). Os intervalos selecionados para cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A4. Adicionalmente, cabe destacar que a aplicação dessa primeira alternativa permite a construção de um intervalo mínimo e máximo de desvio de comércio para cada setor ISIC (31) a (39).

A segunda alternativa de cálculo do Desvio de Comércio admite que esse efeito para o setor (i), a preços do ano-base de 1990, é determinado de acordo com a seguinte equação:

(3) D C = I D C E i · V P R i · E P i

i=setores ISIC 31 a 39 onde:

  • (IDCEi)=Valor das importações da CE de produtos industriais brasileiros no setor (i) para o ano de 1990,

  • (VPRi)=Variação no preço relativo intra-CE no setor i devido à Europa 92 e

  • (EPi)=Elasticidade preço da demanda por importações ela CE ele produtos industriais do Brasil no setor (i).

O processo de escolha dos limites mínimo e máximo cio intervalo ele variação da redução nos preços relativos intra-CE para cada setor ISIC (31) a (39) foi semelhante ao utilizado para obter o intervalo de variação ela redução de importações da CE descrito acima. Isto é, em primeiro lugar foi necessário observar a redução de preços intra-CE estimada pela Comissão da CE para as seções NACE-CLIO (R44) 13 a 51. Em seguida, utilizando a correspondência NACE-CLIO (R44)-ISIC, escolheu-se para cada setor ISIC (31) a (39) o maior valor dentre aqueles estimados para a correspondente seção NACE-CLIO (R44). Os intervalos selecionados para cada setor ISIC (31) a (39) podem ser observados na Tabela A5.

As mesmas dificuldades encontradas para estimar as elasticidades renda (ERi) impediram o cálculo das elasticidades preço (EPi) de produtos industriais brasileiros importados pela CE agregados na classificação NACE-CLIO (R44) ou ISIC 2-dígitos. A alternativa que restou para avaliar a ordem de grandeza dessas elasticidades foi a construção de intervalos a partir das principais estimativas da elasticidade preço das importações de países membros da CE disponíveis na literatura econômica.

A escolha do limite mínimo e máximo para cada setor ISIC (31) a (39) respeita a ordem de grandeza das estimativas obtidas na literatura. Tal processo resulta no intervalo de variação das elasticidades preço utilizadas nas simulações entre -0, 1 e -3,3. Estes, para cada setor ISIC (31) a (39), podem ser observados na Tabela A2. Do mesmo modo que na primeira alternativa, a aplicação do método proposto na segunda permite a construção de um intervalo mínimo e máximo para o desvio de comércio em cada setor ISIC (31) a (39).

EFEITO LÍQUIDO DE CRIAÇÃO OU DESVIO DE COMÉRCIO DA EUROPA 92 SOBRE IMPORTAÇÕES DA CE DE PRODUTOS INDUSTRIAIS BRASILEIROS

A metodologia proposta indica uma forma de quantificar o efeito de Criação de Comércio e oferece duas alternativas para o cálculo do efeito de Desvio de Comércio. Dois casos distintos podem ser elaborados para estimar o efeito líquido da Europa 92 sobre as importações da CE de produtos industriais brasileiros nos setores ISIC (31) a (39).

O primeiro compara os limites mínimo e máximo dos intervalos de criação de comércio com os limites mínimo e máximo de desvio de comércio obtidos através da primeira alternativa de cálculo.25 25 Ou seja, compara os resultados de criação de comércio obtidos na equação (1) com os de desvio de comércio obtidos na equação (2). O limite mínimo de criação de comércio é calculado através da menor estimativa de elasticidade renda, e o limite máximo utiliza a maior estimativa. O limite mínimo de desvio de comércio utiliza a menor estimativa para a redução nas importações extra-CE, e o limite máximo utiliza a maior estimativa. No segundo caso se confrontam os mesmos limites mínimo e máximo de criação de comércio com os limites mínimo e máximo de desvio de comércio calculados a partir da segunda alternativa proposta.26 26 Ou seja, compara os resultados de criação de comércio obtidos na equação (1) com os de desvio de comércio obtidos na equação (3). Os limites mínimo e máximo de criação de comércio são calculados da mesma forma que no 1º. Caso. O limite mínimo de desvio de comércio utiliza a menor estimativa de redução de preços intra-CE e a menor estimativa de elasticidade preço (módulo). No limite máximo o processo é o inverso.

Em cada caso se elaboraram três simulações que diferem de acordo com a hipótese sobre o impacto da Europa 92 sobre a evolução do crescimento da renda da CE no médio prazo. A simulação I supõe crescimento adicional da renda de 4,5%, enquanto tal valor na simulação 2 é de 9,0%. Já a simulação 3 adota a hipótese otimista de crescimento extra de 18,0%. Os resultados obtidos no estudo do 1º Caso estão descritos na Tabela A6, enquanto aqueles derivados do 2º Caso estão na Tabela A7.

Finalmente, cabe notar que essas estimativas do efeito líquido obtido devem ser tratadas como apenas indicativas do valor absoluto dos efeitos da Europa 92 sobre o Brasil, uma vez que não são conhecidas as verdadeiras elasticidade renda, elasticidade preço e redução das importações da CE relativas especificamente aos produtos industriais brasileiros. Desse modo, os intervalos apresentados devem ser entendidos como a ordem de magnitude desse efeito. Adicionalmente, também permitem observar a tendência, em cada setor ISIC (31) a (39), de criação ou desvio líquido de comércio da Europa 92 sobre as importações da Comunidade de produtos industriais provenientes do Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 1993
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