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Alça intestinal invertida como substituto do ureter: estudo experimental em cães

Ureter replacement by inverted ileal seromuscular tube or patch

Resumos

OBJETIVO: Pesquisar a viabilidade da alça ileal invertida como substituto ureteral. MÉTODOS: Quarenta cães foram divididos em 5 grandes grupos de 8 animais, cada um subdividido em 2 subgrupos de acordo com a data do sacrifício (I - sacrifício em 12-15 dias de pós-operatório, e II - 60 dias de pós-operatório). Nos grupos A e B fez-se a substituição ureteral parcial com selo de íleo invertido, após abertura lateral do ureter direito com 2 (Grupo A) ou 4 cm (Grupo B) de extensão. Nos demais grupos fez-se a substituição do segmento completo do ureter usando-se um tubo de íleo invertido de comprimento equivalente ao segmento do ureter ressecado com 2cm (Grupo C) e 6cm (Grupos D e E) de extensão. A mucosa ileal foi removida por raspagem ou diérese. A permeabilidade ureteral foi testada por urografia excretora e por exploração anatômica com cateter após o sacrifício. As peças foram estudas histologicamente após preparação e coloração com hematoxilina-eosina. RESULTADOS: O número de animais com urografia normal após o seguimento foi: A-2, B-2, C-3, D-2 e E- 2. A histologia revelou que a serosa ileal se reveste com urotélio, não como decorrência de metaplasia, mas do crescimento a partir da borda da mucosa ureteral. CONCLUSÃO: Conclui-se que o íleo invertido não é um bom substituto ureteral.

Substituto ureteral; tubo ileal seromuscular; lesão de ureter


OBJECTIVE: To investigate the outcome of ureter replacement with inverted seromuscular tube in dogs. METHODS: 40 adult mongrel dogs were divided in 5 groups of 8 animals. Each group was divided in 2 subgroups: 1 - sacrifice on 12-15 postoperative days, and 2 - sacrifice on the 60th postoperative day). In group A ureter longitudinal incision 2cm long was sewed with an inverted ileal seromuscular patch 2cm long. In group B ureter incision and patch size were 4cm long. In the remaining groups a ureter segment was replaced by an inverted ileal seromuscular tube 2cm long (group C) or 6cm long (groups D and E). In all groups, except E, ileal mucosa was removed by a grasping maneuver with a scalpel. In group E the ileal mucosa was trimmed away by blunt dissection with a scissors. The ureter permeability was tested by an intravenous urogram, and after sacrifice by anatomic exploration with a catheter. All ureter segment removed through the necropsy were analyzed by histology after hematoxilin-eosin coloration. RESULTS: The number of animals with normal urogram after the followup was: A - 2, B - 2, C - 3, D - 2 and E - 2. Histology revealed that ileal serosa was covered by ureteral mucosa grown from the ureter buds. CONCLUSION: The inverted ileal seromuscular tube or patch does not work well for ureter replacement.

Ureter replacement; ileal seromuscular tube; ureter injury


Alça intestinal invertida como substituto do ureter: estudo experimental em cães1 1 Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia e Anatomia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP

Ureter replacement by inverted ileal seromuscular tube or patch

Antonio F. D. MaynardI; Antonio Carlos Pereira MartinsII; Tiago José Borelli-Bovo,III; Haylton Jorge SuaidII; Adauto José ColognaII; Silvio Tucci JuniorII

IProfessor Adjunto, Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Sergipe

IIDocentes da Divisão de Urologia da FMRP-USP

IIIMédico Residente do HCFMRP-USP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Antonio Carlos Pereira Martins Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP, Divisão de Urologia Av. Bandeirantes nº 3900, Ribeirão Preto, SP CEP: 14048-900 E-mail: acpmartins@convex.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Pesquisar a viabilidade da alça ileal invertida como substituto ureteral.

MÉTODOS: Quarenta cães foram divididos em 5 grandes grupos de 8 animais, cada um subdividido em 2 subgrupos de acordo com a data do sacrifício (I - sacrifício em 12-15 dias de pós-operatório, e II - 60 dias de pós-operatório). Nos grupos A e B fez-se a substituição ureteral parcial com selo de íleo invertido, após abertura lateral do ureter direito com 2 (Grupo A) ou 4 cm (Grupo B) de extensão. Nos demais grupos fez-se a substituição do segmento completo do ureter usando-se um tubo de íleo invertido de comprimento equivalente ao segmento do ureter ressecado com 2cm (Grupo C) e 6cm (Grupos D e E) de extensão. A mucosa ileal foi removida por raspagem ou diérese. A permeabilidade ureteral foi testada por urografia excretora e por exploração anatômica com cateter após o sacrifício. As peças foram estudas histologicamente após preparação e coloração com hematoxilina-eosina.

RESULTADOS: O número de animais com urografia normal após o seguimento foi: A-2, B-2, C-3, D-2 e E- 2. A histologia revelou que a serosa ileal se reveste com urotélio, não como decorrência de metaplasia, mas do crescimento a partir da borda da mucosa ureteral.

CONCLUSÃO: Conclui-se que o íleo invertido não é um bom substituto ureteral. Disponível em URL: http://www.scielo.br/acb

Descritores: Substituto ureteral, tubo ileal seromuscular, lesão de ureter.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To investigate the outcome of ureter replacement with inverted seromuscular tube in dogs.

METHODS: 40 adult mongrel dogs were divided in 5 groups of 8 animals. Each group was divided in 2 subgroups: 1 – sacrifice on 12-15 postoperative days, and 2 – sacrifice on the 60th postoperative day). In group A ureter longitudinal incision 2cm long was sewed with an inverted ileal seromuscular patch 2cm long. In group B ureter incision and patch size were 4cm long. In the remaining groups a ureter segment was replaced by an inverted ileal seromuscular tube 2cm long (group C) or 6cm long (groups D and E). In all groups, except E, ileal mucosa was removed by a grasping maneuver with a scalpel. In group E the ileal mucosa was trimmed away by blunt dissection with a scissors. The ureter permeability was tested by an intravenous urogram, and after sacrifice by anatomic exploration with a catheter. All ureter segment removed through the necropsy were analyzed by histology after hematoxilin-eosin coloration.

RESULTS: The number of animals with normal urogram after the followup was: A – 2, B – 2, C – 3, D – 2 and E – 2. Histology revealed that ileal serosa was covered by ureteral mucosa grown from the ureter buds.

CONCLUSION: The inverted ileal seromuscular tube or patch does not work well for ureter replacement.

Keywords: Ureter replacement, ileal seromuscular tube, ureter injury

INTRODUÇÃO

Na prática urológica deparamo-nos não raramente com perdas ureterais sérias. Para evitar a nefrectomia tem-se tentado nos últimos 90 anos o reparo ou a substituição do uterer por próteses, tecidos biológicos tubulares ou não e autotransplante1,2,3,4.

Dentre as próteses, várias substâncias sintéticas foram testadas como o polietileno5, o silicone2, o teflon6, e o gore-tex7, com resultados variáveis mas geralmente insatisfatórios devido a cristalização de sais, deiscência das anastomoses, ausência de peristaltismo ou obstrução.

Vários tecidos biológicos não vascularizados também foram testados com resultados insatisfatórios: veia safena3, segmentos arteriais8, segmentos ureterais autólogos e homólogos1 e esponja de colágeno9. Resultados mais animadores foram conseguidos com mucosa vesical tubulizada para substituição de segmentos de até 1,5cm de ureter4, com selos de peritôneo10 e veia umbilical heteróloga11.

Dentre os tubos biológicos vascularizados a trompa de Falópio não ofereceu bons resultados12 enquanto os obtidos com o apêndice cecal são controvertidos13. Um método efetivo e capaz de substituir o ureter em sua porção distal é pela tubulização de um retalho vesical conhecido pelo nome de técnica de Boari, mas proposta originalmente por Van Hook14. O uso de alça ileal para substituição ureteral foi proposto inicialmente por Fenger (1894) mas primeiramente realizada por Boari (1894) em cães15. Mas, foi somente na década de 1950 que esta técnica se consolidou como método válido para substituição parcial ou total do ureter16,17,18. Entretanto, várias são as desvantagens mencionadas na literatura a respeito da utilização deste substituto ureteral, entre eles a formação de cálculos pela produção de muco, infecçao urinária de repetição, refluxo vésico-íleo-renal, estenoses e absorção de eletrólitos e catabólitos protéicos urinários18,19. Em razão dessas complicações várias modificações foram propostas, como a ressecção parcial da parede ileal para redução do calibre ileal20 e a construção de válvula anti-refluxo por intussuscepção ileal21, com resultados relatados como favoráveis. Outras tentativas experimentais foram feitas, como o uso do íleo invertido22 e do tubo seromuscular ileal cruento (com remoção da mucosa) mas com resultados insatisfatórios ou controvertidos23.

Conclui-se, portanto, que ainda não se encontrou um substituto ureteral satisfatório, pois os métodos disponíveis ou apresentam complicações importantes ou não foram totalmente estudados, como é o caso do íleo invertido.O presente estudo foi realizado no intuito de verificar a viabilidade ou não desta técnica, quer como selo ou tubo de variados comprimentos.

MÉTODOS

Grupos experimentais

Quarenta cães adultos mestiços de ambos os sexos, com peso variável entre 14 e 16kg, foram divididos ao acaso em 5 grandes grupos de 8 animais. Cada um desses grupos foi subdividido em 2 subgrupos de acordo com a data de sacrifício (subgrupo I com sacrifício em 12-15 dias de pós-operatório, e II com 60 dias de pós-operatório). Nos grupos A e B fez-se a substituição ureteral parcial com selo de íleo invertido, após abertura lateral do ureter direito com 2 (Grupo A) ou 4 cm (Grupo B) de extensão. Nos demais grupos fez-se a substituição do segmento completo do ureter usando-se um tubo de íleo invertido de comprimento equivalente ao segmento do ureter ressecado com 2cm (Grupo C) e 6cm (Grupos D e E) de extensão. Em todos os animais excetuando os do Grupo E, antes da confecção do selo, ou tubo, a mucosa intestinal foi removida por raspagem com lâmina de bisturi. No Grupo E a mucosa foi removida por diérese com tesoura.

Preparo pré-operatório/ anestesia.

Todos os animais foram submetidos a jejum pré-operatório de 12 horas antes da cirurgia. Aqueles sorteados para o sacrifício aos 60 dias de pós-operatório (subgrupos II) submeteram-se a urografia excretora com paraaminobenzoato sódico 50%, 1ml/kg por via endovenosa, imediatamente antes do ato operatório. Para o ato cirúrgico os cães foram anestesiados por via endovenosa com nembutal sódico na dose de 30mg/kg, entubados com sonda endotraqueal e submetidos a ventilação controlada.

Técnica cirúrgica

Todos os animais foram submetidos a laparotomia mediana xifo-púbica. O 1/3 médio do ureter direito foi dissecado e isolado. Em seguida, isolou-se o segmento de íleo terminal preservando-se a vascularização. O trânsito intestinal foi reconstruido por anastomose íleo-ileal término-terminal com pontos separados de algodão 3-0. O segmento ileal isolado foi então aberto longitudinalmente na borda anti-mesentérica. A mucosa ileal foi removida por raspagem com lâmina de bisturi ou por ressecção com tesoura usando-se como referência o plano submucoso. Nos grupos A e B o ureter foi aberto longitudinalmente na extensão apropriada, e o defeito ureteral foi reconstruído com selo confeccionado com o íleo isolado previamente, usando-se pontos separados de catgut 4-0 cromado. Nos demais grupos, usou-se o íleo para confecção de um tubo modelado sobre um catéter de polietileno nº 116, suturado com pontos contínuos de catgut 4-0. O comprimento deste tubo foi ajustado conforme o tamanho do segmento do ureter ressecado, e em seguida o tubo foi usado para substituir o segmento ureteral removido, tomando-se o cuidado de respeitar o sincronismo peristáltico das estruturas, empregando-se pontos separados de catgut 4-0 cromado para a sutura dos cabos proximal e distal. Em todos o grupos, o íleo foi colocado em posição invertida, ou seja, a serosa ileal ficou voltada para a luz ureteral. Nos grupos C, D e E o cater de polietileno foi deixado moldando o tubo ileal. O passo final consistiu no fechamento da parede abdominal por planos. Nos subgrupos I deixou-se o catéter de polietileno moldando o ureter até o momento do sacrifício dos animais. Nos subgrupos II não se deixou catéter moldando o ureter.

Pós-operatório

Todos os animais receberam nos primeiros 5 dias trimexazol intramuscular na dose diária de 30mg de sulfa e 6mg de trimetropima por kg de peso. Após a cirurgia os animais receberam dieta líquida por 24h e daí em diante ração comercial ad libitum.

Sacrifício

Na data do sacrifício os animais foram anestesiados com nembutal sódico na dose de 30mg/kg, endovenoso, e em seguida receberam éter sulfúrico por via endovenosa até a parada cardiorespiratória. Realizou-se então a necrópsia para estudo da cavidade abdominal, da permeabilidade do ureter direito e obtenção de material para estudo histológico após fixação em formol a 10%, inclusão em parafina e coloração em hematoxilina e eosina de secções de 5 micra de espessura.

Imediatamente antes do sacrifício, os cães dos subgrupos II foram submetidos à urografia controle.

Análise estatística

A análise de variáveis categóricas como a patência da anastomose ureteral ou existencia ou não de hidroureter foi feita pelo teste exato de Fisher, considerando-se nível de significância p=<0,05.

RESULTADOS

Evolução clínica

A observação diária foi semelhante quanto a recuperação anestésica, início da movimentação e aceitação de dieta nos diversos grupos.

Achados macroscópicos e urográficos

Grupo A

À necrópsia encontrou-se obstrução ureteral completa em 2 dos 8 animais estudados. A análise macroscópica e a urografia mostraram dilatação leve ou moderada do ureter direito em 4 animais e trato urinário normal em 2 cães, sendo 1 após 15 dias de evolução (AI) e 1 após 60 dias (AII).

Grupo B

No subgrupo BI notou-se obstrução ureteral com hidronefrose grave e abscesso retroperitoneal em 1 cão. Hidronefrose discreta foi observada em 2 animais, um dos quais apresentava deiscência parcial da anastomose uretero-ileal e coleção de urina encistada.

No subgrupo BII observou-se obstrução ureteral completa e hidronefrose em 1 animal. Nos demais, o ureter estava pérvio mas 2 dos 3 cães exibiram hidronefrose discreta sendo que uma pequena coleção de muco para-ileal. No cão restante a urografia excretora foi normal.

Grupo C

Todos os animais do subgrupo CI apresentavam ureter patente, mas em 2 deles a urografia revelou hidronefrose moderada. Um cão apresentava urografia normal. Em todos constatou-se também coleção de muco para-ileal.

No subgrupo CII ocorreu obstrução ureteral com hidronefrose grave em 2 cães e nos outros dois a urografia foi normal. Em 3 animais deste subgrupo havia coleção de muco justa ileal.

Os cateteres de polietino migraram e foram encontrados na cavidade vesical de todos animais.

Grupo D

No subgrupo DI, houve obstrução ureteral e hidronefrose em apenas um animal; nos demais, 2 apresentaram hidronefrose discreta e 1 exibiu rim direito normal. No subgrupo DII 1 animal apresentou obstrução ureteral com hidronefrose acentuada, 2 revelaram hidronefrose moderada e 1 rim normal.

Neste grupo o cateter de moldagem também migrou para a bexiga em 7/8 animais.

Grupo E

Nenhum dos animais do subgrupo EI apresentou hidronefrose embora em 3 deles se tenha notado discreto hidroureter. No subgrupo EII, um cão apresentou exclusão renal, 1 hidronefrose grave, 1 hidronefrose discreta e 1 rim normal.

Neste grupo o cateter de polietileno migrou para a bexiga em 5 cães, em 2 a migração ocorreu para o ureter à montante e em 1 manteve-se bem posicionado moldando o tubo ileal.

Exame histopatológico

Os achados histológicos nos grupos A e B revelam infiltrado inflamatório tipo pielonefrite ou focos de infiltrado inflamatório crônico intersticial na maioria dos cães (10 em 16). Quanto à parede do selo ileal, notou-se epitelização da face voltada para a luz do trato urinário em todos os cães, sendo completa em 12 e incompleta nos demais. Notou-se que a epitelização era completa nas extremidades do selo, associada a ausência ou lentidão do processo de epitelização na área central. Na face externa do selo, encontrou-se extensa regeneração de mucosa, com áreas císticas de muco e intenso processo inflamatório crônico em 12 animais.

Nos grupos C e D , 14 animais evidenciaram pielonefrite, não destoando dos grupos anteriores. Ocorreu epitelização total da face luminar do tubo ileal, com mais de 3 camadas de células transicionais, em 5 animais, e nos demais a epitelização foi parcial. Na face externa do tubo ileal ocorreram focos de regenaração da mucosa intestinal em 14 cães e cistos de muco.

O grupo E evidenciou epitelização parcial da luz ileal em todos os animais, sendo que externamente não ocorreu regeneração da mucosa ileal ou formação de cistos de muco.

Análise Estatística

A análise estatística comparando os diversos grupos quanto a existência de hidroureter (p>0,05) e a permealidade ureteral (p>0,05) não mostrou diferença significante.

DISCUSSÃ0

A reconstrução ureteral com selo invertido de alça vascularizada de 2cm de comprimento não mostrou bons resultados, pois apenas 2 de 8 animais operados apresentaram trato urinário normal no pós-operatório, sendo 1 no 15º dia e outro no 60º dia. Como a obstrução mecânica foi demonstrada em apenas 2 cães deste grupo, depreende-se que em 6 deles havia subestenose ureteral na região do selo ou menos provavelmente obstrução parcial funcional. No grupo B, com selo invertido de 4cm de extensão os resultados foram semelhantes, constatando-se trato urinário normal em apenas 3/8 dos cães. Tais dados são de difícil confronto com a literatura, muito embora Kendall & Karafin (1969)24 tenham relatado patência em 100% dos ureteres (apesar de 30% apresentarem dilatação) em pesquisa com 20 cães em que se fez reparação de ureterotomia de 1,5 a 4cm de extensão usando a face seromuscular de alça delgada ou grossa, sem a descontinuidade do trânsito intestinal.

O achado histológico de epitelização completa nas extremidades do selo ileal, nos grupos A e B, associada à ausência ou lentidão na área central , é altamente sugestivo que o processo de epitelização não é decorrente de metaplasia, mas do crescimento do epitélio ureteral sobre a base de serosa ileal. Esta observação constatada no subgrupo BI (cães sacrificados no 15º dia de pós-operatório) provavelmente se deve ao maior comprimento do selo. Nada obstante, deve-se assinalar que em todos os animais do subgrupo BII, com evolução de 60 dias, todos os selos de 6cm estavam completamente epitelizados. Este achado corrobora a recomendação de Shoemaker (1955) 22 de manutenção de cateter de moldagem por mais de 14 dias para permitir crescimento epitelial adequado, prevenindo assim estenoses ao nível do enxerto.

A epitelização dos tubos ileais reproduziu o observado com os selos. Observou-se maior facilidade de epitelização nos enxertos mais curtos, pois quando se avaliou histologicamente tubos ileais de 2 cm (grupo C) a epitelização foi total em 4/6 cães enquanto no grupo D (6 cm) a epitelização foi total em 1/7 cães. Nos casos onde a epitelização foi incompleta , principalmente nos do grupo E, em sua totalidade, notou-se por meio de corte longitudinal que a epitelização foi total nos locais mais próximos à anastomose uretero-ileal, sendo que nas porções mais centrais, foram observados apenas focos iniciais do processo de epitelização.

Nos grupos onde se substituiu o ureter por tubo ileal invertido, notou-se que nos cães onde houve obstrução da luz ureteral o tubo de moldagem havia migrado mostrando que , ao contrário do observado nos grupos de selo ileal, onde não foi utilizado tubo de modelagem após o término da sutura, a ausência do tubo favorece a estenose cicatricial. A urográfica excretora dos grupos com tubo ileal mostrou que somente 1 animal do grupo CI, 2 do CII, 2 do DI, 1 do DII,1 do EI e 1 do E II apresentavam trato urinário normal. Esses resultados não são favoráveis e não recomendam o método.

Em relação ao muco observado, notou-se que a não ocorrência de coleção de muco no Grupo E indica que a dissecção romba foi mais eficiente que a curetagem para e remoção de mucosa ileal sendo o processo recomendado ao se usar íleo invertido.

A variação do comprimento do tubo ileal invertido foi idealizada no sentido de se avaliar se os resultados seriam afetados por este parâmetro . Nos trabalhos de Shoemaker & Bower (1955)25 foram utilizados longos tubos ileais invertidos anastomosados diretamente no bacinete e na bexiga , sendo que a maioria dos cães apresentou estenose da anastomose proximal atribuída à remoção precoce do cateter ureteral e à irritação provocada pela urina na serosa ileal. Neste estudo apresentado, observou-se estenose cicatricial em 2/4 dos cães com tubos de 2cm, em 2/4 com tubo de ¨6cm ( D II) e em 1/4 com tubos de 6 cm ( E II). Esses dados sugerem que o comprimento do tubo não é fator fundamental para estenose cicatricial e que a manutenção do cateter ureteral por 15 dias seria suficiente para garantir a patência tubular e das anastomoses em pelo menos 50 % dos casos ao final de 2 meses.

CONCLUSÕES

A substituição ureteral por íleo invertido permite as chegar às conclusões seguintes: 1 - a serosa ileal é recoberta por urotélio na maioria dos cães em período variável de 15 a 60 dias; 2 - o urotélio neo-formado é resultado de crescimento epitelial sobre a serosa do íleo invertido; 3 – Ocorre obstrução mecânica ou funcional em proporção significativa de casos o que descredencia o íleo invertido como substituto ideal do ureter.

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  • Endereço para correspondência
    Antonio Carlos Pereira Martins
    Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP, Divisão de Urologia
    Av. Bandeirantes nº 3900, Ribeirão Preto, SP
    CEP: 14048-900
    E-mail:
  • 1
    Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia e Anatomia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, USP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Abr 2003
    • Data do Fascículo
      2002
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com