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Desafios emergentes da formação inicial em Psicologia Escolar durante a pandemia

Resumo:

Este artigo visa discutir a formação inicial em Psicologia Escolar no Brasil no contexto da pandemia, focalizando os desafios vivenciados no ensino remoto emergencial. Para tanto, são expostas considerações acerca da formação inicial do psicólogo escolar, sua relação com a realização do ensino remoto emergencial nas universidades e, por último, são abordadas as dificuldades existentes na realidade atual. Os desafios da formação durante a pandemia se referem à mudança da forma como as atividades e disciplinas teóricas e práticas passaram a ser realizadas, de presencias para um ensino mediado pelo uso das tecnologias digitais, além de dificuldades relacionadas às condições sociais, de saúde ou de acesso aos equipamentos e à internet, que trazem implicações para a formação de graduandos em todo o país. Discute-se a importância de um olhar atento para a formação de um profissional que tem vivenciado um processo formativo diferente em relação às experiências acadêmicas e ao desenvolvimento de competências profissionais.

Palavras-chave:
Covid-19; Formação do psicólogo; Pandemia; Psicologia escolar

Abstract:

This paper aims to discuss initial education in School Psychology in Brazil in the framework of the pandemic, addressing the challenges in emergency remote teaching. Therefore, considerations were made about the initial training of the school psychologists, their relationship with the performance of emergency remote teaching. in universities and, finally, the difficulties existing in the current reality. The training challenge during the pandemic refers to the change in the way activities are carried out and theoretical and practical teaching subjects that use digital technologies; in addition to difficulties associated with social conditions, health or access to equipment and the internet, which have implications for the training of undergraduates across the country. The importance of a careful look at the training of a professional who has experienced a different training process in relation to academic experiences and the development of professional skills is discussed.

Keywords:
Covid-19; Pandemic; Psychologist education; School psychology

A pandemia da doença do coronavírus - 2019 (COVID-19), causada pelo novo coronavírus da família da Síndrome Respiratória Aguda Grave 2 (SARS-CoV-2), provocou uma crise sanitária que não apenas afetou a saúde mundial, mas, também, a economia, a educação e a política. De acordo com Antunes (2020)Antunes, R. (2020). Coronavírus: o trabalho sob fogo cruzado. Boitempo. , em um cenário devastador, a pandemia dimensionou e agravou as condições de pobreza, desemprego, precarização da educação e do trabalho, assim como gerou sentimentos de desesperança e medo, vivências de luto e tensionamentos políticos e sociais. Com isso, em muitos países, várias ações têm sido implementadas para assegurar a integridade física, psicológica, social e econômica da população mundial.

Essa situação trouxe muitos desafios à sociedade, alterou o cotidiano das pessoas e intensificou problemas sociais e econômicos no mundo todo. No Brasil, os problemas evidenciados no enfrentamento à pandemia no campo político, em especial no que diz respeito ao Governo Federal, em relação ao planejamento de curto, médio e longo prazo e de normativas para períodos de isolamento social, inclusive referentes à Educação, mostraram a inadequação e a ineficiência do governo em lidar com essa realidade (Carvalho, 2020Carvalho, L. (2020). Curto-circuito: o vírus e a volta do Estado. Todavia.).

A pandemia afetou a todos e todas de forma diferente, e as instituições e os profissionais que poderiam contribuir para amenizar os sofrimentos advindos desse acontecimento também tiveram seus serviços limitados e/ou rotinas alteradas. Nesse cenário, instituições e profissionais da psicologia foram convocados a retomar suas atividades com novas estratégias de funcionamento e organização de acordo com as normas sanitárias vigentes para a prevenção da COVID-19.

Assim, no dia 16 de junho de 2020, o Ministério da Educação, por meio da Portaria nº 5444 4 Essa Portaria revoga as Portarias do Ministério da Educação nº 343, de 17 de março de 2020, nº 345, de 19 de março de 2020, e nº 473, de 12 de maio de 2020. , estabeleceu a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto permanecesse a situação de pandemia de COVID-19. De acordo com essa portaria, as instituições de ensino superior deveriam definir quais disciplinas poderiam ser oferecidas nesse sistema digital, quais ferramentas pedagógicas seriam utilizadas, bem como de que maneira seriam feitas as avaliações nesse período (Ministério da Educação, 2020Ministério da Educação (2020). Portaria nº 544, de 16 de junho de 2020. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais, enquanto durar a situação de pandemia do novo coronavírus - Covid-19, e revoga as Portarias MEC nº 343, de 17 de março de 2020, nº 345, de 19 de março de 2020, e nº 473, de 12 de maio de 2020. https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-544-de-16-de-junho-de-2020-261924872
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). De modo geral, com base nessa portaria, o ensino no Brasil precisou ser reorganizado e ofertado de maneira remota por meio de tecnologias digitais de informação e comunicação, mas sem levar em consideração os marcadores como classe social, gênero, território, deficiências, entre outros.

Em face desse contexto, busca-se discutir a formação inicial em Psicologia Escolar no Brasil no contexto da pandemia abordando os desafios vivenciados no ensino remoto emergencial (ERE). Para tanto, são expostas considerações acerca da formação inicial do psicólogo escolar, sua relação com a realização do ERE nas universidades e, por último, são abordadas as dificuldades existentes na realidade atual.

Formação acadêmica do psicólogo escolar: algumas considerações

Historicamente, a inserção dos psicólogos em contextos educativos tem propiciado o repensar acerca da formação inicial desse profissional, voltada para as diferentes demandas que se apresentam no cenário educacional brasileiro. Pesquisadores, profissionais, instituições e órgãos de classe têm desenvolvido pesquisas e elaborado documentos balizadores para a formação e atuação do Psicólogo Escolar com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no Plano Nacional de Educação (PNE), nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) e no Conselho Nacional de Educação (CNE).

Embora esses marcos legais e a conjuntura política, econômica e social do Brasil afetem diretamente a condução das disciplinas teóricas e os estágios em Psicologia Escolar, as competências requeridas pela realidade nem sempre são ofertadas nesses cursos de formação inicial. Ao tratarem do conceito de competência no ensino superior, Marinho-Araújo e Almeida (2016)Marinho-Araújo, C. M., & Almeida, L. S. (2016). Approach to competences, human development and higher education. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 32, 1-9. https://doi.org/10.1590/0102-3772e32ne212
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e Marinho-Araújo e Rabelo (2015)Marinho-Araújo, C. M., & Rabelo, M. L. (2015). Avaliação educacional: a abordagem por competências. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior, 20(2), 443-466. http://dx.doi.org/10.590/S1414-40772015000200009
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explicam que as Diretrizes Curriculares da Educação Superior devem se pautar em indicadores de competência que considerem os aspectos históricos, culturais e sociais no processo dialético do desenvolvimento e da aprendizagem humana.

Nesse sentido, a competência não pode ser reduzida a treinamentos ou a dimensões técnicas, mas precisa incorporar as dimensões intersubjetivas que ocorrem nos processos educativos e que afetam o desenvolvimento humano. Dessa forma, o desenvolvimento de competências não deve ser associado meramente às exigências do mercado de trabalho por meio de instruções universais e/ou sequencial de resolução de problemas, mas precisa estar atrelado a uma perspectiva de sensibilidade e compreensão do sujeito e da situação-problema sob um viés dialético. Isso permitirá ao sujeito: (a) visualizar as singularidades da situação; (b) mobilizar os recursos necessários para transpor de forma flexibilizada o conhecimento na ação e (c) desenvolver o compromisso de sempre ressignificar a sua atuação diante dos problemas enfrentados (Marinho-Araújo & Rabelo, 2015Marinho-Araújo, C. M., & Rabelo, M. L. (2015). Avaliação educacional: a abordagem por competências. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior, 20(2), 443-466. http://dx.doi.org/10.590/S1414-40772015000200009
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).

Como explica Marinho-Araújo e Almeida (2003)Marinho-Araújo, C. M., & Almeida, S. F. C. (2003). Psicologia Escolar Institucional: desenvolvendo competências para uma atuação relacional. In S. F. C. Almeida (Org.), Psicologia Escolar: ética e competências na formação e atuação profissional. Alínea., a competência de agir diante de uma situação-problema se caracteriza pela mobilização de recursos disponíveis - comportamentos e conhecimentos - pelo sujeito, o qual deverá se articular aos pontos críticos da situação e objetivar a tomada de decisão, bem como os encaminhamentos necessários e úteis para o que está sendo demandado.

Esse desafio de desenvolver as competências profissionais se coloca na formação inicial do Psicólogo Escolar tanto no âmbito das disciplinas teóricas quanto nos estágios supervisionados na área. No que concerne à aquisição de conhecimentos nas disciplinas teóricas, Marinho-Araújo e Rabelo (2015)Marinho-Araújo, C. M., & Rabelo, M. L. (2015). Avaliação educacional: a abordagem por competências. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior, 20(2), 443-466. http://dx.doi.org/10.590/S1414-40772015000200009
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explicam que o conhecimento e a competência são interdependentes; porém, apresentam especificidades que os diferenciam. O conhecimento é imprescindível para construir a competência; no entanto, a forma como o sujeito se apropria da teoria não é suficiente para mensurar a sua competência para agir diante de uma situação-problema.

Por isso, Marinho-Araújo (2005)Marinho-Araújo, C. M. (2005). Psicologia escolar e o desenvolvimento de competências. Boletim Academia Paulista de Psicologia, 25(2), 73-85. https://www.redalyc.org/pdf/946/94625212.pdf
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afirma que desenvolver competências está além da aquisição de conhecimentos, pois exigirá do sujeito a mobilização de recursos internos e externos, de forma intencional e planejada, para enfrentar os desafios cotidianos que se apresentam na esfera pessoal e/ou profissional. É importante destacar que a pesquisadora não minimiza a importância do conhecimento teórico adquirido na graduação. Ao contrário, advoga pela escolha de teorias críticas e contextualizadas para a construção de uma trajetória pessoal e personalizada de competências profissionais que servirão para consolidar a identidade do psicólogo escolar compromissado com as questões sociais e educacionais e posicionado de forma ética-política.

No que diz respeito à importância do estágio supervisionado para a formação do futuro psicólogo escolar, Guzzo et al. (2009)Guzzo, R. S. L., Costa, A. S., & Sant’Ana, I. M. (2009). Formando psicólogos escolares: problemas, vulnerabilidades, desafios e horizontes. In C. M. Marinho-Araújo (Org.), Psicologia escolar: novos cenários e contextos de pesquisa, formação e prática. Alínea. e Silvia Neto et al. (2014)Silva Neto, W. M. F., Guzzo, R. S. L., & Moreira, A. P. G. (2014). Estagiários de Psicologia na Escola: o que os bastidores revelam para a formação profissional?In R. S. L. Guzzo (Org.), Psicologia escolar: desafios e bastidores na Educação Pública. Alínea. destacam que é por meio da inserção no campo educativo que o estagiário terá a oportunidade de reconhecer suas limitações pessoais e técnicas ao se deparar com as complexidades das demandas provenientes da comunidade escolar. Por isso, Ferreira et al. (2019)Ferreira, F. G., Carvalho, M. M., Gomes, Y. A. F., Alarcão, L. C. P., Galvão, D. M., & Marinho-Araujo, C. M. (2019). Estágio supervisionado em psicologia escolar: uma experiência na perspectiva institucional.Revista de Psicologia da IMED,11(1), 202-216. https://dx.doi.org/10.18256/2175-5027.2019.v11i1.3027
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explicam que o desenvolvimento adequado das competências dos estagiários que pretendem atuar nas escolas não pode ser restrito à utilização de metodologias e conhecimentos que abarcam apenas a articulação de teoria e prática. É essencial também contemplar o desenvolvimento dos recursos psicológicos desses estagiários para lidar com as demandas políticas, sociais, culturais e emocionais.

A formação inicial em Psicologia Escolar a partir da inserção do Ensino Remoto Emergencial (ERE) nas universidades

De acordo com o Conselho Nacional de Educação, conforme explicitado no artigo 3°, o “[...] curso de graduação em Psicologia deve ser oferecido na modalidade presencial, tendo em vista a natureza complexa das competências profissionais do psicólogo” (Ministério da Educação, 2019Ministério da Educação (Brasil). (2019). Parecer CNE/CES nº 1.071, de 4 de dezembro de 2019 (não homologado). Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) dos Cursos de Graduação em Psicologia. http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=139201-pces1071-19&category_slug=dezembro-2019-pdf&Itemid=30192
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, Art. 3). Com o surgimento da pandemia da COVID-19, no entanto, nos deparamos com a possibilidade de oferecer a modalidade de ERE para esses estudantes.

No dia 28 de abril de 2020, o CNE apresentou o Parecer CNE/CP nº 5/2020 com diretrizes orientadoras para a Educação Básica e a Educação Superior durante o período de pandemia, especialmente no que se referia à realização de atividades educativas não presenciais. No documento, foi exposta uma lista de tecnologias ou meios que poderiam ser usados no campo educacional, bem como foi indicado o papel dos familiares como mediadores das tarefas escolares de seus filhos. Assim, no dia 16 de junho de 2020, o MEC lançou a Portaria nº 544, de 16 de junho de 2020, que estabeleceu a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durasse a pandemia da COVID-19.

Com base no referido parecer, o ERE foi apresentado como uma estratégia pedagógica para manter o funcionamento do período letivo nos sistemas de ensino. Essa adesão ao ERE, no entanto, trouxe consequências diversas ao processo de ensino e aprendizado, além de intensificar a precarização do trabalho docente e não garantir o funcionamento democrático da educação. Pesquisadores têm apontado algumas limitações, como: (a) dificuldades dos estudantes, especialmente os mais pobres, das periferias das cidades e da zona rural, em ter acesso a equipamentos e à internet de qualidade (Pott, 2020Pott, E. T. B. (2020). Contribuições da psicologia escolar para o ensino superior em um contexto de pandemia: o papel da construção de coletivos. Brazilian Journal of Development, 6(7), 49707-49719. https://doi.org/10.34117/bjdv6n7-571
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); (b) necessidade de formação dos educadores - também realizada de forma emergencial - para atuarem com os recursos e tecnologias no processo de ensino e (c) falta de preparo de estudantes quanto ao acesso à internet para estudarem, considerando a autonomia e as habilidades necessárias no uso dessas tecnologias (Gusso et al., 2020Gusso, H. L., Archer, A. B., Luiz, F. B., Sahão, F. T., Luca, G. G., Henklain, M. H. O., & Gonçalves, V. M. (2020). Ensino superior em tempos de pandemia: diretrizes à gestão universitária. Educação e Sociedade, 41, e238957. https://dx.doi.org/10.1590/es.238957
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; Pott, 2020Pott, E. T. B. (2020). Contribuições da psicologia escolar para o ensino superior em um contexto de pandemia: o papel da construção de coletivos. Brazilian Journal of Development, 6(7), 49707-49719. https://doi.org/10.34117/bjdv6n7-571
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). No caso dos estudantes universitários, Maia e Dias (2020)Maia, B. R., & Dias, P. C. (2020). Ansiedade, depressão e estresse em estudantes universitários: o impacto da COVID-19. Estudos de Psicologia (Campinas), 37, e200067. https://doi.org/10.1590/1982-0275202037e200067
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afirmam que, além dos problemas de acesso aos recursos tecnológicos digitais, são evidenciadas dificuldades como quadros de ansiedade, depressão e estresse, provocadores de efeitos deletérios na saúde mental de professores e estudantes.

Em geral, os autores discutem a importância do planejamento do ensino remoto emergencial, visando superar improvisações e a mera transposição do ensino presencial para o contexto remoto. Também indicam a necessidade de as instituições repensarem a própria concepção de ensino, buscando definir um projeto de trabalho mais coerente com o conceito de educação de qualidade que se almeja no nível superior.

Essa situação se agravou ainda mais nas instituições educacionais que não possuíam a modalidade de Ensino à Distância, como foi o caso dos cursos de Psicologia. No Brasil, o ensino de Psicologia na graduação nunca foi ofertado à distância e a passagem instantânea do presencial para o ERE sem planejamento pedagógico, estrutural e organizacional impôs mais desafios para essa formação. Antes de abordar as dificuldades advindas dessa nova conjuntura na formação inicial do psicólogo, faz-se necessário explicar que há diferenciações importantes entre o que se configura como Educação à Distância (EaD) - e a proposta de Ensino Remoto Emergencial (ERE).

A compreensão sobre EaD é muito ampla (Hermida & Bonfim, 2006Hermida, J. F., & Bonfim, C. R. S. (2006). A educação à distância: história, concepções e perspectivas. Revista HISTEDBR On-line, n. especial, 166-181. https://www.fe.unicamp.br/pf-fe/publicacao/4919/art11_22e.pdf
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). Na literatura são encontrados diversos conceitos de EaD que abrangem: (a) a relação não presencial entre professor e aluno e o uso de livros; (b) os materiais de estudo em cursos por correspondência e (c) as tecnologias convencionais e/ou modernas para a ação educativa com indivíduos e grupos a partir de métodos ou procedimentos que incluem estudos, avaliações, orientações e tutorias à distância (Landim, 1997Landim, C. M. P. F. (1997). Educação a distância: algumas considerações. Edição do Autor.; Mugnol, 2009Mugnol, M. (2009). A educação a distância no Brasil: conceitos e fundamentos. Revista Diálogo Educacional, 9(27), 335-349. http://dx.doi.org/10.7213/rde.v9i27.3589
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).

De acordo com Valente (2014)Valente, J. A. (2014). Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da sala de aula invertida. Educar em Revista, 4, 79-97. https://doi.org/10.1590/0104-4060.38645.
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, com o surgimento das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC), ocorreram alterações no campo da EaD relacionadas a concepções teóricas, abordagens pedagógicas, práticas educativas e processos de avaliação da aprendizagem dos alunos. Para a identificação de cursos EaD, o autor também alerta para a existência de uma pluralidade de termos e denominações usadas na literatura internacional, como web-based education, on-line education, virtual classroom e distributed learning.

Conforme apontam Costa et al. (2015)Costa, S. R. S., Duqueviz, B. C., & Pedroza, R. L. S. (2015). Tecnologias digitais como instrumentos mediadores da aprendizagem dos nativos digitais. Psicologia Escolar e Educacional, 19(3), 603-610, https://www.scielo.br/j/pee/a/NwwLwRTRTdBDmXWW4Nq7ByS/?format=pdf⟨=pt
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, o termo Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) tem sido comumente usado em referência aos dispositivos eletrônicos e tecnológicos, incluindo, também, tecnologias mais antigas, como o jornal e a televisão. Pesquisadores têm utilizado, no entanto, o termo Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) para se referirem especialmente às tecnologias digitais.

Com o advento da pandemia em 2020, o ERE tem sido usado de forma equivocada e não raramente visto como equivalente à EaD. Isso tende a camuflar os impactos que o ERE pode ocasionar no processo de ensino e aprendizagem, tendo em vista que a EaD é uma modalidade educacional permanente que usa meios e tecnologias de informação na mediação didático-pedagógica, com políticas específicas de acesso, acompanhamento e avaliação. Além disso, concebe profissionais preparados para o uso pedagógico de ferramentas virtuais. Tudo isso não foi possível se concretizar de imediato na proposta do ERE porque o denominado ensino remoto é de caráter excepcional, emergencial e temporário e tem como finalidade substituir disciplinas presenciais por atividades que utilizem recursos educacionais digitais durante o período de distanciamento social.

Embora o ensino remoto tenha sido ampliado devido à pandemia, estudos (Alves, 2020Alves, L. (2020). Educação remota: entre a ilusão e a realidade. Educação, 8(3), 348-365. https://doi.org/10.17564/2316-3828.2020v8n3p348-365
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; Canabrava et al., 2020Canabrava, B. W., Almeida, C. M., Leite, R. V., & Lo Bianco, V. (2020). Políticas educacionais do estado do Rio de Janeiro na pandemia: educação à distância, educação on-line ou ensino remoto? In F. F. N. Insfran, P. A. Prado, S. E. F. Faria, T. A. Ladeira, & T. A. Sentineli (Orgs.), Fraturas expostas pela pandemia: escritos e experiências em educação. Encontrografia.) apontam que as práticas educativas remotas se configuram como adaptações temporárias de atividades e metodologias utilizadas no contexto presencial e que nem sempre alcançam os objetivos pretendidos. Sinalizam ainda o caráter de improviso e de urgência com que muitas ações e planejamentos foram realizados, além do fato de que os professores foram compelidos a reverem e adequarem suas práticas para desenvolver atividades balizadas nas tecnologias digitais sem que tivessem suporte adequado ou a devida formação acerca dessas ferramentas.

Santos (2020)Santos, E. (2020). EAD, palavra proibida. Educação online, pouca gente sabe o que é. Ensino remoto, o que temos para hoje. Revista Docência e Cibercultura. https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/re-doc/announcement/view/1119
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esclarece que, embora possam existir experiências curriculares favoráveis ao aprendizado no ensino remoto, as práticas têm repetido modelos pedagógicos massivos e subutilizado o potencial das tecnologias e da cibercultura na área educacional, tornando o ensino cansativo e estressante para alunos e professores. Todavia, como destaca Hodges et al. (2020)Hodges, C.,Moore, S., Lockee, B., Trust, T. & Bond, A. (2020). The difference between emergency remote teaching and online learning. Educause Review. https://er.educause.edu/articles/2020/3/the-difference-between-emergency-remote-teaching-and-online-learning
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, o objetivo do ERE no cenário atual não é recriar um sistema educacional robusto, mas propiciar o acesso à educação e aos suportes instrucionais de forma temporária durante a situação de crise.

Preocupados com a utilização do ERE para a formação inicial dos psicólogos, as organizações de classe, associações, universidades, os conselhos regionais e federal,profissionais e estudantes buscaram soluções que pudessem viabilizar a continuação tanto da formação inicial quanto da prática do psicólogo nos espaços educacionais e de trabalho sem ferir a integridade física e emocional da categoria e da sociedade. Assim, em 2020, a Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP) e o Conselho Federal de Psicologia (CFP) propuseram a realização de seminários nacionais sobre as práticas e os estágios remotos. Esses seminários geraram a elaboração de um documento orientativo denominado “Práticas e estágios remotos em Psicologia no contexto da pandemia da COVID-19: recomendações” (Conselho Federal de Psicologia, 2020Conselho Federal de Psicologia. (2020). Práticas e estágios remotos na área no contexto da pandemia da Covid-19 - Recomendações. https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2020/08/Caderno-de-orientac%CC%A7o%CC%83es-formac%CC%A7a%CC%83o-e-esta%CC%81gios_FINAL2_com_ISBN_FC.pdf.
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).

De acordo com Soligo et al. (2020)Soligo, A. F., Oliveira, L. T., Muniz, M., & Zanini, D. S. (2020). Formação em Psicologia: estágios e avaliação psicológica. Psicologia: Ciência e Profissão, 40, e243432. https://doi.org/10.1590/1982-3703003243432.
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, esse seminário nacional contou com a participação de diversas entidades da Psicologia e reforçou, por um lado, o compromisso da categoria com os princípios dos direitos humanos, do respeito às diferenças e do enfrentamento às desigualdades, e, por outro, a defesa de políticas públicas promotoras do bem-estar, da formação com qualidade ética e técnica e da presencialidade entendida como fundamental para a construção da identidade do profissional a ser formado.

Esse documento contempla basicamente orientações direcionadas às práticas do psicólogo e aos estágios remotos, tendo em vista que as disciplinas teóricas poderiam ser adaptadas para o Ensino Remoto Emergencial. Em relação às práticas do psicólogo, é explícita a necessidade de apresentar orientações e não apenas transpor o ensino remoto para as atividades práticas de estágios.

Assim, ao analisar o documento do Conselho Federal de Psicologia, (2020)Conselho Federal de Psicologia. (2020). Práticas e estágios remotos na área no contexto da pandemia da Covid-19 - Recomendações. https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2020/08/Caderno-de-orientac%CC%A7o%CC%83es-formac%CC%A7a%CC%83o-e-esta%CC%81gios_FINAL2_com_ISBN_FC.pdf.
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sobre as recomendações referentes aos processos de trabalho do psicólogo em cenários educacionais, é possível destacar algumas ações que podem ser desenvolvidas de maneira remota, como: (a) orientação às famílias e estudantes visando o enfrentamento dos impactos desse período; (b) desenvolvimento de estratégias que possam contribuir com o processo de ensino e aprendizagem, em especial atividades direcionadas aos estudantes com deficiência; (c) acompanhamento do processo de trabalho dos/as educadores/as visando identificar riscos à saúde emocional; (d) planejamento escolar em equipe multiprofissional para a estruturação do retorno às atividades presenciais e (e) escuta e acolhimento dos sofrimentos causados pela pandemia. Pelo caráter complexo dos processos educativos e escolares, todavia, não há a recomendação de que os estágios sejam realizados apenas por meios remotos.

Segundo estabelece a Portaria MEC nº 544/2020, as atividades práticas profissionais de estágio devem obedecer às Diretrizes Nacionais Curriculares aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação. A substituição de práticas profissionais deve ser descrita em planos de trabalhos específicos, ser aprovada institucionalmente e estar atrelada aos projetos pedagógicos dos cursos. Ademais, essa portaria também explicita que, no caso de suspensão, as atividades acadêmicas deverão ser repostas de forma integral.

Desafios da formação inicial de Psicologia Escolar no contexto da pandemia

No contexto provisório e transitório da pandemia da COVID-19, a condução das disciplinas teóricas e de estágios tem sido objeto de interesse de diversos pesquisadores e profissionais preocupados com o impacto do ERE na formação inicial do psicólogo, especialmente na área da Psicologia Escolar. A esse respeito, algumas contribuições que expuseram os desafios e as limitações do ensino remoto podem ser localizadas a partir de três pontos interligados: (a) o trabalho docente do psicólogo nas universidades mediado pelas TDIC; (b) a inserção do ERE no processo de ensino e aprendizagem do estudante de psicologia e (c) a complexificação das demandas apresentadas pela escola e advindas do cenário atual de pandemia.

Com relação ao “trabalho docente do psicólogo nas universidades”, mediado pelas TDIC, pesquisadores como Ribeiro et al. (2021)Ribeiro, F. M., Oliveira, F. R. M., & Souza, J. C. (2021). Pandemia, quarentena e aulas remotas: relatos de experiência docente. In A. S. C. Mezzalira & M. Calegare (Orgs.), Processos Psicossociais Vol.II: práticas e reflexões sobre educação, saúde, ruralidades e política. Manaus. afirmam que a imposição do ERE aprofundou a precarização do trabalho desse profissional, principalmente nas instituições privadas de ensino superior que dependem do pagamento de mensalidades para manterem-se abertas. Nesse contexto de pressão financeira, o docente universitário teve o seu contato acelerado com as TDIC ao adaptar-se rapidamente ao ambiente virtual e garantir o breve retorno das aulas para atender às cobranças da sociedade e às exigências do mercado educacional.

O medo do desemprego impulsionou os docentes à adesão de uma nova rotina de flexibilização de jornadas e contratos de trabalho que diminuíram o seu tempo de descanso e lazer e ocuparam o seu espaço familiar e privado. Os professores precisaram repensar as atividades pedagógicas em um curto espaço de tempo e dentro de um contexto pandêmico em que muitos sofriam com a desesperança, o medo e a vivência do luto (Ribeiro et al., 2021Ribeiro, F. M., Oliveira, F. R. M., & Souza, J. C. (2021). Pandemia, quarentena e aulas remotas: relatos de experiência docente. In A. S. C. Mezzalira & M. Calegare (Orgs.), Processos Psicossociais Vol.II: práticas e reflexões sobre educação, saúde, ruralidades e política. Manaus.).

Os treinamentos feitos pelos docentes nesses espaços educacionais foram direcionados apenas às dimensões técnicas, sem propiciar uma análise dialética sobre a conjuntura atual. Isso afetou o desenvolvimento desses docentes e ocasionou processos de sofrimento psíquico. Com explica Marinho-Araújo e Rabelo (2015)Marinho-Araújo, C. M., & Rabelo, M. L. (2015). Avaliação educacional: a abordagem por competências. Avaliação: Revista da Avaliação da Educação Superior, 20(2), 443-466. http://dx.doi.org/10.590/S1414-40772015000200009
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, quando nos propusermos a desenvolver competências profissionais necessárias para lidar com as situações-problemas que surgem no decorrer da vida profissional e pessoal, é de suma importância adicionar as dimensões intersubjetivas a essa conjuntura.

A pandemia exigiu dos docentes tanto a mobilização de recursos técnicos e intersubjetivos quanto materiais. Professores tiveram que arcar com os custos para a compra de novos equipamentos tecnológicos e para a aquisição de internet e móveis adequados para a realização do trabalho. O supervisor de estágio em psicologia também precisou buscar um espaço em casa que não afetasse em demasia as suas orientações de estágio on-line e que assegurasse o sigilo ético profissional das informações advindas dessas orientações. Pode-se inferir que esse docente da área da psicologia escolar também se encontra em situação de risco psicossocial, precisando lidar com as demandas da universidade, dos estudantes, da escola e da própria vida.

Em relação à “inserção do ERE no processo de ensino e aprendizagem”, assim como os professores, os estudantes de psicologia também foram pressionados a aprenderem e a usarem os recursos técnicos exigidos na modalidade de ensino remoto e tiveram que mobilizar os seus recursos intersubjetivos sem o acompanhamento adequado das instituições de ensino superior. Essa situação também provocou sentimentos de ansiedade, estresse, incertezas e inseguranças.

Nessa nova modalidade de ensino remoto, a ausência de democratização do acesso a dispositivos digitais e à internet ensejou sentimentos de injustiça em alguns estudantes por se sentirem excluídos e terem sua autonomia eliminada de seu processo de formação profissional, isso porque os planejamentos e a implementação de projetos pedagógicos nas universidades foram direcionados de modo quase exclusivo à tentativa de transpor para o ambiente on-line as suas atividades presenciais e de assegurar a construção de competências, habilidades e atitudes expressas nas Diretrizes Curriculares Nacionais (Conselho Nacional de Educação, 2004Conselho Nacional de Educação (Brasil). (2004). Resolução nº 8, de 7 de maio de 2004. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Psicologia e estabelecimento de normas para o Projeto Pedagógico Complementar (PPC) para a Formação de Professores de Psicologia. Ministério da Educação. http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rces08_04.pdf
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) para os cursos de Psicologia. Como a proposta era a entrega de conteúdo via on-line para atender situações emergenciais e pontuais, foram postas em segundo plano as atividades pedagógicas que contemplavam os aspectos sociais, políticos, culturais e econômicos causados pela pandemia e que impactavam o desenvolvimento e a aprendizagem humana.

Essa urgência em assegurar o pleno andamento do processo de formação inicial de psicólogos via ensino remoto foi intensificada para os últimos anos dos cursos em razão da obrigatoriedade dos estágios curriculares, caracterizados pelas práticas presenciais nos campos de trabalho. Assim, os estágios tornaram-se o centro de debates sobre a eficácia do ensino remoto em relação às competências necessárias para atuar no campo de trabalho. Com isso, os supervisores de estágios tiveram que repensar suas atividades pedagógicas para além da transposição do método presencial para o on-line.

Pesquisadores como Guzzo et al. (2021), entre outros, estão preocupados em construir práticas possíveis de estágios nesse contexto pandêmico e buscam assegurar não apenas a continuidade da formação e a saúde dos estudantes, mas, também, os direitos da comunidade escolar a um acompanhamento psicológico durante esse contexto. Por essa razão, compartilharam suas experiências exitosas nas supervisões de estágio.

Para esses pesquisadores, apesar de suas limitações e desafios, os estágios realizados nessa modalidade de ensino foram capazes de trazer propostas que se dividiam entre estudos teóricos e inserção no campo via on-line. Os estudos teóricos debatidos na supervisão utilizaram pesquisas que poderiam auxiliar as demandas que iam surgindo a partir dos temas recorrentes e advindos do contato com a comunidade escolar mediado pelas tecnologias. No aspecto prático, ao lado de um profissional de psicologia, os estagiários realizaram reuniões e encontros on-line com estudantes, professores e familiares e buscaram adequar as ações por meio das especificidades tecnológicas e espaciais e das necessidades subjetivas de cada grupo. Para facilitar a comunicação, eram usadas ferramentas digitais como SMS, WhatsApp, e-mails, links e sites das escolas ou redes sociais.

Foi possível observar similaridades nas descrições desses estudos teóricos e de inserção no campo via on-line, especialmente no que diz respeito à importância de se reconfigurar ações preexistentes do ensino e da condução das atividades de estágio, assim como da construção de estratégias que atendessem às demandas psicoeducacionais surgidas no momento atual. Notou-se, porém, a existência de poucos trabalhos sobre a formação em Psicologia Escolar nesse contexto, o que aponta a necessidade de realização de investigações futuras capazes de compreender os impactos do uso das tecnologias e das referidas mudanças para a formação dos psicólogos em relação ao desenvolvimento de competências.

Em termos gerais, o formato remoto demandou uma série de ajustes no desenvolvimento do processo de supervisão acadêmica e nas ações junto à comunidade escolar. Essa aproximação com a escola, mesmo que de caráter remoto, possibilitou identificar as novas demandas das escolas e verificar o agravamento de outras que já existiam. Pode-se considerar, ainda, que o uso de tecnologias favoreceu a realização de encontros virtuais com pesquisadores, profissionais da área e estudantes, tanto em disciplinas teóricas, visando contribuir para estudos e debates sobre temas relevantes para a formação dos graduandos, como em disciplinas práticas, buscando favorecer trocas de experiências acerca dos desafios encontrados naquele cenário.

Ressalta-se que a realização das ações práticas de forma remota, desenvolvidas nos espaços de supervisão de estágio, não tem a pretensão de substituir as atividades presenciais - que são extremamente importantes para o processo de desenvolvimento das competências profissionais.

A partir das leituras realizadas das pesquisas de Camargo and Carneiro (2020)Camargo, N. C., & Carneiro, P. B. (2020). Potências e desafios da atuação em Psicologia Escolar na pandemia de Covid-19. Cadernos de Psicologias, 1. https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/potencias-e-desafios-da-atuacao-em-psicologia-escolar-na-pandemia-de-covid-19/
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, Ferreira and Castro (2020)Ferreira, M. S., & Castro, B. (2020). Uma experiência de estágio remoto na escola durante a pandemia sob a luz da Psicologia histórico-cultural. Anais do IV Congresso Internacional de Educação Inclusiva e V Jornada Chilena Brasileira de Educação Inclusiva, Campina Grande, pp. 1-8. https://editorarealize.com.br/artigo/visualizar/72614.
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, Guzzo et al. (2020)Guzzo, R. S. L., Silva, S. S. G. T., Martins, L. G., Castro, L., & Lorenzetti, L. (2020). Psicologia na escola e a pandemia: buscando um caminho. In N. Fausto & B. O. Ferreira (Orgs.), Onde está a psicologia escolar no meio da pandemia? Pimenta Cultural., Santos (2021)Santos, C. M. L. (2021). Como as diferenças se transformam em desigualdade no contexto escolar (Dissertação de mestrado não-publicada). Universidade Federal do Amazonas., Souza (2021)Souza, C. A. (2021). Notas sobre o fazer de uma psicóloga escolar na pandemia. Estilos da Clínica, 26(1), 17-28. e Vier et al. (2020)Vier, R. F. S., Silveira, R. M. C., & Prsybyciem, M. M. (2020). A inclusão de alunos com transtornos do Espectro Autista (TEA) e orientação psicológica em tempos pandêmicos: suas relações e desafios na educação. Revista Práxis, 12(1), 77-85., tornou-se possível dimensionar as seguintes “situações-problemas direcionadas ao psicólogo escolar que foram agravadas durante a pandemia no contexto escolar”, a saber: violência doméstica e sexual, vivências de lutos e perdas, exclusão social, dificuldades no processo de ensino-aprendizagem, intensificação dos desafios impostos à inclusão escolar, sofrimento psíquico de professores, estudantes e familiares, desigualdade na divisão de trabalho com base no gênero, conflitos na relação família e escola e fragilização do vínculo professor e aluno ocasionada pela privação do convívio social.

Ademais, se intensificou para a escola e para a sociedade a visão de que o psicólogo escolar deve atender as demandas urgentes da escola, segundo uma atuação de caráter imediatista e remediativo. Com a ocorrência da pandemia, houve um agravamento dessas solicitações e de desafios e limitações impostos, não apenas para os profissionais de psicologia, mas, também, para os estudantes de psicologia que se propõem a atuar nos contextos educativos.

Considerações Finais

Diante das mudanças provocadas pela pandemia e vivenciadas nos contextos educacionais, a formação em Psicologia Escolar demanda novos saberes e fazeres para o profissional e o estudante estagiário da psicologia. Essa é uma situação preocupante, pois, apesar dos esforços dos educadores e discentes ao assumirem o compromisso de desenvolver as competências profissionais desses estudantes por meio exclusivamente do ERE ou de modo híbrido, as dificuldades evidenciadas pelas condições sociais, de saúde ou mesmo de acesso dos estudantes aos equipamentos e à internet trazem implicações para a formação de graduandos de Psicologia em todo o país.

No caso específico desses graduandos em anos finais de curso e, especificamente, dos que estavam desenvolvendo estágios no âmbito educacional, destaca-se a importância de um olhar atento sobre a formação de um profissional que, em virtude das condicionantes sociais (afastamento social, ERE, diminuição de carga horária de atividades práticas e não desenvolvimento de estágios presenciais que permitissem o contato com o cotidiano e a interação com a comunidade escolar), tem vivenciado um processo formativo diferente em relação às experiências acadêmicas iniciais e ao desenvolvimento de competências profissionais.

Em termos gerais, os desafios da formação em Psicologia Escolar se referem à mudança da forma como as atividades e disciplinas teóricas e práticas são desenvolvidas, já que ambas deixaram de ser presenciais e se voltaram para um ensino à distância mediado pelo uso das tecnologias digitais.

A crise provocada pela pandemia do coronavírus trouxe muitas adversidades para a sociedade. No campo da Educação, nos motivou a prosseguir na luta pela qualidade da formação em Psicologia Escolar e pela formação continuada, assim como pela preservação da vida e da saúde de graduandos e da população, em especial das pessoas que fazem parte dos contextos e processos educativos.

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  • 4
    Essa Portaria revoga as Portarias do Ministério da Educação nº 343, de 17 de março de 2020, nº 345, de 19 de março de 2020, e nº 473, de 12 de maio de 2020.
  • Suporte: Auxílio financeiro do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEd-So) da Universidade Federal de São Carlos em relação à tradução do artigo para a Língua Inglesa.

Como citar esse artigo

  • 7
    Sant’Ana, I. M., Weber, M. A. L., & Mezzalira, A. S. C. (2022). Desafios emergentes da formação inicial em Psicologia Escolar durante a pandemia. Estudos de Psicologia (Campinas), 39, e210073. https://doi.org/10.1590/1982-0275202239e210073

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    27 Abr 2021
  • Revisado
    15 Jul 2021
  • Aceito
    08 Fev 2022
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