Vivemos numa época de espantosa velocidade na produção, difusão e interconexão dos saberes. Esse ritmo acelerado tem transformado a maneira pela qual as crianças pensam, aprendem e interpretam as informações. A escola, espaço da aprendizagem formal, assume nesse contexto um papel sociocultural e afetivo marcante, particularmente no Brasil, país de tantas desigualdades. Assim, ao papel de utilizar métodos de ensino atuais - que permitam aperfeiçoamento de habilidades, desenvolvimento de potencialidades e estratégias de ensino individualizadas e motivadoras -, acresce-se o de compensar as diferenças, diminuindo a desigualdade de oportunidades. Neste sentido, é fundamental fortalecer e identificar precocemente fragilidades e desenvolver o potencial de enfrentamento das crianças mais vulneráveis. Daí a necessidade de abordagens interdisciplinares extensivas a profissionais de saúde e educação tanto para a identificação como para a seleção de estratégias de reabilitação efetivas frente às dificuldades de aprendizagem.
Estima-se que em torno de 15 a 20% das crianças no início da escolarização apresentam dificuldades em aprender, e essas estimativas podem chegar a 30 a 50% se forem analisados os primeiros seis anos de escolaridade. O mau desempenho escolar, definido como um rendimento acadêmico abaixo do esperado para determinada idade, habilidades cognitivas e escolaridade, é complexo e multifatorial. Inclui desde Dificuldades de Aprendizagem relacionadas a fatores múltiplos - como baixas oportunidades socioambientais e conflitos emocionais - até Transtornos de Aprendizagem de natureza neurobiológica - como a dislexia, a discalculia e o Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade. O mau desempenho escolar, independentemente da etiologia, afeta as diversas esferas da rede relacional da criança, levando a problemas emocionais como ansiedade, baixa autoestima e desmotivação.
Reconhecer como a criança avalia seu próprio desempenho e nível de satisfação com a vida parte da premissa metacognitiva de que a criança em desenvolvimento é capaz de se expressar e de acessar a sua subjetividade. O trabalho “Qualidade de vida e autopercepção de saúde de crianças com mau desempenho escolar11. Rezende BA, Lemos SM, Medeiros AM. Quality of life and health self-perception in children with poor school performance. Rev Paul Pediatr. 2017;35:415-21.” do grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais é um bom representante dessa premissa. A pesquisa, realizada em 99 crianças escolares com mau desempenho escolar, utilizando a Escala de AUQEI, validada no Brasil e de fácil operacionalidade, é muito bem-vinda nesse sentido, pois vai de encontro com a visão atual de que não basta apenas reconhecer e tratar transtornos, mas trazer a visão da própria criança, de sua autonomia e percepção de saúde enquanto potencializadora do sentido de pertencimento e identidade, fundamentais para a inclusão por meio da educação e da cultura.
REFERÊNCIAS
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1Rezende BA, Lemos SM, Medeiros AM. Quality of life and health self-perception in children with poor school performance. Rev Paul Pediatr. 2017;35:415-21.
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Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Oct-Dec 2017
Histórico
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Recebido
09 Jun 2017