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Lesões do ligamento cruzado posterior: características e associações mais frequentes

Resumos

OBJETIVO:

Pesquisar a prevalência das lesões do ligamento cruzado posterior (LCP) e suas combinações e correlações com o mecanismo e a ocorrência de luxação evidente e fratura associada.

MÉTODO:

Estudo retrospectivo de 85 lesões do LCP operadas entre 2003 e 2010. Diagnóstico por meio do exame físico e da radiografia dinâmica, confrontados com achados cirúrgicos.

RESULTADOS:

Lesões que envolveram o LCP foram mais prevalentes nos homens (78,8%) com média de idade de 33 anos. A causa principal foi o acidente de trânsito (73,80%), dos quais 49,4% de motocicleta. Lesão isolada do LCP ocorreu em 15,3% dos casos e combinada em 84,7%. Dentre as lesões isoladas, nove foram avulsões ósseas (10,6%). O ligamento mais associado às lesões do LCP foi o cruzado anterior (48,2%), seguido da lesão combinada do LCP com o ligamento colateral lateral/canto póstero-lateral (22,4%). Fraturas estiveram mais associadas à combinação LCP + LCL/CPL e não apareceram nas lesões do LCP + ligamento colateral medial/canto póstero-medial. Complicações além de fraturas: lesão de nervo periférico (4,8%) e vascular (1,2%). Luxação evidente no primeiro atendimento (16,7%), mais prevalente na combinação LCP + LCA + LCM/CPM (44,4%). Metade dos pacientes foi operada na fase aguda. Houve diferença estatística significativa (p < 0,05) na comparação de cada combinação de lesões de ligamentos com a presença de fratura, luxação evidente ou mecanismo do trauma.

CONCLUSÃO:

Lesões do LCP submetidas a tratamento cirúrgico em centro de atenção ao trauma ortopédico foram na sua maioria multiligamentares e envolveram principalmente o LCA. Houve associação significativa entre o tipo de lesão com o mecanismo de trauma, a forma de apresentação do joelho, se luxado ou reduzido, e a presença de fratura associada.

Estudos retrospectivos Joelho; Ligamento cruzado posterior/lesões; Ligamento cruzado posterior/cirurgia


OBJECTIVE:

To investigate the prevalence and combinations of PCL injuries and their correlations with the mechanism, the occurrence of evident dislocation and associated fracture.

METHOD:

A retrospective study of 85 lesions of PCL operated between 2003 and 2010. Diagnosis by physical examination and dynamic radiography, compared with surgical findings.

RESULTS:

Injuries involving the PCL were more prevalent in men (78.8%) with a mean age of 33 years. The main cause was traffic accidents (73.80%), and (49.4%) motorcycle. Isolated PCL injury occurred in (15.3%) cases, and combined (84.7%). Among the isolated lesions, bone avulsions were nine (10.6%). The most associated PCL injuries were the ACL (48.2%), followed by LCL PCL/PLC (22.4%). Fractures were more associated with combining PCL + LCL/PLC injuries and did not appear in the PCL + MCL/PMC. Complications beyond fractures: peripheral nerve injury (4.8%) and vascular (1.2%). Evident dislocation in primary care (16.7%) was more prevalent in combined ACL + PCL + MCL/PMC (44.4%). Half the patients were operated during the acute phase. There was a statistically significant difference (p < 0.05) comparing each combination of ligament injuries with the presence of fracture, dislocation or clear mechanism of injury.

CONCLUSION:

Surgical treatment of PCL injuries in a center for orthopedic trauma care was mostly multiligament and mainly involving the ACL. A significant association was seen between the type of injury with mechanism of injury, presentation of the knee, if dislocated or reduced, and the presence of associated fracture.

Retrospective studies Knee; Posterior cruciate ligament/injuries; Posterior cruciate ligament/surgery


Introdução

Com o aumento explosivo do número de veículos, principalmente motocicletas, as lesões dos membros inferiores, em particular as do joelho, transformaram-se em problema de saúde pública. Elas geram alto custo social e econômico. Melhorias no diagnóstico e avanços no conhecimento da anatomia, na biomecânica e nas técnicas cirúrgicas aumentaram o interesse nas pesquisas que envolvem o LCP.11. Fanelli GC, Beck JD, Edson CJ. Current concepts review: the posterior cruciate ligament. Knee Surg. 2010;23:61-72.

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5. Allen CR, Kaplan LD, Fluhme DJ, Harner CD. Posterior cruciate ligament injuries. Curr Opin Rheumatol. 2002;14:142-9.
- 66. McDonough EB, Wojtys EM. Multiligamentous injuries of the knee and associated vascular injuries. Am J Sports Med. 2009;37:156-9. Grande número das lesões do LCP tem como causa traumatismos de alta energia e nesses casos o exame do joelho pode ser difícil, principalmente quando o paciente apresenta fraturas do fêmur e/ou da tíbia ipsilaterais. Na avaliação desses pacientes, assim como nos politraumatismos, a lesão ligamentar pode passar despercebida no atendimento inicial.77. Dickson KF, Galland MW, Barrack RL, Neitzschman HR, Harris MB, Myers L, et al. Magnetic resonance imaging of the knee after ipsilateral femur fracture. J Orthop Trauma. 2002;16:567-71. , 88. Walker DM, Kennedy JC. Occult knee ligament injuries associated with femoral shaft fractures. Am J Sports Med. 1980;8:172-4. Existem poucos estudos que avaliam diferentes combinações de lesões que envolvem o LCP com o mecanismo, incidência de fratura no joelho acometido ou luxação evidente. O estudo dessas características pode contribuir para o diagnóstico correto na fase aguda e propiciar tratamento adequado no tempo ideal.

O objetivo deste trabalho foi pesquisar a prevalência das lesões combinadas do LCP e suas correlações com mecanismo, ocorrência de luxação evidente e fratura associada.

Material e método

Por meio de consulta aos registros de cirurgias da instituição, levantaram-se os prontuários de pacientes submetidos a tratamento cirúrgico de lesões do ligamento cruzado posterior do joelho de maio de 2003 a setembro de 2010 e encontraram-se 85 casos em 84 pacientes. Pesquisaram-se o mecanismo de trauma, o número de ligamentos lesados, a prevalência das diferentes combinações de lesões e a associação de cada uma delas com fraturas no joelho, luxação evidente, mecanismo de trauma e tempo decorrido entre acidente e tratamento definitivo. Na instituição onde foi feito o estudo o diagnóstico no setor de urgências foi comparado ao dos residentes em especialização no Grupo de Cirurgia do Joelho por meio da anamnese, do exame físico e de radiografias. Depois o diagnóstico foi revisto por cirurgiões de joelho, que fizeram exame físico e radiológico de estresse sob anestesia (dinâmico) no pré-operatório imediato. O diagnóstico foi complementado pelos achados cirúrgicos nos casos operados na fase aguda.

Fez-se análise descritiva das variáveis do estudo, usaram-se tabelas de frequência e medidas de tendência central/posição e variabilidade e fez-se análise inferencial para avaliar fatores associados às lesões, com o uso do teste qui-quadrado de Pearson para comparação de proporções e do teste exato de Fisher para amostras pequenas. Para variáveis numéricas, usou-se o teste não paramétrico de Mann-Whitney ou o teste de Kruskall-Wallis, por causa do caráter assimétrico das variáveis testadas. Considerou-se nível de significância de 5%. Foi usado o software SPSS 15.0.

Resultados

A incidência de lesões do LCP foi maior nos homens (78,8%) e a média de idade de 32,9 anos, com desvio padrão de 11,9. A maioria dos casos apresentou dois (43,5%) ou três (41,2%) ligamentos lesados. A prevalência da lesão isolada do LCP foi de 15,3%. Nove (10,6%) das lesões foram por avulsão óssea. Os acidentes de trânsito foram responsáveis por 73,8% das lesões e desses o mecanismo de trauma mais frequente (49,4%) foi o acidente de moto, seguido de atropelamento (20%) (tabela 1).

Tabela 1
Frequências - ligamentos lesados e mecanismo de trauma

A tabela 2 mostra a frequência de lesões associadas, luxação evidente e avulsão do LCP.

Tabela 2
Frequência das lesões associadas - luxação evidente - avulsão óssea do LCP

Lesões do LCP combinadas a outros ligamentos totalizaram 84,7% dos casos, maior número de envolvimento do LCA (48,2%), seguido do LCL/CPL (22,4%). A prevalência da lesão bicruzada sem combinação com ligamentos periféricos ou luxação evidente foi de 7,1%. Na análise da relação de cada combinação de lesões com a causa, o acidente de moto foi a mais frequente, com diferença estatística significativa (valor-p < 0,05), exceto para pacientes com combinação LCP + LCM/com, que tiveram o atropelamento como mecanismo mais frequente (41,7%) (tabela 3).

Tabela 3
Tipos de combinac¸ões de lesões x ocorrência de fraturas ou luxac¸ão evidente

Houve diferença significativa (p < 0,012) na comparação das diferentes combinações de lesões de ligamentos com a ocorrência de fratura ou apresentação na urgência com luxação evidente (p < 0,007). Fratura esteve mais associada com as combinações LCP + LCL/CPL (38,9%) e LCP/LCA + LCL/CPL (37,5%) e luxação evidente com a combinação LCP/LCA + LCM/CPM (44,4%) (tabela 4).

Tabela 4
Comparac¸ão - tipos de combinações de lesões x mecanismo

Em 85% dos casos os ligamentos do joelho foram operados nos primeiros oito meses, 50% desses na fase aguda, até três semanas após a lesão.

Discussão

Avaliaram-se neste estudo 85 lesões do LCP em pacientes submetidos a tratamento cirúrgico em centro de atenção ao trauma ortopédico entre maio de 2003 e dezembro de 2010. O diagnóstico foi feito por meio de exame clínico, com avaliação dinâmica do joelho sob anestesia, complementado pelos achados cirúrgicos nos casos operados na fase aguda. Quanto ao gênero, a relação foi de aproximadamente quatro homens para cada mulher e houve maior incidência na terceira década da vida, semelhantemente aos relatos da literatura.99. Schulz MS, Russe K, Weiler A, Eichhorn HJ, Strobel MJ. Epidemiology of posterior cruciate ligament injuries. Arch Orthop Trauma Surg. 2003;123:186-91. , 1010. Camargo OPA, Chamecki A, Lemos PEG, Pecora RAM. Lesão do ligamento cruzado posterior - Incidência e tratamento. Rev Bras Ortop. 1996;31:491-6.

Fanelli et al. 1111. Fanelli GC. Posterior cruciate ligament injuries in trauma patients. Arthroscopy. 1993;9:291-4. , 1212. Fanelli GC, Edson CJ. Posterior cruciate ligament injuries in trauma patients: part II. Arthroscopy. 1995;11:526-9. relatam incidência de 44% de lesão do LCP em centro terciário de atenção ao trauma, em joelhos com hemartrose, submetidos a exame sob anestesia e artroscopia. As causas principais foram os traumas de alta energia (81,5%) e as lesões do esporte (18%). Lesões isoladas ocorreram em 7,5% e combinadas com outros ligamentos em 92,5%. La Prade,1313. La Prade RF, Wentorf FA, Fritts H, Gundry C, Hightower CD. A prospective magnetic resonance imaging study of the incidence of posterolateral and multiple ligament injuries in acute knee injuries presenting with a hemarthrosis. Arthroscopy. 2007;23:1341-7. ao avaliar lesões ligamentares do joelho, constatou a ruptura do LCP em 14,4% dos casos e em 8,2% ao avaliar todos os pacientes com hemartrose após trauma agudo.

O diagnóstico da lesão de ligamentos do joelho na fase aguda faz-se a partir da anamnese detalhada, do exame físico cuidadoso e de radiografias de estresse sob anestesia. A ressonância magnética é considerada o padrão ouro.1313. La Prade RF, Wentorf FA, Fritts H, Gundry C, Hightower CD. A prospective magnetic resonance imaging study of the incidence of posterolateral and multiple ligament injuries in acute knee injuries presenting with a hemarthrosis. Arthroscopy. 2007;23:1341-7.

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- 1717. Clancy WG, Sutherland TB. Combined posterior cruciate ligament injuries. Clin Sports Med. 1994;13:629-47. Em alguns casos a lesão ligamentar não é diagnosticada, pois os sintomas podem ficar mascarados quando ocorrem, por exemplo, fraturas ipsilaterais, como relatado por Braga et al.1818. Braga GF, Cunha FM, Lazaroni AP. Instabilidade do joelho associada a fratura do fêmur. Rev Bras Ortop. 1999;34:329-32. Neste estudo os autores avaliaram no pós-operatório imediato 28 pacientes portadores de 29 fraturas instáveis do fêmur tratadas com haste intramedular bloqueada, com o objetivo de determinar a incidência de lesões ligamentares associadas. Oito (28,6%) pacientes apresentaram nove (32,1%) lesões dos ligamentos do joelho (um caso bilateral). Nenhuma lesão havia sido relatada no prontuário da urgência. No mesmo estudo a associação de lesão complexa do joelho com atropelamento foi estatisticamente significativa (p = 0,004). Os autores reafirmam a necessidade de exame rotineiro dos joelhos em pacientes com fratura ipsilateral do fêmur provocada por traumas de alto impacto.

Estudos que avaliam o exame clínico para diagnóstico das lesões do LCP apontaram graus variáveis de acurácia (96%), especificidade (99%) e sensibilidade (90%). Essa variou entre 70% para lesões grau I e 97% para lesões graus II e III.1919. Rubinstein RA, Shelbourne KD, McCarroll JR, Van Meter CD, Rettig AC. The accuracy of the clinical examination in the setting of posterior cruciate ligament injuries. Am J Sports Med. 1994;22:550-7. Resultados do exame clínico e das radiografias dinâmicas devem ser confrontados com a ressonância magnética.2020. Bui KL, Ilaslan H, Parker RD, Sundaram. Knee dislocations: a magnetic resonance imaging study correlated with clinical and operative findings. Skeletal Radiol. 2008;37, 653-61M. Infelizmente são poucos os hospitais no nosso meio que oferecem acesso a RM no setor de urgência, daí a importância de estudos que analisem resultados de avaliações das lesões agudas dos ligamentos com base no exame físico e radiológico dinâmico sob anestesia.

Na série em estudo detectaram-se 78,8% das lesões em acidentes de trânsito, 49,4% por motocicleta, resultados próximos dos de Fanelli,11. Fanelli GC, Beck JD, Edson CJ. Current concepts review: the posterior cruciate ligament. Knee Surg. 2010;23:61-72. que encontrou 81,5% dos casos em decorrência de traumatismo de alta energia. Schulz et al. 99. Schulz MS, Russe K, Weiler A, Eichhorn HJ, Strobel MJ. Epidemiology of posterior cruciate ligament injuries. Arch Orthop Trauma Surg. 2003;123:186-91. estudaram 494 pacientes e relatam como causas mais comuns o acidente de trânsito (45%) e os esportes (40%), a motocicleta (28%) e o futebol (25%) como as causas específicas mais comuns.

A identificação dos diferentes tipos de lesão dos ligamentos do joelho tem importância no prognóstico e na definição do tratamento. Lesões isoladas do LCP têm incidência baixa (7,5%) e as de graus I e II maior chance de cicatrização, da mesma forma que as lesões isoladas do LCM.2020. Bui KL, Ilaslan H, Parker RD, Sundaram. Knee dislocations: a magnetic resonance imaging study correlated with clinical and operative findings. Skeletal Radiol. 2008;37, 653-61M. , 2121. Parolie JM, Bergfeld JA. Long-term results of nonoperative treatment of isolated posterior cruciate ligament injuries in the athlete. Am J Sports Med. 1986;14:35-8. A lesão isolada do LCP pode ser assintomática, como relatado por Parolie e Bergfeld,2121. Parolie JM, Bergfeld JA. Long-term results of nonoperative treatment of isolated posterior cruciate ligament injuries in the athlete. Am J Sports Med. 1986;14:35-8. que identificaram incidência dessa característica em 2% de jogadores da National Football League (NFL). Em nossa série, diagnosticaram-se 15,3% de lesões isoladas do LCP, 69,2% delas avulsões ósseas, todas submetidas a tratamento cirúrgico.

Existem controvérsias quanto ao melhor tratamento para lesão isolada do LCP grau III e para aquelas combinadas com periférica medial.33. Shelbourne KD, Jennings RW, Vahey TN. Magnetic resonance imaging of posterior cruciate ligament injuries: assessment of healing. Am J Knee Surg. 1999;12:209-13.

4. Hermans S, Corten K, Bellemans J. Long-term results of isolated anterolateral bundle reconstructions of the posterior cruciate ligament a 6- to 12 -year follow-up study. Am J Sports Med. 2009;37:1499-507.
- 55. Allen CR, Kaplan LD, Fluhme DJ, Harner CD. Posterior cruciate ligament injuries. Curr Opin Rheumatol. 2002;14:142-9. Na série estudada, indicou-se tratamento cirúrgico para a lesão completa (grau III) do LCP ou combinada, quando o desvio posterior da tíbia sob o fêmur foi > 10 mm.88. Walker DM, Kennedy JC. Occult knee ligament injuries associated with femoral shaft fractures. Am J Sports Med. 1980;8:172-4. , 1919. Rubinstein RA, Shelbourne KD, McCarroll JR, Van Meter CD, Rettig AC. The accuracy of the clinical examination in the setting of posterior cruciate ligament injuries. Am J Sports Med. 1994;22:550-7. Em concordância com relato na literatura,55. Allen CR, Kaplan LD, Fluhme DJ, Harner CD. Posterior cruciate ligament injuries. Curr Opin Rheumatol. 2002;14:142-9. a cirurgia foi o tratamento indicado para lesões que envolveram o LCP ou LCP/LCA combinadas com estruturas laterais. Hammoud et al. 2222. Hammoud S, Reinhardt KR, Marx RG. Outcomes of posterior cruciate ligament treatment: a review of the evidence. Sports Med Arthrosc. 2010;18:280-91. fizeram estudo de revisão de 21 séries de casos de lesão isolada e 10 de lesões combinadas do LCP. Concluem que não há evidências quanto ao melhor tratamento ou a melhor técnica cirúrgica de escolha e que, apesar dos relatos de bons resultados após reconstrução do LCP, avaliações com seguimentos mais longos sugerem que na maioria dos casos a estabilidade normal do joelho não foi restaurada.

Em nossa série incluíram-se apenas casos submetidos a tratamento cirúrgico nos quais o mecanismo principal da lesão foi o traumatismo de alta energia. Essas características poderiam justificar o número elevado de acometimento de dois ou mais ligamentos em 85,9% dos casos. Em concordância com outros estudos, a lesão do LCP apareceu em maior número envolvendo o LCA, como lesão bicruzada característica ou na combinação com ligamentos periféricos mediais ou laterais.1010. Camargo OPA, Chamecki A, Lemos PEG, Pecora RAM. Lesão do ligamento cruzado posterior - Incidência e tratamento. Rev Bras Ortop. 1996;31:491-6. , 1919. Rubinstein RA, Shelbourne KD, McCarroll JR, Van Meter CD, Rettig AC. The accuracy of the clinical examination in the setting of posterior cruciate ligament injuries. Am J Sports Med. 1994;22:550-7.

Houve diferença estatística significativa na comparação das combinações de lesões dos ligamentos com a prevalência de fratura ou luxação evidente. Associação com fratura foi mais comum nas combinações do LCP com periférica lateral. Luxação evidente esteve mais associada com a combinação LCP/LCA e periférica lateral e não ocorreu na lesão isolada ou combinada do LCP com periférica medial. A prevalência de fraturas ou avulsões ósseas foi de 20,5%. A lesão bicruzada (LCA/LCP) não combinada com a periférica medial ou lateral e não associada à luxação evidente apareceu em 7,1% dos casos, muito abaixo dos relatos de Lustig et al.,2323. Lustig S, Leray E, Boisrenoult P, Trojani C, Laffargue P, Saragaglia D, et al. Dislocation and bicruciate lesions of the knee: epidemiology and acute stage assessment in a prospective series. Orthop Traumatol Surg Res. 2009;95:614-20. que encontraram essa combinação em 25% dos casos em estudo multicêntrico da Sociedade Francesa de Ortopedia e Traumatologia. Observe-se que aqueles autores dividiram as lesões multiligamentares complexas em lesão bicruzada (25,4%) e luxação traumática clássica (74,6%). Usaram critérios epidemiológicos, como idade, presença de lesão associada e tipo de lesão, para indicar ou não o tratamento cirúrgico. Optaram pela reconstrução do LCP, na fase aguda, nos pacientes abaixo de 60 anos, sem lesão vascular associada ou luxação exposta, quando a gaveta posterior foi maior do que 10 mm e/ou a abertura frontal, medial ou lateral maior do que 15 mm. Não indicaram reconstrução do LCA na fase aguda.

Na série avaliada em nosso estudo, apenas um caso foi encaminhado com relato de lesão da artéria poplítea e observou-se também prevalência baixa (4,8%) de lesão do nervo fibular comum se comparada a outros estudos.66. McDonough EB, Wojtys EM. Multiligamentous injuries of the knee and associated vascular injuries. Am J Sports Med. 2009;37:156-9. , 2424. Stannard JP, Sheils TM, Lopez-Ben RR, McGwin G, Robinson JT, Volgas DA. Vascular injuries in knee dislocation: the role of physical examination in determining the need for arteriography. J Bone Joint Surg Am. 2004;86:910-5.

Os pacientes foram operados em 85% dos casos em até oito meses e 50% desses nas primeiras três semanas, ou seja, na fase aguda. A maior mediana de tempo entre a lesão e a cirurgia (105 dias) ocorreu em pacientes com lesão do LCP + LCL/CPL e a menor (8,5 dias) com a lesão isolada do LCP por avulsão óssea. Lesões graves como as de LCP + LCL/CPL foram operadas tardiamente em alguns casos, o que contraria a conduta ideal de dar prioridade ao tratamento cirúrgico mais precoce nessa combinação de lesões. Na instituição onde o estudo foi feito, é frequente o recebimento de pacientes politraumatizados submetidos ao controle de dano, o que muitas vezes protela o tratamento definitivo da lesão ligamentar. Em séries como a de Schulz et al.,99. Schulz MS, Russe K, Weiler A, Eichhorn HJ, Strobel MJ. Epidemiology of posterior cruciate ligament injuries. Arch Orthop Trauma Surg. 2003;123:186-91. os especialistas de joelho receberam apenas 10,3% dos pacientes nos primeiros 30 dias após a lesão. A cirurgia foi feita no tempo médio de 44,4 meses.

O critério de incluir apenas pacientes submetidos a tratamento cirúrgico que envolvessem o LCP foi uma tentativa de criar grupo mais homogêneo em termos de causa e efeito. Contudo, Bui et al.,2020. Bui KL, Ilaslan H, Parker RD, Sundaram. Knee dislocations: a magnetic resonance imaging study correlated with clinical and operative findings. Skeletal Radiol. 2008;37, 653-61M. ao estudar a luxação do joelho, encontraram como mecanismo em 15 casos (75%) traumatismos considerados de baixa energia, como esportes amadores ou quedas simples, e apenas 20% por causa de traumatismos de alta energia, como acidentes de carro.

O número de 85 casos estudados parece adequado estatisticamente se considerarmos a incidência relativamente baixa de lesões do LCP na população geral. Na análise dos dados, considerando-se o grande número de combinações de lesões, algumas com prevalência muito baixa, usou-se análise estatística para pequenas amostras.

Conclusão

Lesões do LCP submetidas a tratamento cirúrgico em centro de atenção ao trauma ortopédico foram acompanhadas, em sua maioria, de lesões multiligamentares. O mecanismo de trauma mais prevalente foi o acidente de trânsito, notadamente com envolvimento de motocicletas e acometimento do sexo masculino. O LCA foi o ligamento mais frequentemente lesado na associação com o LCP, seguido pela lesão periférica lateral. Houve associação significativa entre o tipo de lesão com o mecanismo de trauma, forma de apresentação do joelho, se luxado ou reduzido, e presença de fratura associada.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sept-Oct 2013

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2012
  • Aceito
    03 Set 2012
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