Acessibilidade / Reportar erro

Relação entre obesidade, sarcopenia, obesidade sarcopênica e densidade mineral óssea em idosos com 80 anos ou mais Estudo feito no Departamento de Educação Física, Escola de Tecnologia e Ciências, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Presidente Prudente, SP, Brasil.

RESUMO

Objetivo

Analisar a relação entre os componentes e agravos da composição corporal (obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica) com a densidade mineral óssea em idosos com idade ≥ 80 anos.

Métodos

Estudo com delineamento transversal que avaliou 128 sujeitos entre 80 e 95 anos. A composição corporal e densidade mineral óssea foram mensuradas por meio da técnica de absorciometria de raios X de dupla energia. A velocidade de caminhada foi avaliada pelo teste de caminhada usual. Para análise estatística foram feitos os testes de correlação de Spearman, análise de variância com um fator, teste qui-quadrado e análise de regressão logística binária.

Resultados

Os idosos com sarcopenia apresentaram valores menores de DMO quando comparados com o grupo obesidade com maior chance de risco para a presença de osteopenia/osteoporose na coluna (OR: 2,81; IC: 1,11-7,11) e fêmur (OR: 2,75 IC: 1,02-7,44). Obesidade apresentou fator de proteção para osteopenia/osteoporose na coluna (OR: 0,43; IC: 0,20-0,93) e fêmur (OR: 0,27; IC: 0,12-0,62).

Conclusão

Observou-se que a massa magra está diretamente relacionada com a DMO (total, fêmur e coluna) e que a sarcopenia está associada à osteopenia/osteoporose em idosos com 80 anos ou mais.

Palavras-chave
Composição corporal; Osteoporose; Idosos 80 anos ou mais

ABSTRACT

Objective

This study sought to analyze the relationship between the components and aggravations of body composition (obesity, sarcopenia, and sarcopenic obesity) and bone mineral density in elderly subjects aged ≥80 years.

Methods

A cross-sectional study design was utilized to assess 128 subjects aged between 80 and 95 years. Body composition and bone mineral density were measured by dual energy X-ray absorptiometry. Gait speed was assessment by walking test. The statistical analyses included Spearman's correlation, one-way analysis of variance, the chi-squared test, and binary logistic regression analysis.

Results

The elderly subjects with sarcopenia had lower bone mineral density compared to the obesity group, with higher risk for presence of osteopenia/osteoporosis in the spine (OR: 2.81; CI: 1.11–7.11) and femur (OR: 2.75; CI: 1.02–7.44). Obesity was shown to be a protective factor for osteopenia/osteoporosis in the spine (OR: 0.43; CI: 0.20–0.93) and femur (OR: 0.27; CI: 0.12–0.62).

Conclusion

It was found that lean mass is more directly related to bone mineral density (total, femur, and spine) and sarcopenia is associated with osteopenia/osteoporosis. Obesity represents a possible protective factor for osteopenia/osteoporosis in elderly subjects aged 80 years and over.

Keywords
Body composition; Osteoporosis; Aged 80 years and over

Introdução

A prevalência de osteoporose é alta em idosos. Essa doença prejudica a capacidade funcional nessa população,11 Di Monaco M, Castiglioni C, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Men recover ability to function less than women do: an observational study of 1094 subjects after hip fracture. Am J Phys Med Rehabil. 2012;91(4):309-15. uma vez que pode aumentar a prevalência de quedas e fraturas22 Frost M, Wraae K, Abrahamsen B, Høiberg M, Hagen C, Andersen M, et al. Osteoporosis and vertebral fractures in men aged 60–74 years. Age Ageing. 2012;41(2):171-7. e levar à dependência na feitura de atividades diárias (ADL), por exemplo ficar de pé, sentar-se ou subir um lance de escadas, entre outras.

A densidade mineral óssea (DMO) é determinada pela quantidade de conteúdo mineral na área óssea e pode ser influenciada por vários fatores, tais como a composição corporal.33 Prevention and management of osteoporosis. World Health Organ Tech Rep Ser. 2003;921:1-164. Alguns estudos investigaram as relações individuais entre DMO e seus componentes (gordura corporal e massa magra). Genaro et al.44 Genaro PS, Pereira GA, Pinheiro MM, Szejnfeld VL, Martini LA. Influence of body composition on bone mass in postmenopausal osteoporotic women. Arch Gerontol Geriatr. 2010;51(3):295-8. observaram que, em mulheres pós-menopáusicas osteoporóticas, a massa magra está mais associada à DMO do que à gordura corporal. Por outro lado, Bleicher et al.55 Bleicher K, Cumming RG, Naganathan V, Travison TG, Sambrook PN, Blyth FM, et al. The role of fat and lean mass in bone loss in older men: findings from the CHAMP study. Bone. 2011;49(6):1299-305. sugeriram que a perda de gordura corporal está mais associada à DMO em homens com mais de 70 anos.

Supõe-se que ambos os componentes (gordura corporal e massa magra) poderiam contribuir para a manutenção da DMO, ao gerar uma sobrecarga mecânica nos ossos66 Bhupathiraju SN, Dawson-Hughes B, Hannan MT, Lichtenstein AH, Tucker KL. Centrally located body fat is associated with lower bone mineral density in older Puerto Rican adults. Am J Clin Nutr. 2011;94(4):1063-70.,77 Kaji H. Linkage between muscle and bone: common catabolic signals resulting in osteoporosis and sarcopenia. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2013;16(3):272-7. e favorecer a absorção de cálcio. No entanto, evidências recentes demonstraram que o excesso de gordura corporal não é um fator protetor para a DMO em indivíduos mais velhos.88 Nielson CM, Srikanth P, Orwoll ES. Obesity and fracture in men and women: an epidemiologic perspective. J Bone Miner Res. 2012;27(1):1-10.,99 Tanaka S, Kuroda T, Saito M, Shiraki M. Overweight/obesity and underweight are both risk factors for osteoporotic fractures at different sites in Japanese postmenopausal women. Osteoporos Int. 2013;24(1):69-76. Estudos mostram que a massa magra está diretamente associada à massa óssea1010 Di Monaco M, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Prevalence of sarcopenia and its association with osteoporosis in 313 older women following a hip fracture. Arch Gerontol Geriatr. 2011;52(1):71-4.,1111 Di Monaco M, Castiglioni C, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Sarcopenia is more prevalent in men than in women after hip fracture: a cross-sectional study of 591 inpatients. Arch Gerontol Geriatr. 2012;55(2):e48-52. e que uma diminuição na quantidade e qualidade de ambos está relacionada ao envelhecimento. A profunda diminuição da massa muscular que ocorre com o envelhecimento, associada à baixa força muscular ou ao baixo desempenho físico, caracteriza a sarcopenia1212 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23.; caso essa condição coexista com excesso de gordura corporal, é chamada de obesidade sarcopênica.1313 Zamboni M, Mazzali G, Fantin F, Rossi A, Di Francesco V. Sarcopenic obesity: a new category of obesity in the elderly. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2008;18(5):388-95.

Existe uma lacuna na literatura sobre o tema em indivíduos idosos com idade igual ou superior a 80 anos. Assim, o presente estudo teve como objetivo analisar a relação entre os elementos da composição corporal e complicações (obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica) com a DMO em indivíduos idosos de 80 anos ou mais.

Métodos

Características da amostra

Este foi um estudo transversal com uma amostra de conveniência, feito entre outubro de 2009 e maio de 2010 em Presidente Prudente (∼ 210.000 habitantes), São Paulo, na Região Sudeste do Brasil.

Residentes idosos de ambos os sexos, com 80 anos ou mais, foram convidados a participar. A Secretaria de Saúde forneceu os nomes, endereços e números de telefone dos indivíduos que usaram o serviço de saúde pública municipal. O convite foi feito por telefone e o estudo também foi divulgado na mídia. Responderam aos convites 135 voluntários. Indivíduos que não conseguiam caminhar, acamados, residentes de áreas rurais, internados, portadores de marca-passos e aqueles com dados incompletos no banco de dados foram excluídos. A amostra foi composta por 128 indivíduos.

Os objetivos e a metodologia usados para a coleta de dados foram explicados e os voluntários foram informados de que poderiam se retirar do estudo a qualquer momento. Apenas aqueles que assinaram o termo de consentimento informado foram incluídos na amostra. Todos os protocolos foram revisados e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual Paulista (Caso 26/2009).

Composição corporal

Para análise de composição corporal, usou-se equipamento de densitometria por emissão de raios X de dupla energia (DXA) da marca Lunar, modelo DPX-MD, software 4.7. Os dados foram transmitidos para um dispositivo conectado a um computador, no qual foram registrados os resultados de massa magra, gordura corporal e DMO. Para análise da DMO, foi avaliada a DMO do fêmur proximal total, da coluna lombar (L1-L4) e do corpo inteiro. Os exames foram feitos de acordo com as recomendações do fabricante.

Definição de grupos (obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica)

A amostra foi dividida em quatro grupos: (i) grupo normal (GN): indivíduos que não eram obesos ou sarcopênicos; (ii) grupo obesidade (GO): indivíduos classificados com porcentagem de gordura acima do 60° percentil (33,9% e 43,6% para homens e mulheres, respectivamente), de acordo com as recomendações de Baumgartner et al.;1414 Baumgartner RN, Wayne SJ, Waters DL, Janssen I, Gallagher D, Morley JE. Sarcopenic obesity predicts instrumental activities of daily living disability in the elderly. Obes Res. 2004;12(12):1995-2004. (iii) grupo sarcopenia (SG): indivíduos com baixa massa muscular e velocidade da marcha foram classificados como sarcopênicos. Para a classificação da massa muscular, usou-se o índice de massa magra apendicular (MMA; massa magra do membro superior + massa magra do membro inferior [kg] / estatura [m]2). A massa muscular foi considerada como baixa quando o índice de MMA estava abaixo de 7,59 kg/m2 e 5,57 kg/m2 para homens e mulheres, respectivamente. A adoção desses pontos de corte baseou-se em dois desvios-padrão abaixo da média de um grupo de referência de adultos jovens (n = 60; 25 homens e 35 mulheres) entre 20 e 30 anos, como sugerido por Baumgartner et al.1515 Baumgartner RN, Koehler KM, Gallagher D, Romero L, Heymsfield SB, Ross RR, et al. Epidemiology of sarcopenia among the elderly in New Mexico. Am J Epidemiol. 1998;147(8):755-63. Erratum in: Am J Epidemiol 1999;149(12):1161. Velocidade de marcha abaixo de 0,8 m/s, em um teste de caminhada de 3 mm foi considerada como baixa, de acordo com Cruz-Jentoft et al.;1212 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. (iv) grupo obesidade sarcopênica (GOS): indivíduos que apresentaram tanto obesidade quanto sarcopenia.

Osteopenia/osteoporose

O diagnóstico de osteopenia ou osteoporose foi feito de acordo com os critérios estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde.33 Prevention and management of osteoporosis. World Health Organ Tech Rep Ser. 2003;921:1-164.

Velocidade da marcha

A velocidade de marcha foi estabelecida pelo desempenho em um teste de caminhada de 3 m.1616 Guralnik JM, Simonsick EM, Ferrucci L, Glynn RJ, Berkman LF, Blazer DG, et al. A short physical performance battery assessing lowerb extremity function: association with self-reported disability and prediction of mortality and nursing home admission. J Gerontol. 1994;49(2):M85-94. Os voluntários receberam a orientação de caminhar naturalmente, registrou-se o menor tempo (em segundos) obtido em duas tentativas.

Medições antropométricas

O peso corporal foi medido com uma balança eletrônica e a altura, por um estadiômetro fixo. Essas medidas foram usadas para calcular o índice de massa corporal (IMC [peso (kg)/altura (m)2]) de acordo com os procedimentos descritos por Freitas Júnior.1717 Freitas Júnior IF. Medidas: estatura, peso, comprimento dos segmentos. In: Padronização de técnicas antropométricas. Cultura Acadêmica: Presidente Prudente (SP); 2009. p. 23–5.

Tabagismo

O tabagismo foi relatado pelos voluntários durante as entrevistas. As opções de perguntas e respostas são descritas abaixo:

  1. Você fuma atualmente?

  2. Você fumou no passado?

Análise estatística

As estatísticas descritivas consistiam em média e desvio-padrão. Os valores médios de cada variável foram comparados entre os grupos, com a análise de variância (Anova) seguida do teste de Tukey post-hoc unidirecional. A correlação de Spearman foi usada para analisar a relação entre DMO e composição corporal. Para comparar a DMO entre os grupos (GN, GO, GS e GOS), usou-se Anova unidirecional seguida do teste de Tukey post-hoc. O teste do qui-quadrado foi usado para analisar a associação entre obesidade, sarcopenia, obesidade sarcopênica e presença de osteopenia/osteoporose. A análise de regressão logística binária foi usada para expressar a magnitude das associações em razão de possibilidades (odds ratio [OR]) e seus intervalos de confiança de 95%. O software SPSS (SPSS Inc., Chicago, IL), versão 17.0, foi usado para a análise estatística e o nível de significância foi estabelecido em 5%.

Resultados

A maioria dos participantes era do sexo feminino (63% vs. 37%); a maioria dos indivíduos idosos tinha entre 80 e 84 anos (78% vs. 22%) e 38% da amostra foram compostos por ex- ou atuais tabagistas.

A tabela 1 apresenta as características gerais da amostra e a comparação entre os grupos. Não se observou diferença entre os grupos em relação à altura e massa magra total. O GO apresentou menor idade em comparação com o GOS (p = 0,024). O grupo GS apresentou menor peso corporal em comparação com os grupos GO e GOS (p ≤ 0,001), menor IMC em comparação com os outros três grupos (p ≤ 0,001) e menor MMA em comparação com os grupos GN e GO (p = 0,007). Os grupos GO e GOS apresentaram maior massa gorda em comparação com os grupos GN e GS (p ≤ 0,001).

Tabela 1
Características e comparações da amostra de acordo com o grupo

A tabela 2 apresenta os valores das correlações de Spearman entre as variáveis composição corporal e DMO do fêmur, da coluna vertebral e corpo inteiro. A massa gorda apresentou correlações de 0,39, 0,32 e 0,41 (p ≤ 0,001) com DMO do fêmur proximal total, da coluna e do corpo inteiro, respectivamente, enquanto a massa magra apresentou correlações de 0,55, 0,52 e 0,67 (p ≤ 0,001) e a MMA de 0,53, 0,42, 0,62 (p ≤ 0,001), respectivamente.

Tabela 2
Correlação entre variáveis de composição corporal e densidade mineral óssea em idosos com idade igual ou superior a 80 anos

A figura 1 apresenta a comparação da DMO entre os quatro grupos investigados. As médias da DMO da extremidade proximal do fêmur total e a DMO do corpo inteiro no grupo GO (0,87 g/cm2 e 1,06 g/cm2, respectivamente) foram diferentes daquelas no GN (0,78 g/cm2 e 1,00 g/cm2) e GS (0,75 g/cm2 e 0,98 g/cm2).

Figura 1
Comparação do desvio-padrão e médio da densidade mineral óssea (coluna vertebral, fêmur proximal total e coluna vertebral) entre os grupos normal, obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica.

A tabela 3 mostra a associação entre a presença de osteopenia/osteoporose (coluna vertebral e extremidade proximal do fêmur total) e obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica. A obesidade mostrou ser um fator protetor para osteopenia/osteoporose na coluna vertebral e na extremidade proximal do fêmur total. Os participantes idosos com sarcopenia tiveram mais chances de apresentar osteopenia/osteoporose no fêmur e coluna vertebral, independentemente da idade e do tabagismo.

Tabela 3
Associação entre a presença de osteopenia/osteoporose e obesidade, sarcopenia e obesidade sarcopênica em idosos com idade igual ou superior a 80 anos

A variável sexo apresentou significância estatística no modelo quanto à associação entre obesidade e osteopenia/osteoporose no fêmur (OR: 0,21; IC 95%: 0,08-0,57), indicou proteção para mulheres. Essa variável também foi estatisticamente significativa quanto à associação entre sarcopenia e osteopenia/osteoporose no fêmur (OR: 0,29; IC 95%: 0,11-0,78), indicou proteção para mulheres, bem como na coluna vertebral (OR: 2,78; IC 95%: 1.09-7.19), nesse caso com maior risco para as mulheres.

Discussão

O presente estudo observou que a massa magra está mais diretamente relacionada à DMO (corpo inteiro, fêmur e coluna vertebral) e que a deterioração da composição corporal, a sarcopenia, pode estar relacionada à baixa DMO e à presença de osteoporose no fêmur e na coluna vertebral.

A associação direta entre massa magra e DMO encontrada no presente estudo corrobora os achados publicados anteriormente na literatura científica.1818 Verschueren S, Gielen E, O’Neill TW, Pye SR, Adams JE, Ward KA, et al. Sarcopenia and its relationship with bone mineral density in middle-aged and elderly European men. Osteoporos Int. 2013;24(1):87-98.,1919 Cheng Q, Zhu X, Zhang X, Li H, Du Y, Hong W, et al. A cross-sectional study of loss of muscle mass corresponding to sarcopenia in healthy Chinese men and women: reference values, prevalence, and association with bone mass. J Bone Miner Metab. 2014;32(1):78-88. Um dos fatores fisiológicos que parecem contribuir para essa relação é o fato de que os músculos também apresentam função endócrina, produzem moléculas bioativas, o que pode contribuir para a regulação homeostática de ambas as massas (muscular e óssea).2020 Karasik D, Kiel DP. Evidence for pleiotropic factors in genetics of the musculoskeletal system. Bone. 2010;46(5):1226-37. Quanto à relação entre sarcopenia e osteoporose, estudos recentes apontaram essa ligação; 1010 Di Monaco M, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Prevalence of sarcopenia and its association with osteoporosis in 313 older women following a hip fracture. Arch Gerontol Geriatr. 2011;52(1):71-4.,1111 Di Monaco M, Castiglioni C, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Sarcopenia is more prevalent in men than in women after hip fracture: a cross-sectional study of 591 inpatients. Arch Gerontol Geriatr. 2012;55(2):e48-52.,2121 Sjöblom S, Suuronen J, Rikkonen T, Honkanen R, Kröger H, Sirola J. Relationship between postmenopausal osteoporosis and the components of clinical sarcopenia. Maturitas. 2013;75(2):175-80.2323 Miyakoshi N, Hongo M, Mizutani Y, Shimada Y. Prevalence of sarcopenia in Japanese women with osteopenia and osteoporosis. J Bone Miner Metab. 2013;31(5):556-61. sugere-se que outras investigações mais detalhadas sobre esse aspecto sejam feitas, se considerarmos que a presença dessas duas condições é a principal causa de incapacidade, hospitalização e dispêndios em cuidados de saúde em idosos.2424 Janssen I, Shepard DS, Katzmarzyk PT, Roubenoff R. The healthcare costs of sarcopenia in the United States. J Am Geriatr Soc. 2004;52(1):80-5.,2525 Carlos F, Clark P, Galindo-Suárez RM, Chico-Barba LG. Health care costs of osteopenia, osteoporosis, and fragility fractures in Mexico. Arch Osteoporos. 2013;8:125. Os resultados do presente estudo demonstraram que indivíduos idosos com sarcopenia têm aproximadamente quatro vezes mais chances de apresentar osteopenia/osteoporose no fêmur. Similarmente aos achados do presente estudo, Go et al.2222 Go SW, Cha YH, Lee JA, Park HS. Association between sarcopenia, bone density, and health-related quality of life in Korean men. Korean J Fam Med. 2013;34(4):281-8. observaram que homens com mais de 50 anos com osteopenia/osteoporose têm mais chance de apresentar sarcopenia. Verschueren et al.1818 Verschueren S, Gielen E, O’Neill TW, Pye SR, Adams JE, Ward KA, et al. Sarcopenia and its relationship with bone mineral density in middle-aged and elderly European men. Osteoporos Int. 2013;24(1):87-98. descobriram que homens de meia-idade e idosos de 40 a 79 anos tinham uma probabilidade três vezes maior de apresentar osteoporose. Sjoblom et al.2121 Sjöblom S, Suuronen J, Rikkonen T, Honkanen R, Kröger H, Sirola J. Relationship between postmenopausal osteoporosis and the components of clinical sarcopenia. Maturitas. 2013;75(2):175-80. investigaram um grupo de mulheres pós-menopáusicas entre 65 e 72 anos e observaram que as mulheres com sarcopenia apresentaram 12,9 e 2,7 vezes mais chances de apresentar osteoporose e fraturas, respectivamente, e um risco 2,1 vezes maior de terem caído nos 12 meses anteriores em comparação com mulheres sem sarcopenia. Os presentes achados indicam que indivíduos acima de 80 anos com sarcopenia apresentam maior chance de osteoporose em comparação com indivíduos mais jovens.

Estudos indicam que sarcopenia e osteoporose são condições clínicas associadas à mesma etiologia (inflamação, deficiências hormonais e nutricionais e inatividade física) e os mesmos fatores de risco para lesões músculo-esqueléticas.2626 Ferrucci L, Baroni M, Ranchelli A, Lauretani F, Maggio M, Mecocci P, et al. Interaction between bone and muscle in older persons with mobility limitations. Curr Pharm Des. 2014;20(19):3178-97. Um aumento na massa muscular provoca alongamento das fibras de colágeno e do periósteo na interface, resulta em estimulação do crescimento ósseo no local. Além disso, o maior fluxo sanguíneo para o osso pode levar a um aumento da força óssea; como o aumento do fluxo sanguíneo nos membros é proporcional à quantidade de massa muscular, sua diminuição nesses locais pode levar à osteoporose.77 Kaji H. Linkage between muscle and bone: common catabolic signals resulting in osteoporosis and sarcopenia. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2013;16(3):272-7.

Evidências recentes indicam que a obesidade não é um fator protetor para osteoporose e fraturas em indivíduos idosos,88 Nielson CM, Srikanth P, Orwoll ES. Obesity and fracture in men and women: an epidemiologic perspective. J Bone Miner Res. 2012;27(1):1-10.,99 Tanaka S, Kuroda T, Saito M, Shiraki M. Overweight/obesity and underweight are both risk factors for osteoporotic fractures at different sites in Japanese postmenopausal women. Osteoporos Int. 2013;24(1):69-76.,2727 Tang X, Liu G, Kang J, Hou Y, Jiang F, Yuan W, et al. Obesity and risk of hip fracture in adults: a meta-analysis of prospective cohort studies. PLoS ONE. 2013;8(4):e55077. devido aos efeitos adversos causados pelo tecido adiposo, tais como o estresse oxidativo e a síntese de adipocitocinas pró-inflamatórias que afetam o metabolismo ósseo.66 Bhupathiraju SN, Dawson-Hughes B, Hannan MT, Lichtenstein AH, Tucker KL. Centrally located body fat is associated with lower bone mineral density in older Puerto Rican adults. Am J Clin Nutr. 2011;94(4):1063-70.,2828 Cao JJ. Effects of obesity on bone metabolism. J Orthop Surg Res. 2011;6:30. No entanto, no presente estudo de indivíduos idosos com mais de 80 anos, os resultados revelaram que, nessa faixa etária, a obesidade é um fator protetor para osteopenia/osteoporose na coluna vertebral e no fêmur. Os presentes achados estão de acordo com aqueles observados por Marwaha et al.2929 Marwaha RK, Garg MK, Tandon N, Mehan N, Sastry A, Bhadra K. Relationship of body fat and its distribution with bone mineral density in Indian population. J Clin Densitom. 2013;16(3):353-9. em adultos de ambos os sexos e por Yang et al.3030 Yang S, Nguyen ND, Center JR, Eisman JA, Nguyen TV. Association between abdominal obesity and fracture risk: a prospective study. J Clin Endocrinol Metab. 2013;98(6):2478-83. em mulheres com mais de 50 anos, corroboram a conclusão tradicional de que a obesidade é benéfica para a saúde óssea devido ao efeito positivo bem estabelecido da carga mecânica conferida pelo peso corporal na formação óssea, uma vez que a carga mecânica estimula a formação óssea, diminui a apoptose e aumenta a proliferação e diferenciação de osteoblastos e osteócitos.2828 Cao JJ. Effects of obesity on bone metabolism. J Orthop Surg Res. 2011;6:30. É importante destacar que os efeitos do excesso de gordura corporal na BMD ainda não foram completamente elucidados e que podem variar de acordo com o tipo e distribuição de gordura (subcutânea e visceral).2929 Marwaha RK, Garg MK, Tandon N, Mehan N, Sastry A, Bhadra K. Relationship of body fat and its distribution with bone mineral density in Indian population. J Clin Densitom. 2013;16(3):353-9.

Ao comparar os valores médios da DMO, os valores para idosos com obesidade sarcopênica foram semelhantes aos do GO (fig. 1); no entanto, a associação entre obesidade sarcopênica e osteoporose não foi estatisticamente significativa. Esse resultado indica que a chance de osteoporose em indivíduos idosos com obesidade sarcopênica é menor do que naqueles com apenas sarcopenia, uma vez que o risco parece ser reduzido devido excesso de gordura corporal, mas a associação entre obesidade e sarcopenia não elimina o risco de osteoporose no fêmur causado pela sarcopenia. Esses resultados são semelhantes aos relatados por Beck et al.3131 Beck TJ, Petit MA, Wu G, LeBoff MS, Cauley JA, Chen Z. Does obesity really make the femur stronger? BMD, geometry, and fracture incidence in the women's health initiative-observational study. J Bone Miner Res. 2009;24(8):1369-79. em mulheres pós-menopáusicas; aqueles autores observaram que, em termos absolutos, a DMO e a força geométrica femoral são maiores em indivíduos com IMC mais elevado. No entanto, esse aumento na DMO e força geométrica variam com a proporção de massa muscular, e não com o peso corporal ou com a massa gorda, isso mostra que a massa magra exerce grande influência sobre essa relação.

Como uma ressalva, é importante observar que o desenho transversal do presente estudo não permite estabelecer uma relação de causalidade; no entanto, um número reduzido de estudos teve como objetivo verificar esses aspectos em idosos acima de 80 anos. No presente estudo, a análise da densidade mineral óssea foi feita por DXA, o equipamento padrão-ouro para esse tipo de diagnóstico.

Conclusão

A massa magra está mais diretamente relacionada à DMO (corpo inteiro, fêmur e coluna vertebral) e a sarcopenia está associada à osteopenia/osteoporose. A obesidade é um possível fator protetor contra osteopenia/osteoporose em indivíduos idosos acima de 80 anos. Medidas preventivas, tais como a prática de atividade física ao longo da vida, podem ajudar a preservar a massa muscular e óssea e reduzir assim o risco de sarcopenia, obesidade sarcopênica e osteoporose em indivíduos mais velhos.

  • Estudo feito no Departamento de Educação Física, Escola de Tecnologia e Ciências, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Presidente Prudente, SP, Brasil.

Agradecimentos

Reconhecemos o apoio de Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Brasil.

REFERENCES

  • 1
    Di Monaco M, Castiglioni C, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Men recover ability to function less than women do: an observational study of 1094 subjects after hip fracture. Am J Phys Med Rehabil. 2012;91(4):309-15.
  • 2
    Frost M, Wraae K, Abrahamsen B, Høiberg M, Hagen C, Andersen M, et al. Osteoporosis and vertebral fractures in men aged 60–74 years. Age Ageing. 2012;41(2):171-7.
  • 3
    Prevention and management of osteoporosis. World Health Organ Tech Rep Ser. 2003;921:1-164.
  • 4
    Genaro PS, Pereira GA, Pinheiro MM, Szejnfeld VL, Martini LA. Influence of body composition on bone mass in postmenopausal osteoporotic women. Arch Gerontol Geriatr. 2010;51(3):295-8.
  • 5
    Bleicher K, Cumming RG, Naganathan V, Travison TG, Sambrook PN, Blyth FM, et al. The role of fat and lean mass in bone loss in older men: findings from the CHAMP study. Bone. 2011;49(6):1299-305.
  • 6
    Bhupathiraju SN, Dawson-Hughes B, Hannan MT, Lichtenstein AH, Tucker KL. Centrally located body fat is associated with lower bone mineral density in older Puerto Rican adults. Am J Clin Nutr. 2011;94(4):1063-70.
  • 7
    Kaji H. Linkage between muscle and bone: common catabolic signals resulting in osteoporosis and sarcopenia. Curr Opin Clin Nutr Metab Care. 2013;16(3):272-7.
  • 8
    Nielson CM, Srikanth P, Orwoll ES. Obesity and fracture in men and women: an epidemiologic perspective. J Bone Miner Res. 2012;27(1):1-10.
  • 9
    Tanaka S, Kuroda T, Saito M, Shiraki M. Overweight/obesity and underweight are both risk factors for osteoporotic fractures at different sites in Japanese postmenopausal women. Osteoporos Int. 2013;24(1):69-76.
  • 10
    Di Monaco M, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Prevalence of sarcopenia and its association with osteoporosis in 313 older women following a hip fracture. Arch Gerontol Geriatr. 2011;52(1):71-4.
  • 11
    Di Monaco M, Castiglioni C, Vallero F, Di Monaco R, Tappero R. Sarcopenia is more prevalent in men than in women after hip fracture: a cross-sectional study of 591 inpatients. Arch Gerontol Geriatr. 2012;55(2):e48-52.
  • 12
    Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23.
  • 13
    Zamboni M, Mazzali G, Fantin F, Rossi A, Di Francesco V. Sarcopenic obesity: a new category of obesity in the elderly. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2008;18(5):388-95.
  • 14
    Baumgartner RN, Wayne SJ, Waters DL, Janssen I, Gallagher D, Morley JE. Sarcopenic obesity predicts instrumental activities of daily living disability in the elderly. Obes Res. 2004;12(12):1995-2004.
  • 15
    Baumgartner RN, Koehler KM, Gallagher D, Romero L, Heymsfield SB, Ross RR, et al. Epidemiology of sarcopenia among the elderly in New Mexico. Am J Epidemiol. 1998;147(8):755-63. Erratum in: Am J Epidemiol 1999;149(12):1161.
  • 16
    Guralnik JM, Simonsick EM, Ferrucci L, Glynn RJ, Berkman LF, Blazer DG, et al. A short physical performance battery assessing lowerb extremity function: association with self-reported disability and prediction of mortality and nursing home admission. J Gerontol. 1994;49(2):M85-94.
  • 17
    Freitas Júnior IF. Medidas: estatura, peso, comprimento dos segmentos. In: Padronização de técnicas antropométricas. Cultura Acadêmica: Presidente Prudente (SP); 2009. p. 23–5.
  • 18
    Verschueren S, Gielen E, O’Neill TW, Pye SR, Adams JE, Ward KA, et al. Sarcopenia and its relationship with bone mineral density in middle-aged and elderly European men. Osteoporos Int. 2013;24(1):87-98.
  • 19
    Cheng Q, Zhu X, Zhang X, Li H, Du Y, Hong W, et al. A cross-sectional study of loss of muscle mass corresponding to sarcopenia in healthy Chinese men and women: reference values, prevalence, and association with bone mass. J Bone Miner Metab. 2014;32(1):78-88.
  • 20
    Karasik D, Kiel DP. Evidence for pleiotropic factors in genetics of the musculoskeletal system. Bone. 2010;46(5):1226-37.
  • 21
    Sjöblom S, Suuronen J, Rikkonen T, Honkanen R, Kröger H, Sirola J. Relationship between postmenopausal osteoporosis and the components of clinical sarcopenia. Maturitas. 2013;75(2):175-80.
  • 22
    Go SW, Cha YH, Lee JA, Park HS. Association between sarcopenia, bone density, and health-related quality of life in Korean men. Korean J Fam Med. 2013;34(4):281-8.
  • 23
    Miyakoshi N, Hongo M, Mizutani Y, Shimada Y. Prevalence of sarcopenia in Japanese women with osteopenia and osteoporosis. J Bone Miner Metab. 2013;31(5):556-61.
  • 24
    Janssen I, Shepard DS, Katzmarzyk PT, Roubenoff R. The healthcare costs of sarcopenia in the United States. J Am Geriatr Soc. 2004;52(1):80-5.
  • 25
    Carlos F, Clark P, Galindo-Suárez RM, Chico-Barba LG. Health care costs of osteopenia, osteoporosis, and fragility fractures in Mexico. Arch Osteoporos. 2013;8:125.
  • 26
    Ferrucci L, Baroni M, Ranchelli A, Lauretani F, Maggio M, Mecocci P, et al. Interaction between bone and muscle in older persons with mobility limitations. Curr Pharm Des. 2014;20(19):3178-97.
  • 27
    Tang X, Liu G, Kang J, Hou Y, Jiang F, Yuan W, et al. Obesity and risk of hip fracture in adults: a meta-analysis of prospective cohort studies. PLoS ONE. 2013;8(4):e55077.
  • 28
    Cao JJ. Effects of obesity on bone metabolism. J Orthop Surg Res. 2011;6:30.
  • 29
    Marwaha RK, Garg MK, Tandon N, Mehan N, Sastry A, Bhadra K. Relationship of body fat and its distribution with bone mineral density in Indian population. J Clin Densitom. 2013;16(3):353-9.
  • 30
    Yang S, Nguyen ND, Center JR, Eisman JA, Nguyen TV. Association between abdominal obesity and fracture risk: a prospective study. J Clin Endocrinol Metab. 2013;98(6):2478-83.
  • 31
    Beck TJ, Petit MA, Wu G, LeBoff MS, Cauley JA, Chen Z. Does obesity really make the femur stronger? BMD, geometry, and fracture incidence in the women's health initiative-observational study. J Bone Miner Res. 2009;24(8):1369-79.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    3 Mar 2017
  • Aceito
    2 Maio 2017
  • Publicado
    22 Set 2017
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br