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Formação de expectativas de inflação em um ambiente de racionalidade limitada: uma abordagem de escolha discreta

Resumo

Elabora-se um modelo computacional de escolha ternária baseado em agentes para avaliar a evolução da distribuição de frequência de preditores de inflação. A cada período de reavaliação das estratégias de previsão, cada agente escolhe um dentre três preditores (estático, adaptativo e VAR) para prever a inflação mensal. O processo de seleção de preditores é formalizado como uma dinâmica de escolha discreta baseada em dois atributos, a saber, acurácia menos o custo médio do preditor (atributos privados) e habilidades cognitivas heterogêneas (dispersão nas habilidades cognitivas). O modelo computacional baseado em agentes calibrado apresenta persistência da heterogeneidade de expectativas inflacionárias, ou seja, preditores de inflação menos acurados acabam coexistindo com o preditor mais acurado devido à dispersão das habilidades cognitivas dos agentes.

Palavras-Chave:
Expectativas inflacionárias heterogêneas; Dispersão das habilidades cognitivas; Modelos computacionais baseados em agentes

Abstract

We propose a discrete (ternary) choice model to study the frequency distribution of inflation predictors. In every reappraisal period of the foresight strategies, each agent chooses only one among three predictors (naive, adaptive and VAR) to forecast the monthly inflation rate. The predictor selection process is modeled as a discrete choice dynamics based on two attributes, namely, accuracy less the average cost predictor (private attributes) and dispersion in cognitive abilities. The calibrated agent-based computational model shows that heterogeneity in inflation expectations is persistent, that is, less accurate predictors coexist with the most accurate predictor due to the dispersion in cognitive abilities of agents.

Keywords:
Heterogeneous inflation expectations; Dispersion in cognitive abilities; Agent-based computational models

1. Introdução

Decisões econômicas hoje dependem das expectativas do estado futuro da economia. Desta forma, a formação das expectativas é de suma importância no processo de tomadas de decisões de consumidores, firmas e instituições públicas e privadas. Compreender como as expectativas inflacionárias são formadas e revisadas se torna ainda mais necessário para os formuladores de política monetária em um regime de meta de inflação (Hommes 2011Hommes, Cars H. 2011. "The heterogeneous expectations hypothesis: some evidence from the lab." Journal of Economic Dynamics and Control 35: 1-24. doi:10.1016/j.jedc.2010.10.003.
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, 1).

A grande maioria dos estudos sobre política monetária ótima em regime de meta de inflação supõe que as expectativas inflacionárias individuais são homogêneas e formadas de acordo com alguns dos postulados de expectativas racionais. Todavia, como ressaltam Sargent (1993)Sargent, Thomas J. 1993. "Bounded rationality in macroeconomics." Oxford: Oxford University Press. e Conlisk (1996)Conlisk, John. 1996. "Why bounded rationality?" Journal of Economic Literature XXXIV: 669-700. , a hipótese de expectativas racionais requer uma forte capacidade computacional dos agentes econômicos para coletar e processar todas as informações disponíveis. Ademais, evidências empíricas, baseadas em dados de opinião ou experimentos de laboratórios, têm mostrado que estas expectativas são heterogêneas, sendo esta heterogeneidade persistente e variante no tempo.

Um arcabouço bastante utilizado para explicar a existência e persistência da heterogeneidade é a abordagem introduzida por Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160., denominada de Adaptively Rational Equilibrium Dynamics (ARED). Estes autores mostram que os agentes não utilizam uma heurística de previsão cegamente; de fato, os agentes são racionalmente heterogêneos, no sentido de que cada preditor escolhido é individualmente ótimo em um determinado momento. Uma importante extensão de Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160. é encontrada em Branch (2004)Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , na qual a presença de heterogeneidade nas expectativas inflacionárias individuais dos consumidores no Michigan Survey é avaliada. Para tanto, Branch (2004)Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. elabora um modelo no qual cada agente busca, a cada período de tempo, escolher o melhor preditor de um conjunto de três heurísticas de previsão possíveis, a saber: preditores VAR (vetor autorregressivo), adaptativo e estático. Utilizando um modelo de escolha discreta para fundamentar o processo de seleção de heurísticas, o autor conclui que o preditor VAR, em média, é o mais utilizado pelos agentes, seguido pelos preditores adaptativo e estático. Além disso, há heterogeneidade nas expectativas inflacionárias, sendo a mesma persistente e variante no tempo.

No estudo de Branch (2004)Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , os preditores podem, a priori, apresentar custos distintos. Ao estimá-los via máxima verossimilhança, o referido autor encontra tais diferenças de custos, mas não a mesma hierarquia entre estes presente em Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160.. Mais precisamente, o autor encontra que o preditor estático é mais custoso, enquanto que o preditor VAR é o mais barato. Diante deste resultado, (Branch 2004Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , 613) argumenta que "cost in the model acts as a threshold with which forecast error must cross in order to induce a switch of methods. We argue this is a reasonable and natural interpretation of expectation formation".

Embora suponha que todos os agentes que usam um mesmo tipo de preditor incorram no mesmo custo de formação de expectativas, Branch (2004, 598)Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. sugere que trabalhos futuros poderiam, ao levarem em consideração a heterogeneidade das habilidades cognitivas dos agentes, abrir a possibilidade dos custos de formação de expectativas de agentes que usam um mesmo tipo de preditor serem distintos. Considerando tal sugestão, o presente estudo, seguindo Lima e Silveira (2015)______. 2015. "Conquering credibility for monetary policy under sticky confidence." Revista Brasileira de Economia 69 (2): 251-261., separa o custo de uso de um preditor em dois componentes, a saber, uma parcela comum a todos os agentes que adotam o mesmo preditor, aqui denominado de custo médio do preditor, e uma parcela, específica por indivíduo, que reflete a dispersão das habilidades cognitivas.

Considerando o exposto, a contribuição deste estudo para a literatura de expectativas inflacionárias heterogêneas consiste na elaboração de um modelo de escolha discreta ternária que, ao considerar que os agentes possuem habilidades cognitivas heterogêneas, propõe uma formalização capaz de incorporar no próprio arcabouço da abordagem ARED a ideia de que os custos de informações são heterogêneos na população de agentes. Com o modelo aqui proposto torna-se possível, portanto, estudar impactos da heterogeneidade cognitiva dos agentes sobre o processo de formação de expectativas de inflação, sem a necessidade de descartar a priori a possibilidade de existência de uma hierarquia objetiva de custos (médios) dos preditores de inflação.

O restante deste estudo encontra-se estruturado como segue. A seção 2 resenha brevemente a literatura relacionada. Em seguida, a seção 3 apresenta o modelo de tomada de decisão individual com campo de escolha ternário e traz a descrição do campo de escolha dos agentes e os detalhamentos do componente aleatório do modelo proposto. Posteriormente, a seção 4 traz a implementação computacional, as características e regras que balizaram a calibragem e, em seguida, apresenta propriedades emergentes do modelo. Por fim, a seção 5 fecha o trabalho com algumas considerações finais.

2. Evidências empíricas sobre a heterogeneidade das expectativas de inflação

A literatura que analisa a heterogeneidade das expectativas inflacionárias dos agentes privados tem se desenvolvido e recebido importantes contribuições nos anos recentes. Três diferentes argumentos são frequentemente empregados para explicar a presença de heterogeneidade nas estratégias. As previsões são heterogêneas devido ao fato de os agentes econômicos: (i) empregarem diferentes modelos; (ii) utilizarem diferentes informações na formulação da previsão; (iii) ou possuírem diferentes capacidades cognitivas para processar as informações (Pfajfar e Santoro 2010).

Hommes (2011, 5)Hommes, Cars H. 2011. "The heterogeneous expectations hypothesis: some evidence from the lab." Journal of Economic Dynamics and Control 35: 1-24. doi:10.1016/j.jedc.2010.10.003.
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salienta que a heterogeneidade das expectativas inflacionárias é persistente no tempo e os modelos que a incorporam apresentam um bom grau de ajuste em relação aos dados reais. Por sua vez, Amilon (2008)Amilon, Henrik. 2008. "Estimation of an adaptive stock market model with heterogeneous agents." Journal of Empirical Finance 15 (2): 342-362. doi:10.1016/j.jempfin.2006.06.007.
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destaca que heterogeneidade dessas expectativas pode conduzir à instabilidade no mercado e dinâmicas complexas de preços geradas endogenamente. Ademais, Pfajfar e Santoro (2009)Pfajfar, Damjan, and Emiliano Santoro. 2009. "Asymmetries in inflation expectations across socioeconomic groups." Mimeo, University of Copenhagen. afirmam que diferentes capacidades cognitivas de atualização e processamento de informações com vistas à formulação de expectativas inflacionárias podem ter implicações não desprezíveis em termos dos custos reais de desinflação.

Os trabalhos que avaliam empiricamente a formação das expectativas inflacionárias são relativamente recentes e dividem-se entre trabalhos de pesquisa de opinião e experimentos de laboratórios. Na primeira frente de estudos, encontra-se o trabalho de Chavas (2000)Chavas, Jean-Paul. 2000. "On information and market dynamics: the case of the US beef market." Journal of Economic Dynamics and Control 24 (5): 833-853. doi:10.1016/S0165-1889(99)00027-5.
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. Neste estudo, o autor, utilizando dados dos EUA no período entre 1948 a 1992, e adotando a metodologia dos momentos generalizados (GMM), alcança o resultado que 18% dos produtores de carne formam suas expectativas de produção utilizando o mecanismo de previsão de expectativas racionais. Por sua vez, 35% formam expectativas adaptativas, enquanto os 47% restantes usam o preditor estático.

Mankiw et al. (2004)Mankiw, N. Gregory, Ricardo Reis and Justin Wolfers. 2004. "Disagreement about inflation expectations." NBER Macroeconomics Annual 2003 18: 209-270. analisam a formação das expectativas de inflação dos consumidores com base em diferentes dados de pesquisa. Mais precisamente, os autores utilizam dados da Michigan Survey of Consumer Attitudes and Behavior, da Livingston Survey e do Professional Forecasters. Utilizando estatística descritiva e abordagem econométrica (Mínimos Quadrados Ordinários), os referidos autores encontram evidências de heterogeneidade nas expectativas inflacionárias, isto é, os dados encontram-se dispersos e tal dispersão se altera ao longo do tempo. Ademais, os autores inferem que os dados são inconsistentes com expectativas racionais ou expectativas adaptativas, mas podem ser consistentes com modelos de informação rígida.1 1 Para mais explicações sobre informações rígidas e suas implicações ver Sims (2003) e Coibion e Gorodnichenko (2012, 2015).

Outro estudo baseado em pesquisa de opinião foi elaborado por Pfajfar e Santoro (2010). Estes autores utilizam dados da Michigan Survey, no período de 1978 a 2005. Utilizando dados em diferentes percentis, os autores encontram evidências de que há heterogeneidade nas expectativas e a mesma é persistente no tempo. Ademais, os autores identificam três diferentes mecanismos de formação de expectativas utilizados pelos agentes. Mais precisamente, os autores identificam: uma região estática ou altamente regressiva no lado esquerdo da média; uma racional ao redor da média; e uma com aprendizado adaptativo ou região de informação rígida no lado direito da média. Na mesma linha de estudo, Weber (2010)Weber, Anke. 2010. "Heterogeneous expectations, learning and European inflation dynamics." Discussion Paper Series 1: Economic Studies No 16/2007. Deutsche utiliza dados da European Commission's Consumer Survey no período de 1990 a 2006 com a finalidade de avaliar o desempenho de diferentes previsores de inflação ao explicar as expectativas de famílias e profissionais de previsão em cinco economias europeias (Alemanha, Espanha, França, Holanda e Itália). O resultado alcançado pelo autor é que as expectativas das famílias e dos profissionais são bastante heterogêneas não somente entre estes dois grupos, mas também intragrupo. Por fim, conclui que as previsões realizadas por profissionais possuem menor erro quadrático médio.

Blanchflower e Maccoille (2009)Blanchflower, David G., and Conall Maccoille . 2009. "The formation of inflation expectations: an empirical analysis for the UK." NBER Working Paper 15388. buscam avaliar como as expectativas são formadas. Para tanto, utilizam três fontes de dados, a saber: Bank of England's Inflation Attitudes Surveys no período de 2001 a 2009; dados da GfK/NOP Consumer Confidence Barometer Surveys que cobre o período de 1996 a 2008; e Eurobarometer Survey para o ano de 2007.

Os autores encontram fortes evidências de heterogeneidade e comportamento backward-looking na formação das expectativas de inflação, de maneira que a percepção da inflação presente é um forte determinante da inflação esperada.

Thehan (2010)Thehan, Bharat. 2010. "Survey measures of expected inflation learning and the inflation process." Working Paper 2009-10. Federal Reserve Bank of San Francisco. http://www.frbsf.org/publications/economics/papers/2009/wp09-10bk.pdf
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utilizando dados da Michigan Survey e da American Statistical Association, ambas para o período de 1978 a 2009, busca verificar se as famílias e profissionais de previsão alteram suas expectativas de inflação quando ocorrem mudanças nos dados da inflação. Ao avaliar os dados, verifica-se que as famílias reagem pouco às mudanças nos dados, enquanto os profissionais de previsão reagem mais. No entanto, estes últimos dão maiores pesos às alterações do núcleo da inflação.

Na linha de estudo empírico que investiga o processo de formação das expectativas inflacionárias realizadas em laboratório, destacam-se os estudos de Adam (2007)Adam, Klaus. 2007. "Experimental evidence on the persistence of output and inflation." Economic Journal 117 (520): 603-636. doi:10.1111/j.1468-0297.2007.02043.x.
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, Pfajfar e Zakelj (2011)Pfajfar, Damjan, and Blaz Zakelj. 2011. "Inflation expectations and monetary policy design: evidence from the laboratory." Mimeo, Tilburg University. e Assenza et al. (2013)Assenza, Tiziana, et al. 2013. "Individual expectations and aggregate macro behavior." Tinbergen Institute Discussion Paper 13-016/II.. Pfajfar e Zakelj (2011) 1 Para mais explicações sobre informações rígidas e suas implicações ver Sims (2003) e Coibion e Gorodnichenko (2012, 2015). elaboram um experimento no qual os agentes, 2.500 alunos das universidades de Pompeu Fabra e Tilburg, devem prever a inflação para o próximo período e o intervalo de confiança de sua previsão. Para tanto, os participantes foram divididos em grupos de nove participantes e, em cada período, de um total de 70, os participantes podem adotar qualquer tipo de preditor. Os resultados obtidos fornecem evidências de heterogeneidade do processo de previsão de inflação entre os participantes, bem como de sua persistência no tempo. Ademais, os autores encontram que uma grande parte dos participantes comporta-se de forma racional e que o restante usa expectativas adaptativas, aprendizado adaptativo e modelos do tipo informação rígida. Por fim, concluem que muitos participantes utilizam modelos diferentes em cada período.

Em seu estudo de laboratório dentro do arcabouço novo-keynesiano, Assenza et al. (2013)Assenza, Tiziana, et al. 2013. "Individual expectations and aggregate macro behavior." Tinbergen Institute Discussion Paper 13-016/II. solicitaram aos participantes, 120 alunos de graduação e pós-graduação dos cursos de Química, Psicologia e Economia da Universidade de Amsterdã, para prever a inflação em três cenários diferentes em termos das expectativas do hiato do produto. Os participantes podiam realizar as previsões nos seguintes cenários: previsão perfeita, previsão estática e previsão em grupo (os participantes foram divididos em dois grupos aleatoriamente, um que realiza previsões sobre o hiato do produto e o outro que forma expectativas sobre a taxa de inflação). Os autores encontram que o preditor comum mais usado foi a taxa de inflação defasada em um período, seguido pela previsão própria mais recente ou pelo penúltimo valor registrado da inflação. Ademais, os autores encontram evidência de que os indivíduos baseiam sua previsão em observações passadas, seguindo heurísticas de previsões simples e que os indivíduos aprendem e mudam o preditor a ser usado em um novo período, ou seja, existe aprendizado adaptativo.

Outro grupo de pesquisa em expectativas inflacionárias é formada por autores que buscam relacionar a heterogeneidade das expectativas de inflação às características demográficas, gênero e características socioeconômicas individuais. Pfajfar e Santoro (2009)Pfajfar, Damjan, and Emiliano Santoro. 2009. "Asymmetries in inflation expectations across socioeconomic groups." Mimeo, University of Copenhagen. elaboram um modelo econométrico para avaliar a relação entre a atualização das informações das notícias e características socioeconômicas. Utilizando dados do Michigan Survey, os autores obtêm os resultados de que na média 20% das famílias atualizam seu conjunto de informação em todos os períodos. Quando separados por grupos específicos, infere-se que homens atualizam as informações mais frequentemente que as mulheres. Já outros autores relacionam heterogeneidade de expectativas inflacionárias devido à influência das variáveis idade e escolaridade na formação das expectativas. Por exemplo, Maital e Maital (1981)Maital, Shlomo, and Sharome Maital. 1981. "Individual-rational and group-rational inflation expectation: theory and cross section evidence." Journal of Economic Behavior and Organization 2 (2): 179-186. , Souleles (2001)Souleles, Nicholas S. 2001. "Consumer sentiment: its rationality and usefulness in forecasting expenditure-evidence from the Michigan micro data." NBER Technical Report. http://www.nber.org/papers/w8410.pdf
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e Bryan e Venkatu (2001)Bryan, Michael F., and Guhan Venkatu. 2001. "The demographics of inflation opinion surveys." Federal Reserve Bank of Cleveland Issue Oct. encontram evidências que homens com menor idade e maior escolaridade possuem expectativas de inflação menores em relação aos indivíduos de mesmo gênero, com maior idade e menor escolaridade.

3. Modelo de formação de expectativas de inflação baseado em heurísticas

Considere um agente i que poderá escolher uma alternativa, mutuamente excludente, de um campo de escolha finito {1,2,3} ⊂ ℕ. Seja σi ∈ {1, 2, 3} a escolha (ou estado) do i-ésimo agente em um dado momento. Como veremos adiante, as escolhas representarão os preditores de inflação utilizados pelos agentes para prever a inflação mensal em cada período de tempo.

Mais precisamente, se σi=1, então o agente i está adotando o preditor estático. Por sua vez, σi = 2 se, indica que o i-ésimo agente utiliza o preditor adaptativo. Por fim, caso σi = 3, o agente i está utilizando o preditor VAR. Segundo Branch (2002, 66)Branch, William A. 2002. "Local convergence properties of a cobweb model with rationally heterogeneous expectations." Journal of Economic Dynamics and Control 27 (1): 63-85., estes três preditores representam uma ampla classe de funções de preditores e são os mais utilizados em modelos macroeconômicos. Como destaca o autor, ao utilizar-se o mecanismo VAR (modelo multivariado) para prever a inflação para o próximo período, os agentes buscam obter a melhor acurácia, porém haverá um custo relativamente alto para coletar e processar as informações. Por sua vez, no preditor adaptativo (modelo univariado com suavizações), os agentes utilizam de maneira ponderada a inflação passada e o custo de coletar as informações será menor. Por fim, no preditor estático (modelo univariado), a previsão de inflação é a última inflação observada.

Formalmente, os agentes que utilizam o preditor estático definem a inflação esperada em t baseado na inflação observada no período t −1:

(1) π t e = π t 1

Por sua vez, os agentes que adotam o preditor adaptativo utilizam-se do seguinte algoritmo para formação da inflação esperada em t:

(2) π t e = π t 1 e + μ π t 1 π t 1 e

no qual µ é o parâmetro que é estimado via mínimo quadrados recursivos, ou seja, é determinado como segue:

(3) μ = arg min 1 T i = 0 T π a , t i e π t i 2

sendo T o número de períodos da amostra.

Por fim, existem os agentes que estabelecem a inflação esperada baseados no VAR estrutural. Como ressalta Branch (2004)Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , o VAR é a melhor alternativa para representar a formação das expectativas racionais. Assim, ao se estimar a inflação por VAR, obtém-se a melhor previsão usando todas as informações relevantes e disponíveis. O modelo VAR estimado se assemelha ao praticado pelo Banco Central do Brasil (BCB) para previsões de inflação mensal, conforme consta no relatório de inflação divulgado pela instituição. Portanto, para utilizar o preditor VAR, os agentes incluem dados de inflação mensal livre e observada no período anterior à variação da taxa Selic real e a variação do câmbio nominal. Assim, a inflação esperada usando VAR é dada por:

(4) π t e = α + β 1 π t 1 l + β 2 π t 1 a + β 3 jr + β 4 cam + ε t

na qual α é a constante da regressão; π𝑙 é a inflação dos preços livres; πα é a inflação dos preços administrados; jr é a variação dos juros reais; cam é a variação da taxa cambial nominal; e εt é o resíduo da regressão.

A cada período de tempo t, o i-ésimo agente busca escolher a estratégia que apresenta maior utilidade total entre as possíveis estratégias do campo de escolha {1,2,3}. Seguindo a literatura de modelos de escolhas discretas, conforme exposto em Train (2003, 4)Train, Kenneth. 2003. Discrete choice models with simulation. Cambridge: Cambridge University Press., a escolha de cada agente ao longo do tempo possui um caráter probabilístico, baseada em suas preferências sobre o campo de escolha que podem ser representadas pela seguinte função utilidade aditiva:

(5) U σ i = U d σ i + ς σ i

qual Ud (σi) corresponde ao componente determinístico da utilidade e refere-se às motivações observáveis2 2 O termo Ud (σi) é uma função comum a todos os agentes submetidos ao mesmo campo de escolha e ambiente estratégico. Portanto, para dois agentes quaisquer i e j, se σi = σj, então Ud (σi) = Ud (σj). e ς(σi) representa o componente aleatório associado às motivações não observáveis do i-ésimo agente3 3 Para dois agentes quaisquer i e j, se σi = σj, pode-se ter (e possivelmente ter-se-á) ς(σi) ≠ ς(σj). . É este termo que torna a decisão individual de cada agente um fenômeno aleatório.

Uma vez definido o campo de escolha e a função utilidade de cada agente, pode-se tratar da tomada de decisão em si. Supondo que cada agente i é maximizador de utilidade, a alternativa σi ∈ {1, 2, 3} será uma escolha ótima se:

(6) U σ i U σ i ´ , σ ' 1 , 2 , 3

Usando (5), o critério de escolha (6) pode ser redefinido como segue:

(7) U d σ i U d σ i ´ ς σ i , σ ' 1 , 2 , 3

Em outros termos, a alternativa será uma escolha ótima para o i-ésimo agente caso o ganho líquido da parcela observável da função utilidade relacionada a esta escolha, dado por Ud (σi) ≥ Udi') não seja inferior aos ganhos líquidos não observáveis que o agente associa às demais escolhas σi '∈ {1,2,3}.

Desta forma, mesmo que a parcela da utilidade observada de uma estratégia σi seja maior que as utilidades observadas das outras duas estratégias, não necessariamente esta estratégia σi será a escolhida pelo i-ésimo agente. Isto pode ocorrer caso um dos incentivos não observáveis de pelo menos uma das outras duas estratégias assumir valores elevados, de tal maneira que a torne mais atrativa que a estratégia σi. Portanto, diante da presença do componente aleatório na escolha do i-ésimo agente, pode-se apenas estabelecer a probabilidade com a qual o agente irá escolher a estratégia σi ∈ {1, 2, 3}. Esta probabilidade, dadas as desigualdades (6) e (7), pode ser estabelecida como segue:

(8) Prob σ i = Prob U σ i U σ i ´ σ i ´ , = Prob ς σ ς σ i U d σ i U d σ i ´ σ i ' , = I ς σ ς σ i U d σ i U d σ i ' σ i ´ f ς d ς i ,

na qual f(ς⃗i) denota a função densidade de probabilidade conjunta do vetor de variáveis aleatórias ς⃗i = (ς(σi = 1), ς(σi = 2), ς(σi = 3)) e 𝐼[∙] é uma função indicadora, que assume o valor 1 se a desigualdade entre colchetes for verdadeira e zero caso contrário.

A utilidade determinística refere-se aos incentivos explícitos e observáveis de caráter privado, que no presente contexto estão associados ao grau de acurácia na previsão de inflação e aos custos médio dos preditores. Como adotado por Brock e Hommes (1997, 1062)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160. e Branch (2002, 67)Branch, William A. 2002. "Local convergence properties of a cobweb model with rationally heterogeneous expectations." Journal of Economic Dynamics and Control 27 (1): 63-85., a utilidade determinística do i-ésimo agente no período t pode ser expressa como segue:

(9) U d σ i , t = π i , t e π t 2 + C σ i , t

na qual Ci,t) é uma constante exógena, estritamente positiva, e representa o custo médio do preditor associado à escolha σi ∈ {1, 2, 3}. Este custo será igual para todos os agentes que utilizam o mesmo preditor, ou seja, C(σi,t) = Cj,t) ∀σi,tj,t.

Seguindo Lima e Silveira (2015, 1116 -1117)______. 2015. "Conquering credibility for monetary policy under sticky confidence." Revista Brasileira de Economia 69 (2): 251-261., considera-se que o custo individual de um dado preditor se distribui em torno do custo médio deste preditor. Mais precisamente, o componente ς(σi) representará a dispersão das habilidades cognitivas, e será tomado como variável aleatória independente e com a mesma distribuição de probabilidade de valores extremos. Portanto, se a realização da variável aleatória ς(σi) for positiva (negativa), isto significa que o custo total do i-ésimo agente ter adotado o preditor, dado por C(σi) + ς(σi), será maior (menor) que o custo médio do preditor, dado por C (σi) . Em outros termos, quando ς(σi) for positiva (negativa), o i-ésimo agente apresentará uma habilidade cognitiva menor (maior) do que a respectiva habilidade média da população.

Uma vez definida a utilidade do i-ésimo agente, chega-se à propensão à escolha da alternativa no período t, expressa como segue:

(10) Prob σ i , t = 1 1 + e β U d σ i , t 1 U d σ i , t 1 ´ + e β U d σ i , t 1 U d σ i ̂ , t 1 ´ ´

na qual σi,t −1, σ'i,t-1 e σ''î,t-1 representam as três alternativas distintas no período t −1. O processo de seleção de heurísticas baseado em (10) é o mesmo que o elaborado por Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160..

O parâmetro β em (10) é a intensidade de escolha dos agentes. Segundo Freitas (2003, 60)Freitas, Gustavo Gomes de. 2003. "Economia e sistemas complexos: interações sociais, dinâmicas emergentes e uma análise da difusão da internet na cidade de São Paulo." Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo., este parâmetro possui algumas propriedades interessantes do ponto de vista populacional. Quanto menor o valor assumido por este parâmetro, ceteris paribus, maior será o peso dos incentivos não observáveis sobre a propensão à escolha da alternativa pelo agente, isto é, quando β→0, as escolhas tornam-se equiprováveis, independente dos valores observados das utilidades determinísticas. Em outras palavras, considerando (10), quando β→0, ter-se-á Prob (σi) → 1/3. Por sua vez, quando β →∞, a alternativa que apresentar maior utilidade determinística será quase certamente a escolhida. Assim, caso β torne-se suficientemente grande, ter-se-á Prob(σi) →1 caso Udi) ≥ Udi), ∀ σ'i ≠ σi.

4. Implementação computacional e propriedades emergentes

4.1. Implementação computacional

Para implementar computacionalmente o modelo de escolha ternária exposto na seção 3, fez-se uso do software MatLab. Lembra-se que, a cada período de tempo t ∈ ℕ todos os agentes irão se deparar com o mesmo conjunto de três preditores, podendo cada um dos agentes adotar um, e somente um, destes preditores no início de cada período. Fixados os valores da intensidade de escolha e os custos médios dos preditores, no início de t = 1 as estratégias na população de agentes, composta por 144 indivíduos, foram distribuídas aleatoriamente até que cada um dos preditores fosse adotado por 1/3 dos agentes. Em seguida, as expectativas de inflação foram formadas de acordo com o preditor associado a cada agente, as quais, juntamente com a inflação observada no final de t =1, permitiram calcular as utilidades determinísticas em t =1 com base em (9).

Com as utilidades determinísticas obtidas em t =1 e usando-se (10), foram computadas as três propensões à escolha para cada um dos 144 agentes em t. Com base nestas, a escolha do preditor a ser utilizado em t = 2 por cada um dos agentes foi implementada computacionalmente como segue. A cada período ≥ utilizou-se o comando rand do MatLab para gerar um número aleatório r ∈ ℕ [0,1] ⊂ ℝ a partir de uma distribuição uniforme. Caso r ≤ Probi,t-1 = 1), o agente i adotará o preditor estático no período t; se Probi,t-1 = 1) < rProbi,t-1 = 1) Probi,t-1 = 2), o agente i adotará o preditor adaptativo em t; por último, caso r > Probi,t-1 =1)+ Probit,1 = 2) , o agente i adotará o preditor VAR em t. Aplicando-se este procedimento para todos os agentes, forma-se uma nova distribuição de preditores na população de agentes para o período t. Todo o procedimento aqui descrito foi aplicado em cada período t ≥ 2.

O modelo aqui proposto foi calibrado buscando-se uma combinação da intensidade de escolha e dos custos médios dos preditores que oferecesse o melhor grau de ajuste com respeito à série observada das expectativas de inflação do Boletim Focus. Mais precisamente, foram utilizadas as séries históricas da média e do desvio padrão das expectativas de inflação, obtidos do Banco Central do Brasil, para o período entre abril de 2000 a setembro de 2015, todos dados mensais, totalizando uma amostra de 187 observações.4 4 Os dados empíricos obtidos em http://www3.bcb.gov.br/expectativas/publico/consulta/serieestatisticas. Para maiores detalhes sobre o método de calibragem consulte DeJong e Dave (2011, cap. 6).

Utilizou-se a expectativa de inflação mensal do dia imediatamente após o anúncio da inflação do mês anterior. Por exemplo, se a inflação de março de 2000 foi divulgada em 8 de abril, a expectativa de inflação para abril será a divulgada pelo BCB no dia 9 de abril ou dia útil subsequente mais próximo. Desta forma, os agentes têm a possibilidade de reunir todas as informações necessárias para formular sua expectativa de inflação para o próximo período.

A calibragem realizada foi baseada na minimização da seguinte função-objetivo:

(11) t = 1 T M t o M t s 2 + D t o D t s 2 + γ 1 , t o γ 1 , t s 2 + γ 2 , t o γ 2 , t s 2

na qual T é o número de períodos; o subíndice t indica o período no qual cada variável está sendo avaliada; Mo é a média observada das expectativas de inflação; Ms é a média simulada das expectativas de inflação; Do é o desvio padrão observado das expectativas de inflação; Ds é o desvio padrão simulado das expectativas de inflação; γo é a autocorrelação observada de i-ésima ordem das expectativas de inflação; e γS é a autocorrelação simulada de i-ésima ordem das expectativas de inflação.

Com base no critério acima, utilizou-se da função fminsearch do MatLab para selecionar a melhor configuração de parâmetros que minimiza (11). Este algoritmo realiza uma busca finita da combinação de valores dos parâmetros que minimiza (11) com certo grau de tolerância, aqui fixado em 0,001. Dada a possibilidade de existência de mínimos locais da função-objetivo (11), buscou-se obter a melhor configuração inicial dos parâmetros a serem calibrados. A combinação inicial de parâmetros foi escolhida aleatoriamente no espaço de valores [0,20] × [0,3]3 ⊂ ℝ4, isto é, o parâmetro β pôde variar no intervalo [0, 20] ⊂ ℝ e os parâmetros de custos no intervalo [0,3] ⊂ ℝ. Posteriormente, utilizou-se de 100.000 diferentes combinações de parâmetros e foi escolhida a que gerou menor valor para a função-objetivo (11). A melhor configuração inicial dos parâmetros foi: β = 2,75; C (σi = 1) = 0,03; C(σi = 2) = 0,04; C (σi = 3) = 0,08. A partir desta configuração inicial, a combinação de parâmetros selecionados pela função fminsearch foi: β = 2,9730; Ci = 1) = 0,0125 ; Ci = 2) = 0,0417 e Ci = 3) = 0,0667.

Como o valor de β selecionado pelo processo de calibragem foi estritamente positivo, infere-se que, como esperado, acurácias e custos médios dos preditores afetam as escolhas das heurísticas de previsão dos agentes. Todavia, como o valor da intensidade de escolha foi finito, conclui-se que, diferentemente do caso de racionalidade plena, no qual o preditor com maior benefício líquido observado em um dado período seria adotado por toda a população de agentes, as decisões dos agentes não reagem instantaneamente diante de pequenas mudanças nas diferenças entre os benefícios líquidos observados das heurísticas (Branch 2004Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , 595).Por sua vez, os valores calibrados para os custos médios dos preditores indicam que o preditor estático é aquele que apresenta o menor custo médio, enquanto o preditor VAR é o que apresenta o maior custo médio. Portanto, os valores dos parâmetros obtidos na calibragem para os referidos custos corroboram a hipótese de hierarquia de custos dos preditores levantada no estudo de Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160.. Os autores afirmam que um preditor que demanda menos informações e menor capacidade para processar os dados do que outro preditor mais complexo será, em média, mais barato.

Na Tabela 1 encontram-se algumas estatísticas descritivas da série observada das expectativas de inflação do Boletim Focus, bem como as estatísticas da respectiva série simulada pelo modelo computacional calibrado. Observa-se que a série simulada apresenta estatísticas com valores próximos aos respectivos valores observados.

Tabela 1
Estatísticas das séries observada e simulada das expectativas de inflação

4.2. Propriedades agregadas emergentes

Para os próximos testes, salvo menção em contrário, os valores dos parâmetros obtidos na calibragem serão utilizados como referência para avaliar as propriedades emergentes do modelo. A primeira propriedade a ser avaliada é verificar se existe heterogeneidade nos preditores de inflação adotados pelos agentes. Esta propriedade pode ser verificada ao analisar como se comportam as heurísticas de previsão ao longo dos períodos da simulação. A Figura 1 apresenta a evolução das estratégias de previsão na população de agentes. Nela encontram-se duas curvas. A mais baixa representa a fração de agentes que utilizam o preditor estático. A curva intermediária representa a soma da fração de indivíduos que usam o preditor estático e a fração de indivíduos que adotam o preditor adaptativo. Assim, a diferença entre estas curvas fornece a fração de indivíduos que utilizam este último. Por sua vez, a diferença entre a reta paralela ao eixo das abcissas e que passa pelo eixo das ordenadas no ponto 1 e a curva superior dá a fração de agentes usando o preditor VAR.

Figura 1
Evolução da distribuição dos preditores

Ao analisar a Figura 1, observa-se que no período t =1, como informado na seção 4, cada preditor é utilizado na fração de 1/3 pela população de agentes. Posteriormente, verifica-se que a evolução da distribuição das estratégias varia suavemente e não se observa uma estratégia estritamente dominante. No entanto, existem períodos em que menos de 10 % dos agentes utilizam o preditor estático ou o preditor adaptativo e períodos em que todos os agentes utilizam estes mesmos preditores. A frequência média com que o preditor estático foi adotado pelos agentes ao longo da simulação foi de 34,69%. Por sua vez, o preditor adaptativo foi utilizado em média 32,38% das vezes e, por fim, nos 32,93% restantes das vezes o preditor VAR foi adotado.

A alta proporção de agentes adotando o preditor estático pode ser entendida considerando que este apresenta o menor custo médio. Além disso, este preditor é útil quando os dados apresentam baixo desvio padrão ou quando as variações na inflação ocorrem de maneira frequente e contínua. Levando em consideração o baixo valor encontrado para a média e o desvio padrão da inflação observada,5 5 A média e o desvio padrão da inflação mensal no período de 2000 a 2015 foram de 0,53 e 0,39, respectivamente. constata-se que o custo para obter e processar as informações não compensa o benefício em formar expectativas de maneira ótima, de maneira que uma boa parcela dos agentes acaba formulando suas expectativas inflacionárias utilizando informações defasadas (Branch 2004Branch, William A. 2004. "The theory of rationally heterogeneous expectations: evidence from survey data on inflation expectations." Economic Journal 114 (497): 592-621. , 613). Ademais, observa-se que existe heterogeneidade na distribuição dos mecanismos de inflação e a mesma é persistente e variante no tempo.

O próximo teste busca avaliar se a condição inicial de distribuição equitativa dos preditores na população de agentes não é a responsável direta pela heterogeneidade nos mecanismos de inflação mostrado na Figura 1. Para a realização deste teste, uma única estratégia é utilizada por todos os agentes no período t =1. As Figuras 2, 3 e 4 mostram a distribuição dos preditores quando a estratégia estática, adaptativa e VAR, respectivamente, são utilizadas por todos os agentes no período t =1 das simulações.

Figura 2
Evolução da distribuição dos preditores partindo da condição inicial na qual todos os agentes usam o preditor estático

Figura 3
Evolução da distribuição dos preditores partindo da condição inicial na qual todos os agentes usam o preditor adaptativo

Figura 4
Evolução da distribuição dos preditores partindo da condição inicial na qual todos os agentes usam o preditor VAR

Ao analisar as Figuras 2, 3 3 Para dois agentes quaisquer i e j, se σi = σj, pode-se ter (e possivelmente ter-se-á) ς(σi) ≠ ς(σj). e 4 4 Os dados empíricos obtidos em http://www3.bcb.gov.br/expectativas/publico/consulta/serieestatisticas. Para maiores detalhes sobre o método de calibragem consulte DeJong e Dave (2011, cap. 6). , observa-se que em todos os casos há heterogeneidade persistente no processo de formação de expectativa de inflação, isto é, todos os três mecanismos de previsão se fazem presentes ao longo das simulações. Portanto, independente da condição inicial, a heterogeneidade é uma característica inerente ao modelo elaborado.

No teste que segue, analisar-se-á como as distribuições médias dos preditores comportam-se com respeito ao parâmetro β, que mede a intensidade de escolha dos agentes. Este parâmetro assume valores positivos. Esperase que o parâmetro, ao assumiro valor zero e todos os demais parâmetros assumam os valores encontrados na calibragem, os valores das propensões à escolha tornem-se 1/3. Por sua vez, quando β assumir valores elevados, espera-se que a alternativa que apresentar melhor acurácia de previsão seja a escolhida pela maior parte dos agentes. Para a realização deste teste, foram geradas simulações com 187 passos para 101 valores equidistantes de β, começando em 0 e terminando em 100, e extraiu-se a média das últimas 50 observações de cada simulação. A Figura 5 apresenta os resultados obtidos destas 101 simulações.

Figura 5
Evolução média da distribuição dos preditores em função do parâmetro β

No que diz respeito à Figura 5, como era de se esperar, observa-se que quando β assume o valor zero, os três preditores são adotados de forma igualitária pela população de agentes, ou seja, cada preditor é adotado em média por 1/3 dos agentes no modelo. Por sua vez, quando β se eleva, os agentes passam a adotar o preditor VAR com maior frequência. Todavia, observa-se que a predominância do preditor VAR ocorre apenas quando o parâmetro β assume valores próximos a 100. Desta forma, o valor 2,9730 do referido parâmetro encontrado na calibragem é um indicativo da presença de heterogeneidade no processo de formação de expectativas de inflação.

No modelo elaborado, o preditor VAR é o que oferece a melhor acurácia de previsão, porém, devido ao custo de coletar e processar as informações para formar expectativas inflacionárias a ele associado, outros preditores podem ser utilizados de maneira ótima pelos agentes. Desta forma, o próximo teste busca avaliar se a hierarquia dos custos médio é a responsável pela presença persistente da heterogeneidade dos preditores de inflação. Para tanto, analisa-se a situação na qual qualquer um dos preditores pode ser utilizado sem custo. Os resultados do teste encontram-se sintetizados na Figura 6.

Figura 6
Evolução da distribuição dos preditores em função dos mecanismos serem adotados sem custo de formação

Ao analisar-se a Figura 6, observa-se que o preditor VAR é o mais adotado pelos agentes. A fração média que o preditor VAR é adotado pelos agentes ao longo da simulação é de 42%. Por sua vez, 31% dos agentes adotam o mecanismo de previsão adaptativo, enquanto os 29% restantes usam o preditor estático. Portanto, este resultado é um forte indicativo de que heterogeneidade é uma propriedade robusta do modelo computacional baseado em agentes elaborado.

5. Considerações finais

O presente estudo elaborou um modelo computacional baseado em agentes com a finalidade de avaliar a evolução da distribuição dos preditores de inflação em um ambiente no qual os agentes buscam escolher a melhor heurística de um conjunto finito de preditores possíveis. Os agentes, a cada período de tempo, podiam escolher entre o preditor estático, adaptativo ou VAR para formar expectativas de inflação mensal para o próximo período.

A utilização de cada heurística foi determinada por dois fatores, a saber, o desempenho passado de previsão do preditor menos seu custo médio de formação (atributos observáveis) e habilidades cognitivas específicas de cada agente para processar as informações (componente aleatório). Os resultados calibrados para os parâmetros do modelo mostraram que a hierarquia dos custos médios dos preditores encontrada no estudo de Brock e Hommes (1997)Brock, William A., and Cars H. Hommes. 1997. "A rational route to randomness." Econometrica 65: 1059-1160. se mantém no presente contexto, isto é, o preditor estático é o mais barato e o preditor VAR é o mais custoso. Posteriormente, observou-se que a evolução na distribuição dos preditores mostraram ser heterogêneas e variantes no tempo quando assumiu-se como condição inicial que cada preditor era utilizado por 1/3 da fração da população de agentes.

Em seguida, verificou-se que a distribuição equitativa dos preditores como condição inicial da simulação não era a responsável pela persistência da heterogeneidade da distribuição dos preditores ao longo da simulação. Ademais, na situação na qual os custos médio dos preditores são zerados, observou-se que o preditor VAR era o mais utilizado pelos agentes, seguido dos preditores adaptativo e estático. Portanto, a dispersão das habilidades cognitivas em si, no modelo proposto, é capaz de gerar heterogeneidade persistente de expectativas de inflação.

Considerando-se este resultado central, pode-se indagar se a persistência da heterogeneidade de heurísticas de previsão, gerada pela dispersão das habilidades cognitivas dos agentes, seria um obstáculo intransponível ao alcance de metas macroeconômicas preestabelecidas pelos formuladores de políticas econômicas com base em tecnologias de compromisso, como, por exemplo, o regime monetário de meta de inflação. Usando uma abordagem de jogos evolucionários, Silveira e Lima (2013)Silveira, Jaylson Jair da, and Gilberto Tadeu Lima. 2013. "Regime monetário de meta de inflação em um ambiente de heterogeneidade de estratégias de formação de expectativas de inflação." Estudos Econômicos 43 (2): 213-239., Lima e Silveira (2014)Lima, Gilberto Tadeu, Mark Setterfield and Jaylson Jair da Silveira. 2014. "Inflation targeting and macroeconomic stability with heterogeneous inflation expectations." Journal of Post Keynesian Economics 37 (2): 255-279. e Silveira e Lima (2015)______. 2015. "Conquering credibility for monetary policy under sticky confidence." Revista Brasileira de Economia 69 (2): 251-261. mostram, em contextos macroeconômicos distintos, que este não é o caso, ou seja, a situação em que todos os agentes escolhem individualmente usar a mesma heurística de previsão de inflação não é uma condição necessária para o alcance da meta de inflação, nem uma consequência inexorável do alcance desta meta. Seria interessante, portanto, analisar esta mesma questão usando o arcabouço ARED, tomando-se como ponto de partida o modelo computacional de formação de expectativas baseado em heurísticas aqui desenvolvido.

  • 1
    Para mais explicações sobre informações rígidas e suas implicações ver Sims (2003)Sims, Christopher A. 2003. "Implications of rational inattention." Journal of Monetary Economics 50 (3): 665-690. e Coibion e Gorodnichenko (2012Coibion, Olivier, and Yuri Gorodnichenko. 2012. "What can survey forecasts tell us about informational rigidities?" Journal of Political Economy 120 (1): 116-159., 2015)______. 2015. "Information rigidity and the expectations formation process: a simple framework and new facts." American Economic Review 105 (8): 2644-2678..
  • 2
    O termo Ud (σi) é uma função comum a todos os agentes submetidos ao mesmo campo de escolha e ambiente estratégico. Portanto, para dois agentes quaisquer i e j, se σi = σj, então Ud (σi) = Ud (σj).
  • 3
    Para dois agentes quaisquer i e j, se σi = σj, pode-se ter (e possivelmente ter-se-á) ς(σi) ≠ ς(σj).
  • 4
    Os dados empíricos obtidos em http://www3.bcb.gov.br/expectativas/publico/consulta/serieestatisticas. Para maiores detalhes sobre o método de calibragem consulte DeJong e Dave (2011, cap. 6)DeJong, David N., and Chetan Dave. 2011. Structural macroeconometrics. Princeton: Princeton University Press..
  • 5
    A média e o desvio padrão da inflação mensal no período de 2000 a 2015 foram de 0,53 e 0,39, respectivamente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2017

Histórico

  • Recebido
    24 Jun 2016
  • Aceito
    28 Abr 2017
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