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Uma ideia simples para diminuir custo e peso das talas gessadas

Resumos

OBJETIVO:

Diminuir o custo e o peso (aumentando o conforto para o paciente) das talas gessadas, mantendo resistência semelhante.

MÉTODOS:

Foram analisadas 22 talas de gesso, 11 com formato convencional e 11 com formato piramidal. Foi feita comparação, teórica (matemática) e prática, entre as talas convencionais e as piramidais quanto à mudança de peso (e consequentemente de custo) e à resistência à flexão.

RESULTADOS:

Análise matemática – diminuição peso e custo entre 26,7% e 38,9%, variando conforme a disposição das camadas da tala. Análise prática – diminuição do peso em 34,5% (p = 0,000005) e resistência aumentada em 26,7% (p = 0,03).

CONCLUSÃO:

A tala gessada com formato piramidal apresenta diminuição estatisticamente significativa de peso (e consequentemente de custo), com aumento estatisticamente significativo da resistência, se comparada à tala de formato convencional.

Aparelhos ortopédicos; Custos; Imobilização; Moldes cirúrgicos; Resistência de materiais; Sulfato de cálcio


OBJECTIVE:

To reduce the cost and weight of plaster molded orthosis (increasing patient comfort), keeping the same resistance.

METHODS:

22 plaster orthosis were analysed, 11 with conventional shape and 11 with pyramidal shape. It was compared, in theory (mathematcally) and practice, the change of weight (and consequently cost) and flexion resistance between conventional shape and pyramidal shape.

RESULTS:

Theorical analysis: weight and cost decrease of 26.7%-38.9%, according to the layers disposition of the cast. Laboratorial analysis: cast´s weight decrease of 34.5% (p = 0.000005) and resistance increase of 26.7% (p = 0.03).

CONCLUSION:

plaster molded orthosis made in a pyramidal shape, have a statistically significant decrease of weight (and consequently cost) and statistically significant increase of resistance if compared with traditional shape.

Orthotic devices; Cost; Immobilization; Cast, surgical; Material resistance; Calcium sulfate


Introdução

As talas gessadas não precisam ter a mesma espessura em toda a sua extensão, já que as forças deformantes a que uma tala é submetida também não são iguais em toda a sua extensão. Elas são submetidas à maior força de fratura do gesso nas regiões sob as articulações, pois é sob o fulcro do movimento em potencial que o estresse do material é maior.

Na prática, isso se torna verdade na medida em que as talas geralmente quebram-se sob as áreas de articulação (punho, cotovelo, tornozelo ou joelho), isto é, uma tala suro-podálica geralmente quebra-se na região do tornozelo ou uma tala antebráquio-palmar quebra-se no punho etc.

Pensando-se em melhorar a confecção das talas gessadas, foi iniciado este trabalho experimental.

Não foram encontrados trabalhos similares nas bases de dados Bireme (Lilacs e Scielo), PubMed e RBO.

Objetivo

Diminuir o custo e o peso da tala gessada e manter resistência semelhante.

Métodos

Fundamentação teórica

A força de flexão do material é a principal causadora de quebra da tala. Quanto mais próximo ao fulcro do movimento, maior o estresse do material e maior deve ser a espessura da tala.

Neste experimento, foi reorganizada a disposição das camadas de gesso, com maior número de camadas na região do fulcro do movimento. Esse aumento no número de camadas deve ser progressivo, assim como é progressivamente maior a tendência de fratura da tala gessada nesse local.

Pensando-se nisso, resolveu-se aumentar o número de camadas, progressivamente, na forma de "degraus", até a região do fulcro do movimento (Figs. 1A e 1B).

Figs. 1A e 1B
Aumento progressivo das camadas em direção ao fulcro do movimento, na forma de "degraus", acompanhando as forças de deformação em flexão da tala. O primeiro degrau deve ter quatro camadas. O lado pelo qual iniciamos o desenrolar da atadura tem uma camada a mais, entretanto o ápice tem o mesmo número de camadas em ambos os lados.

Entretanto, duas camadas nos degraus mais periféricos quebram-se com muita facilidade. Optou-se então por quatro camadas nos degraus periféricos. Também, durante a confecção da tala, o lado pelo qual iniciamos o desenrolar da atadura gessada fica com uma camada a mais; entretanto, o ápice da pirâmide acaba ficando com o mesmo número de camadas em ambos os lados do fulcro se finalizarmos o desenrolar da atadura no mesmo lado em que começamos.

A partir da definição do formato da tala, pôde-se então prever matematicamente, por meio do cálculo da área, a diminuição do peso (e, portanto, do custo) das talas confeccionadas dessa forma (apresentados no item "Resultados" e "Discussão").

Prática - Pesagem e ensaio de flexão

Após isso, foram confeccionadas 26 talas gessadas, 13 com formato convencional e 13 com formato piramidal, todas com 30 cm de comprimento, fulcro central e 12 camadas (cinco degraus de cada lado). Foram usadas duas caixas com 20 ataduras gessadas cada, tamanho 8 cm x 2 m, de marca bem conceituada no mercado (Figs. 2A e 2B).

Figs. 2A e 2B
A tala adquire um formato piramidal, com o ápice da pirâmide na região sob a articulação.

Após cinco dias (tempo de secagem), foram levadas ao laboratório de engenharia mecânica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, onde foram pesadas e foi feito ensaio de flexão em três pontos com vão de 26 cm entre os apoios, em máquina da marca EMIC DL500, com célula de carga com capacidade de 200 kg e velocidade de avanço de 50 mm/min., até a deformação da tala em 30 mm, de forma muito semelhante a um ensaio de flexão feito para teste de qualidade de três diferentes marcas de gesso publicado na Ata Ortopédica Brasileira em 20061 (Fig. 3).

Fig. 3
Ensaio de flexão em três pontos.

Foram excluídas duas talas de cada grupo, devido a erro na confecção da tala ou no teste de flexão.

Resultados

Da fundamentação teórica

Foram calculadas matematicamente as áreas de três tipos de tala piramidal, diferentes em número de camadas e posição do ápice piramidal, e comparadas à área equivalente de uma tala com formato convencional:

  1. Cálculo da área de tala piramidal com 12 camadas e fulcro central em comparação com tala convencional (Fig. 4).

  2. Cálculo da área de tala piramidal com 12 camadas e fulcro entre o primeiro e o segundo quarto, em comparação com tala convencional (Fig. 5).

  3. Cálculo da área de tala piramidal com 22 camadas e fulcro central, em comparação com tala convencional (Fig. 6).

Fig. 4
Representação gráfica da área ocupada por uma tala piramidal com 12 camadas e fulcro central. Enquanto a tala convencional ocupa uma área = 12c, a tala piramidal ocupa uma área = 8,4c.

Fig. 5
Representação gráfica e cálculo matemático da área. Enquanto a tala convencional ocupa uma área = 12c, a tala piramidal com 12 camadas e fulcro periférico ocupa uma área = 8,8c.

Fig. 6
Tala com 22 camadas e fulcro central. Enquanto a tala convencional ocupa uma área = 22c, a tala piramidal ocupa uma área = 13,45c.

Da pesagem e do ensaio de flexão

Após isso as talas foram levadas ao laboratório de engenharia mecânica da "Universidade X", onde se fizeram a pesagem das talas e o teste de flexão em três pontos, como já descrito anteriormente. Os resultados estão expressos em força, em newtons, necessária para deformar a tala em 3 cm, e no peso respectivo de cada tala, em gramas, e são apresentados na Tabela 1.

Tabela 1
Resultados da Pesagem e Teste de Flexão em Três Pontos.

O peso médio da tala convencional foi de 152,70 g e da tala piramidal 100,06 g, ou seja, 34,5% menor (p = 0,000005).

A força média, em newtons, necessária para a flexão da tala foi de 1,62 N na tala convencional e 2,05 N na tala piramidal, ou seja, 26,7% maior (p = 0,03).

Discussão

Quanto à parte teórica

É importante o aumento progressivo das camadas da tala, para que a resistência aumente harmonicamente conforme se aproxima do fulcro e para evitar a presença de degraus dentro dela, o que poderia causar desconforto ao paciente.

O número de degraus deve ser calculado conforme o comprimento da tala e o número de camadas. Com cinco degraus de cada lado, são conseguidas 12 camadas, com seis degraus são conseguidas 14 camadas, com sete degraus, 16 camadas e assim progressivamente, aumentando-se duas camadas para cada degrau aumentado, conforme a Tabela 2.

Tabela 2
Número de Degraus e a Espessura Resultante da Tala.

Por exemplo, uma tala antebráquio-palmar pode ser confeccionada com quatro degraus, o que resultaria em 10 camadas, espessura geralmente suficiente para esse tipo de tala. Já uma tala ínguino-maleolar pode ser confeccionada com oito degraus, resultando em 18 camadas.

Por meio do cálculo matemático da área ocupada pela tala, vê-se que a economia varia conforme a posição do fulcro em relação à tala, sendo maior quando o fulcro é central. Também varia conforme o número de degraus, sendo pouco maior quanto maior for o número de degraus. Varia, de outra forma, com o número de camadas usadas, pois quanto mais camadas, maior a economia em relação à tala confeccionada da forma habitual.

Outra consideração a ser feita é que esse formato de tala só é possível quando existe apenas um fulcro, como nas talas antebráquio-palmares, bráquio-antebraquias, ínguino-maleolares e suro-podálicas, não sendo, na prática, tecnicamente possível o cálculo de dois ápices piramidais em talas com dois fulcros, como as bráquio-palmares e ínguino-pédicas.

Quanto à parte prática

Existe uma maior dificuldade técnica na confecção da tala com formato piramidal: a marcação do fulcro, a divisão dos degraus e a submersão na bacia d'água sem que os degraus escorreguem. Nesse último ponto, pode-se usar uma pinça cirúrgica ou grampo de roupa comum preso ao fulcro para que as camadas não escorreguem umas sobre as outras.

Deve-se pensar também na aplicabilidade desse conceito em talas pequenas versus talas grandes. Em talas maiores, a vantagem, tanto econômica como de diminuição do peso, é maior.

Quanto aos resultados da diminuição do peso das talas, mais razoável é analisá-la com base na redução do peso visto na prova prática (pesagem), e não na teórica (cálculo matemático da área) - considerando-se que o gesso estava totalmente seco no momento da pesagem, isto é, cinco dias após sua confecção. Ressalta-se que essa diminuição do peso é diretamente proporcional à diminuição do custo. Portanto, uma tala gessada antebráquio-palmar, com 12 camadas, diminuiria seu peso de cerca de 150 g para 105 g e seu custo de cerca de R$ 2,00 para R$ 1,40 (considerando-se 30% de economia e usando-se duas ataduras de 8 cm x 2 m, cada uma custando US$ 1,00), ou, ainda melhor, uma tala gessada ínguino-maleolar com 22 camadas diminuiria seu peso de cerca de 1.500 g para 915 g e seu custo de cerca de R$ 20,00 para cerca de R$ 12,00 (considerando-se 38,9% de economia e usando-se quatro ataduras de 20 cm x 4 m, cada uma custando R$ 5,00.

Quanto aos resultados de resistência, apesar de o objetivo do trabalho ter sido conseguir resistência semelhante, conseguiu-se resistência à flexão ainda maior com o formato piramidal, o que, a princípio, não se consegue explicar.

Deve-se enfatizar a importância do estudo se dimensionar-mos a aplicação desses conceitos à magnitude dos gastos hospitalares com ataduras de gesso. E, finalmente, tão importante quanto essa, é que a diminuição do peso da tala beneficia o paciente.

Conclusão

A tala com formato piramidal apresenta diminuição estatisticamente significativa de peso, e consequentemente de custo, e aumento da resistência quando comparada às talas com formato convencional.

REFERENCES

  • 1
    Vieira GC, Fonseca MCR, Shimano AC, Mazzer M, Barbieri CH, Elui VCM. Avaliação das propriedades mecânicas de atadura gessada de três diferentes fabricantes, usada para confecção de órtese. Acta Ortop Bras. 2006;14(3):122-5.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2013

Histórico

  • Recebido
    02 Abr 2012
  • Aceito
    06 Jun 2012
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