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Da Individuação à Cumulatividade: a incorporação nominal em Tenetehára (Tupí-Guaraní)

From Individuation to Cumulativity: the noun incorporation in Tenetehára (Tupí-Guaraní)

RESUMO

Para expressar individuação e cumulatividade, as línguas naturais apresentam uma significativa diversidade de mecanismos gramaticais que envolvem estratégias lexicais, morfológicas e sintáticas. Pretendemos demonstrar que, na língua Tenetehára (Tupí-Guaraní), a incorporação nominal constitui-se como um desses recursos. Para isso, será discutida essa operação sintática, que expressa baixo grau de individuação do termo incorporado, além de resultar ainda em nomes com uma interpretação cumulativa. Embora não haja, por exemplo, artigos nessa língua que possam denotar definitude ou especificidade, objetos não incorporados apresentam maior grau de individuação quando são contrastados com suas versões incorporadas. A análise aqui proposta se fundamenta em dados linguísticos elicitados que compreendem as duas estratégias de incorporação nominal nessa língua: (i) incorporação nominal com redução de valência, que envolve a incorporação do objeto de verbos transitivos; e (ii) incorporação sem diminuição de valência, que diz respeito à incorporação do termo possuído de sintagmas nominais na função sintática de sujeito de verbos intransitivos e objeto de transitivos.

Palavras-chave:
tupí-guaraní; tenetehára; incorporação nominal; cumulatividade; individuação

ABSTRACT

To express individuation and cumulativity, natural languages present a significant diversity of grammatical mechanisms that involve lexical, morphological, and syntactic strategies. We intend to demonstrate that, in the Tenetehára language (Tupí-Guaraní), noun incorporation is one of these resources. In this regard, we discuss the syntactic operation of incorporation, which expresses a low degree of individuation of the incorporated term, in addition to resulting in nouns with a cumulative interpretation. Although, for example, there are no articles in this language that can denote definiteness or specificity, non-incorporated objects present a greater degree of individuation when they are contrasted with their incorporated versions. The analysis proposed here is based on elicited linguistic data that comprise the two strategies of noun incorporation in this language: (i) noun incorporation with valence reduction, which involves incorporation of the object of transitive verbs; and (ii) incorporation without valence reduction, which concerns the incorporation of the possessed constituent of noun phrases in the syntactic function of subject of intransitive verbs and object of transitive verbs.

Keywords:
tupí-guaraní; tenetehára; noun incorporation; cumulativity; individuation

1. Introdução

De acordo com Hopper e Thompson (1980Hopper, P. J., & Thompson, S. A. (1980). Transitivity in Grammar and Discourse. Language, 56(2), 251-299.), Haspelmath (1987Haspelmath, M. (1987). Transitivity alternations of the anticausative type. Arbeitspapiere, 4, 1-51.), Dowty (1989Dowty, D. R. (1989). On the semantic content of the notion ‘thematic role’. In B. Partee, G. Chierchia, & R. Turner (Eds.), Properties, types and meanings 2 (pp. 69-130). Kluwer.), Dahl e Fraurud (1996Dahl, Ö., & Fraurud, K. (1996). Animacy in grammar and discourse. In T. Fretheim, & J. K. Gundel (Eds.), Reference and Referent Accessibility (pp. 47-64). John Benjamins Publishing Company.), entre muitos outros, a individuação refere-se essencialmente ao grau em que compreendemos algo como uma entidade individual claramente identificável e delimitada. Não há dúvida, por exemplo, de que nomes próprios, como Pedro e Maria, ou nomes comuns, como árvore ou casa, são expressões que ilustram muito bem o que se denomina como entidades individuadas, haja vista fazerem referência a entidades individuais perfeitamente identificáveis. De modo paralelo, há outras expressões nominais que se caracterizam por serem não individuadas, exatamente porque é difícil identificar suas delimitações e, por isso, não são percebidas como entidades individuais. Esse último caso pode ser muito bem exemplificado por expressões nominais que denotam substâncias ou líquidos (nomes massivos), tais como água ou barro, por exemplo.

Embora haja trabalhos que assumem um distinção binária, como fizemos acima, entre objetos individuados e não individuados (cf. Bloom, 1990Bloom, P. (1990). Semantic structure and language development [Doctoral dissertation, Massachusetts Institute of Technology]. DSpace@MIT. https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/13686.
https://dspace.mit.edu/handle/1721.1/136...
, 1994Bloom, P. (1994). Possible names: The role of syntax-semantics mappings in the acquisition of nominals. Lingua, 92, 297-329.; Wisniewski et al., 1996Wisniewski, E.J., Imai, M., & Casey, L. (1996). On the equivalence of superordinate concepts. Cognition, 60, 269-298.; Barner & Snedeker, 2005Barner, D., & Snedeker, J. (2005). Quantity judgments and individuation: evidence that mass nouns count. Cognition, 97, 41-66.; entre muitos outros), uma abordagem que adota a propriedade de individuação de forma hierárquica e gradual, como fazem Yamamoto (1999Yamamoto, M. (1999). Animacy and reference: a cognitive approach to corpus linguistics. John Benjamins Publishing Company.) e Grimm (2018Grimm, S. (2018). Grammatical Number and the Scale of Individuation. Language, 94(3), 527-574.), por exemplo, certamente traz grandes contribuições para uma melhor caracterização dessa propriedade semântica, uma vez que “[...] a individuação não está apenas relacionada às características intrínsecas dos objetos, como a forma, mas também ao fato de os elementos serem reconhecidos como suficientemente independentes uns dos outros, seja espacial ou funcionalmente, para serem interpretados como indivíduos”3 3 “[…] individuation is not only related to intrinsic features of objects, such as shape, but also to whether elements are recognized as sufficiently independent from one another, either spatially or functionally, to be construed as individuals.” (Grimm, 2018, p. 593). (Grimm, 2018Grimm, S. (2018). Grammatical Number and the Scale of Individuation. Language, 94(3), 527-574., p. 593).

Nesse sentido, a individuação não pode ser caracterizada de forma independente do mundo, uma vez que a interpretação de cada objeto depende não só da caracterização desse mundo, mas também da maneira como cada entidade é compreendida pelos falantes. Em Tenetehára4 4 Para mais detalhes a respeito da gramática da língua Tenetehára, veja Duarte (1997, 2003, 2007), Castro (2007, 2017), Carreira (2008), Silva (2010) e Camargos (2013, 2017a), entre muitos outros trabalhos. (Tupí-Guaraní), por exemplo, o modo como a expressão nominal paku “pacu (espécie de peixe)” é interpretada nos dois exemplos abaixo depende da interação do falante com o evento. Pode-se afirmar que, no exemplo5 5 Abreviaturas utilizadas neste artigo: 1: primeira pessoa; 2: segunda pessoa; 3: terceira pessoa; C: prefixo que marca a adjacência sintática do determinante/complemento; CAUS: morfema causativo; COL: coletivo; INTS: aspecto intensivo; ITER: aspecto iterativo; NC: prefixo que marca a não adjacência sintática do determinante/complemento; NEG: negação; PL: plural; PROJ: aspecto projetivo; QUAL: aspecto qualitativo; RETR: aspecto retrospectivo; SG: singular. (1), a entidade paku “pacu” apresenta uma interpretação determinada, específica e, por isso, individuada, ao passo que, em (2), ela tem uma interpretação indeterminada, não específica e com baixo grau de individuação.

(1) u-mu-hem-kar Kahiw paku a’e

3-caus-sair-caus Kahiw pacu 3

“Kahiw fez/deixou o pacu fugir.”

(2) h-eta-tetea’u paku yrykaw ø-pe a’e wà

3-ter-ints pacu rio c-em 3 pl

“Tem muito pacu no rio.”

No exemplo (1), que se refere a um contexto em que Kahiw (nome próprio) deixou o peixe pacu escapar depois de pescá-lo, esse nome, paku, só pode se referir a uma entidade individual claramente identificável nessa situação. Portanto, no conjunto de pacus que existem no mundo, há uma, e apenas uma, entidade a quem a sentença se refere. Portanto, o termo paku apresenta alto grau de individuação. Também produzido no mesmo universo, deve-se notar que, no exemplo em (2), por sua vez, esse sintagma nominal, paku, não mais se refere a uma entidade individual claramente identificável, mas sim a um conjunto de entidades. É, por isso, em contraste com o exemplo (1), interpretado de forma genérica e com baixo grau de individuação.

Deve-se destacar que a expressão nominal paku em (2), mas não em (1), caracteriza-se também por exibir uma leitura cumulativa. Para introduzirmos o conceito de cumulatividade - expressão originalmente proposta por Quine (1960Quine, W. V. O. (1960). Word and object. MIT Press.) -, recorremos a Krifka (1987Krifka, M. (1987). Nominal Reference and Temporal Constitution. Proceedings of the Sixth Amsterdam Colloquium, Amsterdam, 6, 153-173.), para quem é preciso comparar expressões, como, por exemplo, livros e cinco livros, ou cerveja e um copo de cerveja. Nessa linha de investigação, o primeiro elemento de cada par exibe a propriedade de se referir de maneira cumulativa. Nesse sentido, caso haja duas entidades às quais livro se aplica, este predicado também se refere à sua coleção. Em contrapartida, o segundo integrante de cada par não apresenta a cumulatividade. Isso ocorre porque, se existirem duas entidades diferentes às quais um livro se aplica, o predicado em questão não se aplica à sua coleção. Logo, o segundo participante de cada par, ao invés de exibir cumulatividade, evidencia a propriedade de quantização e, como vimos no início desta introdução, também de individuação. Krifka (1998Krifka, M. (1998). The Origins of Telicity. In S. Rothstein (Ed.), Events in grammar (pp. 197-235). Kluwer Academic Publishers., p. 200) também afirma que

Exemplos de predicados cumulativos são água ou maçãs: Se x e y forem aplicados a maçãs, a soma de x e y também será aplicada a maçãs. Exemplos de predicados quantizados são três litros de água ou três maçãs: Se x se refere a três maçãs, então ele não pode ter uma parte y apropriada que também recai sob três maçãs. A cumulatividade de um predicado X implica que X se aplica a pelo menos dois elementos distintos. Isso garante que nenhum predicado possa ser cumulativo e quantizado ao mesmo tempo.6 6 “Examples of a cumulative predicates are water or apples: If x and y fall under apples, then the sum of x and y falls under apples as well. Examples of quantized predicates are three liters of water or three apples: If x falls under three apples, then it cannot have a proper part y that also falls under three apples. Cumulativity of a predicate X implies that X applies to at least two distinct elements. This makes sure that no predicate can be both cumulative and quantized.” (Krifka, 1998, p. 200).

Aplicando a definição de Krifka (1987Krifka, M. (1987). Nominal Reference and Temporal Constitution. Proceedings of the Sixth Amsterdam Colloquium, Amsterdam, 6, 153-173., 1998Krifka, M. (1998). The Origins of Telicity. In S. Rothstein (Ed.), Events in grammar (pp. 197-235). Kluwer Academic Publishers.) ao Tenetehára, paku “pacu”, por exemplo, terá uma leitura cumulativa em (2), exatamente porque esse termo pode fazer referência tanto a pacus singulares (atômicos) ou a pacus com uma interpretação quantizada. Nesse sentido, em um contexto em que haja apenas um, e somente um, pacu no rio, a sentença (2) estaria apropriada. Ademais, em um cenário em que o sujeito da sentença corresponda a cinco ou cinquenta pacus, por exemplo, a sentença continuaria satisfatória.

Além de estar conectado com propriedades de definitude e especificidade, o conceito da individuação tem sido também tratado como um dos parâmetros que influenciam a codificação da animacidade, que distingue entidades animadas e inanimadas, embora seja possível dizer também que é a animacidade que contribui para a caracterização da individuação (cf. Morolong & Hyman, 1977Morolong, M., & Hyman, L. (1977). Animacy, objects, and clitics in Sesotho. Studies in African Linguistics, 8, 199-217.; Hopper & Thompson, 1980Hopper, P. J., & Thompson, S. A. (1980). Transitivity in Grammar and Discourse. Language, 56(2), 251-299.; Haspelmath, 1987Haspelmath, M. (1987). Transitivity alternations of the anticausative type. Arbeitspapiere, 4, 1-51.; Nᴂss, 2004Næss, Ǻ. (2004). What markedness marks: the markedness problem with direct objects. Língua, 114, 1186-1212.; entre muitos outros). De todo modo, entidades humanas e animadas tendem a apresentar maior grau de individuação em comparação com entidades não animadas.

Quanto à animacidade, pode-se afirmar que há ainda uma distinção fundamental entre a primeira pessoa, que corresponde àquele que fala; a segunda pessoa, que compreende os destinatários da mensagem; e a terceira pessoa, que é, conforme Lopes (2009Lopes, M. A. G. (2009). Aspectos gramaticais da língua Ka’apor [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. http://hdl.handle.net/1843/ALDR-7R5QDU.
http://hdl.handle.net/1843/ALDR-7R5QDU...
), inspirado em Benveniste (1991Benveniste, É. (1991). Problemas de lingüística geral I. Editora da Unicamp.), a não pessoa. Deve-se notar que tanto a primeira quanto a segunda pessoas apresentam um valor dêitico que acaba acarretando sempre uma referência direta aos participantes de um diálogo. Essa referência direta inevitavelmente implica em uma animacidade mais proeminente, em contraste com a terceira pessoa. Foley e Van Valin (1985Foley, W. A., & Van Valin, R. D. Jr. (1985). Information packaging in the clause. In T. Shopen (Ed.), Syntactic Typology and Linguistic Description 1 (pp. 282-364). Cambridge University Press.) afirmam que a primeira e a segunda pessoas são mais animadas do que a terceira pessoa, por exemplo. Por isso, compreendemos que essa hierarquia de pessoa é então um dos parâmetros que atua de forma significativa dentro não só da categoria de animacidade, mas também para a caracterização da individuação.

Muitas línguas naturais apresentam fenômenos gramaticais sensíveis a algumas dessas propriedades semânticas. O sistema de concordância verbal em Tenetehára, por exemplo, é substancialmente sensível a essa hierarquia de pessoa, de tal forma que o verbo concorda sempre com o argumento mais alto neste ranqueamento: 1ª pessoa > 2ª pessoa > 3ª pessoa, conforme exemplos abaixo:

(3) a-pytywà Tuira ihe

1-ajudar Tuira 1sg

“Eu ajudei a Tuira.”

(4) he=ø-pytywà Tuira a’e

1sg=c-ajudar Tuira 3

“A Tuira me ajudou.”

(5) ere-pytywà Tuira ne

2sg-ajudar Tuira 2sg

“Você ajudou a Tuira.”

(6) ne=ø-pytywà Tuira a’e

2sg=c-ajudar Tuira 3

“A Tuira te ajudou.”

(7) he=ø-pytywà ne

1sg=c-ajudar 2

“Você me ajudou.”

Conforme os exemplos acima, o sistema de concordância verbal na língua Tenetehára é sensível à hierarquia de pessoa, uma vez que o verbo concorda preferencialmente com argumentos de primeira pessoa, como em (3), (4) e (7), ao passo que, na ausência da primeira pessoa, a concordância ocorre com a segunda pessoa, como em (5) e (6). Devido a essa hierarquia, realizam-se à esquerda da raiz verbal marcadores que correferenciam argumentos tanto na função sintática de sujeito, como em (3) e (5), quanto na função de objeto, como em (4), (6) e (7). Deve-se destacar que o sistema de concordância verbal nessa língua dispõe de pelo menos duas séries de marcadores de pessoa: (i) uma que correferencia sujeitos de verbos transitivos e intransitivos ativos - Sistema Nominativo-Acusativo - e (ii) outra que codifica objetos de verbos transitivos e sujeitos de verbos intransitivos inativos - Sistema (Ergativo)-Absolutivo7 7 Os prefixos de concordância verbal do Sistema Nominativo-Acusativo são: a- “1sg”; uru- ~ oro- “1pl.excl”; xi- “1pl.incl”; ere- “2sg”; pe- “2pl”; u- ~ w- ~ o- “3”. Os marcadores de pessoa do Sistema (Ergativo)-Absolutivo são: he= “1sg”; ure= “1pl.excl”; zane= “1pl.incl”; ne= “2sg”; pe= “2pl”. Para mais detalhes acerca do sistema de concordância verbal nessa língua, direcionamos o leitor para os trabalhos de Camargos (2017b) e Duarte (2005, 2006, 2007, 2017). .

Diante dessas considerações iniciais, em que advogamos a favor da hipótese de que a gramática Tenetehára é sensível à hierarquia de pessoa (i.e., hierarquia de animacidade), neste artigo investigaremos as construções que nessa língua são denominadas como incorporação nominal8 8 Para mais detalhes a respeito da incorporação nominal em Tenetehára, direcionamos o leitor aos trabalhos de Duarte e Castro (2010), Castro (2007, 2013, 2017, 2020, 2021a, 2021b) e Castro e Camargos (2021), sobretudo para investigações morfossintáticas. . Os exemplos abaixo visam demonstrar que esse mecanismo morfossintático é também sensível a uma hierarquia semântica, a saber: a hierarquia de individuação.

(8a) a-pyhykpira ihe

1-segurar peixe 1sg

“Eu segurei/peguei o/um peixe.”

(8b) a-pira-pyhyk ihe

1-peixe-segurar 1sg

“Eu pesquei.”

(9a) i-pàri kwaharer h-eha a’e

3-torto menino 3-olho 3

“O/Um olho do/dum menino está torto.”

(9b) h-eha-pàri kwaharer a’e

3-olho-torto menino 3

“O/Um menino é vesgo.”

A hipótese que defenderemos neste trabalho é que a incorporação nominal, conforme exemplos em (8b) e (9b), se constitui como um dos mecanismos dispostos na gramática da língua Tenetehára que expressa baixo grau de individuação. Esse comportamento contrasta com as versões sem incorporação, como em (8a) e (9a), em que os nomes apresentam maior grau de individuação. Dessa forma, apresentaremos na seção 2 algumas estratégias gramaticais que têm como função caracterizar a individuação em Tenetehára, a fim de demonstrar, por fim, na seção 3, que essas marcações estão ausentes nos contextos de incorporação nominal.

Antes de começarmos, devemos destacar que há certamente vários outros processos gramaticais disponíveis na língua ‒ sejam lexicais, morfológicos ou ainda sintáticos (além da incorporação nominal) ‒ que contribuem para a caracterização da individuação em Tenetehára, mas que serão objeto de investigação em artigos futuros.

2. As propriedades formais do sintagma nominal em Tenetehára

Nesta seção, temos por objetivo analisar as estruturas morfológicas e sintáticas dos sintagmas nominais na língua em análise, com o intuito de compreender algumas de suas propriedades que contribuem para a individuação dos nomes. Isso é imprescindível para demonstrar, nas seções seguintes, que a incorporação nominal é de fato o expediente morfossintático que envolve a instanciação de elementos nominais que apresentam cumulatividade e baixo grau de individuação.

De início, pode-se ressaltar que diferentemente, por exemplo, das línguas românicas, os sintagmas nominais em Tenetehára não exibem artigos para codificar as propriedades de definitude9 9 Para mais detalhes a respeito das propriedades semânticas dos nomes em Tenetehára, direcionamos o leitor ao trabalho de Chamorro e Duarte (2020), que investigam os nomes contáveis e massivos nessa língua. . Por essa razão, a sentença (10) pode muito bem apresentar sintagmas nominais com interpretação definida ou indefinida10 10 Müller (2009) destaca que na língua Karitiana (Tupí-Arikém) os nomes não exibem flexão de número, determinantes e classificadores. Por isso, podem de modo geral apresentar não só interpretações definidas ou indefinidas, como também singular ou plural. , sendo, por isso, ambíguas nesse quesito.

(10) o-mokon zawar zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro galinha-filho 3

“O/Um cachorro engoliu o/um pintinho.”

Apesar de não dispor de artigos definidos e indefinidos como se nota no exemplo acima, há sintaticamente uma posição para determinantes, uma vez que a língua exibe uma riqueza de pronomes demonstrativos, que precedem o nome que determinam, como nos exemplos abaixo.

(11) o-mokon zawar aipo zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro aquele galinha-filho 3

“Aquele pintinho, o/um cachorro engole.” (aipo = aquele não visível para o falante)

(12) o-mokon zawar wi zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro aquele galinha-filho 3

“Aquele pintinho, o/um cachorro engole.” (wi = aquele longe do falante, mas visível)

(13) o-mokon zawar ko zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro esse galinha-filho 3

“Esse pintinho, o/um cachorro engole.” (ko = esse perto do falante)

(14) o-mokon zawar ’àg zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro esse galinha-filho 3

“Esse pintinho sentado, o/um cachorro engole.” (àg = esse sentado perto do falante)

(15) o-mokon zawar ’aw zapukaz-a’yr a’e

3-engolir cachorro esse galinha-filho 3

“Esse pintinho deitado, o/um cachorro engole.” (’aw = esse deitado perto do falante)

Pode-se afirmar, no entanto, que os pronomes demonstrativos acima não têm como função codificar definitude, mas sim indicar a disposição e a localização espacial do referente. Para demonstrar que esses pronomes e a propriedade de definitude não têm um mapeamento biunívoco, utilizamos o teste proposto por Ramires e Vicente (2018Ramires, D., & Vicente, H. G. (2018). Sintagmas nominais no Kaiowá (Tupí-Guaraní): expressão de número e indefinitude. Caderno de Squibs, 4, 59-72.) para a língua Kaiowá (Tupí-Guaraní). Assim, em nosso diagnóstico, os sintagmas nominais Mair “Maíra” e zahy “lua” nos exemplos a seguir, embora sejam necessariamente definidos - e altamente individuados - não podem coocorrer com pronomes demonstrativos, contrastando com os exemplos de (11) a (15):

(16) ?n-u-weruzar-kwaw tentehar ko Mair a’e wà

neg-3-obedecer-neg Tenetehára esse Maíra 3 pl

“Os Tenetehára desobedeceram esse Maíra.”

(17) ?u-hyape aipo zahy taw ø-pe a’e

3-brilhar aquele lua aldeia c-em 3

“Aquela lua iluminou a/uma aldeia.”

Nota-se que as sentenças (16) e (17) resultam em construções estranhas em Tenetehára, uma vez que Mair, que é um herói e ser espiritual e cultural Tenetehára, e zahy “lua” fazem referência a uma entidade única no mundo, o que é, em conformidade com Ramires e Vicente (2018Ramires, D., & Vicente, H. G. (2018). Sintagmas nominais no Kaiowá (Tupí-Guaraní): expressão de número e indefinitude. Caderno de Squibs, 4, 59-72.), incompatível com pronomes demonstrativos. Isso ocorre porque quantificadores implicam a existência de um conjunto de pelo menos duas entidades no mundo.

De todo modo, apesar de os demonstrativos não codificarem definitude ‒ como demonstrado por meio das evidências negativas acima ‒, eles contribuem de forma a proporcionar um maior grau de individuação dos nomes que determinam. Deve-se destacar, no entanto, que o dado em (17) é possível em um contexto marcado em que zahy denota um evento específico e particular, resultando, por exemplo, na seguinte interpretação: “Aquela lua, que tínhamos visto anteriormente e não essa que vemos agora, iluminou a aldeia”. Nesse último caso, zahy não referencia mais o objeto astronômico em si ‒ lua ‒, mas um de seus eventos, apresentando nesse caso um menor grau de individuação em comparação ao seu uso que denota uma entidade individual. Dados como esse em Tenetehára trazem à tona uma discussão a respeito dos fatores que podem influenciar a classificação dos nomes em contáveis e não contáveis. Não pretendemos aprofundar essa questão neste artigo, mas ela pode ser vista, em relação ao Tenetehára, em Chamorro e Duarte (2020Chamorro, P., & Duarte, F. B. (2020). On the semantic properties of mass and count nouns in Guajajára (Tenetehára). Linguistic Variation, 20(2), 366-381.) e, no que concerne a outras línguas, em Wierzbicka (1988Wierzbicka, A. (1988). The semantics of grammar. John Benjamins Publishing Company.), Prasada et al. (2002Prasada, S., Ferenz, K., & Haskell, T. (2002). Conceiving of entities as objects and stuff. Cognition, 83, 141-165.), Middleton et al. (2004Middleton, E. L., Wisniewski, E.J., Trindel, K.A., & Imai, M. (2004). Separating the chaff from the oats: Evidence for a conceptual distinction between count noun and mass noun aggregates. Journal of Memory and Language, 50, 371-394.), entre muitos outros trabalhos. De todo modo, deve-se destacar que a individuação não pode ser compreendida como uma propriedade apenas inerente ao objeto, mas dependente sobretudo do reconhecimento dos falantes que podem interpretá-lo como indivíduo ou não (cf. Grimm, 2018Grimm, S. (2018). Grammatical Number and the Scale of Individuation. Language, 94(3), 527-574.).

Outro ponto que merece nossa atenção é que a língua Tenetehára não exibe morfemas nominais de número, diferindo-se novamente de línguas tais como o português. Apesar disso, há uma partícula que se realiza no final das sentenças com a função de denotar o plural do argumento verbal sob seu escopo, constituindo-se assim como uma estratégia sintática quantificacional, conforme os pares de exemplos abaixo:

(18a) u-zapo awa he=r-àpuz taw ø-pe a’e

3-fazer homem 1sg=c-casa aldeia c-em 3

“O/Um homem fez minha casa na aldeia.”

(18b) u-zapo awa he=r-àpuz taw ø-pe a’e

3-fazer homem 1sg=c-casa aldeia c-em 3 pl

“Os/Uns homens fizeram minha casa na aldeia.”

(19a) a-enoz kuzà ko ø-pe ihe

1-chamar mulher roça c-em 1sg

“Eu chamei a/uma mulher na roça.”

(19b) a-enoz kuzà ko ø-pe ihe

1-chamar mulher roça c-em 1sg pl

“Eu chamei as/umas mulheres na roça.”

Nota-se que a partícula , ao se realizar no final das sentenças, pode ter como escopo ou o argumento na função sintática de sujeito, como em (18), ou aquele na posição de objeto, como em (19), com o propósito de marcar sua quantificação. Dessa maneira, esse recurso sintático contribui com a individuação desses argumentos, uma vez que nomes no plural tendem a ter algum grau de individuação, embora menor do que em sua versão no singular. A esse respeito, Hopper e Thompson (1980Hopper, P. J., & Thompson, S. A. (1980). Transitivity in Grammar and Discourse. Language, 56(2), 251-299.) afirmam que a oposição entre singularidade e pluralidade é um dos componentes necessários para uma melhor caracterização da individuação.

Além dessas estratégias sintáticas, a língua utiliza ainda itens lexicais, tais como os numerais mokoz “dois” e na’iruz “três”, além do morfema coletivizador {-kwer}, os quais, de forma análoga ao que vimos até o momento, contribuem com a quantização e a individuação das expressões nominais. Nesses casos, no entanto, os nomes devem necessariamente pertencer à classe dos contáveis nessa língua.

(20) u-pyta na’iruz awa taw r-ehe a’e wà

3-ficar três homem aldeia c-em 3 pl

“Três homens ficaram na aldeia.”

(21) w-exak mokoz kwaharer zàwàruhu a’e wà

3-ver dois menino onça 3 pl

“Dois meninos viram a/uma onça.”

(22) u-hem kuzà-gwer a’e wà

3-vir mulher-col 3 pl

“A/Uma mulherada chegou.”

(23) u-pytywà awa-kwer he=r-àpuz i-apo mehe a’e wà

3-ajudar homem-col 1sg-c-casa 3-fazer quando 3 pl

“Todos os homens ajudaram a fazer minha casa.”

Além de pronomes demonstrativos e numerais, os nomes em Tenetehára podem também ser precedidos por outros sintagmas nominais, quando eles assumem a função de partes do corpo, como em (24), ou denotam relações de parentesco, como em (25). Ademais, eles podem também receber pronomes pessoais clíticos, à semelhança do exemplo (26).

(24) a-pyhyk kwaharer i-po ihe

1-segurar menino 3-mão 1sg

“Eu segurei a/uma mão do/dum menino.”

(25) a-noz kwaharer i-hy ihe

1-chamar menino 3-mãe 1sg

“Eu chamei a mãe do/dum menino.”

(26) a-exak ne=r-u’yw ihe

1-ver 2sg=c-flecha 1sg

“Eu vi sua flecha.”

Em termos morfológicos, os nomes podem também ser modificados por sufixos funcionais que codificam, sobretudo, propriedades aspectuais. A nosso ver, por apresentar propriedades substancialmente gramaticais, esses morfemas contribuem com a individuação dos nomes, conforme os exemplos abaixo:

(27) a-noz he=ø-men-kwer ihe

1-chamar 1sg=c-marido-retr 1sg

“Eu chamei meu antigo marido (ex-marido).” (aspecto retrospectivo)

(28) a-noz he=ø-men-ràm ihe

1-chamar 1sg=c-marido-proj 1sg

“Eu chamei meu futuro marido.” (aspecto projetivo)

(29) a-noz t-uwihaw-ete ihe

1-chamar 3g-chefe-qual 1sg

“Eu chamei o chefe verdadeiro.” (aspecto qualitativo)

Outra estratégia de modificação de nomes que contribui com sua especialização é exemplificada nos exemplos abaixo, em que cada nome pode coocorrer com adjetivos, que necessariamente sucedem o sintagma nominal, embora o resultado não seja necessariamente uma expressão com maior grau de individuação

(30) u-zuka Kahiw pira puku a’e

3-matar Kahiw peixe comprido 3

“Kahiw matou o/um peixe comprido.”

(31) o-’ok kwaharer kara piràg a’e

3-arrancar menino cará vermelho 3

“O/Um menino arrancou o/um cará vermelho.”

(32) a-pyhyk ywy zuwa xig ihe

1-segurar terra barrento branco 1sg

“Eu segurei o/um barro branco.”

Em Tenetehára, os adjetivos se constituem em uma classe fechada, de tal maneira que há uma pequena quantidade de itens lexicais que integram essa categoria gramatical. Nos exemplos acima, nota-se que eles têm como função denotar maior especialização para cada nome. No exemplo (30), puku “comprido” restringe o conjunto de peixes, denotando apenas aqueles da família das lampreias. Em (31), entre os tipos de cará, a referência é feita ao subconjunto delimitado pelo adjetivo piràg “vermelho”. E, por fim, no exemplo (32), o nome ywy “terra” é delimitado por dois adjetivos, zuwa “barrento” e xig “branco”. Para os propósitos do presente trabalho, observe que, em todos os casos, cada um dos adjetivos contribui com a especialização dos nomes que eles modificam.

Diante da caracterização das estratégias morfológicas e sintáticas que contribuem para a marcação da individuação dos nomes em Tenetehára, passaremos a analisar na próxima seção as estruturas que envolvem a incorporação nominal nessa língua. O objetivo é demonstrar que os nomes incorporados necessariamente exibem cumulatividade e um baixo grau de individuação, em contraste com as estratégias de individuação que foram evidenciadas na seção que se encerra aqui.

3. A incorporação nominal e sua função semântica em Tenetehára

Na língua Tenetehára, ocorrem em termos sintáticos pelo menos dois tipos de incorporação nominal, a saber: (i) incorporação com diminuição de valência e (ii) incorporação sem diminuição de valência. Para os dois tipos, nossa proposta é que a versão com o nome incorporado expressa sua cumulatividade e seu baixo grau de individuação, em contraste com as versões sem incorporação nominal. Comecemos nossa explanação com a incorporação nominal que resulta em diminuição de valência:

(33a) a-pyhyk pira ihe

1-segurar peixe 1sg

“Eu segurei/peguei o/um peixe.”

(Contexto: Eu segurei o/um peixe em minhas próprias mãos)

(33b) a-pira-pyhyk ihe

1-peixe-segurar 1sg

“Eu pesquei.”

(Contextos: Posso ter pego um, muitos ou nenhum peixe)

Note que, embora o nome pira “peixe” no exemplo (33a) não apresenta distinção entre definido e indefinido, ele carrega alto grau de individuação. Isso fica particularmente evidenciado pelo fato de o evento denotar uma ação verbal que necessariamente recai sobre o ente pira “peixe”, o qual também recebe o papel temático de afetado. Essa sentença só é possível em contextos nos quais há um peixe que tenha sido segurado. Por outro lado, o mesmo nome, pira “peixe”, na sentença (33b), não se refere mais a uma entidade individual e, por essa razão, exibe uma interpretação cumulativa e, logo, um baixo grau de individuação.

Pode-se afirmar ainda que construções morfossintáticas tais como (33b) resultam em formações que focalizam fundamentalmente o evento verbal em si, de tal forma que termos incorporados assumem funções cumulativas. De fato, embora tenhamos nesse exemplo um nome expresso, mesmo que incorporado, nenhuma entidade específica ou identificável é pretendida, exceto aquela que pertence ao conjunto delimitado pelo nome incorporado. Ademais, esse exemplo pode se aplicar a contextos em que um único peixe tenha sido pescado, ou muitos, ou até mesmo nenhum.

Ademais, nas incorporações nominais, o nome incorporado em Tenetehára carece de qualquer marcação gramatical de número. Com efeito, sentenças como (33b) podem se referir tanto a contextos em que apenas um peixe tenha sido pescado, quanto a circunstâncias em que mais de um peixe tenha sido capturado. Como vimos na seção anterior, a singularidade e a pluralidade contribuem para a individuação dos nomes (cf. Hopper & Thompson, 1980Hopper, P. J., & Thompson, S. A. (1980). Transitivity in Grammar and Discourse. Language, 56(2), 251-299.) e, devido à incorporação nominal, essa marcação de número fica ausente no exemplo (33b). No entanto, caso a estrutura com incorporação nominal coocorra com a partícula de plural , o evento verbal só é possível nos contextos em que a pescaria tenha sido bem sucedida e que mais de um peixe tenha sido pescado, conforme exemplos abaixo:

(34a) a-pyhyk pira ihe

1-segurar peixe 1sg pl

“Eu segurei/peguei os/uns peixes.”

(Contexto: Eu segurei mais de um peixe)

(34b) a-pira-pyhyk ihe

1-peixe-segurar 1sg pl

“Eu pesquei.”

(Contexto: Vários peixes e/ou vários tipos de peixes foram capturados)

Pode-se afirmar que, embora em (34b) ocorra a partícula de plural , ainda assim o termo incorporado apresenta baixo grau de individuação e uma interpretação cumulativa, uma vez que essa sentença se aplica a contextos em que dois, vinte ou até mesmo duzentos peixes tenham sido pescados, por exemplo. Portanto, a interpretação em que nenhum peixe tenha sido capturado não se aplica a essa sentença.

Observe ainda que na incorporação nominal nessa língua, eventuais determinantes, como apresentados na seção anterior, são incapazes de participar do processo de incorporação, conforme os exemplos agramaticais abaixo:

(35a) *a-wi-pira-pyhyk ihe

1-aquele-peixe-segurar 1sg

“Eu pesquei aquele peixe.”

(35b) *a-ko-pira-pyhyk ihe

1-esse-peixe-segurar 1sg

“Eu pesquei esse peixe.”

(35c) *a-mokoz-pira-pyhyk ihe (wà)

1-dois-peixe-segurar 1sg pl

“Eu pesquei dois peixes.”

Conforme os exemplos acima, nenhum dos determinantes parecem ser capazes de participar do processo de incorporação nominal. Tal restrição pode ser explicada tendo em vista esses marcadores revelarem a projeção do nível funcional do sintagma nominal que denota alto grau de individuação, o que é incompatível com nomes incorporados. Logo, existe uma evidente distribuição complementar: ou o nome ostenta alto grau de individuação ou incorpora-se. Deve-se notar também que o termo incorporado em (35c), ademais, está quantizado por meio do numeral mokoz “dois” e, conforme Krifka (1987Krifka, M. (1987). Nominal Reference and Temporal Constitution. Proceedings of the Sixth Amsterdam Colloquium, Amsterdam, 6, 153-173., 1998Krifka, M. (1998). The Origins of Telicity. In S. Rothstein (Ed.), Events in grammar (pp. 197-235). Kluwer Academic Publishers.), nomes quantizados não podem ser cumulativos, já que são propriedades excludentes, o que explica a agramaticalidade acima.

No entanto, modificadores nominais, tais como os adjetivos discutidos na seção anterior, além de não serem impedimento para a incorporação nominal, participam do processo incorporando-se junto com os nomes, conforme os exemplos (36a) e (36b):

(36a) a-pira-uhu-pyhyk ihe

1-peixe-grande-segurar 1sg

“Eu pesquei peixe(s) grande(s).”

(36b) a-pira-puku-pyhyk ihe

1-peixe-comprido-segurar 1sg

“Eu pesquei peixe(s) comprido(s).”

Nos exemplos (36a) e (36b), os adjetivos são capazes de participar do processo de incorporação nominal, o que pode ser explicado tendo em vista que esses modificadores, embora delimitem o conjunto denotado pelo termo incorporado, não acarretam maior grau de individuação. As sentenças acima são possíveis em contextos nos quais apenas tipos específicos de peixes, uhu “grande” e puku “comprido”, tenham sido pescados, não se referindo, no entanto, a entidades individuais e, por essa razão, exibem novamente uma interpretação cumulativa e um baixo grau de individuação. Assim, as duas sentenças acima se aplicam perfeitamente a circunstâncias em que um ou muitos desses tipos de peixes tenham sido pescados, exatamente por causa de sua interpretação cumulativa.

Diante dos dados acima, sustentamos que a realização de qualquer determinante contribui para a individuação dos argumentos, o que bloqueia a incorporação nominal em Tenetahára. Isso ocorre em razão de que apenas argumentos com baixo grau de individuação podem se submeter a esse processo morfossintático. Ademais, pode-se aventar a hipótese adicional de que apenas núcleos lexicais podem se incorporar em Tenetehára. Logo, nenhuma propriedade funcional participa de derivações como (33b).

Deve-se considerar que muitas construções com incorporação nominal ‒ que fazem parte do nosso corpus ‒ codificam eventos que dizem respeito a ações culturais e atividades tradicionais, como é o caso, por exemplo, da pescaria tradicional Tenetehára, que ilustrou nossos exemplos acima. Na verdade, essa interpretação do evento como atividade ou ação cultural é compatível exatamente com argumentos internos semanticamente cumulativos e, logo, com baixo grau de individuação. Mithun (1984Mithun, M. (1984). The Evolution of Noun Incorporation. Language, 60(4), 847-894., p. 856), ao tratar de incorporação nominal, afirma que esses ambientes morfossintáticos geralmente exprimem “o nome de uma atividade ou estado institucionalizado”11 11 “All incorporating languages utilize the process to create basic unitary lexical items as needed to represent institutionalized, unitary concepts. […] Their generic character usually results in their use for habitual activities, for those directed at an unspecified portion of a mass, for those that incompletely affect and individual patient, or for those that are simply part of a greater group effort.” (Mithun, 1984, p. 890). , por exemplo. Apresentamos nos exemplos em (b) abaixo outras expressões em Tenetehára que se referem à atividade tradicional da pescaria. De fato, a interpretação como atividade cultural, deve-se destacar, é obtida apenas nas versões com incorporação nominal.

(37a) u-pyhyk awa pira a’e

3-segurar homem peixe 3

“O/Um homem segurou/pegou o/um peixe.”

(37b) u-pira-pyhyk awa a’e

3-peixe-segurar homem 3

“O/Um homem pescou.” (pescaria com linha ou rede)

(38a) u-zuka awa pira a’e

3-matar homem peixe 3

“O/Um homem matou o/um peixe.”

(38b) u-pira-zuka awa a’e

3-peixe-matar homem 3

“O/Um homem pescou.” (pescaria com algo que mata/atordoa peixe, como timbó)

(39a)o-poz awa pira a’e

3-alimentar homem peixe 3

“O/Um homem alimentou o/um peixe.”

(Contexto: O homem cria peixes num aquário ou num tanque, por exemplo)

(39b) u-pira-poz awa a’e

3-peixe-alimentar homem 3

“O/Um homem pescou.” (pescaria com isca)

(40a) w-eityk awa pina a’e

3-jogar homem anzol 3

“O/Um homem jogou/perdeu o/um anzol.”

(40b) u-pina-eityk awa a’e

3-anzol-jogar homem 3

“O/Um homem pescou.” (pescaria com linha de mão)

(41a) o-’ok awa pina a’e

3-puxar homem anzol 3

“O/um homem puxou o/um anzol.” (tirou de algum lugar)

(41b) u-pina-’ok awa a’e

3-anzol-puxar homem 3

“O/um homem fisgou.”

A partir dos exemplos acima, percebe-se que há um conjunto significativo de expressões especializadas e com enriquecimento semântico, referente ao contexto cultural de pescaria tradicional e que apresenta o fenômeno gramatical da incorporação nominal na língua em análise. Entretanto, há também inúmeras estruturas com incorporação nominal que podem se referir a outras ações tradicionais e atividades culturais, embora nem toda incorporação nominal resulte em expressões dessa natureza. Algumas delas podem ser conferidas nos exemplos (42) a (50):

(42) u-’y-’u-tetea’u kuzà a’e

3-água-comer-ints mulher 3

“A/uma mulher bebeu (algum líquido).”

(43) u-kawi-’u-tetea’u awa a’e

3-cauim12 12 Caium é um tipo de bebida alcoólica tradicional Tenetehára feita a partir da mandioca. -comer-ints homem 3

“O/Um homem se embriagou (bebida alcoólica).”

(44) u-’y-ahaw kuzà a’e

3-água-atravessar mulher 3

“A/Uma mulher cruzou o rio.”

(45) u-’y-pykuz kuzà a’e

3-água-mexer mulher 3

“A/Uma mulher remou.”

(46) u-eny’i-yryk awa a’e

3-saliva-escorrer homem 3

“O/Um homem babou.”

(47) u-zuru-peka kuzà a’e

3-boca-abrir mulher 3

“A/Um mulher bocejou.”

(48) u-àz-gyryw~gyryw awa a’e

3-dente-ranger~iter homem 3

“O/Um homem rangeu-dente.”

(49) o-po-e’eg kuzà a’e

3-mão-sinalizar mulher 3

“A/Um mulher acenou.”

(50) u-pira-wàn awa a’e

3-peixe-embrulhar homem 3

“O/Um homem assou peixe (embrulhado em folhas de bananeira debaixo do fogo).”

Considerando os exemplos acima, note que os argumentos internos incorporados apresentam cumulatividade e baixo grau de individuação, razão pela qual assumimos ser possível sua incorporação. Esse grau reduzido de individuação pode ser percebido não só pela ausência de marcações gramaticais que denotam maior individuação, mas também pela natureza cumulativa de cada um dos termos incorporados. Nesse sentido, esses nomes contrastam-se com aqueles que são marcados lexicalmente como altamente individuados, como vimos na seção anterior. Com efeito, entidades individuais claramente identificáveis, como nomes próprios, por exemplo, não podem se incorporar em Tenetehára, conforme a sentença agramatical em (51b).

(51a) u-miar-pyhyk awa a’e

3-caça-pegar homem 3

“O/Um homem caçou.”

(51b) *u-Kahiw-pyhyk awa a’e

3-Kahiw-pegar homem 3

“O/Um homem pegou-Kahiw.”

No entanto, as classes de nomes que denotam seres animados e principalmente humanos, que não vinculam um único referente no mundo, mas sim um conjunto, podem se incorporar caso apresentem uma interpretação cumulativa e, logo, menor grau de individuação, conforme a sentença em (52b).

(52a) u-pyhyk aipo awa kuzà a’e

3-pegar aquele homem mulher 3

“Aquele homem segurou a/uma mulher.”

(52b) u-kuzà-pyhyk aipo awa a’e

3-mulher-segurar aquele homem 3

“Aquele homem segura mulher.”

(Contexto: aquele homem vive atacando/agarrando mulheres)

Veja que o exemplo (52a) refere-se a um evento particular que é dirigido a uma entidade individual claramente identificável e delimitada, razão pela qual não desencadeia incorporação nominal. No exemplo (52b), contudo, devido à incorporação, o termo incorporado só pode ter uma interpretação cumulativa e com baixo grau de individuação, embora faça referência a uma entidade alta na hierarquia de animacidade. Ademais, o evento verbal produzido pela incorporação nominal acima apresenta um caráter genérico com uma leitura habitual. Embora (52b) seja de fato possível, a incorporação de nomes que denotam entidades humanas é pouco comum em Tenetehára. Por isso, são muito marcadas na língua.

A interpretação habitual de (52b) é também obtida na versão com incorporação nominal em (53b). Note que nesses dois exemplos há o mesmo padrão de recorrência de eventos, que está ausente tanto no exemplo (52a) quanto em (53a).

(53a) u-’u tàmuz axuk a’e

3-comer avô açúcar 3

“O avô comeu açúcar”

(53b) w-axuk-’u tàmuz a’e

3-açúcar-comer avô 3

“O avô come-açúcar.”

(Contexto: o avô vive comendo açúcar)

Como fora dito no início desta seção, nem toda incorporação nominal em Tenetehára resulta em redução de valência verbal. Na verdade, é possível que tanto verbos intransitivos quanto transitivos sejam submetidos a esse processo morfossintático, mantendo sua valência verbal inalterada. Esse tipo de incorporação nominal, Baker (1988Baker, M. C. (1988). Incorporation: a theory of grammatical function changing. University of Chicago Press.) denomina como encalhamento do possuidor (possessor stranding), exatamente porque, ao incorporar o termo possuído, o possuidor permanece encalhado (stranded), passando a realizar a função sintática de sujeito de verbos intransitivos ou objeto de transitivos. Para fins ilustrativos, apresentamos abaixo um exemplo desse tipo de incorporação nominal com verbo transitivo:

(54a) o-’ok awa miar i-àkàg a’e

3-tirar homem animal 3-cabeça 3

“O/Um homem tirou a cabeça do/dum animal.”

(54b) u-zàkàg-ok awa miar a’e

3-cabeça-tirar homem animal 3

“O/Um homem decapitou o/um animal.”

Em (54a), ocorre o verbo transitivo ’ok “tirar”, o qual seleciona o objeto sintático miar iàkàg “cabeça do/dum animal”. Em (54b), por sua vez, nota-se o processo de incorporação do termo possuído àkàg “cabeça”, gerando o verbo ainda transitivo zàkàg-ok “decapitar”. Por conseguinte, o elemento que exerce a função de possuidor, ao ficar encalhado na sentença, passa a desempenhar a função sintática de objeto. Portanto, essa incorporação nominal não resulta em redução de valência verbal.

Nota-se que o termo nominal incorporado no exemplo (54b) constitui-se como posse inerente (inalienável) e, por isso, caracteriza-se por indicar relações inatas e, assim, não adquiridas e não transferidas/transferíveis. Portanto, há entre o possuidor e o possuído uma relação de parte-todo, de tal sorte que é, a nosso ver, o possuidor o elemento sobre o qual recai a marcação de individuação. O termo possuído, por sua vez, fica apto a se incorporar exatamente porque não é sobre ele que incide a individuação e, por isso, apresenta baixo grau dessa marcação semântica. No que diz respeito a partes de corpo, Velázquez-Castillo (1996Velázquez-Castillo, M. (1996). The grammar of possession: inalienability, incorporation and possessor ascension in Guaraní. John Benjamins Publishing Company.) afirma que os termos relacionados a partes do corpo carecem de individuação, porque são conceitualizados em relação a seus possuidores. Dessa forma, pode-se afirmar que os termos possuídos não são totalmente distintos dos possuidores13 13 “They [body-part terms] lack individuation because they are normally conceptualized in relation to their [possessor], that is, they are not totally distinct from their [possessor ].” (Velázquez-Castillo, 1996, p. 135). . Ademais, sentenças como (54b) em Tenetehára fazem alusão a eventos verbais que focalizam o referente possuidor (todo), de tal sorte que a função semântica de afetação recai sobre ele e não sobre o termo possuído (parte). Em (54a), por sua vez, o evento verbal tem escopo sobre o referente possuído, atribuindo-lhe a propriedade semântica de afetação. Nesse último exemplo, o possuidor tem a função tão somente de determinar o termo possuído. Por essa razão, entendemos que a individuação é marcada apenas no nome possuído, o que impede sua incorporação nominal.

Na posse alienável, por outro lado, o termo possuído não integra e não é parte do possuidor. São, assim, duas entidades completamente distintas uma da outra, apesar de haver relação entre elas. Portanto, o possuído e o possuidor podem ambos ter alto grau de individuação. Nesses ambientes, é improvável a incorporação nominal, conforme ilustrado nos exemplos malformados a seguir:

(55a) u-kwaw he=r-u Murari i-mem a’e

3-conhecer 1sg=c-pai Murari 3-marido 3

“Meu pai conhece o marido da Murari.”

(55b) *u-men-kwaw he=r-u Murari a’e

3-marido-conhecer 1sg=c-pai Murari 3

“Meu pai conhece o marido da Murari.”

(56a) w-exak Murari he=r-u r-àpuz a’e

3-ver Murari 1sg=c-pai 3-casa 3

“A Murari viu a casa do meu pai.”

(56b) *w-àpuz-exak Murari he=r-u a’e

3-casa-ver Murari 1sg=c-pai 3

“A Murari viu a casa do meu pai.”

Nos exemplos em (55) e (56), os termos possuídos men “marido” e àpuz “casa” e os possuidores Murari (nome próprio) e heru “meu pai” constituem-se como entidades individuais claramente identificáveis, delimitadas e, por isso, com existência independente no mundo. À vista disso, eles exibem alto grau de individuação. Por isso, não devem participar de processo de incorporação nominal.

Semelhantemente ao que ocorre nos contextos acima, verbos intransitivos na língua em análise também permitem a incorporação do termo possuído, constituindo-se, portanto, como mais uma versão de encalhamento de possuidor. Nesses contextos, o possuidor passa a exercer a função sintática de sujeito. Dessa forma, apenas parte do argumento interno irá se incorporar a um verbo intransitivo, como se pode depreender a seguir.

(57a) i-pàri kwaharer h-eha a’e

3-torto menino 3-olho 3

“O/Um olho do/dum menino está torto.”

(57b) h-ehà-pàri kwaharer a’e

3-olho-torto menino 3

“O/Um menino é vesgo.”

(58a) h-ahy kwaharer h-ye a’e

3-doer menino 3-barriga 3

“A barriga do/dum menino dói.”

(58b) h-ye-ahy kwaharer a’e

3-barriga-doer menino 3

“O/Um menino está com dor de barriga.”

Os exemplos acima, à semelhança do que vimos anteriormente, também envolvem a posse inalienável, uma vez que o termo possuído e o possuidor constituem-se como uma única entidade. Nessa relação parte-todo, a marcação de individuação, nas versões com incorporação nominal, recai mais uma vez sobre o elemento possuidor, que é o termo que corresponde à entidade percebida e identificada com alto grau de individuação. O termo possuído, por sua vez, que é parte do possuidor, fica assim disponível para passar por incorporação nominal, tendo em vista que não é sobre ele que recai a individuação. Ademais, nota-se que os eventos verbais em (57b) e (58b) dizem respeito a eventos verbais que se reportam ao referente possuidor (todo) e não ao termo possuído (parte). A função semântica de afetação, por sua vez, incide sobre o possuidor. Por sua vez, em (57a) e (58a), o evento verbal tem escopo sobre o termo possuído, de tal maneira que lhe é atribuída a função semântica de afetação. Por essa razão, é o elemento possuído que apresenta maior grau de individuação e, por isso, não se incorpora, ao passo que a função do possuidor nesses dois exemplos é tão somente determinar os termos possuídos.

Considerações finais

O objetivo deste artigo foi investigar o mecanismo de incorporação nominal na língua Tenetehára (Tupí-Guaraní) e sua relação com a marcação de individuação e cumulatividade. Como foi visto, essa operação sintática faz parte do inventário de mecanismos gramaticais translinguísticos capazes de expressar, pelo menos nessa língua, cumulatividade e baixo grau de individuação do termo incorporado.

A presente pesquisa se fundamentou em dados linguísticos elicitados que compreendem as duas estratégias de incorporação nominal presentes nessa língua, a saber: (i) incorporação com diminuição de valência, que se caracteriza pela incorporação do argumento interno de predicados verbais transitivos, e (ii) incorporação nominal sem diminuição de valência, que compreende os processos nos quais apenas o termo possuído é incorporado, de tal forma que o possuidor passa a funcionar como sujeito de verbos intransitivos e objeto de transitivos.

Vimos ainda que, apesar de o Tenetehára não dispor de artigos definidos e indefinidos - que são recursos gramaticais disponíveis em muitas línguas para marcar individuação, por exemplo -, a incorporação nominal se constitui em uma operação mofossintática que sinaliza que um nome possui baixo grau de individuação.

Nesse sentido, propusemos alguns diagnósticos cujo propósito foi evidenciar que nomes apresentando alto grau de individuação não podem passar por incorporação nominal. Por outro lado, objetos de verbos transitivos e sujeitos de intransitivos, caso apresentem cumulatividade e baixo grau de individuação, são sujeitos à incorporação. Como corolário disso, há uma distribuição complementar que pode ser sumarizada da seguinte forma: quando há interpretação cumulativa e baixo grau de individuação, o nome se incorpora; quando há alto grau de individuação, ele deve se realizar de forma plena. Em trabalhos futuros, pretendemos investigar na língua Tentehára outras estratégias gramaticais - lexicais, morfológicas e sintáticas - que contribuem para a marcação da individuação, sobretudo, tendo como objetivo, caracterizar melhor sua gradação e hierarquia.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer ao povo Tenetehára-Guajajára, que tem nos ajudado no levantamento dos dados linguísticos que compõem esta pesquisa, sobretudo durante os trabalhos de campo realizados nas Terras Indígenas Caru e Arariboia, localizadas no estado do Maranhão, entre os anos de 2010 e 2018. Agradecemos ainda à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), cuja pesquisa desenvolvida por Ricardo Campos Castro durante seu pós-doutorado - processos 2017/09615-9 (Brasil) e 2018/06203-4 (EUA) - iluminaram questões teóricas aqui desenvolvidas. Por fim, agradecemos também ao Laboratório de Línguas e Culturas Indígenas (LALIC) e ao Grupo de Pesquisa em Educação na Amazônia (GPEA) da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), pelo suporte e apoio às pesquisas desenvolvidas por Quesler Fagundes Camargos.

Referências

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  • 3
    “[…] individuation is not only related to intrinsic features of objects, such as shape, but also to whether elements are recognized as sufficiently independent from one another, either spatially or functionally, to be construed as individuals.” (Grimm, 2018Grimm, S. (2018). Grammatical Number and the Scale of Individuation. Language, 94(3), 527-574., p. 593).
  • 4
    Para mais detalhes a respeito da gramática da língua Tenetehára, veja Duarte (1997Duarte, F. B. (1997). Análise gramatical das orações da Língua Tembé [Dissertação de Mestrado, University of Brasília]. Repositório Institucional da UnB. , 2003Duarte, F. B. (2003). Ordem dos constituintes e movimento em Tembé: minimalismo e anti-simetria [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. http://www.letras.ufmg.br/fbonfim/pdf/ordem_de_constituintes.pdf.
    http://www.letras.ufmg.br/fbonfim/pdf/or...
    , 2007Duarte, F. B. (2007). Estudos de morfossintaxe Tenetehára. Faculdade de Letras da UFMG.), Castro (2007Castro, R. C. (2007). Interface morfologia e sintaxe em Tenetehára [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/ALDR-797JYN.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    , 2017Castro, R. C. (2017). Morfossintaxe Tenetehára (Tupí-Guaraní) [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/RMSA-AMER3H.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    ), Carreira (2008Carreira, G. E. S. (2008). Parâmetros e macroparâmetros: um olhar sobre as línguas indígenas Tembé e Guajajára (Tupi) [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFRJ. http://www.ppglinguistica.letras.ufrj.br/images/Linguistica/2-Mestrado/dissertacao/109-genne-eunice.pdf.
    http://www.ppglinguistica.letras.ufrj.br...
    ), Silva (2010Silva, T. F. (2010). História da língua Tenetehára: contribuição aos estudos histórico-comparativos sobre a diversificação da família lingüística Tupi-Guarani do Tronco Tupi [Dissertação de Mestrado, University of Brasília]. Repositório Institucional da UnB. https://repositorio.unb.br/handle/10482/8947.
    https://repositorio.unb.br/handle/10482/...
    ) e Camargos (2013Camargos, Q. F. (2013). Estruturas causativas na língua Tenetehára: uma análise minimalista. [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/LETR-9ARQBD.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    , 2017aCamargos, Q. F. (2017a). Aplicativização, causativização e nominalização: uma análise unificada de estruturas argumentais em Tenetehára-Guajajára (Família Tupí-Guaraní) [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/LETR-AQ3HUB.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    ), entre muitos outros trabalhos.
  • 5
    Abreviaturas utilizadas neste artigo: 1: primeira pessoa; 2: segunda pessoa; 3: terceira pessoa; C: prefixo que marca a adjacência sintática do determinante/complemento; CAUS: morfema causativo; COL: coletivo; INTS: aspecto intensivo; ITER: aspecto iterativo; NC: prefixo que marca a não adjacência sintática do determinante/complemento; NEG: negação; PL: plural; PROJ: aspecto projetivo; QUAL: aspecto qualitativo; RETR: aspecto retrospectivo; SG: singular.
  • 6
    “Examples of a cumulative predicates are water or apples: If x and y fall under apples, then the sum of x and y falls under apples as well. Examples of quantized predicates are three liters of water or three apples: If x falls under three apples, then it cannot have a proper part y that also falls under three apples. Cumulativity of a predicate X implies that X applies to at least two distinct elements. This makes sure that no predicate can be both cumulative and quantized.” (Krifka, 1998Krifka, M. (1998). The Origins of Telicity. In S. Rothstein (Ed.), Events in grammar (pp. 197-235). Kluwer Academic Publishers., p. 200).
  • 7
    Os prefixos de concordância verbal do Sistema Nominativo-Acusativo são: a- “1sg”; uru- ~ oro- “1pl.excl”; xi- “1pl.incl”; ere- “2sg”; pe- “2pl”; u- ~ w- ~ o- “3”. Os marcadores de pessoa do Sistema (Ergativo)-Absolutivo são: he= “1sg”; ure= “1pl.excl”; zane= “1pl.incl”; ne= “2sg”; pe= “2pl”. Para mais detalhes acerca do sistema de concordância verbal nessa língua, direcionamos o leitor para os trabalhos de Camargos (2017bCamargos, Q. F. (2017b). Exploring agreement displacement from the internal to the external argument in the Tenetehára language (Tupí-Guaraní family). Revista Diadorim, 19, 325-342.) e Duarte (2005Duarte, F. B. (2005). Propriedades denotacionais do prefixo relacional {i- e h-} em Tenetehára. Revista Estudos Lingüísticos, 34(1), 1194-1199., 2006Duarte, F. B. (2006). Codificação de argumentos e ergatividade (cindida) em Tenetehára. LIAMES, 5, 113-145., 2007Duarte, F. B. (2007). Estudos de morfossintaxe Tenetehára. Faculdade de Letras da UFMG., 2017Duarte, F. B. (2017). The split-s system and the source of the absolutive case in Tenetehára. Revista Linguística, 13, 317-367.).
  • 8
    Para mais detalhes a respeito da incorporação nominal em Tenetehára, direcionamos o leitor aos trabalhos de Duarte e Castro (2010Duarte, F. B., & Castro, R. C. (2010). Incorporação nominal, inergatividade e estrutura causativa em Tenetehára. In A. S. A. Cabral, & A. D. Rodrigues (Eds.), Línguas e Culturas Tupí 2 (pp. 43-62). Curt Nimuendajú.), Castro (2007Castro, R. C. (2007). Interface morfologia e sintaxe em Tenetehára [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/ALDR-797JYN.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    , 2013Castro, R. C. (2013). O epifenômeno da alternância de valência na língua Tenetehára (Tupí-Guaraní). Revista da Anpoll, 34, 347-391., 2017Castro, R. C. (2017). Morfossintaxe Tenetehára (Tupí-Guaraní) [Tese de Doutorado, Universidade Federal de Minas Gerais]. Repositório Institucional da UFMG. https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/RMSA-AMER3H.
    https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/...
    , 2020Castro, R. C. (2020). Incorporação nominal e aspecto lexical em Tenetehára (Tupí-Guaraní). LIAMES, 20, 1-27. , 2021aCastro, R. C. (2021a). Prolegômenos acerca da Incorporação Nominal em Tenetehára (Tupí-Guaraní). Revista Sociodialeto, 12(34), 1-19., 2021bCastro, R. C. (2021b). Estruturas antipassivas-desiderativas em Tenetehára (Tupí-Guaraní). In Q. F. Camargos, & F. B. Duarte, Descrição e análise gramatical de línguas indígenas amazônicas (pp. 154-180). Editora da Universidade Federal de Rondônia.) e Castro e Camargos (2021Castro, R. C., & Camargos, Q. F. (2021). The syntactic status of noun incorporation in the Tenetehára language (Tupí-Guaraní family). Revista Brasileira de Linguística Antropológica, 13, 367-394.), sobretudo para investigações morfossintáticas.
  • 9
    Para mais detalhes a respeito das propriedades semânticas dos nomes em Tenetehára, direcionamos o leitor ao trabalho de Chamorro e Duarte (2020), que investigam os nomes contáveis e massivos nessa língua.
  • 10
    Müller (2009Müller, A. (2009). Variação semântica: individuação e número na língua Karitiana. Estudos Linguísticos 38, 295-308.) destaca que na língua Karitiana (Tupí-Arikém) os nomes não exibem flexão de número, determinantes e classificadores. Por isso, podem de modo geral apresentar não só interpretações definidas ou indefinidas, como também singular ou plural.
  • 11
    “All incorporating languages utilize the process to create basic unitary lexical items as needed to represent institutionalized, unitary concepts. […] Their generic character usually results in their use for habitual activities, for those directed at an unspecified portion of a mass, for those that incompletely affect and individual patient, or for those that are simply part of a greater group effort.” (Mithun, 1984Mithun, M. (1984). The Evolution of Noun Incorporation. Language, 60(4), 847-894., p. 890).
  • 12
    Caium é um tipo de bebida alcoólica tradicional Tenetehára feita a partir da mandioca.
  • 13
    “They [body-part terms] lack individuation because they are normally conceptualized in relation to their [possessor], that is, they are not totally distinct from their [possessor ].” (Velázquez-Castillo, 1996Velázquez-Castillo, M. (1996). The grammar of possession: inalienability, incorporation and possessor ascension in Guaraní. John Benjamins Publishing Company., p. 135).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    25 Abr 2020
  • Aceito
    13 Dez 2021
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