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Eugenia e raça no pós-guerra: o periódico Mankind Quarterly e as teorizações da extrema-direita

Eugenics and Race in the Post-war: The Journal Mankind Quarterly and the Theories of the Far-Right

RESUMO

Este artigo tem por objetivo analisar a persistência da eugenia após o final da Segunda Guerra. Tendo como objeto o periódico Mankind Quarterly, fundado em 1960 nos Estados Unidos, buscaremos demonstrar como um tipo específico de projeto eugênico, centrado na ideia de raça, se propagou dentro da extrema-direita a partir da rede internacional, a qual contava com participantes de diversos continentes e apoiando inúmeras ideias, que incluíam supremacia branca, antissemitismo, anticomunismo, neonazismo e neofascismo. Também procuraremos abordar como tais questões contribuem para demonstrar a continuidade da eugenia e do conceito de raça no pós-segunda guerra, contrariando a linha que durante muito tempo foi predominante dentro da historiografia sobre esses dois temas.

Palavras-chave:
eugenia; raça; extrema-direita

ABSTRACT

The aim of this article is to analyze the persistence of eugenics after the end of the Second World War. Using as an object the periodical Mankind Quarterly, founded in 1960 in the United States, we will try to demonstrate how a specific type of eugenics project, centered on the idea of race, spread within the extreme right from the international network, which had participants from different continents and supported numerous ideas, including white supremacy, anti-Semitism, anti-communism, neo-Nazism and neo-fascism. We will also try to address how these issues contribute to demonstrating the continuity of eugenics and the concept of race in the post-Second World War period, contradicting the line that has long been predominant within historiography on these two subjects.

Keywords:
Eugenics; Race; Far Right

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, vem se ampliando o campo de estudos da história da Eugenia, especialmente no que diz respeito a sua propagação após o final da Segunda Guerra Mundial. Se anteriormente se acreditava que teria havido um declínio das teorias eugênicas após esse período, hoje cada vez mais autores (Kline, 2001KLINE, Wendy. Building a Better Race: Gender, Sexuality, and Eugenics from the Turn of the Century to the Baby Boom. Berkeley: University of California Press, 2001.; Schoen, 2005SCHOEN, Johanna. Choice and Coercion: Birth Control, Sterilization, and Abortion in Public Health and Welfare. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2005.; Bashford; Levine, 2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010.; Diwan, 2020DIWAN, Pietra Stefania. Entre Dédalo e Ícaro: cosmismo, Eugenia e genética na invenção do transhumanismo norte-americano (1939-2009). Tese (Doutorado em História Social) - Faculdade de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2020.; Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.; 2009TUCKER, William. The Cattell Controversy: Race, Science and Ideology. Champaign: University of Illinois Press, 2009.; Schaffer, 2008SCHAFFER, Gavin. Racial Science and British Society (1930-62). London: Palgrave Macmillan , 2008.; Dowbiggin, 2008DOWBIGGIN, Ian Robert. The Sterilization Movement and Global Fertility in the Twentieth Century. Oxford: Oxford University Press , 2008.; Ramsden, 2009RAMSDEN, Edmund. Confronting the Stigma of Eugenics: Genetics, Demography and the Problems of Population. Social Studies of Science, n. 39, v. 6, pp. 853-884, 2009.; Stern, 2016STERN, Alexandra Minna. Eugenic Nation: Faults and Frontiers of Better Breeding in Modern America. Oakland: University of California Press, 2016.) têm demonstrado sua persistência e reconfiguração dentro do novo contexto que se forma nas décadas após o fim do conflito bélico. Nosso artigo se insere nessa nova linha interpretativa, de forma a compreender a propagação de determinadas ideias eugênicas dentro da extrema-direita, especialmente nos Estados Unidos, a partir do periódico Mankind Quarterly.

Publicada pela primeira vez em 1960 em Edimburgo, na Escócia, onde residia o seu editor-chefe, o antropólogo Robert Gayre of Gayre (1907-1996), a revista mantém suas atividades até hoje. Segundo o próprio site, desde a sua fundação, a Mankind Quarterly dedicou-se ao “estudo interdisciplinar do homem” enquanto espécie, tendo adquirido, historicamente, uma reputação “for publishing articles in controversial areas, including behavioral race differences and the importance of mental ability for individual outcomes and group differences”. Atualmente, “most of the research that the Mankind Quarterly publishes today is ‘normal’ science, but the editors still welcome controversy and new ideas. They see it as part of the journal’s mission to provide a forum for the presentation and discussion of theories and empiric research that challenge entrenched beliefs” (Editorial Panel, [s.d.]EDITORIAL PANEL. [s.d.]. Disponível em: Disponível em: https://mankindquarterly.org/about . Acesso em: 15 mar. 2023.
https://mankindquarterly.org/about...
). Apesar dessas declarações, muito do seu conteúdo ainda tem como foco questões relacionadas à existência de diferenças raciais e de questões relacionadas à eugenia. Nesse artigo, nossa análise se concentrará nas primeiras décadas de existência da Mankind Quarterly.

RAÇA E EUGENIA NO PÓS-1945: UMA BREVE DISCUSSÃO HISTORIOGRÁFICA

Durante muito tempo, 1945 representou um marco importante tanto nos estudos sobre a história do pensamento eugênico quanto das teorias raciais. De acordo com autores que representaram importantes referências na área, como Stepan (1982STEPAN, Nancy. The Idea of Race in Science: Great Britain 1800-1960. London: Palgrave Macmillan , 1982., 2005STEPAN, Nancy Leys. A hora da Eugenia: raça, gênero e nação na América Latina. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2005.) Barkan (1992BARKAN, Elazar. The Retreat of Scientific Racism: Changing Concepts of Race in Britain and the United States Between the World Wars. Cambridge: Cambridge University Press, 1992.), Stocking (1982STOCKING, George, Jr. Race, Culture, and Evolution: Essays in the History of Anthropology. Chicago: The University of Chicago Press, 1982.) e Kevles (1995KEVLES, Daniel J. In the Name of Eugenics: Genetics and the Uses of Human Heredity. Cambridge: Harvard University Press, 1995.), a associação de ambas as ciências com os horrores perpetrados durante o Holocausto foi o bastante para pôr fim a essas duas áreas, cujo processo de declínio já havia começado na década anterior.

Raça e eugenia teriam, portanto, se tornado tabus e sido rechaçadas, especialmente após os julgamentos de Nuremberg. Sociedades, que antes carregavam orgulhosamente o nome da ciência galtoniana em seus nomes, teriam escolhido termos que carregassem menos estigma, como genética populacional ou hereditariedade para designar suas atividades (Black, 2003). Já os estudos raciais teriam sido completamente abolidos, e o conceito de raça enquanto forma de explicar as variações biológicas entre seres humanos teria dado lugar aos estudos culturais e étnicos da antropologia (Stepan, 1982STEPAN, Nancy. The Idea of Race in Science: Great Britain 1800-1960. London: Palgrave Macmillan , 1982.; Stocking, 1992STOCKING, George, Jr. Race, Culture, and Evolution: Essays in the History of Anthropology. Chicago: The University of Chicago Press, 1982.). As Declarações sobre Raça da UNESCO1 1 A Declaração sobre Raça nasceu de uma de uma iniciativa do Social Sciences Department da UNESCO no ano de 1949, que tinha por objetivo debater as implicações sociais da ciência em questões relacionadas à raça. Segundo Selcer (2012): “The statements responded to UNESCO’s constitutional mandate to fight ‘the doctrine of the inequality of men and races’ and a call from the UN Economic and Social Council to disseminate scientific facts disproving racial prejudice” (p. 173). Ao todo, quatro Declarações foram emitidas: Statement on Race (1950), Statement on the nature of race and race differences (1951), Proposals on the biological aspects of race (1964) e Statement on race and racial prejudice (1967). (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) simbolizariam essa transformação, pois representariam o repúdio da comunidade científica ao emprego de categorias raciais como forma de representação das diferenças humanas (Stepan, 1982STEPAN, Nancy. The Idea of Race in Science: Great Britain 1800-1960. London: Palgrave Macmillan , 1982.).

Essa tendência pode ser verificada no recorte de muitas das pesquisas sobre história da eugenia e das teorias raciais2 2 Embora as teorias raciais e a eugenia compartilhem uma parte significativa de sua história, havendo um entrelaçamento significativo entre ambas, elas não podem ser tratadas como sinônimos. Primeiro, porque se trata de teorias diferentes, com objetivos distintos. Enquanto a eugenia tem, em seu cerne, o objetivo do melhoramento da coletividade, e sua existência enquanto ciência data do final do século XIX, os estudos raciais são bem anteriores, tendo se iniciado por volta do século XVIII, com os trabalhos de Carl Linnaeus (1707-1778), Charles White (1728-1813), Conde de Buffon (1707-1788) e Johann Blumenbach (1752-1840). Esses primeiros trabalhos buscaram classificar e separar os seres humanos a partir de diferentes classes taxonômicas, com base em características comuns ou a partir de sua origem evolutiva. Uma parte significativa desses estudos raciais acabou sendo classificada como “racismo científico” pela historiografia, devido ao fato de que pressupunham uma hierarquia entre os grupos, na qual o europeu branco ocupava a posição mais elevada. Ainda que muitas dessas ideias sobre raça tenha servido de sustentação para projetos eugênicos, nem todo o teórico racial buscou, necessariamente, atrelar sua teoria a um propósito eugenista. . Poucas, de fato, ultrapassam a década de 1940. Afinal, se ambas seguem uma temporalidade semelhante, que situa seu declínio após 1945, por que investigar períodos posteriores?

Nas últimas duas décadas, no entanto, tem crescido o número de estudos que passaram a questionar esse tipo de narrativa. Tal modelo, que traça um corte bem definido para a derrocada da ciência racial, tem sido criticado por alguns estudiosos, como Gavin Schaffer (2008SCHAFFER, Gavin. Racial Science and British Society (1930-62). London: Palgrave Macmillan , 2008.), Jenny Reardon (2005REARDON, Jenny. Race to the Finish: Identity and Governance in an Age of Genomics. Princeton: Princeton University Press, 2005.), Perrin Selcer (2012SELCER, Perrin. Beyond the Cephalic Index: Negotiating Politics to Produce UNESCO’s Scientific Statements on Race. Current Anthropology, v. 53, suppl. 5, pp. 173-184, April 2012.), Michelle Brattain (2007BRATTAIN, Michelle. Race, Racism, and Antiracism: UNESCO and the Politics of Presenting Science to the Postwar Public. The American Historical Review, v. 112, n. 5, pp. 1386-1413, 2007.), Diane Paul (2016PAUL, Diane B. Reflections on the Historiography of American Eugenics: Trends, Fractures, Tensions. Journal of the History of Biology, n. 49, v. 4, pp. 641-658, 2016.), entre outros. Para eles, além de possuir uma série de fragilidades, essa perspectiva atua como um elemento limitador das pesquisas sobre o tema.

Reardon (2005REARDON, Jenny. Race to the Finish: Identity and Governance in an Age of Genomics. Princeton: Princeton University Press, 2005.), por exemplo, argumenta que essa noção de apogeu e declínio, fundamental para o que ela classifica como “the canonical narrative of the history of race and science” (p. 22), “truncates history and removes from critical view a major site for the construction and reconstruction of race following World War II: the life sciences” (p. 23).

Os estudos de William Tucker (2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.; 2009TUCKER, William. The Cattell Controversy: Race, Science and Ideology. Champaign: University of Illinois Press, 2009.), Andrew Winston (1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.; 2020), Gavin Schaffer (2008SCHAFFER, Gavin. Racial Science and British Society (1930-62). London: Palgrave Macmillan , 2008.), Michael E. Staub (2018STAUB, Michael E. The Mismeasure of Minds: Debating Race and Intelligence between Brown and The Bell Curve. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 2018.) e John P. Jackson Jr. (2005JACKSON, John P., Jr. Science for Segregation: Race, Law, and the Case against Brown v. Board of Education. New York: NYU Press, 2005.; 2023JACKSON, John P., Jr. Arthur Jensen. Evolutionary Biology, and Racism. History of Psychology, n. 26, v. 1, pp. 1-28, 2023.) também apontam que áreas como a psicologia e antropologia física têm sido negligenciadas dentro do debate sobre raça e eugenia, uma vez que esses campos de conhecimento também foram responsáveis pela propagação de tais ideias, especialmente dentro do campo da psicometria, nos estudos de inteligência e personalidade conduzidos por figuras como Henry Garrett (1894-1973), Arthur Jensen (1923-2012), Hans Eysenck (1916-1997), Raymond Cattell (1905-1998), John Philippe Rushton (1943-2012) e Richard Lynn (1930-).

Isso ocorre porque, ao tratar as teorias raciais e eugênicas como uma espécie de entidade homogênea, cuja ascensão e queda podem ser identificadas de imediato e mapeadas de forma clara e precisa, provoca-se um corte abrupto na história, deixando de fora importantes debates ocorridos no pós-Segunda Guerra e nos impedindo de perceber como o abandono (quando houve) dessas ideias se deu de forma desigual em diferentes áreas de conhecimento. Além disso, esse tipo de visão negligencia importantes transformações, tanto no significado quanto nos usos das teorias raciais e eugênicas dentro do vocabulário científico, e que permitiram que esses termos continuassem sendo empregados e considerados como formas válidas e legítimas de classificação e conhecimento.

Mesmo a noção de que tenha havido um fim e posterior “renascimento” dessas ciências nas décadas de 1960 apresenta o mesmo tipo de inconsistência. Primeiro porque a premissa central na qual ela se baseia - isto é, de que houve uma rejeição completa da eugenia e dos modelos raciais no final da década de 1940, seja pela associação negativa de ambas as ciências com o Holocausto e com a rassenhygiene alemã, seja porque as antigas noções tipológicas deram lugar a novas concepções de população, trazidas pela teoria sintética da evolução - não resiste a uma análise mais cuidadosa de alguns dos debates intelectuais que ocorreram durante e após o final da Segunda Guerra.

A ideia de que o conceito de raça foi abandonado estava longe de ser um consenso, e muitos ainda continuavam acreditando que o termo continuava sendo uma forma válida de classificar populações ou grupos humanos possuidores de características similares. Além disso, questionamentos sobre a existência ou não de traços raciais ainda povoavam os debates intelectuais do período. Havia, por um lado, aqueles que defendiam a existência de características intelectuais e psicológicas inatas3 3 Conforme podemos observar nos trabalhos de Selcer (2012), Schaffer (2008), Reardon (2005) e Maio & Santos (2015), os documentos produzidos durante a elaboração das Declarações sobre Raça da UNESCO são um ótimo registro de como ainda havia cientistas que defendiam a existência de traços inatos, ainda que fossem favoráveis ao desmantelamento de políticas de discriminação e segregação, como as existentes no sul dos Estados Unidos e na África do Sul. Para eles, o princípio de igualdade jurídica não deveria ser dependente do pressuposto da existência de uma igualdade biológica. Os biólogos Julian Huxley (1887-1975), Leslie Clarence Dunn (1893-1974) e Theodozius Dobzhansky (1900-1975) são exemplos desse tipo de visão. No entanto, o adendo publicado juntamente com a segunda Declaração, emitida em 1951, demonstra que nem mesmo a mensagem principal de repúdio às políticas racistas era compartilhada por todos. Os geneticistas Cyril Dean Darlington (1903-1981) e Ronald Fisher (1890-1962), e o antropólogo Carleton Coon (1904-1981), por exemplo, se manifestaram completamente contrários às proposições apresentadas no texto. Cientistas alemães, como o médico e antropólogo Eugen Fischer (1874-1967) e o geneticista Fritz Lenz (1887-1976), ambos importantes referências da eugenia e da higiene racial nazista, também registraram seu repúdio (UNESCO, 1952). , enquanto outros argumentavam que tais variações eram resultado da influência de fatores como cultura e ambiente, descartando a possibilidade de que houvesse um fundo genético nelas (Selcer, 2012SELCER, Perrin. Beyond the Cephalic Index: Negotiating Politics to Produce UNESCO’s Scientific Statements on Race. Current Anthropology, v. 53, suppl. 5, pp. 173-184, April 2012.; Schaffer, 2008SCHAFFER, Gavin. Racial Science and British Society (1930-62). London: Palgrave Macmillan , 2008.; Reardon, 2005REARDON, Jenny. Race to the Finish: Identity and Governance in an Age of Genomics. Princeton: Princeton University Press, 2005.; Maio; Santos, 2015MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo Ventura. Antiracism and the Uses of Science in the Post-World War II: An Analysis of UNESCO’s First Statements on Race (1950 and 1951). Vibrant: Virtual Brazilian Anthropology, n. 12, v. 2, pp. 1-26, 2015.).

Assim como raça, as propostas eugênicas também não desapareceram do vocabulário científico no pós-guerra. Julian Huxley, em seu primeiro discurso como diretor da UNESCO em 1946, atribuía à Eugenia um papel essencial dentro das incumbências da recém-fundada organização:

Biological inequality is, of course, the bedrock fact on which all of eugenics is predicated. But it is not usually realized that the two types of inequality have quite different and indeed contrary eugenic implications. The inequality of mere difference is desirable, and the preservation of human variety should be one of the two primary aims of eugenics. But the inequality of level or standard is undesirable, and the other primary aim of eugenics should be the raising of the mean level of all desirable qualities. While there may be dispute over certain qualities, there can be none over a number of the most important, such as a healthy constitution, a high innate general intelligence, or a special aptitude such as that for mathematics or music.

At the moment, it is probable that the indirect effect of civilization is dysgenic instead of eugenic; and in any case it seems likely that the dead weight of genetic stupidity, physical weakness, mental instability, and disease-proneness, which already exist in the human species, will prove too great a burden for real progress to be achieved. Thus even though it is quite true that any radical eugenic policy will be for many years politically and psychologically impossible, it will be important for Unesco to see that the eugenic problem is examined with the greatest care, and that the public mind is informed of the issues at stake so that much that now is unthinkable may at least become thinkable (Huxley, 1946HUXLEY, Julian. UNESCO: It’s Purpose and Philosophy. 1946. Disponível em: Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0006/000681/068197eo.pdf . Acesso em: 2 jan. de 2023.
http://unesdoc.unesco.org/images/0006/00...
, p. 21).

A constatação de que fatores como inferioridade intelectual, instabilidade mental, fraqueza física e propensão a doenças constituíam empecilhos ao progresso, e a proposição de que a UNESCO atuasse no sentido de examinar o problema eugênico e informar o público sobre essas questões, para que políticas públicas voltadas para sanar esses males pudessem se tornar uma realidade possível, não causou a comoção que se deveria esperar entre seus pares caso a Eugenia tivesse se tornado um tabu nesse período. De acordo com a historiadora Alison Bashford, tais declarações geraram menos controvérsia do que a posição de Huxley referente a assuntos como, por exemplo, o controle de natalidade e a gestão populacional (Bashford; Levine, 2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010., p. 163).

Esse desejo por uma busca por soluções eugênicas não foi um ato isolado de Huxley dentro da UNESCO. Em 1950, Alva Myrdal, então chefe da Social Science Division, liderou um projeto que buscava investigar a relação entre fertilidade e inteligência. O estudo, intitulado Diferential Fertility and its Effects on the Intelligence of the Population Stock, foi uma das principais contribuições da UNESCO à World Population Conference, realizada em Roma e apoiada pela ONU no ano de 1954 (Bashford; Levine, 2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010.).

A equipe selecionada por Myrdal para trabalhar em sua pesquisa contava com alguns dos principais cientistas que estudavam Eugenia e Genética no período, como Cedric Oswald Carter, secretário da Eugenics Society de Londres, e John Alexander Fraser Roberts, médico geneticista cujos trabalhos sobre hereditariedade em seres humanos levaram-no a ser um dos pioneiros na área de aconselhamento e planejamento genético. Conforme Bashford (Bashford; Levine, 2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010.), os trabalhos do grupo retornavam (ou ao menos representavam uma continuidade) ao que chamou de “projeto eugênico original”, ou seja, “classbased studies on differential fertility and intelligence” (p. 163).

Também não é correta a afirmação de que houve uma mudança imediata no nome de periódicos e sociedades eugênicas logo após 1945. Muitas dessas publicações, voltadas para o estudo da ciência eugênica, continuaram a ser editadas nas décadas que se seguiram ao fim do conflito, bem como novas revistas do gênero continuaram a ser criadas, sem que a palavra “Eugenia” deixasse de ser estampada em seus títulos. Entre eles, podemos citar a Eugenics Quarterly, cujas publicações iniciaram em 1954, ou mesmo a Bulletin of the Eugenics Society, criada em 1969. A primeira conservou seu nome até 1969. Já a segunda permaneceu com o mesmo título até 1983, quando se tornou Biology and Society: The Journal of Eugenics Society, e assim manteve-se até a sua extinção na década de 1990. Outro exemplo é a Eugenics Review (1909-1968), periódico oficial da Eugenics Society (atualmente atuando sob o nome de Galton Institute), que continua sua publicação até hoje como Journal of Biosocial Science. De acordo com Bashford, essa mesma instituição continua oferecendo seminários regulares e publicando volumes sobre questões relacionadas à questão populacional (Bashford; Levine, 2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010., p. 542).

Algumas das leis eugênicas aprovadas no início do século XX continuaram em vigor durante a segunda metade do século XX, muitas delas tendo sido revogadas apenas em meados da década de 1970. Nos Estados Unidos, por exemplo, os estados da Vigínia e da Califórnia anularam a legislação referente à esterilização compulsória somente em 1967 e 1979, respectivamente. Já na Carolina do Norte, embora o Eugenics Board tenha sido dissolvido em 1977, as leis propriamente ditas só forma extinguidas em 2003. No Canadá, as províncias de Alberta e British Columbia mantiveram seus códigos até 1972 e 1973. Na Suécia, até 1975. Casos similares foram verificados na Noruega, na Áustria, na Dinamarca, na Finlândia e na Bélgica. Conforme demonstraram Schoen (2005SCHOEN, Johanna. Choice and Coercion: Birth Control, Sterilization, and Abortion in Public Health and Welfare. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2005.) e Dowbiggin (2008DOWBIGGIN, Ian Robert. The Sterilization Movement and Global Fertility in the Twentieth Century. Oxford: Oxford University Press , 2008.), inúmeras mulheres continuaram sendo esterilizadas no contexto pós-segunda guerra. Os eugenistas, sob o argumento de que era preciso controlar a população, especialmente de nações mais pobres, apoiaram a implementação de programas de controle de natalidade em países como Índia, Porto Rico, Brasil.

A história das discussões sobre raça e Eugenia não se encerram, portanto, no pós-Segunda Guerra. Isso não significou, no entanto, que o contexto não tenha provocado mudanças na forma como a questão foi discutida, nem que o prestígio que tais ciências ocupavam na primeira metade do século XX tenha permanecido o mesmo. O período que se sucede ao fim do conflito bélico é de intensa reformulação e rearticulação dos debates em torno de questões relacionadas ao estudo da diversidade humana e ao papel da Eugenia.

Para a historiadora Wendy Kline (2001KLINE, Wendy. Building a Better Race: Gender, Sexuality, and Eugenics from the Turn of the Century to the Baby Boom. Berkeley: University of California Press, 2001.), a “era de ouro” da eugenia se situou num período no qual muitos trabalhos situam que a ciência galtoniana havia desaparecido (p. 156). Segundo ela, o baby boom dos anos 1950 e o contexto da Guerra Fria criaram um terreno fértil em que os eugenistas puderam atuar. Seu espaço de influência e vias de ação não se limitaram apenas a um determinado campo. Conforme podemos observar por meio de estudos como os de Kline (2001KLINE, Wendy. Building a Better Race: Gender, Sexuality, and Eugenics from the Turn of the Century to the Baby Boom. Berkeley: University of California Press, 2001.), Schoen (2005SCHOEN, Johanna. Choice and Coercion: Birth Control, Sterilization, and Abortion in Public Health and Welfare. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2005.), Dowbiggin (2008DOWBIGGIN, Ian Robert. The Sterilization Movement and Global Fertility in the Twentieth Century. Oxford: Oxford University Press , 2008.), Diwan (2020DIWAN, Pietra Stefania. Entre Dédalo e Ícaro: cosmismo, Eugenia e genética na invenção do transhumanismo norte-americano (1939-2009). Tese (Doutorado em História Social) - Faculdade de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2020.), Tucker (2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.; 2009) e Bashford & Levine (2010BASHFORD, Alison; LEVINE, Phillipa (Eds.). The Oxford Handbook of the History of Eugenics. Oxford: Oxford University Press, 2010.), o pensamento eugênico assumiu formas bastante variadas tanto em termos de propostas quanto de visões políticas.

A International Association for the Advancement of Eugenics e Ethnology (IAAEE) e o periódico Mankind Quarterly vão se inserir nesse cenário como representantes de uma linhagem de eugenia focada na questão racial, no controle de grupos considerados intelectualmente inferiores e no incentivo daqueles identificados como mentalmente superiores. Criados nos anos de 1959 e 1960, respectivamente, nos Estados Unidos, como uma reação não só às declarações sobre raça da UNESCO, mas também ao processo de dessegregação escolar iniciado a partir da decisão da Suprema Corte americana em Brown v. Board of Education (1954), o IAAEE e a Mankind Quarterly foram capazes de articular uma rede internacional de pesquisadores especializados na questão racial e na promoção das ideias eugênicas, com estreitos laços com indivíduos e organizações de extrema-direita4 4 A terminologia aqui utilizada é baseada no conceito de far-right, do cientista político Cas Mudde. Segundo Mudde (2018, 2019), a far right se define por sua atitude anti-sistema e hostilidade aos valores da democracia liberal. Ela pode ser dividida em dois grandes subgrupos: “The extreme right rejects the essence of democracy, that is, popular sovereignty and majority rule. The most infamous example of the extreme right is fascism, which brought to power German Führer Adolf Hitler and Italian Duce Benito Mussolini, and was responsible for the most destructive war in world history. The radical right accepts the essence of democracy, but opposes fundamental elements of liberal democracy, most notably minority rights, rule of law, and separation of powers. Both subgroups oppose the postwar liberal democratic consensus, but in fundamentally different ways. While the extreme right is revolutionary, the radical right is more reformist. In essence, the radical right trusts the power of the people, the extreme right does not” (Mudde, 2019, p. 26). de diversas partes do mundo, como Inglaterra, França, Escócia, África do Sul, Índia, Japão, entre outros. Conforme demonstram Kühl (2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013.), Tucker (2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.) e Winston (1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.), será essa estrutura organizada e mantida pelo dinheiro do Pioneer Fund5 5 De acordo com Lombardo (2002), o Pioneer Fund, entidade criada pelo magnata Wickliffe Draper (1891-1972), tem um longo histórico de financiar pesquisas, publicações e propaganda sobre assuntos relacionados a “hereditariedade e eugenia” e “melhoramento racial”. O Pioneer também deu suporte a inúmeros trabalhos que visavam demonstrar que inteligência e personalidade eram geneticamente e racialmente determinados. Tucker (2009) igualmente aponta que a fundação também atuou no sentido de financiar processos e leis que visassem a manutenção da segregação racial nos Estados Unidos e do status da população afro-americana como cidadã de segunda classe. que formará a base para o ressurgimento, na década de 1970, das pesquisas voltadas à existência de diferenças de intelecto e personalidade entre raças.

Foi na psicologia, especialmente na área da psicometria, que os membros do IAAEE e os editores e autores da Mankind Quarterly fundamentaram seus conceitos de raça e muitas de suas propostas eugênicas. Os testes de QI, por exemplo, eram bastante citados como indicativos de que havia uma grande disparidade no nível intelectual entre brancos e negros, e trabalhos como o da psicóloga Audrey Shuey, The Testing of Negro Intelligence (1958), e os resultados obtidos por meio de Army Alpha test e Army Beta test6 6 Testes de inteligência, desenvolvidos pelo psicólogo americano Robert Yerkes, em conjunto com W. V. Bingham, Henry H. Goddard, T. H. Haines, Lewis Terman, Guy Montrose Whipple e F. L. Wells. , aplicados aos recrutas do exército americano durante a Primeira Guerra Mundial, eram bastante citados como referências.

Para os psicólogos que escreviam e integravam o corpo editorial da Mankind Quarterly, o QI era uma medida fixa e imutável do intelecto de uma pessoa, sendo determinada majoritariamente por fatores hereditários e raciais. O ambiente e a educação, embora pudessem exercer alguma influência na melhoria dessa medida, eram vistos como tendo uma atuação bastante limitada. Tal entendimento também era aplicado ao estudo da personalidade, de forma que certos traços eram apontados como sendo característicos de determinadas raças. Isso fez com que apresentassem pesadas críticas não só às Declarações sobre Raça da UNESCO, mas também a autores como Franz Boas (1858-1942), Ashley Montagu (1905-1999), Otto Klineberg (1899-1992) e Juan Comas (1900-1979), cujos trabalhos afirmavam que as diferenças entre raças eram devido a influências ambientais e não a caracteres inatos. A partir de tais ideias, defendiam projetos políticos e políticas públicas destinadas à manutenção de segregação racial não só nos Estados Unidos, mas também na África do Sul, argumentavam sobre os malefícios da miscigenação, advogavam em favor de programas destinados ao controle populacional e à restrição de natalidade de grupos considerados intelectualmente inferiores. Entre os psicólogos que compuseram o corpo editorial da Mankind Quarterly ou receberam apoio do Pioneer Fund, destacam-se Henry Garrett (1994-1973), Arthur Jensen (1923-2012), Hans Eysenck (1916-1997), Raymond Cattell (1905-1998), John Philippe Rushton (1943-2012) e Richard Lynn (1930-2023). Tendo isso em vista, acreditamos que a revista se torna um espaço importante para analisarmos não só a manutenção do ideário eugenista e das teorias sobre raça no período pós-guerra, mas também a organização do movimento eugênico a partir de diferentes espaços, de forma a ressaltar a diversidade das discussões e dos projetos de eugenia do período pós-guerra.

A MANKIND QUARTERLY: CRIAÇÃO, CONTEÚDO E PRINCIPAIS IDEIAS

Fundada em 1960, pelos membros da International Association for the Advancement of Ethnology and Eugenics, e financiada com dinheiro do Pioneer Fund, a Mankind Quarterly espelhava a agenda de pesquisa de seus fundadores, ainda que não se apresentasse como periódico oficial da instituição.

Encabeçada pelo antropólogo Robert Gayre (1907-1996), o geneticista e eugenista Reginald Ruggles Gates (1882-1962) e o psicólogo Henry Garrett, a revista contava ainda com a participação de pesquisadores interessados em temas ligados à raça, bem como eugenistas e membros de grupos de extrema-direita. Na sua primeira década de existência, o seu corpo editorial foi composto por pessoas como o estatístico Corrado Gini (1884-1965), presidente da Latin International Federation of Eugenic Societies e fundador do Italian Committee for the Study of Population Problems, o psiquiatra e geneticista Torsten Sjogren (1896-1974), membro da extinta International Federation of Eugenic Organizations, o geneticista Luigi Gedda (1902-2000) e o antropologista Sergio Sergi (1878-1972), integrantes do movimento eugênico italiano, o médico nazista Otmar von Verschuer (1896-1969), o geneticista e integrante da American Eugenics Society Clarence P. Oliver (1898-1991), o antropólogo neonazista e fundador da Northern League Roger Pearson (1927-), a psicóloga Audrey Shuey (1900-1977), autora do livro The Testing of Negro Intelligence, Sir Charles Galton Darwin (1887-1962), físico e membro da Eugenics Society, bem como o professor de filosofia e psicologia e defensor das leis de segregação Herbert Charles Sandborn (1873-1967).

A Mankind Quarterly, a IAAEE e o Pioneer Fund funcionavam de forma coordenada, compartilhando um projeto intelectual que envolvia a promoção de teorias raciais e da eugenia. Devido a essa grande proximidade, não é possível falarmos sobre o periódico sem mencionarmos essas duas entidades.

O Pioneer Fund foi a primeira dessas instituições a serem criadas. Foi ele que forneceu meios para a viabilização do IAAEE e da Mankind Quarterly. Idealizado pelo magnata americano Wickliffe Preston Draper, o fundo foi registrado em 1937, nos Estados Unidos, como uma organização sem fins lucrativos, cujos objetivos centrais eram: 1- fornecer incentivos financeiros que auxiliassem a educação de crianças brancas e de descendência europeia, com o intuito de encorajar os pais a terem mais filhos e, assim, auxiliarem na melhoria da população americana; 2- proporcionar meios para a realização de estudos e pesquisas sobre eugenia, melhoramento racial ou que apontassem soluções para resolver os problemas da hereditariedade da raça humana, além de promover o avanço do conhecimento e a divulgação de informações relativas a temas ligados a hereditariedade e eugenia (Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.).

De acordo com Lombardo, os estatutos da entidade traduziam não só os ideais que eram caros a Draper, e que este buscou promover ao longo se sua vida, mas também de seu primeiro presidente, o eugenista Harry Laughlin (1880-1943) (Lombardo, 2002LOMBARDO, Paul. “The American Breed”: Nazi Eugenics and the Origins of the Pioneer Fund. Albany Law Review, n. 65, v. 3, pp. 743-830, 2002.). Inspirado pela eugenia nazista, bem como pelas ideias de Madison Grant (1865-1937) e pelo projeto de repatriação defendido pelo ativista político Earnest Sevier Cox (1880-1966) e pelo senador Theodore Bilbo (1877-1947), o “arcanjo da supremacia branca”, que pretendia financiar a volta da população afro-americana para o recém-criado Estado da Libéria, Draper e Laughlin formularam os estatutos do Pioneer Fund. Por meio dele, o magnata financiou uma série de projetos que tinham por objetivo comprovar cientificamente a superioridade dos brancos perante outras raças, de forma que esse conhecimento pudesse servir de base para a criação de políticas públicas voltadas à manutenção da pureza e do melhoramento dessa população (Lombardo, 2002LOMBARDO, Paul. “The American Breed”: Nazi Eugenics and the Origins of the Pioneer Fund. Albany Law Review, n. 65, v. 3, pp. 743-830, 2002.; Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.).

Já a International Association for the Advancement of Ethnology and Eugenics (IAAEE) foi criada em 1959, também nos Estados Unidos, durante o período de luta pelos direitos civis e da mobilização de uma “resistência massiva” nos estados do sul, após a Suprema corte americana ordenar a integração das instituições de ensino público em Brown v. Board of Education, no ano de 1954. A IAAEE apresentava-se como um espaço dedicado a financiar, promover, publicar e disseminar pesquisas relacionadas ao “desenvolvimento ideal” de pessoa, raças e grupos culturais e étnicos por meio de ciências como a genética, a eugenia, a etnologia, a antropologia, a psicologia, a história, a pré-história, a arqueologia, a geografia demográfica e a ecologia humana. De acordo com Winston, o intuito da associação, de acordo com seu estatuto, era “to effectuate a betterment and enhancement of the various nations of the world and to assist anyone interested in the issues of ethnology and eugenics, and to investigate the sources of incorrect information on these issues” (Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998., p. 189). Apesar de declarar não possuir nenhum tipo de vínculo político, a associação forneceu amplo apoio à causa segregacionista, emprestando sua expertise em casos em que houve a tentativa de reverter o precedente estabelecido em Brown, atuando também na produção de material de suporte e propaganda em prol das leis de segregação.

Ela era composta por um grupo bastante variado, que incluía advogados, psicólogos, cientistas políticos, biólogos, entre outros. Alguns deles, como os já citados Henry Garrett, Reginald Ruggles Gates, o historiador revisionista Charles Tansill (1890-1964) e o biólogo eugenista Cyril D. Darlington (1903-1981) haviam ocupado ou ocupavam, na época, cargos em algumas das universidades mais prestigiadas dos Estados Unidos, da Inglaterra, da África do Sul e da Itália. O que unia esse conjunto heterogêneo e de múltiplas origens era, de acordo com Winston, uma visão compartilhada de raça e de história: para eles, a civilização europeia estava fadada ao declínio e ao desaparecimento caso não houvesse uma proteção cuidadosa do gene pool, por meio da manutenção da pureza racial da população. Isso porque acreditavam que o colapso de grandes civilizações antigas como as do Egito e da Índia se dera por conta da intensa miscigenação ocorrida ao longo de sua trajetória (Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998., p. 192).

Outra causa comum era a do repúdio às Declarações sobre Raça da UNESCO de 1951 e 1952 (Cassata, 2008CASSATA, Francesco. Against Unesco: Gedda, Gini and American Scientific Racism. Medicina Nei Secoli: Arte e Scienza, n. 20, v. 3, pp. 907-935, 2008.). Desde a fundação do IAAEE, o geneticista Reginald Ruggles Gates havia proposto que os membros da instituição redigissem um manifesto em resposta aos documentos publicados pela UNESCO. No entanto, o projeto idealizado por Gates só se materializaria em 1967, com o lançamento da coletânea Race and Modern Science, organizada por Robert E. Kuttner (1921-1987) e financiada pelo Pioneer Fund. No prefácio, Kuttner explica o objetivo da obra:

The Unesco series of publications on race which, to say the least, leave much to be to desired, suggested that what was needed was a new collection of essays devoted to the relationship of race and anthropology, heredity, sociology and psychology, such as are brought together in the present volume. The idea was originally conceived by the late Professor R. Ruggles Gates, a pioneer in the science of human genetics. It contains sixteen essays by outstanding scientists from seven nations and attempts to survey contemporary empirical research in the area of race and race relations and in so doing evidence the scientific import of the race concept (Kuttner, 1967KUTTNER, Robert E. (Ed.). Race and Modern Science. New York: Social Science Press, 1967., p. XVIII).

O livro contava com uma série de ensaios, assinados por dezesseis autores. De acordo com Jackson:

The published volume contained two essays by Nazi scientists: Ilse Schwidetzky and Friedrich Keiter. Schwidetzsky worked with anthropologist Egon von Eickstedt (e.g., von Eickstedt & Schwidetzsky, 1940) who had applied for Nazi party membership in 1933 (for Schwidertzy’s background see Connelly, 1999; Garn, 1976; Proctor, 1988). Keiter (1938) produced a three-volume antisemetic study of race for the Nazi regime based on the Günther’s work (Lilienthal, 1993; Petermann, 2017). In the Kuttner volume, both authors remained committed to the morphological studies favored by the Nazi regime and demonstrated no knowledge of modern population genetics. The same could be said for Bertil Lundman, a Swede who had also published in Nazi race journals (Jackson, 2023JACKSON, John P., Jr. Arthur Jensen. Evolutionary Biology, and Racism. History of Psychology, n. 26, v. 1, pp. 1-28, 2023., pp. 12-13).

A lista também incluía Corrado Gini e Luigi Gedda, ambos envolvidos na formulação de políticas eugênicas durante o regime fascista de Benito Mussolini, o geneticista sul-africano J. D. J. Hofmeyr, cujas ideias forneceram justificativa para a manutenção do apartheid (Dubow, 2015), os norte-americanos A. James Gregor (1929-2019), Robert E. Kuttner, Frank C. J. McGurk (1910-1995) e R. Travis Osborne (1913-2013), que participaram como testemunhas nos processos que tinham como objetivo reverter a decisão de Brown v. Board of Education nos Estados Unidos, C. D. Darlington, presidente da Eugenics Society, o geneticista C. P. Oliver, cujo trabalho recebeu financiamento do Pioneer Fund em 1950 (Jackson, 2023JACKSON, John P., Jr. Arthur Jensen. Evolutionary Biology, and Racism. History of Psychology, n. 26, v. 1, pp. 1-28, 2023.), e o sociólogo George Lundberg (1895-1966). Muitos desses autores, incluindo Egon von Eickstedt (1892-1965), que trabalhou com Schwidetzsky mas não participou da coleção organizada pelo IAAEE, também publicariam artigos Mankind Quarterly. As críticas às publicações da UNESCO também seriam frequentes dentro do periódico.

Como podemos observar, o Pioneer Fund, a IAAEE e a Mankind Quarterly funcionavam em sintonia, questão também ressaltada por Tucker (2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.). Enquanto os integrantes do IAAEE emprestavam sua expertise para a produção de materiais que discutissem questões relacionadas a raça e eugenia, o Pioneer fornecia dinheiro para que esses profissionais mantivessem suas atividades por meio de incentivos e bolsas, além de cuidar da publicação e da difusão desses trabalhos. Já o periódico atuava como um veículo de expressão e promoção dos projetos dessas duas instituições. De acordo com Robert Gayre de Gayre, um dos primeiros editores do periódico, a Mankind Quarterly seria um espaço no qual o “pequeno grupo” reunido em torno do IAAEE teria seus artigos aceitos sem restrições, já que, segundo ele, as visões por eles defendida não eram mais toleradas em outras esferas. Jackson também ressalta que essa estreita estrutura organizacional que se formou entre o Pioneer Fund, a IAAEE e a Mankind Quarterly permitiu a manutenção de uma consistência retórica em torno de certas concepções e projetos comuns (Jackson, 2005JACKSON, John P., Jr. Science for Segregation: Race, Law, and the Case against Brown v. Board of Education. New York: NYU Press, 2005., p. 10).

A psicologia foi uma das áreas em que os projetos defendidos pelos intelectuais ligados tanto ao Pioneer Fund quanto à IAAEE e a Mankind Quarterly encontraram terreno fértil. De acordo com Yakushko, o agora extinto website do Pioneer afirmava que a instituição “changed the face of the social and behavioral sciences by restoring the Darwinian-Galtonian perspective to the mainstream in traditional fields such as […] psychology […] as well as fostering the newer disciplines of behavioral genetics, neuroscience, evolutionary psychology, and sociobiology” (apud Yakushko, 2019, p. 9).

Os autores e editores da Mankind Quarterly fundamentaram seu projeto de eugenia e suas noções de diferença racial, sobretudo, a partir de ideias oriundas de ciências comportamentais, especialmente aquelas voltadas para o estudo do intelecto e da personalidade. Desde Galton, inteligência e personalidade eram tidas como atributos quantificáveis e transmissíveis de geração em geração, tendo sido áreas de grande interesse entre os eugenistas. Para muitos deles, suas nações encontravam-se em franco processo de decadência devido à rápida multiplicação de indivíduos e de raças de nível intelectual inferior. Com o intuito de frear e reverter a degeneração em curso, tornava-se imperativo identificar esses grupos que consideravam como potenciais ameaças, de forma que pudessem ser segregados e esterilizados. Enquanto isso, os possuidores de intelecto e caráter superiores deveriam ser incentivados a terem mais filhos. Para isso, lançaram mão de ferramentas como testes para mensurar o quociente intelectual (QI), de forma a separar as pessoas com base em sua “idade mental”, e modelos que determinassem o comportamento e as motivações de indivíduos e grupos. Estabelecia-se assim, uma escala para a normalidade a partir de padrões determinados por esses testes (Kline, 2001KLINE, Wendy. Building a Better Race: Gender, Sexuality, and Eugenics from the Turn of the Century to the Baby Boom. Berkeley: University of California Press, 2001.; Winston, 2020WINSTON, Andrew. Scientific Racism and North American Psychology. 29 May 2020. Disponível em: Disponível em: https://oxfordre.com/psychology/view/10.1093/acrefore/9780 190236557.001.0001/acrefore-9780190236557-e-516 . Acesso em: 20 mar. 2023.
https://oxfordre.com/psychology/view/10....
; Brookwood, 2021BROOKWOOD, Marilyn. The Orphans of Davenport: Eugenics, the Great Depression, and The War over Children’s Intelligence. New York: Liveright Publishing Corporation, 2021.).

Muitos adeptos da eugenia oriundos da Psicologia foram pioneiros no estudo da inteligência e da personalidade, como Charles Spearman (1863-1945), William McDougall (1871-1938), Edward Thorndike (1874-1949), Henry H. Godddard (1866-1957) e Raymond Cattell. Alguns, inclusive, criaram suas próprias ferramentas de avaliação, como a escala Stanford-Binet, idealizada por Lewis Terman (1877-1956) a partir da revisão do modelo Simon-Binet, o Army Alpha e o Army Beta Intelligence Test, desenvolvido por Robert Yerkes (1876-1956), e o Porteus Maze Test, concebido por Stanley Porteus (1888-1972).

A ideia de que a inteligência seria predominantemente influenciada pela hereditariedade, constituindo um fator de diferenciação não só entre indivíduos, mas também entre grupos raciais, foi uma das linhas principais de argumentação desenvolvida pelos autores e editores da Mankind Quarterly. Garrett, por exemplo, afirmava que os testes mentais constituíam uma ferramenta objetiva e válida “for judging the comparative worth of racial groups. [...] The view held here is that psychological tests offer the best, i.e., most valid, quantitative data for the determination of race differences” (Garrett, 1961, p. 255).

Potencial e maturidade intelectual também seriam fatores apontados como fundamentais na potencialidade de um povo para o progresso ou para o atraso. Seriam, segundo Hans Burkhart, os principais fatores que separariam os povos mais primitivos daqueles que possuem uma tendência mais progressiva (Burkhardt, 1961BURKHARDT, Hans. Somatopsychical Structures in Human Races. Mankind Quarterly, pp. 277-287, April 1961., p. 285). Assim, a determinação do QI médio de uma população, tendo em vista sua composição racial e sua predisposição genética, serviria como uma espécie de prognóstico para o seu desenvolvimento futuro, seja em termos sociais, econômicos, culturais e políticos.

A psicometria também foi um dos instrumentos amplamente utilizados pelos autores do periódico em seus textos. Da mesma forma que as ferramentas de mensuração do quociente intelectual, os testes de personalidade eram apresentados como instrumentos avançados e confiáveis para mensurar certos valores, tais como a contribuição de um indivíduo ou grupo para a sociedade, a aptidão para o desempenho de uma função específica ou mesmo como forma de determinar a capacidade de adaptação a um determinado sistema cultural ou político e o potencial para desenvolvimento civilizacional.

Ao lado dos fatores psíquicos e mentais, ressaltava-se, ainda, a existência de diferenças anatômicas, na morfologia e fisiologia cerebrais (Swan, 1962SWAN, Donald W. Juan Comas on “Scientific Racism Again?”. Mankind Quarterly , pp. 231-245, April 1962.; Putnam, 1963PUTNAM, Carleton. There are the Guilty. Mankind Quarterly , pp. 12-27, July 1963.), maior predisposição a determinadas doenças (Cochrane, 1962COCHRANE, R. G. The Significance of the Anthropological Approach to Leprosy. Mankind Quarterly , pp. 178-181, Jan. 1962.; Gregor, 1963GREGOR, A. James. Science and Social Change (Review). Mankind Quarterly , pp. 229-237, April 1963.) e mesmo diferentes índices de morbidade como características ligadas à herança racial.

Donald Swan, por exemplo, em uma réplica ao artigo de Juan Comas intitulado “‘Scientific’ Racism Again?”7 7 O artigo de Comas, publicado na revista Current Anthropology em outubro1961, era uma tradução na íntegra do texto em espanhol que havia saído em abril do mesmo ano na revista América Antropológica. Junto com o ensaio de Comas, foram publicadas as opiniões de vários intelectuais, como Theodozius Dobzhansky, Julian Huxley, H. B. S. Haldane, Ashely Montagu, Božo Škerlj e Stanley Portheus. Como o artigo apresentava uma crítica ao primeiro volume da Mankind Quarterly, Henry Garrett, Reginald Ruggles Gates e Robert Gayre foram convidados a responder também. No final, há uma réplica de Comas aos comentários de Garrett, Gates e Gayre. , argumentava que, uma vez que o cérebro seria um produto do desenvolvimento evolucionário da espécie humana, eram esperadas que diferenças significativas no tamanho, mas também na forma e na estrutura desse órgão, fossem verificadas entre as raças. Segundo ele, estudos comparativos feitos por Cornelius J. Connolly haviam demonstrado disparidades importantes na morfologia cerebral de brancos e negros, incluindo massa, estrutura e padrão de sulcos e fissuras da superfície. Já o trabalho de F. W. Vint, publicado em 1934, comparando a histologia cortical do cérebro de europeus e africanos, era citado a fim de corroborar mais ainda tais ideias. Além de uma discrepância em termos de peso e volume, Vint também dizia ter encontrado variações tanto na espessura quanto na cito-arquitetura do córtex pré-frontal entre esses dois grupos:

Thus, Dr Vint found statistically significant racial differences in the thickness of the frontal cortex - the granular and supragranular layers being thicker in European Whites and the infragranular layer in East Africans. According to Professor Gates, the supragranular layer - which was the last to be evolved and in Vint’s study was 16% smaller in Africans than in Europeans - is concerned with will, intellect, control, etc. Altogether, the total cortex was 15% thinner in the African Negroes. Furthermore, Dr Vint found a significant simplicity in the convolutional pattern of the Negroes and marked racial differences in the cyto-architecture of the frontal cortex - a paucity of large pyramidal neurons and an excess of small primitive cells in the brains of the East African Negroes (Swan, 1962SWAN, Donald W. Juan Comas on “Scientific Racism Again?”. Mankind Quarterly , pp. 231-245, April 1962., p. 235).

Além da estrutura, Swan apontava que a atividade elétrica do cérebro também diferia de acordo com a raça do indivíduo. Segundo ele, embora a eletroencefalografia fosse uma ciência relativamente nova, “enough studies have been made to attempt to correlate brain wave patterns with behavior and personality structure and thus to establish criteria of normality and abnormality” (Swan, 1962SWAN, Donald W. Juan Comas on “Scientific Racism Again?”. Mankind Quarterly , pp. 231-245, April 1962., p. 236). Utilizando dois artigos publicados pelos médicos franceses Gallais, Miletto, Corriol e Bert, em 1949 e 1951, nos quais os autores reportavam os resultados de um estudo encefalográfico de 100 soldados “aparentemente normais e saudáveis”, oriundos da costa da Guiné, comparando-os com 3000 europeus “aparentemente saudáveis”, apontava que Gallais e seus associados teriam constatado que 58% dos africanos possuíam resultados “anormais”, em contraste com apenas 13.8% do outro grupo.

De acordo com Swan, todos esses estudos indicavam que havia diferenças profundas em termos de intelecto e comportamento entre raças humanas. Apontava que “estudos de um grande número de cérebros”8 8 No original: “Nevertheless, studies of large numbers of brains have established a positive relationship statistical in nature - between brain weight and mental capabilities” (Swan, 1962, p. 237). haviam estabelecido uma correlação estatística positiva entre o peso cerebral e as capacidades mentais. Os achados de Connolly sobre morfologia cerebral também explicariam, conforme o parecer de J. C. Carothers, “many of the peculiarities of African psychology and psychiatry could be seen (in terms of physiology) as frontal idleness” (Swan, 1962SWAN, Donald W. Juan Comas on “Scientific Racism Again?”. Mankind Quarterly , pp. 231-245, April 1962., p. 240).

Swan, ao atribuir determinados traços psicológicos e capacidade cognitiva a fatores anatômicos, explicava que as diferenças entre raças se davam no nível biológico, não podendo, portanto, ser atribuídas a fatores sociais, econômicos ou culturais. A partir dessas ideias, muitos autores dentro da Mankind Quarterly concluíam que certos povos estavam limitados em sua capacidade de progredir ou mesmo de participar da vida cultural e política em países democráticos e “civilizados”. Dessa forma, justificavam não só a sua exclusão enquanto cidadãos, mas também questionavam a sua capacidade de autogoverno e sua viabilidade enquanto formadores de nações soberanas e independentes.

O preconceito e a tendência à segregação, da mesma forma, foram tratados como traços pertencentes à psique humana e adquiridos no processo evolutivo. Ou seja, era algo que, para os autores da Mankind Quarterly, fazia parte da natureza e do instinto de proteção da própria espécie, e não um comportamento aprendido socialmente9 9 Alguns exemplos dessa argumentação podem ser observados em Purves (1960), Josey (1962), Gregor (1962) e Lundberg (1963). . O artigo do PhD em bioquímica David Purves, publicado na edição de junho de 1960PURVES, D. The Evolutionary Basis of Race Consciousness. Mankind Quarterly , pp. 51-54, July 1960., ilustra bem essa visão. Intitulado “The Evolutionary Basis of Race Consciousness”, o texto tinha como objetivo demonstrar que sentimentos como “consciência racial” e a relutância demonstrada por uma “subespécie” em contrair matrimônio com outras teriam origem na pré-história humana e possuíam uma função biológica. Segundo o autor:

This is to say that a man’s love for his country, or at a more prosaic level, his willingness to identify himself with the interests of his social group, do not arise fortuitously, but these are instinctive feelings rooted in man’s nature. Because of their instinctive character, these feelings, being independent of transient social conditions, can never be eliminated by any programme of conditioning designed to eradicate race consciousness in the schools (Purves, 1960PURVES, D. The Evolutionary Basis of Race Consciousness. Mankind Quarterly , pp. 51-54, July 1960., p. 51).

Utilizando como base a teoria de amity-enmity complex (complexo de amizade-inimizade) do antropólogo britânico Arthur Keith (1866-1955), Purves argumentava que a hostilidade e as tensões que emergiam nos estados nacionais modernos contra pessoas de diferentes raças ou “subespécies” remetiam a um instinto primitivo, assim como a tendência de integrar e demonstrar simpatia a pessoas cuja aparência fosse semelhante àquele grupo:

Now while it is possible, although often difficult, for members of one social group to accept and absorb members of another social group who are visually indistinguishable from members of the parent group, an explosive situation is created when members of different races (or sub-species) are mixed in the same community. In such a situation the society cannot formulate the group consciousness on which its cohesion depends, because a proportion of its members automatically provoke in the majority the primitive response appropriate to the code of enmity. The underlying biological reason for the resulting hostility is that each group is endangering the genetic integrity of the other (Purves, 1960PURVES, D. The Evolutionary Basis of Race Consciousness. Mankind Quarterly , pp. 51-54, July 1960., p. 53).

Esses sentimentos tendiam, de acordo com Purves, a aparecer durante a puberdade, uma vez que possuíam a função biológica de evitar a mistura racial (interbeeding). Todos esses aspectos, argumentava, constituíam “ampla evidência” de que instabilidade social seria um desenrolar inevitável em sociedades multirraciais. Concluía assim que:

In view of the instinctive character of the antagonisms inherent in the multi-racial community, there appear to be good grounds for preventing the establishment of communities of this kind in the future and for attempting to solve the problem of the existing communities by resolving them into separate societies on a racial basis. However harsh the application of such policies may appear to be, they do provide the possibility of social harmony and friendly competition between national groups in the future - the alternatives are permanent instability and exploitation of one racial group by the other indefinitely prolonged (Purves, 1960PURVES, D. The Evolutionary Basis of Race Consciousness. Mankind Quarterly , pp. 51-54, July 1960., p. 54).

Todas essas ideias compunham o cerne do projeto eugênico expresso pelos autores que contribuíram para a organização e redação da Mankind Quarterly. Voltado para a reafirmação da existência de grupos raciais puros e da existência de caracteres físicos, intelectuais e comportamentais, advogavam em favor da manutenção de políticas de segregação racial, da criação de Estados etnicamente homogêneos, da necessidade de controle racial e do controle de grupos considerados “inferiores”, a fim de evitar o comprometimento dos traços “superiores” de intelecto, habilidade e personalidade que acreditavam ser característicos do tipo ideal que almejavam.

Tanto em termos de concepção racial como de projetos eugênicos, os autores e editores da Mankind Quarterly, durante a década de 1960, se aproximavam mais da eugenia e dos estudos sobre raça do início do século XX do que era discutido em revistas como a Eugenics Quarterly ou a Eugenics Review, por exemplo. Embora compartilhassem alguns temas e concepções em comum com eugenistas da época (como controle populacional, por exemplo), ainda tinham como referência teóricos como Arthur Keith e Hans Friedrich Karl Günther, e estudos que eram amplamente citados, como o de Vint ou os resultados do Army Alpha e do Army Beta, aplicados nos recrutas do exército americano durante a primeira guerra, datavam da primeira metade do século XX. Isso não implica, no entanto, que tais concepções não tenham passado por reformulações. Não se trata, portanto, de afirmar que há uma continuidade direta, mas sim de demonstrar que essa perpetuação se dá a partir de constantes processos de reorganização, recomposição e reposicionamento.

A REDE EM TORNO DA MANKIND QUARTERLY E SUA ASSOCIAÇÃO COM A EXTREMA-DIREITA

Além de a Mankind Quarterly, o IAAEE e o Pioneer Fund funcionarem como veículos de produção de ideias por meio de divulgação e financiamento, eles também atuavam no sentido de estabelecer uma rede internacional de circulação e de contatos, que incluíam outras associações, grupos, periódicos e editoras. Além disso, foram responsáveis por aproximar cada vez mais os produtores dessa ciência racista e de propostas eugênicas com grupos de extrema-direita, que passaram a se apropriar dos trabalhos desses intelectuais para dar suporte a sua ideologia e aos seus projetos políticos (Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.; Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.; Jackson, 2005JACKSON, John P., Jr. Science for Segregation: Race, Law, and the Case against Brown v. Board of Education. New York: NYU Press, 2005.; Saini, 2019SAINI, Angela. Superior: The Return of Race Science. Boston: Beacon Press, 2019.).

Parte desses laços se deu pela participação dos integrantes dessas três instituições (que na prática acabavam formando um mesmo núcleo, afinal, a coordenação da Mankind Quarterly era formada dos membros IAAEE e da diretoria do Pioneer) em grupos de extrema-direita, como Liberty Lobby, Northern League, American Nazi Party, e por sua atuação ativa em periódicos nacionais e internacionais do mesmo espectro político, como Northern World, American Mercury, Common Sense, Truth Seeker, The European, South African Observer, Western Destiny e Right.

Apesar da relação de proximidade com associações segregacionistas, antissemitas, supremacistas brancas, neonazistas, neofascistas e pró-Apartheid, tanto nos Estados Unidos como na Europa e na África do Sul (Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.; Jackson, 2005JACKSON, John P., Jr. Science for Segregation: Race, Law, and the Case against Brown v. Board of Education. New York: NYU Press, 2005.; Kühl, 2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013.; Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.; 2021WINSTON, Andrew S. “Jews Will Not Replace Us!”: Antisemitism, Interbreeding and Immigration in Historical Context. American Jewish History, n. 105, v. 1/2, pp. 1-24, 2021.), houve uma tentativa por parte da direção da revista de esconder esses vínculos, de forma a transmitir a imagem de um periódico que não possuía nenhuma motivação ideológica a não ser a preocupação em discutir questões relacionadas a raça. Em um de seus editoriais, Reginald R. Gates justificava a criação da Mankind Quarterly a partir da necessidade da criação de um local onde

A scientific approach to racial questions, free from sentiment, propaganda or bias, may lead to a more reasonable attitude to the problems which agitate considerable sections of mankind. This need for a calmer approach to problems of racial origin and racial relationships can be quietly discussed, without rancor or bigotry and with the primary aim of elucidating facts (Gates, 1960GATES, Reginald R. The Emergence of Racial Genetics. Mankind Quarterly , pp. 5-73. July 1960., p. 11).

Por meio dessa linguagem, de que representariam um terreno “neutro” de debates, onde se avaliaram questões apenas do ponto de vista “dos fatos”, a Mankind Quarterly tentava, ao menos aparentemente, se apresentar como uma publicação de caráter científico. Dessa forma, buscava conferir legitimidade àqueles que defendiam os mesmos pressupostos expressos nas páginas do impresso, de forma que os estudos ali citados eram utilizados como evidência de que suas opiniões não eram meramente fruto de escolhas políticas, mas sim tinham como base um conhecimento “técnico” e “neutro.

Esse discurso, no entanto, não impediu o periódico de funcionar como espaço de recomendação e propaganda de obras e publicações desses mesmos grupos de que faziam parte, como White America, de Earnest Sevier Cox (1880-1966) (reeditada por Willis Carto), os trabalhos do membro da Northern League, H. B. Isherwood e The Dispossessed Majority, de Wilmot Robertson. Mas nenhuma dessas publicações esteve tão fortemente associada com a MQ como a Nouvelle École e a Neue Anthropologie (Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.; Jackson, 2005JACKSON, John P., Jr. Science for Segregation: Race, Law, and the Case against Brown v. Board of Education. New York: NYU Press, 2005.; Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.).

A francesa Nouvelle École era dirigida por Alain de Benoist (1943-) e ligada ao GRECE (Groupement de recherche et d’études pour la civilisation européenne). Sob o pseudônimo de Fabrice Laroche, Benoist buscou transformar o GRECE em uma espécie de think thank “anti-igualitário”, empregando seu periódico como uma ferramenta para influenciar o debate público.

Assim como a Mankind Quarterly, a Nouvelle École também adotava uma visão próxima do que Kühl classifica como uma “eugenia mais ortodoxa”, na qual os seres humanos são concebidos como determinados majoritariamente pela sua evolução biológica e por sua raça. Segundo Kühl, o GRECE e sua revista lançavam mão de teorias da eugenia, sociobiologia e da pesquisa racial para contrapor a ideia de igualdade estabelecida a partir da Revolução Francesa”:

In opposition to “Liberty, Equality, Fraternity,” the new French Right emphasized belonging to a new national community, one that included the natural inequality of races and the ideology of a self-creating elite. Benoist made use of the usual mixture of studies of identical twins and the differing results for Blacks and Whites on intelligence tests to trace back the supposed differences in intelligence of Blacks to their genetic predisposition and not to unfavorable environmental circumstances (Kühl, 2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013., p. 175).

Além da similaridade de visões entre as duas publicações, havia ainda uma grande proximidade entre os membros do corpo editorial de ambas. Além das referências mútuas, vários pesquisadores vinculados a Mankind Quarterly participaram do comitê patrocinador da Nouvelle École, como John R. Baker (1900-1984), Luigi Gedda, Robert Gayre, Henry E. Garrett, Cyril D. Darlington, Robert E. Kuttner, Bertil J. Lundman (1899-1993), Stefan T. Possony (1913-1995) e Roger Pearson (Kühl, 2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013.; Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.; Tucker, 2002TUCKER, William. The Funding of Scientific Racism: Wickliffe Draper and the Pioneer Fund. Champaign: University of Illinois Press , 2002.).

Quase na mesma época da fundação do GRECE, um grupo de eugenistas liderados pelo advogado neonazista Jürgen Rieger (1946-2009) fundou a Gesellschaft für biologische Anthropologie, Eugenik und Verhaltensforschung (GbAEV - Sociedade de Antropologia Biológica, Eugenia e Pesquisa Comportamental) e o periódico Neue Anthropologie. Segundo Kühl, ambas declaravam abertamente sua proximidade com o IAAEE e com a Mankind Quarterly. Leitor assíduo das publicações dos intelectuais ligados à International Association for the Advancement of Eugenics and Ethnology, Rieger se autodenominava discípulo intelectual de Donald Swan (Kühl, 2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013., p. 175).

A GbAEV promovia um tipo de eugenia orientada para questões raciais, semelhante ao que era feito dentro do GRECE e do IAAEE. Além de defenderem a inclusão no currículo escolar de um conhecimento capaz de fornecer uma base biológica para que a população desenvolvesse uma responsabilidade eugênica, também acreditavam ser necessário que o Estado fornecesse um generoso apoio monetário e incentivos fiscais como incentivo ao aumento de natalidade. Viam a miscigenação como fator de degeneração, pois tornava os indivíduos mais propensos a uma série de doenças e ocasionava a deterioração da qualidade genética da nação (Kühl, 2013KÜHL, Stephan. For the Betterment of the Race: The Rise and Fall of the International Movement for Eugenics and Racial Hygiene. London: Palgrave Macmillan, 2013., p. 175).

Ao longo da década de 1970, os laços entre os membros das três associações e seus respectivos periódicos foram se aprofundando. As revistas frequentemente faziam propaganda umas das outras, anunciando sua produção de conteúdo, além de veicularem traduções de textos publicados em suas parceiras. Por esse motivo, tanto a Nouvelle École quanto a Neue Anthropologie eram referidas como “sister journals”, “versões europeias” ou até “clones europeus” da Mankind Quarterly (Winston, 1998WINSTON, Andrew S. Science in the Service of the Far Right: Henry E. Garrett, the IAAEE, and the Liberty Lobby. Journal of Social Issues, n. 54, v.1, pp. 179-210, 1998.).

Os laços do grupo reunido em torno da MQ também se estendiam a organizações como o Liberty Lobby e sua editora, a Noontide Press, e o Institute for Historical Review. Em comum, além dos laços com os dirigentes do IAAEE e da Mankind Quarterly, essas três associações compartilhavam o mesmo fundador: Willis Carto (1926-2015). Todavia, mais do que relações próximas entre os membros, colaborações e circularidade de conteúdo, esses diferentes grupos que se interconectavam partilhavam de ideais e objetivos comuns.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme podemos observar, no caso da Mankind Quarterly houve a manutenção de um tipo específico de eugenia, centrada na questão racial e na manutenção da homogeneidade e da superioridade de um tipo branco ideal. Isso se deu não só pela adesão a teóricos e ideias específicas sobre raça, mas também pela participação de intelectuais ligados ao Terceiro Reich nas páginas do periódico. A proximidade com o movimento segregacionista, tanto nos Estados Unidos como na África do Sul, também fez com que as pautas desses grupos fossem incorporadas ao repertório da revista.

Longe de se tratar de um grupo marginalizado, desorganizado e cujas ideias não encontraram expressão, a rede formada pelo IAAEE, a Mankind Quarterly e o Pioneer Fund foram capazes de criar uma teia de relações internacionais bastante complexa, formada por grupos, editoras e periódicos de inúmeros nichos da extrema-direita oriunda de vários países. Embora não tenha sido possível trabalhar essas conexões de forma mais detalhada, pode-se dizer que houve uma ressonância importante nesses meios, permitindo a propagação de um cerne comum de concepções e projetos que ainda encontram eco na atualidade, por meio não só da própria Mankind Quarterly, que continua a ser publicada ainda hoje, mas de seus editores e autores.

Dessa forma, procuramos demonstrar que, apesar do estigma que essa vertente específica do pensamento eugênico, centrada na ideia de raça, adquiriu no pós-45, isso não implicou em um completo abandono de tais proposições, mas sim em sua restrição a um determinado nicho. Dessa forma, é possível perceber uma riqueza em relação às diferentes faces que a eugenia assume na segunda metade do século XX, não só em termos de propostas, mas também com diferentes concepções e espectros políticos.

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  • 1
    A Declaração sobre Raça nasceu de uma de uma iniciativa do Social Sciences Department da UNESCO no ano de 1949, que tinha por objetivo debater as implicações sociais da ciência em questões relacionadas à raça. Segundo Selcer (2012SELCER, Perrin. Beyond the Cephalic Index: Negotiating Politics to Produce UNESCO’s Scientific Statements on Race. Current Anthropology, v. 53, suppl. 5, pp. 173-184, April 2012.): “The statements responded to UNESCO’s constitutional mandate to fight ‘the doctrine of the inequality of men and races’ and a call from the UN Economic and Social Council to disseminate scientific facts disproving racial prejudice” (p. 173). Ao todo, quatro Declarações foram emitidas: Statement on Race (1950), Statement on the nature of race and race differences (1951), Proposals on the biological aspects of race (1964) e Statement on race and racial prejudice (1967).
  • 2
    Embora as teorias raciais e a eugenia compartilhem uma parte significativa de sua história, havendo um entrelaçamento significativo entre ambas, elas não podem ser tratadas como sinônimos. Primeiro, porque se trata de teorias diferentes, com objetivos distintos. Enquanto a eugenia tem, em seu cerne, o objetivo do melhoramento da coletividade, e sua existência enquanto ciência data do final do século XIX, os estudos raciais são bem anteriores, tendo se iniciado por volta do século XVIII, com os trabalhos de Carl Linnaeus (1707-1778), Charles White (1728-1813), Conde de Buffon (1707-1788) e Johann Blumenbach (1752-1840). Esses primeiros trabalhos buscaram classificar e separar os seres humanos a partir de diferentes classes taxonômicas, com base em características comuns ou a partir de sua origem evolutiva. Uma parte significativa desses estudos raciais acabou sendo classificada como “racismo científico” pela historiografia, devido ao fato de que pressupunham uma hierarquia entre os grupos, na qual o europeu branco ocupava a posição mais elevada. Ainda que muitas dessas ideias sobre raça tenha servido de sustentação para projetos eugênicos, nem todo o teórico racial buscou, necessariamente, atrelar sua teoria a um propósito eugenista.
  • 3
    Conforme podemos observar nos trabalhos de Selcer (2012SELCER, Perrin. Beyond the Cephalic Index: Negotiating Politics to Produce UNESCO’s Scientific Statements on Race. Current Anthropology, v. 53, suppl. 5, pp. 173-184, April 2012.), Schaffer (2008SCHAFFER, Gavin. Racial Science and British Society (1930-62). London: Palgrave Macmillan , 2008.), Reardon (2005REARDON, Jenny. Race to the Finish: Identity and Governance in an Age of Genomics. Princeton: Princeton University Press, 2005.) e Maio & Santos (2015MAIO, Marcos Chor; SANTOS, Ricardo Ventura. Antiracism and the Uses of Science in the Post-World War II: An Analysis of UNESCO’s First Statements on Race (1950 and 1951). Vibrant: Virtual Brazilian Anthropology, n. 12, v. 2, pp. 1-26, 2015.), os documentos produzidos durante a elaboração das Declarações sobre Raça da UNESCO são um ótimo registro de como ainda havia cientistas que defendiam a existência de traços inatos, ainda que fossem favoráveis ao desmantelamento de políticas de discriminação e segregação, como as existentes no sul dos Estados Unidos e na África do Sul. Para eles, o princípio de igualdade jurídica não deveria ser dependente do pressuposto da existência de uma igualdade biológica. Os biólogos Julian Huxley (1887-1975), Leslie Clarence Dunn (1893-1974) e Theodozius Dobzhansky (1900-1975) são exemplos desse tipo de visão. No entanto, o adendo publicado juntamente com a segunda Declaração, emitida em 1951, demonstra que nem mesmo a mensagem principal de repúdio às políticas racistas era compartilhada por todos. Os geneticistas Cyril Dean Darlington (1903-1981) e Ronald Fisher (1890-1962), e o antropólogo Carleton Coon (1904-1981), por exemplo, se manifestaram completamente contrários às proposições apresentadas no texto. Cientistas alemães, como o médico e antropólogo Eugen Fischer (1874-1967) e o geneticista Fritz Lenz (1887-1976), ambos importantes referências da eugenia e da higiene racial nazista, também registraram seu repúdio (UNESCO, 1952UNESCO. The Race Concept: Results of an Inquiry. Paris: UNESCO, 1952.).
  • 4
    A terminologia aqui utilizada é baseada no conceito de far-right, do cientista político Cas Mudde. Segundo Mudde (2018MUDDE, Cas. The Far Right in America. Abingdon: Routledge, 2018., 2019MUDDE, Cas. The Far Right Today. Cambridge: Polity Press, 2019.), a far right se define por sua atitude anti-sistema e hostilidade aos valores da democracia liberal. Ela pode ser dividida em dois grandes subgrupos: “The extreme right rejects the essence of democracy, that is, popular sovereignty and majority rule. The most infamous example of the extreme right is fascism, which brought to power German Führer Adolf Hitler and Italian Duce Benito Mussolini, and was responsible for the most destructive war in world history. The radical right accepts the essence of democracy, but opposes fundamental elements of liberal democracy, most notably minority rights, rule of law, and separation of powers. Both subgroups oppose the postwar liberal democratic consensus, but in fundamentally different ways. While the extreme right is revolutionary, the radical right is more reformist. In essence, the radical right trusts the power of the people, the extreme right does not” (Mudde, 2019MUDDE, Cas. The Far Right Today. Cambridge: Polity Press, 2019., p. 26).
  • 5
    De acordo com Lombardo (2002LOMBARDO, Paul. “The American Breed”: Nazi Eugenics and the Origins of the Pioneer Fund. Albany Law Review, n. 65, v. 3, pp. 743-830, 2002.), o Pioneer Fund, entidade criada pelo magnata Wickliffe Draper (1891-1972), tem um longo histórico de financiar pesquisas, publicações e propaganda sobre assuntos relacionados a “hereditariedade e eugenia” e “melhoramento racial”. O Pioneer também deu suporte a inúmeros trabalhos que visavam demonstrar que inteligência e personalidade eram geneticamente e racialmente determinados. Tucker (2009TUCKER, William. The Cattell Controversy: Race, Science and Ideology. Champaign: University of Illinois Press, 2009.) igualmente aponta que a fundação também atuou no sentido de financiar processos e leis que visassem a manutenção da segregação racial nos Estados Unidos e do status da população afro-americana como cidadã de segunda classe.
  • 6
    Testes de inteligência, desenvolvidos pelo psicólogo americano Robert Yerkes, em conjunto com W. V. Bingham, Henry H. Goddard, T. H. Haines, Lewis Terman, Guy Montrose Whipple e F. L. Wells.
  • 7
    O artigo de Comas, publicado na revista Current Anthropology em outubro1961, era uma tradução na íntegra do texto em espanhol que havia saído em abril do mesmo ano na revista América Antropológica. Junto com o ensaio de Comas, foram publicadas as opiniões de vários intelectuais, como Theodozius Dobzhansky, Julian Huxley, H. B. S. Haldane, Ashely Montagu, Božo Škerlj e Stanley Portheus. Como o artigo apresentava uma crítica ao primeiro volume da Mankind Quarterly, Henry Garrett, Reginald Ruggles Gates e Robert Gayre foram convidados a responder também. No final, há uma réplica de Comas aos comentários de Garrett, Gates e Gayre.
  • 8
    No original: “Nevertheless, studies of large numbers of brains have established a positive relationship statistical in nature - between brain weight and mental capabilities” (Swan, 1962SWAN, Donald W. Juan Comas on “Scientific Racism Again?”. Mankind Quarterly , pp. 231-245, April 1962., p. 237).
  • 9
    Alguns exemplos dessa argumentação podem ser observados em Purves (1960PURVES, D. The Evolutionary Basis of Race Consciousness. Mankind Quarterly , pp. 51-54, July 1960.), Josey (1962JOSEY, Charles C. Conscience: God, Man and Society. Mankind Quarterly , pp. 20-25, July 1962.), Gregor (1962GREGOR, A. James. Notes on a “Scientific” Controversy. Mankind Quarterly , pp. 166-177, Jan. 1962.) e Lundberg (1963LUNDBERG, George. Some Neglected Aspects of the “Minorities” Problem. Mankind Quarterly , pp. 211-228, April 1963.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    24 Mar 2023
  • Aceito
    28 Ago 2023
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