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ABAIXO DA SUPERFÍCIE: Adorno e o cinema reconsiderado

Below the Surface: Adorno and Cinema Reconsidered

RESUMO

O artigo discute a análise que Adorno faz do cinema em momentos diversos de sua obra. Apresenta um texto pouco discutido que ele escreveu com o compositor Hanns Eisler, quando ambos viviam em Los Angeles, e que tem como tema central a presença da música no cinema. Ademais, demonstra como alguns ensaios de Adorno dos anos 1960 procuram reconsiderar o cinema e discutir as suas potencialidades em diálogo com o Novo Cinema alemão.

PALAVRAS-CHAVE:
Theodor W. Adorno; Hanns Eisler; Novo Cinema alemão; Teoria Crítica; Cinema

ABSTRACT

The article discusses Adorno’s analysis of cinema at different moments of his oeuvre and presents a scarcely discussed text, written with the musician Hanns Eisler while both lived in Los Angeles, which has as its central theme the presence of music in the cinema. In addition, it tries to demonstrate how some essays written in the 1960s try to reconsider the cinema and to discuss its potentialities in dialogue with the so-called New German Cinema.

KEYWORDS:
Theodor W. Adorno; Hanns Eisler; New German Cinema; Critical Theory; Cinema

Um esforço da fantasia poderia sugerir a seguinte cena: Theodor W. Adorno numa festa de Hollywood, divertindo-se ao lado de Greta Garbo e Charles Chaplin; nada parece mais fora de lugar. A potência crítica da obra de Adorno, somada à feição intelectual construída por sua fortuna crítica, criou uma imagem cristalizada de sua personalidade que impede a imaginação de cenas como essa, que, aliás, ocorreu de fato.

Seguindo a trilha de um artigo de Mateus Araújo Silva publicado em 1999Silva, Mateus Araújo. “Adorno e o cinema: um início de conversa”. Novos Estudos Cebrap, n. 54, São Paulo, 1999, pp. 114-26. nesta mesma Novos Estudos, as reflexões a seguir buscam decompor a interpretação rígida da figura de Adorno e de suas considerações sobre o cinema. A crítica incisiva de Adorno à indústria cultural em geral e ao cinema em particular foi lida reiteradamente como uma manifestação de elitismo.1 1 A teoria da indústria cultural é uma espécie de programa de pesquisa que atravessa a obra de Adorno e não há espaço para esmiuçá-la aqui. Além da correspondência com Benjamin e do ensaio presente na Dialética do esclarecimento (1944), o conceito de indústria cultural aparece desenvolvido em muitas outras formulações. Poder-se-ia citar “O esquema da cultura de massas” (1942), “Prólogo sobre a televisão” (1953), “Cultura e administração” (1960), “Breves considerações sobre a indústria da cultura” (1963), “Pode o público querer?” (1963), entre outros. Para fins da discussão proposta neste artigo, trata-se de ressaltar dois elementos fundamentais da noção de indústria cultural. Em primeiro lugar, de que ela é um sistema e que seu funcionamento só pode ser compreendido plenamente nessa condição. “Indústria cultural”, portanto, não é um “adjetivo” dos bens culturais. Em segundo lugar, a teoria da indústria cultural não é apenas uma teoria da cultura no capitalismo tardio, mas uma teoria da dominação que se dá a partir da cultura. Portanto, a discussão proposta aqui enfatiza as potencialidades do cinema fora desse sistema. Essa interpretação reforçou a sua imagem de filósofo da “torre de marfim” (cf. Abromeit, 2010Abromeit, John. “The Limits of Praxis: The Social-Psychological Foundations of Theodor Adorno’s and Herbert Marcuse’s Interpretations of the 1960s Protest Movements". In: Davis, Belinda; Mausbach, Wilfried; Klimke, Martin; MacDougall, Carla (orgs.). Changing the World, Changing Oneself: Political Protest and Collective Identities in West Germany and the U.S. in the 1960s and 1970s. Nova York: Berghahn Books, 2010, pp. 13-38.). Algumas considerações sobre sua trajetória podem auxiliar a desconstruir essa imagem. A escassez de análises imanentes dos filmes, ao contrário do que ocorre em sua apreciação sobre a música e a literatura, também sugere a resistência de Adorno em aceitar o cinema como arte. Da mesma forma, a ausência de traduções para o português de muitos de seus textos colaborou para que a recepção de sua obra fosse orientada por esse tipo de perspectiva. Finalmente, é importante salientar um traço pouco comentado: a produção intelectual de Adorno concernente ao tema do cinema e da indústria cultural se dá em dois momentos diferentes. O primeiro ocorre sobretudo na década de 1930 e gira em torno do tema benjaminiano da “reprodutibilidade técnica” e da tensão entre arte autônoma e arte política (cf. Duarte, 2003Duarte, Rodrigo. Teoria crítica da indústria cultural. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.; Gatti, 2009Gatti, Luciano. Constelações: crítica e verdade em Benjamin e Adorno. São Paulo: Loyola, 2009.). O segundo momento, que não contraria o primeiro, é marcado, no entanto, por uma inflexão que diz respeito à experiência de Adorno nos Estados Unidos, resumida no seguinte testemunho:

Na América eu fui liberado de uma certa crença ingênua na cultura e alcancei a capacidade de olhar a cultura de fora. Para esclarecer esse ponto: apesar de toda crítica social e de toda a consciência do primado dos fatores econômicos, a importância fundamental do espírito - Geist - era quase um dogma autoevidente para mim desde o começo. O fato de que isso não era uma conclusão pré-determinada eu aprendi na América, onde nenhum silêncio reverencial prevalecia na presença de tudo que era intelectual […]. Isso afetou especialmente os pressupostos europeus de cultivo da música nos quais eu estava imerso. Não que eu tenha renunciado a essas assunções ou abandonado minhas concepções de tal cultura; mas parece-me uma distinção fundamental ater-se a elas irrefletidamente ou tornar-se ciente delas precisamente em oposição aos padrões do país tecnológica e industrialmente mais desenvolvido. (Adorno, 1969______. Ohne Leitbild. Frankfurt: Suhrkamp, 1969b, pp. 89-93.a, p. 367).

Nesse mesmo texto, Adorno ressalta que, até ir aos Estados Unidos, não havia percebido quão longe a “racionalização e a padronização haviam permeado a chamada mídia de massa” (idem, p. 341), e que qualquer teoria que não leve essa experiência em conta para refletir sobre o estado atual da cultura será uma teoria de caráter reacionário. Isso não significa que Adorno tenha abandonado seu diagnóstico da indústria cultural, mas que suas reconsiderações sobre as potencialidades do cinema estavam ligadas a uma reavaliação do debate dos anos 1930.

Para compreender a inserção de Adorno na cultura americana e, assim, revisitar a sua teoria sobre o cinema nesse contexto, esse artigo visa recontar a história da escrita do livro Composing for the Films - feito em parceria com Hanns Eisler - e apresentar os argumentos centrais do livro. Além disso, recorre também a “Filmtransparente” (1966), um ensaio pouco comentado do autor e inspirado no Novo Cinema alemão, do qual o cineasta Alexander Kluge, aluno de Adorno, fez parte.

ADORNO EM HOLLYWOOD

Após uma estadia de três anos em Nova York, onde participara do famoso Princeton Radio Research Project, coordenado por Paul Lazarsfeld, Adorno partiu para Los Angeles (Jay, 1996Jay, Martin. The Dialectical Imagination: A History of the Frankfurt School and the Institute of Social Research. 1923-1950. Los Angeles: University of California Press, 1996.). A partir de 1941, ele pôde conhecer a indústria cinematográfica de perto, pois além de visitar estúdios e frequentar festas, conviveu com muitos intelectuais que foram trabalhar para Hollywood. Nesse período, propôs ao fundador da Warner Brothers o roteiro de um filme baseado nos estudos da “escala F” (Adorno et al., 1950, p. 663), escrito com Max Horkheimer, que não vingou. O filme levaria o nome de Below the Surface e, provavelmente, trataria de questões referentes a ideologia (cf. Jenemann, 2007Jenemann, David. Adorno in America. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2007.).

Composing for the Films não é um livro muito conhecido e raramente é associado à obra de Adorno. Uma parcela da culpa dessa negligência pode ser tributada à história complicada de sua publicação. O volume saiu em 1947 sob a autoria somente de Eisler, que reconhecia a colaboração de Adorno no prefácio. O motivo da isenção era político. Adorno havia retirado seu nome para não chamar a atenção do Comitê de Atividades Antiamericanas. Para se ter uma ideia da gravidade da perseguição anticomunista, em 1942, um cerco foi imposto aos intelectuais alemães emigrados; eles não podiam chegar em casa depois das oito da noite nem de lá se afastar mais de cinco milhas. J. Edgar Hoover havia colocado diversos intelectuais emigrados, que recebiam a alcunha de “communazis” (cf. Stephan, 2000Stephan, Alexander. Communazis: FBI Surveillance of German Emigre Writers. New Haven/Londres: Yale University Press, 2000.) sob vigilância. Em 1948, Eisler foi obrigado a deixar os Estados Unidos sob a acusação de que “era o Karl Marx do comunismo no campo musical” (McCann, 2007McCann, Graham. “New introduction”. In: Adorno, Theodor W; Eisler, Hanns. Composing for the Films. Nova York/Londres: Continuum International Publishing Group , 2007., p. XXXI). Ele mudou-se então para a Alemanha Oriental, e Adorno só reconheceu sua participação no livro em 1969, num prefácio à ocasião do lançamento de sua segunda edição alemã, na Berlim Ocidental.

Eisler havia feito parte da Segunda Escola de Viena, ao lado de Berg e Webern. Após uma série de conflitos de natureza política com Shönberg, ele adotou uma postura ligada à arte engajada e associou-se a Brecht. Similarmente a muitos intelectuais exilados nos Estados Unidos, viu-se obrigado a trabalhar para os estúdios de Hollywood e foi indicado ao Oscar pela composição do filme Hangmen Also Die, de Fritz Lang, que contou igualmente com a participação de Brecht no roteiro. Essas experiências foram, no entanto, muito frustrantes e impulsionaram a escrita do livro que problematiza e comenta o modo como cada estúdio de Hollywood tinha seu departamento de música, nos quais os músicos contratados, sem autonomia alguma, deveriam criar (ou, em outras palavras, encaixar) esquemas musicais pré-concebidos nas cenas já prontas.

COMPONDO PARA OS FILMES

Durante sua estada nos Estados Unidos, Eisler recebeu uma bolsa da Oxford University Press para escrever um estudo sobre a música no cinema. Redigido em parceria com Adorno, o livro era uma contribuição inédita para o debate sobre o papel da música nos filmes do período. O que chama a atenção na obra é o caráter inusitado da parceria. Embora Eisler fosse um compositor importante ligado ao grupo de Shönberg e tivesse, nesse aspecto, muitas afinidades com Adorno, sua atuação já estava intimamente ligada à chamada arte engajada e à figura de Brecht. Conquanto Adorno tenha sido desde a década de 1930 um crítico da arte política em geral, o livro tenta estabelecer uma ponte entre a teoria crítica de Adorno e o engajamento de Eisler. Ou seja, o que eu gostaria de sugerir é que, diante da generalização da indústria cultural, uma colaboração com um representante da arte engajada parece uma solução de compromisso para pensar as potencialidades do cinema sem abandonar a defesa da arte autônoma. Nesse sentido, mesmo o que se pretendia arte engajada precisava ter certa autonomia diante das forças do mercado representadas pela indústria cultural.

O cerne da crítica desenvolvida pelos autores reside nos problemas oriundos da criação de departamentos especializados em música na indústria do cinema. Cada grande estúdio de Hollywood tem o seu, que fica responsável por esse elemento dos filmes. Já desse ponto de vista, os autores podem afirmar que “devido ao caráter comercial da indústria do cinema, é impossível separar seus aspectos organizacionais de seus aspectos técnicos” (Adorno; Eisler, 2007Adorno, Theodor W.; Eisler, Hanns. Composing for the Films. Nova York/Londres: Continuum International Publishing Group, 2007., p. 61).

Além disso, a hierarquia entre o diretor, os produtores e os demais participantes impede que o músico tenha a oportunidade de influenciar minimamente a produção do filme. Nela, ele é tratado como um especialista, que pode ser contratado a longo ou a curto prazo e ser facilmente dispensado. O compositor está sempre sujeito a cortes pelo diretor, “quando algum som contradiz o ideal convencional de beleza, ou simplesmente quando uma passagem envolve problemas difíceis para os instrumentistas, de modo que o ensaio lhes tomaria muito tempo” (idem, p. 75).

No cinema, somado aos elementos pragmáticos e organizacionais supracitados, a autonomia é bloqueada também por uma razão formal: a música está completamente a serviço da imagem. A concepção do cinema como ação e diálogo dispensa à música um papel secundário. Assim, afirmam os autores, uma das principais premissas do cinema é a de que o espectador não deve ter consciência da música. A noção de “música de fundo”, que Adorno havia utilizado para caracterizar o jazz, parece estar presente na própria definição do papel da música no cinema. Ela não pode distrair o espectador daquilo que no filme é o principal, embora ela seja então apreendida de maneira distraída. Nesse sentido, ela cumpre a função de preenchimento quando, por exemplo, o herói espera sua namorada. A cena sem suspense corre o risco de lançar o espectador no terreno baldio do tédio e a música entra apenas para ocupar esse silêncio; “a música torna-se um acessório da trama, uma espécie de característica acústica do cenário” (idem, p. 7). Ademais, a música pode exercer também uma função ilustrativa, seguindo o que é sugerido pela imagem: “passarinhos cantam, a música canta” (idem, ibidem). Normalmente, a música serve de acompanhamento para tomadas de paisagem, criando e reiterando uma visão completamente estereotipada da natureza: “O rancho para o qual o herói viril escapou com a heroína sofisticada é acompanhado por murmúrios da floresta e uma melodia de flauta. Uma valsa lenta acompanha uma cena de luar na qual um barco desliza para baixo de um rio margeado por salgueiros” (idem, ibidem).

A música pode ser utilizada também para dar um sentido histórico-geográfico a uma sequência. No caso de uma cena que se passa numa cidade holandesa, o compositor deve procurar uma canção folclórica para utilizar seu tema como base de composição: “A música é usada da mesma maneira que um figurino […]” (idem, p. 8), e seu uso é marcado pelos clichês, pela ilustração e pela estereotipia. Assim, associam-se, por exemplo, as imagens com os títulos musicais e “a cena de uma noite de luar é acompanhada pelo primeiro movimento da Sonata ao luar” (idem, p. 9).

Apesar de citar muitos exemplos desse uso engessado da música no cinema, Adorno e Eisler não se detêm apenas neles e apresentam uma reflexão sobre a transformação da música sob a égide do consumo cultural. A ideia é: a música, como arte não referencial por excelência, é a mais distanciada das artes no que tange às coisas práticas. Sendo assim, a audição teria se adaptado muito menos que o olhar à ordem burguesa racionalizada que concebe o mundo de modo fragmentado e funcional. A audição seria um sentido mais “arcaico”, se comparado à visão, esta sim mais adaptada ao progresso tecnológico:

O olho é sempre um órgão do esforço, do trabalho e da concentração; ele compreende um objeto definido. O ouvido do leigo, por outro lado, comparado ao especialista em música, é indefinido e passivo. Não se deve abri-lo, como se faz com o olho, comparado com o qual é indolente e desinteressado. Mas essa indolência é objeto do tabu que a sociedade impõe a todas as formas de preguiça. A música como arte tem sido uma tentativa de contornar esse tabu, de transformar essa indolência, devaneio e desinteresse do ouvido em uma questão de concentração, esforço e trabalho sério. Hoje em dia, a indolência não é superada, mas gerida e acentuada cientificamente. Tal irracionalidade racionalmente planejada é ela mesma a essência da indústria da diversão em todos os seus ramos. (idem, pp. 14-5)

Isso que os autores chamam de indolência relaciona-se com a ideia de Benjamin (2012Benjamin, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. Porto Alegre: Zouk, 2012.) de que a apreensão das imagens no cinema se dá de maneira distraída. Os autores, contudo, percebem a extensão dessa lógica também para a música. E embora a sua natureza possa ser mais avessa à percepção distraída, seu uso cinematográfico compromete sua apreensão a partir de sua estrutura e material. A música no cinema é, na maioria das vezes, ilustrativa, e a função que ela exerce está submetida à dramaturgia. Basta pensarmos, por exemplo, como uma imagem muda de sentido de acordo com a música que a acompanha. Desse modo, pode-se transformar um conjunto de indivíduos inofensivos numa horda de bárbaros, criar suspense numa cena que não necessariamente o possui, dar a impressão de movimento etc.

Em decorrência da complicada relação entre música e imagem, seria difícil estabelecer princípios estéticos para o cinema. Sendo assim, os autores não defendem uma incompatibilidade intrínseca entre essas formas, mas buscam compreender onde residem as maiores dificuldades dessa junção, que poderiam ser minimizadas, se houvesse no cinema um planejamento objetivo e uma montagem que não se restringisse à estereotipia e ao clichê. Em primeiro lugar, seria preciso abandonar a ilusão de unir organicamente a imagem e a música, posto que

o cinema seria confinado aos conteúdos expressivos os quais, conforme mostrou Walter Benjamin, são basicamente incompatíveis com a reprodutibilidade técnica. Os efeitos nos quais imagem e música podem ser diretamente unidos são inevitavelmente do tipo que Benjamin chamou de aurático - na verdade, eles são formas degeneradas da aura, na qual o feitiço do aqui e agora é manipulado tecnicamente. (Adorno; Eisler, 2007Adorno, Theodor W.; Eisler, Hanns. Composing for the Films. Nova York/Londres: Continuum International Publishing Group, 2007., p. 48).

Nesse ponto, a montagem poderia servir como um rompimento da ilusão de unidade e do contexto dramático produzido por essa junção. Conforme ressalta M. Hansen, a proposta dos autores envolve a construção de relações de contraponto entre música e imagem, que produzam efeito de “dissonância e ruptura, ironia e desfamiliarização - efeitos que sabotam o caráter afirmativo do fluxo de imagens tornado narrativa” (Hansen, 2011, p. 216).

O mesmo problema da unidade entre imagem e música aplica-se à tentativa de criação de um estilo musical cinematográfico. No cinema, a música não pode se desenvolver a partir de seus próprios critérios, daí ser impossível o surgimento de qualquer “estilo”, pois “o conceito de estilo serve primariamente à unidade intacta da obra de arte orgânica. Considerando que o filme não é tal obra de arte, já que a música não pode e não deveria ser parte de tal unidade orgânica, a tentativa de impor um ideal estilístico à música do cinema é absurda” (Adorno; Eisler, 2007Adorno, Theodor W.; Eisler, Hanns. Composing for the Films. Nova York/Londres: Continuum International Publishing Group, 2007., p. 53).

Não se trata, portanto, de uma recusa peremptória do cinema. O livro defende principalmente a libertação do cinema de sua opressão comercial e a busca das possibilidades de um uso crítico da música, sem tentar, no entanto, estabelecer um critério estético universal para essa música. Nas palavras dos autores,

A aplicação desse princípio não sujeita a música no cinema à arbitrariedade; isso significa que o critério dessa música deve ser derivado de cada caso particular a partir dos problemas que ele levanta. A tarefa das considerações estéticas é lançar luz na natureza desses problemas e suas necessidades, nos tornar conscientes de seu próprio desenvolvimento inerente, não fornecer receitas. (idem, p. 59)

Infelizmente para a fortuna crítica de Adorno, que saberia quais soluções práticas ele daria aos problemas que enxergava no cinema, seu roteiro não foi aprovado pela Warner Brothers. Esse episódio, entretanto, assim como a colaboração com Eisler, mostra como sua avaliação do cinema de Adorno não é definitiva. Apesar de “não fornecer receitas”, suas críticas a ele seriam elaboradas por seus alunos na década de 1960, e o cinema seria discutido mais uma vez em sua obra, tendo em vista agora o diálogo com Kracauer e o Novo Cinema alemão.

“ANYTHING GOES”: REVISITANDO O CINEMA

Se é possível confirmar que a indústria cultural e o seu maior representante foram pensados a partir de dentro, o problema de Adorno em relação ao cinema, conforme sugerem alguns de seus comentadores (Cf. Hansen, 2011Hansen, Miriam B. Cinema and Experience: Siegfried Kracauer, Walter Benjamin and Theodor W. Adorno. Berkeley/Los Angeles/Londres: University of California Press, 2011.; Silva, 1999Silva, Mateus Araújo. “Adorno e o cinema: um início de conversa”. Novos Estudos Cebrap, n. 54, São Paulo, 1999, pp. 114-26.), é que ele estende para essa forma àquilo que dizia respeito apenas ao cinema hollywoodiano. Isto é, de um lado, o diagnóstico relativo à indústria cultural parece estar baseado na alegada distância elitista em relação à chamada cultura de massas, mas, de outro lado, a imersão de Adorno nessa cultura é igualmente apresentada como um problema. Esse seria, aliás, o mesmo argumento dos críticos da sua teoria do jazz: Adorno só conheceria o jazz comercial americano (Steinert, 2003Steinert, Heinz. Culture Industry. Oxford/Malden, MA: Polity, 2003.). Alexander Kluge, aluno e amigo de Adorno, insistiu nessa ideia quando afirmou que nunca acreditara nas teses de Adorno sobre o filme, pois ele só conheceu os de Hollywood (Kluge, 1988, p. 42). Essas duas atitudes tendem a bloquear uma apreensão dos desdobramentos da teoria de Adorno.

Na década de 1960, Adorno escreveu alguns textos importantes que revisitam o debate dos anos 1930, como o famoso “Engagement”, no qual reconsidera a arte política a partir de Sartre e Brecht. Foi nesse período que ele decidiu assinar a autoria de Composing for the Films. “Notas sobre o filme”, de 1966, é uma das peças mais enigmáticas de sua obra, pois Adorno ensaia construir uma leitura do cinema que se afaste das formulações definitivas que encontramos, por exemplo, no excerto sobre a indústria cultural. Tal texto, que é mais um conjunto de considerações do que um ensaio, tem duas referências fundamentais: o Novo Cinema alemão impulsionado pelo Manifesto de Oberhausen, do qual Kluge foi um dos representantes, e o livro Theory of Film (1960), de Siegfried Kracauer.

Nessa obra, Kracauer defende uma estética do cinema preocupada com o conteúdo, não com a forma. Uma vez que a base do filme é a fotografia, esta estabelece o conteúdo do filme, e a sua natureza fotográfica permaneceria naquele. O filme é uma extensão da fotografia “e portanto compartilha com esse medium uma afinidade marcada pelo mundo visível ao nosso redor”, uma espécie de “descobridor das maravilhas da vida cotidiana” (Kracauer, 1960, p. IX). De acordo com sua interpretação, o cinema é capaz de apreender fenômenos que dificilmente seriam apreendidos sem a câmera, fenômenos efêmeros como multidões nas ruas, gestos involuntários etc. Sendo assim, enquanto as obras de arte tradicionais consumiriam a matéria-prima de que são feitas e a partir da qual se erigem, o cinema e a fotografia deixariam a sua matéria-prima mais ou menos intacta. Kracauer defende a investigação do conteúdo no cinema (contra o formalismo) porque o cinema é, entre as artes, o mais dependente da matéria-prima, de seus objetos, sejam eles a natureza ou a vida cotidiana. A teoria do cinema como arte impura é um dos pontos mais interessantes da tese de Kracauer2 2 Vale citar as reflexões sobre o cinema como “forma impura” e também as sobre a relação entre a imagem o som, realizadas por Ismail Xavier (1984). que Adorno assimilaria às suas reflexões sobre as possibilidades do cinema como arte.

O surgimento do Novo Cinema alemão e o lançamento do Manifesto de Oberhausen também impulsionaram Adorno a repensar o filme na década de 1960. Em carta dirigida a Kracauer, em 22 de outubro de 1962, ele destaca que:

O que hoje é decente no filme alemão está ligado mais ou menos ao grupo de Oberhausen, e resulta que eu não lhes faça nenhuma reprimenda pelo fato de eles não conseguirem dizer exatamente o que eles querem - eles sabem exatamente o que não querem, e Spinoza está certo, o falso é índice do verdadeiro. (Adorno, 2012______. “An Siegfried Kracauer”. In: Eue, Ralph; Gass, Lars Henrik (orgs.). Provokation der Wirklichkeit. Das Oberhausener Manifest und die Folgen. Munique: edition text + Kritik, 2012., p. 25)

Esse manifesto,3 3 Como o manifesto é curto, vale citá-lo. “O colapso do filme alemão convencional finalmente tira o chão econômico de uma postura espiritual [Geisteshaltung] por nós recusada. Por meio disso, o filme novo tem a oportunidade de se tornar vivo. […] Filmes alemães curtos de jovens autores, diretores e produtores receberam nos últimos anos um grande número de prêmios em festivais internacionais e encontraram reconhecimento da crítica internacional. Esses trabalhos e seus sucessos mostram que o futuro do filme alemão está com eles, que provaram falar uma nova língua do filme. Como em outros países, também na Alemanha o filme curto tornou-se escola e campo de experimentação do filme. […] Nós declaramos nossa demanda pela criação do novo filme alemão. Esse novo filme precisa de novas liberdades. Liberdade das convenções usuais. Liberdade da influência por meio de parceiros comerciais. Liberdade do paternalismo por meio de grupos de interesses. […] Nós temos ideias espirituais [geistige] concretas, formais e econômicas a respeito da produção do novo filme alemão. Nós estamos em conjunto preparados para assumir riscos econômicos. […] O velho filme está morto. Nós acreditamos no novo. Declaração de 28 de fevereiro de 1962 em Oberhausen.” (Eue; Gass, 2012, p. 15). apresentado numa conferência em 1962, proclamava a necessidade de o cinema alemão se distanciar dos filmes comerciais do período do milagre econômico.4 4 De acordo com Ulrich Gregor, o cinema alemão vivera uma expansão no pós-guerra, com relativo sucesso financeiro e filmes interessantes. No entanto, havia uma escassez não só de filmes mais ligados à arte, como de uma discussão acadêmica sobre o cinema, e isso gerava um descontentamento dos cineastas mais jovens desse período. Vale ressaltar também a importância que o cinema teve como propaganda nazista (o que explica também parte da aversão de Adorno pelos filmes) e a necessidade de problematizar a partir desse meio o passado alemão. Vários cineastas ligados ao Oberhausen participavam também do movimento estudantil, por isso o Novo Cinema alemão carrega as marcas da Nova Esquerda alemã e de suas reivindicações. Ver: Gregor, 1978. A ideia era focar no “cinema autoral”, na linguagem do filme a tornar visível o cinema como medium. Além disso, tratava-se de reivindicar apoio financeiro para cineastas novos e estimular o cinema experimental; seus adeptos retornavam a técnicas elementares do cinema.

Vale salientar que a influência do manifesto no cinema alemão não foi nem unívoca nem imediata, pois veio a se desdobrar nos anos que se seguiram e a produzir cineastas diversos entre si, como Kluge, já mencionado, Wim Wenders, Helke Sander, entre muitos outros. Mas os problemas levantados pelo manifesto, como a questão de uma nova linguagem para o cinema, influenciaram uma geração inteira de cineastas e críticos, e são comentados por Adorno em “Notas sobre o filme”.

Adorno inicia sua análise fazendo um elogio ao cinema que se contrapõe aos padrões estabelecidos da indústria cultural:

Na arte autônoma nada é válido que fique aquém do nível técnico já alcançado; mas no confronto com a indústria cultural, cujo padrão exclui o que não tenha sido previamente apreendido e mastigado, e que atua analogamente ao ramo dos cosméticos quando elimina rugas dos rostos, obras que não dominam inteiramente sua técnica e que, por isso, deixam passar algo de incontrolado, de ocasional, têm o seu lado liberador. Nelas, as imperfeições na cútis de uma bela garota tornam-se um corretivo na imaculada tez da estrela consagrada. (Adorno, 1986______. “Notas sobre o filme”. In: Cohn, Gabriel (org.). Theodor W. Adorno. São Paulo: Ática, 1986., p. 101)

Seguindo o raciocínio de Adorno, o aspecto mais rudimentar do cinema que se opõe à indústria cultural dá a ele um caráter crítico em relação à primeira, ao livrar-se de sua aparência de perfeição. Isso fica claro na fotografia do Novo Cinema alemão. Hoje, com o desenvolvimento da cenografia e dos efeitos especiais digitais, essa tendência à “perfeição”, não só nas paisagens cuidadosamente desenhadas em softwares de última geração, como no retoque digital da aparência dos atores do cinema, até o ponto de esta se tornar completamente irreal, é ainda mais visível.

O elogio de Adorno, porém, não demora a tornar-se ambíguo quando ele passa a comentar o filme O jovem Törless (1966), uma adaptação por Volker Schlöndorff, um dos signatários do Manifesto de Oberhausen, do romance Die Verwirrungen des Zöglings Törleß (1906), de Robert Musil. Adorno ressalta a diferença entre os meios do cinema e da literatura. Törless reproduz os diálogos dos romances de Musil quase sem alterações e, por causa dessa característica, foi extremamente mal recebido pela crítica americana. A intenção do filme, diz Adorno, era evitar a “má prosa”, retirando da literatura a “boa prosa”. No entanto, a diferença de meio entre essas duas artes consistiria no fato de que, no romance, mesmo a palavra falada nunca é falada, mas mediada pela narração. Na literatura, os personagens nunca correspondem a figuras empíricas, como ocorre no filme. Adorno insiste, ao contrário, que, quanto maior a exatidão de sua representação, maior a sua autonomia estética e maior a sua distância da empiria. A imediatez na literatura é dada pela distância entre empiria e representação - e a imediatez do diálogo é seu produto. O caso do cinema, que se pretende realista, segundo Adorno, é diferente. Em vez de buscar a partir de diferentes meios o traço referido acima, ela é inerente a ele. As frases, que no romance de Musil são resultado de um esforço para alcançar essa aparência, soam artificiais no cinema, que a atinge muito mais facilmente. O filme, defende Adorno, precisaria recorrer a outros meios de imediatez, como o improviso, “que planejadamente confia no acaso da empiria não dirigida” (Adorno, 1986, p. 101).

No cinema, sublinha Adorno, convergem as duas formas da técnica, que em artes como a música seriam claramente distinguíveis: a técnica imanente (organização interna da obra) e a interpretação, fornecida pelos meios de reprodução. Isso fica claro na diferença, por exemplo, entre uma música em sua composição e sua execução por uma orquestra, o que sugere como a recusa que Adorno tinha do cinema, menos que elitismo, referia-se a sua própria concepção de arte, ligada justamente à relação imanente entre técnica e tecnologia, ou seja, à ideia de que as várias artes obedecem a um critério interno de desenvolvimento estético que não estaria presente no cinema. Adorno retorna aqui aos temas que foram objeto de seu debate com Benjamin para destacar que, no cinema, não há um original que passa a ser reproduzido em massa, pois “o produto em massa é a própria coisa” (Adorno, 1986, p. 102). Daí a particularidade do cinema, no qual “é impossível decifrar as normas a partir da técnica cinematográfica como tal” (idem, ibidem). Para ilustrar essa questão, Adorno cita Chaplin e afirma que este não dominava a técnica cinematográfica, embora ninguém duvidasse de sua qualidade como cineasta. Num outro texto, escrito em homenagem aos 75 anos de Chaplin, Adorno (1969b) elogia a presença de espírito e a habilidade mimética do cineasta, ao comentar como foi imitado por ele numa festa (mais um caso difícil de imaginar devido à ausência de traduções importantes de sua obra).

Uma vez que a técnica no cinema não pode ser derivada de sua tecnologia, trata-se de pensar ajustes alternativos, como incorporar uma forma de experiência subjetiva

com a qual se assemelha apesar da sua origem tecnológica, e que perfaz aquilo que ele tem de artístico. A uma pessoa que, por exemplo, depois de um ano na cidade, permanecer por várias semanas de inteiro repouso numa região montanhosa, pode ocorrer que, no sono ou no devaneio, coloridas imagens da paisagem passem agradavelmente à sua frente ou através dela. Mas elas não se sucedem de modo continuado, umas após as outras: elas têm um intervalo em seu transcurso, como na lanterna mágica da infância. A essa parada no movimento é que as imagens do monólogo interior devem a sua semelhança à escrita: também ela é algo que se move sob o olho e, ao mesmo tempo, é algo paralisado em seus signos individuais. É possível que esse traço das imagens comporte-se em relação ao filme assim como o mundo dos olhos em relação à pintura ou o mundo auditivo em relação à música. O filme seria arte enquanto reposição objetivadora dessa espécie de experiência. O meio técnico par excellence é profundamente aparentado com a beleza natural. (Adorno, 1986______. “Notas sobre o filme”. In: Cohn, Gabriel (org.). Theodor W. Adorno. São Paulo: Ática, 1986., p. 102)

A semelhança do cinema, enquanto meio técnico, com o “belo natural” deduz-se do fato de que, para Adorno, este não pode ser representado, pois ele é a sua própria imagem. Essa ideia remete à sua concepção de cinema como aquilo que não representa alguma coisa, mas cujo produto em massa seria a própria coisa. Para isso, o cinema, como o extremo da técnica, estaria preparado quando fosse capaz de objetivar a experiência subjetiva do indivíduo que passara vários dias descansando na montanha, como ele diz numa das passagens supracitadas. Conforme destaca Loureiro, “se o originalmente fílmico é seu caráter de massa, trair e desafiar esse traço fundamental significa, em Adorno, o recurso, por parte da estética do filme, a uma forma de experiência subjetiva capaz de produzir o que ele tem de artístico” (2006, p. 124). Trata-se, portanto, da compreensão de que

A expressão pura das obras de arte, liberta das interferências coisais e também do assim chamado material natural, converge com a natureza […]. O desenvolvimento subjetivo pleno da arte enquanto uma linguagem não conceitual é, no estágio da racionalidade, a única figura na qual reflete algo como a linguagem da criação, com o paradoxo da distorção do que reflete. A arte tenta imitar uma expressão que não seria intenção humana embutida. Esta é somente o seu veículo. […] Se a linguagem da natureza é muda, a arte aspira a trazer o mutismo à fala […]. (Adorno, 1970______. Ästhetische Theorie. Frankfurt: Suhrkamp, 1970., p. 121)

As possibilidades do cinema como uma nova forma de experiência subjetiva, sobre as quais discorre Adorno em “Notas sobre o filme”, supõem a compreensão de que essa elaboração subjetiva na arte pode se dar, na contramão de Kracauer, enquanto linguagem não conceitual, que o cinema assume como sua forma através de sua linguagem imagética.

O texto “Notas sobre o filme” oscila entre a investigação estética e a crítica da indústria cultural. De um lado, critica as análises do cinema que se referem ao conteúdo e reitera a tese presente nos seus textos sobre a televisão como ideologia.5 5 Refiro-me aos textos “Prólogo sobre a televisão” (1963) e “A televisão e os padrões da cultura de massa” (1954). Adorno defende uma investigação via “psicologia profunda” dos meios de comunicação, pois esses meios não se reduzem à mensagem que transmitem e apresentam várias camadas de significação superpostas que determinam em conjunto o seu efeito. Seria preciso atentar não só aos significados manifestos desses meios, mas também a seus significados latentes. De outro lado, Adorno discute as potencialidades do cinema como forma e as teses de Kracauer são retomadas tendo em vista esse segundo ponto. Adorno concorda com a ideia do cinema como extensão da fotografia e desta como cópia da realidade empírica. Ele segue o argumento de Kracauer de que o cinema pode decompor e modificar os objetos, mas que, no final das contas, uma desmontagem completa dos objetos não seria possível. O modo como a sociedade está presente no filme, diz ele, é muito mais imediato, se comparado à pintura ou literatura; “por isso a estética do filme, graças à sua posição em relação ao objeto, ocupa-se de modo imanente com a sociedade. Não há estética do filme, nem que seja puramente tecnológica, que não contenha em si a sua sociologia” (Adorno, 1986, p. 104). E, embora Kracauer tenha deixado as análises sociológicas de fora “por abstinência sociológica”, nas palavras de Adorno, seu livro impeliria ao reconhecimento desse aspecto do cinema. Adorno afirmaria ainda que Kracauer foi o grande descobridor do cinema como “fato social” (Adorno, 2009, p. 12).

Kracauer defende o potencial que o cinema teria de revelar as belezas da vida cotidiana. Adorno acusa ser esse um resquício da art noveau, uma transformação do antiformalismo em formalismo, isto é, quando se quer atribuir significados a objetos em si, destituídos de sentido subjetivo como nuvens no céu ou um lago sombrio. Em “O curioso realista”, encontra-se um comentário de Adorno que ilumina a crítica presente no ensaio de 1966, em que ele diz que a teoria enfática “tem de ir ao extremo na interpretação dos objetos, caso não queira contrapor-se a sua própria ideia” (Adorno, 2009, p. 10). Isto é, a representação dos objetos por eles mesmos também no cinema padeceria dessa incompletude da crítica, consistiria num realismo ingênuo. Adorno complementa as reflexões sobre o cinema de Kracauer retornando ao debate com Benjamin:

Benjamin não tratou de quão profundamente várias de suas categorias postuladas para o cinema - valor de exposição, teste - estão comprometidas com o caráter de mercadoria, contra o qual sua teoria se volta. Mas inseparável desse caráter de mercadoria é a essência reacionária de qualquer realismo estético hoje, tendencialmente voltado para o reforço afirmativo da superfície visível da sociedade e que repele como romântico o querer ir além dessa fachada. Todo significado que se empreste ao filme através da câmera já violaria a lei dela e atentaria contra o tabu de Benjamin, inventado com a expressa intenção de radicalizar para além do radical Brecht e, talvez, secretamente para libertar-se dele. O filme encontra-se diante da alternativa de como proceder na ausência do ofício artístico por um lado e, por outro, sem cair no meramente documentário. (Adorno, 1986______. “Notas sobre o filme”. In: Cohn, Gabriel (org.). Theodor W. Adorno. São Paulo: Ática, 1986., p. 105)

Adorno considera como solução a montagem e o seu potencial para colocar as coisas em constelações. Isto é, defende a necessidade de ir além de uma mera representação descrita por imagens da realidade na direção de uma apresentação “configurada” da mesma. Aqui ele retoma o debate dos anos 1930 e elucida sua crítica a uma das versões de montagem presentes na obra de Benjamin: aquela que visa ao choque. Trata-se de denunciar como ilusória a montagem que almeja prescindir do sentido subjetivo, uma vez que mesmo essa renúncia seria subjetivamente organizada.6 6 Esse argumento tambem e utilizado por Adorno na sua critica do surrealismo em“Revendo o surrealismo”(1956). Ver: Adorno, 2003, p. 75. O filme citado como exemplo é Antithese (1965), de Mauricio Kagel, o qual ilustra como o cinema deve servir-se de artes que lhe são afins, como determinada música.

Embora Adorno apresente essas reflexões sobre os potenciais da montagem - que também apareciam em Composing for the Films -, suas considerações permanecem ainda abstratas, e o texto é encerrado com um retorno à crítica da indústria cultural. Ele destaca que o sujeito constitutivo do cinema - nisso este se assemelharia à música - seria um “nós” e para isso também convergiriam seus aspectos estéticos e sociológicos. O filme teria um caráter coletivo e sociológico a priori, por causa de sua composição técnica. Porém esse a priori coletivo, diz Adorno, atuaria de maneira inconsciente e irracional. Tal caráter coletivo precisaria ser problematizado para ser colocado a serviço de uma intenção iluminista. Nas palavras de Adorno,

A produção cinematográfica emancipada não deveria mais […] confiar irrefletidamente na tecnologia, no fundamento do métier. Nele é que o conceito de adequação material alcança a crise, antes mesmo de ter sido obedecido. Misturam-se turvamente a exigência de uma relação plena de sentido entre modos de procedimento, material e estruturação com o fetichismo dos meios. (Adorno, 1986______. “Notas sobre o filme”. In: Cohn, Gabriel (org.). Theodor W. Adorno. São Paulo: Ática, 1986., p. 106)

Adorno reitera um raciocínio que acompanha sua formulação do conceito de indústria cultural: apesar de parecer, a indústria cultural não é a arte dos consumidores, mas sim uma ideologia; seria necessário combater essa ideia da indústria cultural como a arte dos consumidores, a arte popular: “Ela configura a relação entre a arte e a sua recepção de um modo estático-harmônico, segundo o modelo, em si dúbio, da oferta e da procura” (idem, p. 107). A indústria cultural visaria então reproduzir-se por meio dos consumidores.

Por que, porém, Composing for the Films termina destacando a indústria cultural? Será que esse texto é, de fato, um elogio ao Novo Cinema alemão?

O CINEMA E A ARTE

Em 1967, um ano após “Notas sobre o filme”, Adorno escreveu outro ensaio no qual o cinema é (re)considerado, chamado “A arte e as artes”. Nele, tematiza a tendência de erosão das fronteiras entre diferentes artes e o significado desse processo para a arte, no singular. O cinema seria a forma mais nova e representativa desse fenômeno. Nesse texto, diferentemente do anterior, Adorno afirma que a questão relativa à possibilidade do cinema como arte estaria em desuso e não faria mais sentido, uma vez que o próprio cinema seria justamente a expressão dessa borra da fronteira entre as artes e da tensão que ela estabelece com a arte. Na Teoria estética, ele diria que “a questão colocada acima, se um fenômeno como o filme ainda é arte ou não, não leva a lugar algum” (Adorno, 1970______. Ästhetische Theorie. Frankfurt: Suhrkamp, 1970., p. 12).

Novamente, Adorno ressalta a compreensão de Benjamin sobre o cinema como liquidação da aura presente na arte anterior ao seu surgimento. Ainda na Teoria estética, numa passagem sobre o antagonismo inerente ao conceito de técnica, comenta que um desenho numa parede de caverna sem dúvida se diferencia de uma câmera, que capta várias imagens e as reproduz. Em relação ao desenho, a câmera é um avanço técnico. Mas no primeiro, que objetivava o imediatamente visto - separando a imagem do ato subjetivo da visão -, já estava contido o conceito de reprodução. Por isso, Adorno defende que Benjamin suprimiu a unidade desses dois momentos a favor da diferença entre eles. Essa seria, segundo Adorno, a crítica dialética de sua teoria. A ideia aqui é que a imersão da câmera na realidade crua, isto é, como matéria-prima do cinema, não escaparia à intenção subjetiva que organiza a arte em formas como a literatura. Nas suas palavras,

Mas tal recusa, por sua vez, enquanto a priori da realização [Gestaltung] de filmes, é novamente um princípio de estilização estético. Mesmo com máximo ascetismo contra a aura e a intenção subjetiva, o procedimento fílmico, no entanto, verte inevitavelmente na coisa, puramente de acordo com sua técnica, por meio do script, da forma [Gestalt] do fotografado, do foco da câmera, da edição de imagens, momentos que lhe atribuem sentido, a propósito, de maneira semelhante à dos procedimentos na música e na pintura, que querem deixar o material evidenciar-se nu e, justamente em tal empenho, o pré-formam. Mesmo que o filme, por sua legalidade imanente, quisesse descartar seu estatuto de arte [Kunsthaft] - quase como se ele contradissesse seu princípio de arte -, ele é, ainda nessa rebelião, arte e a alarga. (Adorno, 1977______. Die Kunst und die Künste. In: Tiedemann, Rolf (org.). Kulturkritik und Gesellschaft. Gesammelte Schriften. Bd. 10. Frankfurt: Suhrkamp, 1977., p. 181)

O problema, portanto, não se resume a uma recusa peremptória do cinema como arte ou como forma de expressão. Adorno não atribuía ao cinema o mesmo estatuto da música e da literatura em sua obra, como gostaria Kluge. Anos depois da morte de Adorno, o cineasta afirmaria:

Por algum tempo, Adorno não considerava o cinema como uma forma artística original. Por um lado, por causa do domínio da indústria cultural, que no negócio do cinema assume traços especiais, mas também porque desconfiava da supervalorização do cinema por parte de Benjamin. Posso afirmar que, ao final, fiz por seduzi-lo no sentido de corrigir essa concepção. Ele não me teria contradito quanto a terem existido já na cabeça dos homens, não importa se em vigília ou em sonhos, desde a Idade da Pedra (ou desde a invenção da linguagem), as imagens em movimento e a arte da montagem. Essa linguagem das imagens em movimento, sobre isso ele estaria de acordo, possui uma autonomia própria, que simplesmente não obedece nem às palavras nem às notas musicais. Se digo que a arte cinematográfica é o eco dessa autonomia, ele estaria de acordo. (Kluge, 2009______. “A atualidade de Adorno. Discurso de agradecimento pelo Prêmio Adorno - Frankfurt”, 11/09/2009. Tradução de José Pedro Antunes. Disponível em: <http://www.unimep.br/anexo/adm/22032015192424.pdf>. Acesso em: 22/04/2017.
http://www.unimep.br/anexo/adm/220320151...
)

Ou seja, trata-se, de um lado, de inserir o cinema na história da arte e refletir sobre suas potencialidades formais, de outro, de acusar a sua pretensão como arte popular apenas pelo fato de sua produção e sua recepção se darem de maneira coletiva. É como se, apenas por ser “cultura de massa”, o cinema já se eximisse de qualquer suspeita. Mas, conforme destaca Adorno, a redução do filme ao coletivo, a sua “independência em relação às normas da obra de arte autônoma” não o definem necessariamente, pois ele também é fruto - e poderia ser expressão - de um momento em que a arte nega a si mesma em nome de expandir-se rumo à sua realização. Aqui o crítico aposta mais uma vez no papel expressivo que a montagem no cinema poderia assumir. No entanto, o cinema permanece reduzido a um meio de dominação. Nas suas palavras,

a morte da arte individualista não é justificativa para uma arte que se comporta como se o seu sujeito, que reage arcaicamente, fosse o natural, quando ele é o representante, certamente inconsciente, do par de grandes firmas. […] Finalmente, que no filme tenham voz numerosos peritos e simples técnicos garante tão pouco sua humanidade quanto a decisão de associações científicas o faz para bombas e gás tóxico. (Adorno, 2008______. Minima Moralia: reflexões a partir da vida lesada. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2008., p. 120)

A crítica de Adorno à indústria cultural incentivou uma geração inteira - como comprova a atuação de Kluge no cinema e de Palatas na crítica e historiografia - a pensar o cinema de maneira mais crítica. Suas formulações sobre o cinema, e, no caso do jazz ainda mais, são controversas e não cabe defendê-las acriticamente. Não obstante, reler a sua obra sem recorrer à estereotipia envolve pensá-la naquilo que ela apresenta de contraditório, de inconsistente, de problemático, de inconclusivo. Sua teoria sobre o cinema é um desses momentos. Ao contrário do que faz em seus escritos sobre o jazz, cujo diagnóstico assume um caráter muito mais peremptório - para não mencionar a televisão e o rádio -, seus textos sobre o cinema apresentam uma apreciação muito mais ambígua e vacilante. Além disso, ainda que as críticas adornianas ao cinema apliquem-se apenas ao chamado cinema comercial mainstream, elas permanecem atuais quando os campeões de bilheteria continuam a ser os mesmos filmes de super-heróis eternamente reciclados. Uma de suas considerações a respeito do filme envolve a indagação de como o cinema de Hollywood pode, com todos os recursos que tem à sua disposição, ser tão repetitivo, regressivo e pouco criativo.

À fortuna crítica resta apenas escolher o caminho mais profícuo. Pode-se sugerir, como faz Heinz Steinert (2003Steinert, Heinz. Culture Industry. Oxford/Malden, MA: Polity, 2003.), que o conceito de indústria cultural não dê conta da ironia dos filmes de Woody Allen e ressaltar quais filmes e fenômenos culturais escapam aos ditames da cultura de massa. A outra opção é mergulhar abaixo da superfície e escolher o caminho incerto e vacilante sugerido pela obra de Adorno, a saber, o da crítica dialética da cultura, que não deixa de ver as potencialidades do cinema, mas que não se reduz a afirmação do mero existente.

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  • Xavier, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
  • 1
    A teoria da indústria cultural é uma espécie de programa de pesquisa que atravessa a obra de Adorno e não há espaço para esmiuçá-la aqui. Além da correspondência com Benjamin e do ensaio presente na Dialética do esclarecimento (1944), o conceito de indústria cultural aparece desenvolvido em muitas outras formulações. Poder-se-ia citar “O esquema da cultura de massas” (1942), “Prólogo sobre a televisão” (1953), “Cultura e administração” (1960), “Breves considerações sobre a indústria da cultura” (1963), “Pode o público querer?” (1963), entre outros. Para fins da discussão proposta neste artigo, trata-se de ressaltar dois elementos fundamentais da noção de indústria cultural. Em primeiro lugar, de que ela é um sistema e que seu funcionamento só pode ser compreendido plenamente nessa condição. “Indústria cultural”, portanto, não é um “adjetivo” dos bens culturais. Em segundo lugar, a teoria da indústria cultural não é apenas uma teoria da cultura no capitalismo tardio, mas uma teoria da dominação que se dá a partir da cultura. Portanto, a discussão proposta aqui enfatiza as potencialidades do cinema fora desse sistema.
  • 2
    Vale citar as reflexões sobre o cinema como “forma impura” e também as sobre a relação entre a imagem o som, realizadas por Ismail Xavier (1984Xavier, Ismail. O discurso cinematográfico: a opacidade e a transparência. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.).
  • 3
    Como o manifesto é curto, vale citá-lo. “O colapso do filme alemão convencional finalmente tira o chão econômico de uma postura espiritual [Geisteshaltung] por nós recusada. Por meio disso, o filme novo tem a oportunidade de se tornar vivo. […] Filmes alemães curtos de jovens autores, diretores e produtores receberam nos últimos anos um grande número de prêmios em festivais internacionais e encontraram reconhecimento da crítica internacional. Esses trabalhos e seus sucessos mostram que o futuro do filme alemão está com eles, que provaram falar uma nova língua do filme. Como em outros países, também na Alemanha o filme curto tornou-se escola e campo de experimentação do filme. […] Nós declaramos nossa demanda pela criação do novo filme alemão. Esse novo filme precisa de novas liberdades. Liberdade das convenções usuais. Liberdade da influência por meio de parceiros comerciais. Liberdade do paternalismo por meio de grupos de interesses. […] Nós temos ideias espirituais [geistige] concretas, formais e econômicas a respeito da produção do novo filme alemão. Nós estamos em conjunto preparados para assumir riscos econômicos. […] O velho filme está morto. Nós acreditamos no novo. Declaração de 28 de fevereiro de 1962 em Oberhausen.” (Eue; Gass, 2012Eue, Ralph; Gass, Lars Henrik (orgs.). Provokation der Wirklichkeit. Das Oberhausener Manifest und die Folgen. Munique: edition text + Kritik, 2012., p. 15).
  • 4
    De acordo com Ulrich Gregor, o cinema alemão vivera uma expansão no pós-guerra, com relativo sucesso financeiro e filmes interessantes. No entanto, havia uma escassez não só de filmes mais ligados à arte, como de uma discussão acadêmica sobre o cinema, e isso gerava um descontentamento dos cineastas mais jovens desse período. Vale ressaltar também a importância que o cinema teve como propaganda nazista (o que explica também parte da aversão de Adorno pelos filmes) e a necessidade de problematizar a partir desse meio o passado alemão. Vários cineastas ligados ao Oberhausen participavam também do movimento estudantil, por isso o Novo Cinema alemão carrega as marcas da Nova Esquerda alemã e de suas reivindicações. Ver: Gregor, 1978Gregor, Ulrich. Geschichte des Films ab 1960. Munique: Bertelsmann, 1978..
  • 5
    Refiro-me aos textos “Prólogo sobre a televisão” (1963) e “A televisão e os padrões da cultura de massa” (1954).
  • 6
    Esse argumento tambem e utilizado por Adorno na sua critica do surrealismo em“Revendo o surrealismo”(1956). Ver: Adorno, 2003______. “Revendo o surrealismo”. In: Notas de Literatura I. São Paulo: Duas Cidades/Editora 34, 2003., p. 75.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Set 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2019

Histórico

  • Recebido
    05 Jun 2018
  • Aceito
    23 Maio 2019
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