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Avaliação de variedades frutíferas: o caso do maracujá-azedo cultivado em São Paulo, Brasil

Evaluation of fruit varieties: the case of passion fruit cultivated in São Paulo, Brazil

Resumos

Resumo

Esta pesquisa teve como objetivo a proposição de um protocolo metodológico para avaliação de impactos de cultivares frutíferas adotadas pelo setor agropecuário e a validação com cultivares de maracujá-azedo (Passiflora edulis Sims). O protocolo foi baseado no estudo do contexto da pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) em que o objeto avaliado estava inserido, identificação de indicadores e definição de critérios para a mensuração de adicionalidade e causalidade. Os resultados contribuíram para a estruturação de um protocolo metodológico de avaliação de impactos fundamentado por indicadores para caracterização socioeconômica de Unidade de Produção Agropecuária (UPA) e para a mensuração de impacto direto com o uso cultivares frutíferas. No caso de estudos de avaliação de impacto cultivares frutíferas, salienta-se a importância do conhecimento dos processos de P&D, difusão e adoção, como também características socioeconômicas das UPAs. A validação do protocolo em um conjunto de produtores de maracujá-azedo, permitiu identificar que tanto os indicadores de caracterização socioeconômica como os de impacto são passíveis de serem utilizados para avaliar o impacto de diferentes cultivares de frutíferas.

Palavras-chave:
Passiflora edulis Sims; avaliação de impacto; cultivar; horticultura; sustentabilidade


Abstract

This research aimed to propose a methodological protocol for evaluating the impacts of fruit cultivars adopted by the agricultural sector and validation with passion fruit cultivars (Passiflora edulis Sims). The protocol was based on the study of the context of research, development and innovation (RD&I) in which the evaluated object was inserted, identification of indicators and definition of criteria for measuring additionality and causality. The results contributed to the structuring of a methodological impact assessment protocol based on indicators for the socioeconomic characterization of the Agricultural Production Unit (UPA) and for the measurement of direct impact with the use of fruit cultivars. In the case of impact assessment studies of fruit cultivars. In the case of impact assessment studies on fruit cultivars, the importance of knowledge of the processes of R&D, diffusion and adoption is highlighted, as well as the socioeconomic characteristics of the UPAs. The validation of the protocol in a group of passion fruit producers allowed to identify that both socioeconomic and impact indicators can be used to assess the impact of different fruit cultivars.

Keywords:
Passiflora edulis Sims; impact assessment; grow crops; horticulture; sustainability


1. INTRODUÇÃO

Estudos de Avaliação de Impacto (AI) da pesquisa têm se destacado cada vez mais no ambiente de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Isto decorre da compreensão de que seus resultados permitem aprendizagem sobre processos de inovação e contribuem para gestão da pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) e prestação de contas à sociedade (Morton, 2015Morton, S. (2015). Progressing research impact assessment: a “contributions” approach. Research Evaluation, 24(4), 405-419. http://dx.doi.org/10.1093/reseval/rvv016.
http://dx.doi.org/10.1093/reseval/rvv016...
). Nesse sentido, a construção e aplicação de métodos de AI configuram-se como elemento chave para organizações atuantes em PD&I diante da necessidade de ampliação de legitimidade e sustentabilidade em Sistemas de CT&I (Gertler et al., 2011Gertler, P. J., Martinez, S., Premand, P., & Rawlings, L.B. (2011). La evaluación de impacto en la práctica. Washington: Banco Mundial. https://doi.org/10.1596/978-1-4648-0888-3.
https://doi.org/10.1596/978-1-4648-0888-...
). A construção de métodos para AI deve considerar a complexidade das atividades de CT&I e que seus resultados e usos são moldados por interesses diferenciados (Matt et al., 2017Matt, M., Gaunand, A., Joly, P. B., & Colinet, L. (2017). Opening the black box of impact - ideal-type impact pathways in a public agricultural research organization. Research Policy, 46(1), 207-218. http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2016.09.016.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2016....
).

A atribuição de adicionalidade e causalidade é crucial em pesquisas de AI, notadamente em processos socialmente construídos, como é o caso da produção e do uso do conhecimento. A identificação da relação causal entre o observado e o medido é metodologicamente complexa (Capanema et al., 2013Capanema, L. M., Zackiewicz, M., Mello, L. M. R., Caetano, S. F., Gianoni, C., & Tonietto, J. (2013). Avaliação de impactos multidimensionais de indicações geográficas: o caso do Vale dos Vinhedos, Rio Grande do Sul. Revista de Economia Agrícola, 60(2), 57-76.). A atribuição de adicionalidade e causalidade são pontos fundamentais a serem considerados tanto na proposição dos indicadores de avaliação quanto na elaboração do questionário de levantamento de dados primários (Gertler et al., 2011Gertler, P. J., Martinez, S., Premand, P., & Rawlings, L.B. (2011). La evaluación de impacto en la práctica. Washington: Banco Mundial. https://doi.org/10.1596/978-1-4648-0888-3.
https://doi.org/10.1596/978-1-4648-0888-...
; Moed & Halevi, 2014Moed, H. F., & Halevi, G. (2014). Multidimensional assessment of scholarly research impact. Journal of the American Society for Information Science and Technology, 66(10), 1988-2002. Recuperado em 30 de maio de 2022, de https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/asi.23314
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/...
). Assim, a adicionalidade é uma forma utilizada para mensurar impactos a partir de um baseline (a diferença entre um indicador medido no tempo T1 e o mesmo indicador no tempo T0). Estas definições têm uma forte ligação com o objeto estudado, no caso da pesquisa agrícola com o contexto de desenvolvimento de seus resultados tecnológicos, bem como com os sistemas de cultivo e diferentes ambientes de produção.

Nessa linha, o modelo apresentado neste artigo considerou as seguintes premissas: (i) as atividades de CT&I são complexas, coletivas e que seus resultados se destinam a diferentes públicos; (ii) a agricultura tem caráter multifuncional definido por atividades agrícolas que vão além da produção agropecuária e incorporam aspectos socioeconômicos, ambientais e desenvolvimento rural; (iii) as especificidades do objeto a ser avaliado.

Tomando as premissas apontadas anteriormente, o objetivo deste artigo é apresentar um protocolo metodológico para avaliação de impactos de cultivares frutíferas a partir de estudo de caso de variedades de maracujá-azedo.

Considerando a aplicação do protocolo ao caso das cultivares de maracujá-azedo, a subseção a seguir contextualiza essa frutífera destacando pontos relevantes para a discussão apresentada neste artigo.

1.1 A PRODUÇÃO DE MARACUJÁ-AZEDO NO BRASIL

O maracujazeiro é uma planta de clima tropical. A principal espécie cultivada é o maracujá-azedo (Passiflora edulis Sims). Dentre os principais países produtores estão Brasil, Colômbia, Peru e Equador (Coelho et al., 2017Coelho, E. M., Gomes, R. G., Machado, B. A. S., Oliveira, R. S., Lima, M. S., Azevedo, L. C., & Guez, A. M. U. (2017). Passion fruit peel flour--technological properties and application in food products. Food Hydrocolloids, 62, 158-164.; Pires et al., 2011Pires, M. M., São José, A. R., & Conceição, A. O. (2011). Maracujá: avanços tecnológicos e sustentabilidade. Ilhéus: Editus.).

Informações sobre a produção da cultura no Brasil mostraram que no ano de 2015 foram cultivados 51,4 mil hectares, representando uma produção de 704,3 mil toneladas e produtividade média de 13,7 t.ha-1 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2020Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (2020). Produção agrícola municipal. Culturas temporárias e permanentes. Recuperado em 30 de maio de 2022, de https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas/agricultura-e-pecuaria/9117-producao-agricola-municipal-culturas-temporarias-e-permanentes.html
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/eco...
). Essa produtividade é considerada baixa devido à presença constante de doenças e a não adoção de sementes geneticamente superiores (cultivares), além de não se utilizar práticas culturais adequadas. Como consequência estão as perdas na produção e/ou menor qualidade de fruto (Fredo et al., 2020Fredo, C. E., Bezerra, L. M. C., Purquerio, L. F. V., Pelegrini, D. F., Meletti, L. M. M., Bin, A., Sachs, R. C. C., & Campagnuci, B. C. G. (2020). Adoção e difusão de cultivares de maracujá-azedo desenvolvidas pelo IAC no Brasil. Informações Econômicas, 51, 1-12.).

Seu cultivo ocorre com uso intensivo de em mão de obra familiar e geralmente em áreas pequenas, o que o qualifica como uma atividade da agricultura familiar (Capanema et al., 2016Capanema, L. M., Fredo, C. E., & Meletti, L. M. M. (2016). Cultivo de maracujá-amarelo no estado de São Paulo: principais características a partir do Levantamento das Unidades de Produção Agropecuária, ano-safra 2007/2008. Informações Econômicas, 46(2), 35-46.). Para o caso brasileiro, observou-se que 60% do total produzido é destinado ao consumo de fruta fresca (in natura) e o restante para a agroindústria (Meletti, 2011Meletti, L. M. M. (2011). Avanços na cultura do maracujá no Brasil. Revista Brasileira de Fruticultura, 33(spe 1), 83-91.; Pires et al., 2011Pires, M. M., São José, A. R., & Conceição, A. O. (2011). Maracujá: avanços tecnológicos e sustentabilidade. Ilhéus: Editus.).

Doenças como o Vírus do Endurecimento dos Frutos (Passionfruit woodiness vírus), a bacteriose (Xanthomonas axonopodis pv. passiflorae) e a fusariose (Fusarium oxysporum f. sp. passiflorae), entre outras pragas atacam a cultura (Aguiar et al., 2014Aguiar, A., Charleston, G., Paterniani, M. E. A. G. Z., Tucci, M. L. S., & Castro, E. F. (2014). Instruções agrícolas para as principais culturas econômicas. Campinas: Instituto Agronômico.). Destas, o Vírus do Endurecimento dos Frutos tem sido considerado a principal doença que acomete os pomares comerciais em muitas regiões do Brasil, causando prejuízos aos produtores como a necessidade de erradicação de pomares contaminados (Capanema et al., 2016Capanema, L. M., Fredo, C. E., & Meletti, L. M. M. (2016). Cultivo de maracujá-amarelo no estado de São Paulo: principais características a partir do Levantamento das Unidades de Produção Agropecuária, ano-safra 2007/2008. Informações Econômicas, 46(2), 35-46.; Damatto Junior et al., 2014Damatto Junior, E. R., Fuzitani, E. J., & Nomura, E. S. (2014). Produção de maracujá com uso de mudas avançadas no Vale do Ribeira. Revista Pesquisa & Tecnologia, 11(1), 1-6.).

2. MATERIAL E MÉTODO

Esta seção apresenta um protocolo metodológico para avaliação de impactos de cultivares de espécies frutíferas aplicado ao caso de variedades de cultivares de maracujá-azedo. Na Figura 1 o protocolo é apresentado, descrevendo cada uma das etapas para AI de cultivares frutíferas.

Figura 1
Protocolo metodológico para avaliação de impactos de cultivares frutíferas

A partir da sequência destacada na Figura 1, a seguir é detalhada cada etapa do protocolo metodológico proposto:

  • Estudo do contexto da PD&I: consiste em revisão de documentos referente ao processo de PD&I que resultou na tecnologia (para o caso deste estudo, cultivares frutíferas de maracujá-azedo); publicações técnico-científicas; base de dados secundários e entrevistas com pesquisadores e usuários da tecnologia em estudo. Esta etapa gera informações quantitativas e qualitativas que fornecem aos avaliadores um conhecimento detalhado sobre o objeto em avaliação e fundamenta a definição do escopo da avaliação.

  • Identificação de indicadores: baseada no estudo do contexto da PD&I, propõe indicadores de avaliação dos impactos do objeto em estudo, que são validados pela equipe de pesquisa.

  • Definição de critérios para adicionalidade e a atribuição da causalidade: também baseada no estudo do contexto da PD&I e nos indicadores de impacto. Propõe modelo de levantamento que pode identificar indicadores passíveis ou não de mensuração de adicionalidade e causalidade.

  • Planejamento e levantamento de dados primários: seleção de amostra, construção de questionários e definição do formato do levantamento (presencial, online, telefone) e organização de base de dados das informações.

  • Análise e discussão dos impactos medidos: análise dos dados primários subsidiada pela proposição de modelos adequados aos objetivos da avaliação.

O estudo do contexto da PD&I, destacado como a primeira etapa do protocolo, é fundamental para delimitação do escopo da avaliação e para a compreensão das especificidades do objeto de estudo. A partir das informações coletadas e organizadas nesta etapa delimitou-se o escopo da avaliação (Figura 1) para cultivares frutíferas, aplicado ao estudo de variedades comerciais de maracujá-azedo. Por serem tecnologias comerciais e em uso no setor produtivo, a avaliação foi qualificada como ex-post, ou seja, os indicadores foram definidos e mensurados a partir do uso da tecnologia. O estudo do contexto da PD&I também apresentou informações sobre a existência de diferentes cultivares desenvolvidas e disponibilizadas ao setor produtivo por organizações de pesquisa brasileiras. Conforme apresentadas no Quadro 1, as características agronômicas das cultivares diferem uma das outras e embasam a fundamentação para avaliação dos indicadores propostos como percentual de polpa, qualidade do fruto, produtividade e outras.

Quadro 1
Características agronômicas das cultivares IAC e Embrapa

Esta constatação subsidiou a proposição de um modelo contrafactual, onde cultivares de maracujá-azedo do Instituto Agronômico (IAC) disponibilizadas comercialmente foram definidas como grupo de tratamento e cultivares da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) se configuram como grupo de controle. A variável que delimitou os grupos de controle e tratamento foi a origem das mudas de maracujá-azedo adquiridas em um mesmo viveiro, como pode-se ser observado no decorrer desta seção. O viveiro garante sementes com certificação de origem genética, produzidas em um mesmo sistema (estufa com tela antiafideos e substrato livre de fungos), comercializadas em um mesmo porte e em condições para plantio imediato.

A definição do contrafactual subsidiou a elaboração do questionário que apresentou uma estrutura de questões para realizar a comparação entre os grupos de controle e tratamento. A seleção de grupo de tratamento, cultivares IAC de maracujá-azedo, foi devido ao maior acesso às informações sobre essas tecnologias, bem como por terem sido as primeiras cultivares de maracujá registradas comercialmente no Brasil.

Sequencialmente, foram propostos indicadores que visam captar diferentes sistemas de produção de maracujá-azedo e suas cultivares utilizadas que podem ser representativas no cenário brasileiro. Para o cálculo de avaliação de impactos foram propostos dois conjuntos de indicadores; o primeiro buscou caracterizar os produtores de maracujá-azedo frente a aspectos socioeconômicos, já o segundo apresenta aspectos relacionados às cultivares avaliadas.

No primeiro grupo foram selecionados os seguintes indicadores: nível de instrução, tempo na atividade, principal atividade econômica da UPA1 1 A definição de uma UPA é: a) conjunto de propriedades agrícolas contíguas e pertencente ao(s) mesmo(s) proprietário(s); localizadas inteiramente dentro de um mesmo município, inclusive dentro do perímetro urbano; c) com área total ou superior a 0,1 ha; d) não destinada exclusivamente para lazer (São Paulo, 2019). , importância da atividade agropecuária sobre renda familiar, uso de mão de obra familiar e contratada, conforme os indicadores de caracterização na Figura 1. Nota-se que essa caracterização não apresenta elementos de adicionalidade ou causalidade.

O segundo conjunto de indicadores selecionados foram: número de plantas cultivadas, espaçamento, quantidade produzida, qualidade do fruto, percentual de polpa, produtividade, resistência e tolerância a pragas e doenças, forma de comercialização do produto2 2 Forma de comercialização de produto refere-se fruta fresca, fruta para indústria, polpa e outros produtos artesanais. e canais de comercialização do produto3 3 Canal de comercialização do produto refere-se à distribuição da produção (total ou parte dela) para supermercado, restaurante e bar, hotelaria, estabelecimento alimentício, feiras livres, associação e cooperativa de produtores rurais, intermediários; centrais de abastecimento, entreposto comercial, exportação; indústria alimentícia, dentre outros. . Nota-se que esses indicadores são os de impacto, por isso apresentam os elementos de adicionalidade e causalidade (Figura 1).

A análise dos dados primários4 4 Os dados obtidos para cada UPA resultantes do levantamento realizado foram organizados no MSOFFICE-EXCEL. para a avaliação de resultados e impactos das tecnologias de maracujá-azedo se baseou no cálculo da adicionalidade por meio da observação da evolução dos indicadores selecionados em T0 (safra 2015/2016) e T1 (safra 2016/2017). A causalidade para cada indicador foi atribuída diretamente no momento do levantamento de dados primários (no questionário), onde o entrevistado informava quanto na mudança no indicador se devia à utilização da cultivar em avaliação.

O universo de pesquisa foi composto por cadastro prévio de compradores de mudas certificadas de viveirista localizado no município de Limeira (São Paulo, Brasil) em 2017. Considerando o intervalo T0 (safra 2015/2016) e T1 (safra 2016/2017) foram entrevistados doze produtores separados em dois grupos: grupo A - (dois) produtores que haviam comprado somente cultivares IAC; grupo B - (sete) produtores que haviam comprado tanto cultivares IAC quanto da EMBRAPA. Diante da escolha do período não houve nenhum entrevistado que possuísse exclusivamente cultivares de origem EMBRAPA.

Considerou-se que em T0 todas as Unidades Produtivas Agropecuárias (UPAs) apresentavam condições iguais, por terem em uso cultivares adquiridas de um mesmo fornecedor, o viveiro de mudas certificadas. Contudo, constatou-se que o resultado medido de cada indicador em T1 poderia ter sido influenciado por variáveis endógenas ao contexto de cada UPA, ou seja, seus indicadores socioeconômicos. Esses complementaram o modelo, pois apresentam uma maior relação de influência com o uso das cultivares e a eficiência (ou não) de seus resultados de produção. A esses indicadores socioeconômicos foram atribuídos pesos de acordo com as possibilidades de resposta, permitindo o cálculo de um score variando de zero até oito para cada unidade produtiva (Tabela 1).

Tabela 1
Indicadores e Resultados de caracterização socioeconômica das Unidades Produtivas Agropecuárias (UPAs) com maracujá-azedo, 2018.

O impacto foi mensurado a partir da média ponderada entre a variação do indicador (adicionalidade) entre os períodos T0 e T1, o score de cada unidade produtiva e o fator de causalidade. A notação matemática para o cálculo do Impacto de cultivares de maracujá-azedo é apresentada a seguir:

Ι j = i = 1 η I t 1 - I t 0 . α i I t 0 . S i i = 1 n S i (1)

Onde:

It0, indicador medido em TO; It1, indicador medido em T1; Si, score de cada unidade produtiva; αi, fator de causalidade; η é o total de entrevistados na pesquisa; Ij, média ponderada de cada indicador e o score de cada unidade produtiva;

I g r u p o = j = 1 η I j n (2)

Onde:

Igrupo, média aritmética entre os indicadores Ij para os grupos A e B analisados, IA e IB; η, total de indicadores.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A primeira parte dos resultados apresentados nesta seção referem-se à análise dos indicadores socioeconômicos utilizados para caracterizar as UPAs que cultivam maracujá-azedo (Tabela 1). Para a maioria dos entrevistados, o nível de instrução formal mais declarado foi o médio completo. A experiência agropecuária dos produtores foi obtida por meio do indicador referente ao tempo de exercício na atividade, cujo resultado foi superior a cinco anos para a maioria. Outro resultado, de relevância socioeconômica, mostrou a participação das atividades agropecuárias sobre o total da renda familiar que contribuiu em mais de 60% sobre o total da renda, constatação observada também por Capanema et al. (2016)Capanema, L. M., Fredo, C. E., & Meletti, L. M. M. (2016). Cultivo de maracujá-amarelo no estado de São Paulo: principais características a partir do Levantamento das Unidades de Produção Agropecuária, ano-safra 2007/2008. Informações Econômicas, 46(2), 35-46.. Apesar disso, o maracujá-azedo foi reconhecido pela maioria como uma atividade secundária na propriedade, sendo assim, complementar à renda da UPA.

Conforme observado por Capanema et al. (2017)Capanema, L. M., Fredo, C. E., Sachs, R. C., & de Paula, L. F. (2017). A produção familiar de maracujá-amarelo no Estado de São Paulo, 2007/2008. Informações Econômicas, 47, 30-41. o cultivo de maracujá é caracterizado como uma atividade típica da agricultura familiar no Brasil. Nesta pesquisa esse fato também foi constatado, quando a maioria dos entrevistados relataram utilizar principalmente a mão de obra familiar. Contudo, por ser um cultivo que utiliza considerado esforço humano, principalmente na fase de polinização, o trabalho familiar é complementado com contratação de mão de obra temporária (Tabela 1).

Os pesos atribuídos a cada um dos indicadores revelaram scores (soma dos pesos) variando entre três e oito. Para a maioria dos produtores os scores foram superiores a cinco (66%), evidenciando perfis com indicadores qualitativamente positivos e que intrinsicamente se traduzem nas boas práticas de cultivo e manejo do maracujá-azedo.

A segunda parte dos resultados apresenta a discussão dos indicadores de impacto seguindo o protocolo metodológico (Figura 1) para os grupos A e B (Tabela 2 e Figura 2). Os resultados permitiram a identificação de três situações possíveis conforme as notações matemáticas apresentadas na seção anterior: Ij>0;Ij=0e Ij<0 para cada um dos indicadores mensurados na pesquisa.

Tabela 2
Indicadores de avaliação de impactos nas Unidades Produtivas Agropecuárias (UPAs) com cultivares de maracujá-azedo, 2018.
Figura 2
Indicadores de avaliação de impactos nas Unidades Produtivas Agropecuárias (UPAs) com cultivares de maracujá-azedo, 2018Fonte: Dados da pesquisa.

Independentemente do grupo (A ou B) analisado e observando especificamente cada UPA, o resultado Ij=0 ocorreu em algumas unidades que compararam uma cultivar com outras disponíveis, no tocante aos indicadores: qualidade do fruto, percentual de polpa, produtividade, tolerância e resistência às pragas e doenças. Algumas UPAs informaram percentual de polpa e produtividade superiores em relação a outras, porém a resposta se manteve inalterada no período entre T0 e T1, ocasionando um impacto nulo.

A situação de Ij=0 também foi observada no indicador que media os espaçamentos de plantio. Independentemente da cultivar adotada, o sistema de plantio entre número de plantas cultivadas por linhas e entre ruas não se alterou no período, chegando também a impacto zero.

As situações em que foi identificado Ij>0 ocorreram em indicadores de número de plantas cultivadas e quantidade produzida, ainda que essa situação tenha ocorrido em um número reduzido de UPAs. O impacto positivo pode ser relativo ao uso das cultivares de maracujá-azedo como alternativa para auferir maior renda e ampliar formas e canais de comercialização, principalmente quando o preço comercializado estiver favorável ao produtor.

A ocorrência de Ij<0 se deu no indicador sobre quantidade produzida por safra. Este resultado pode estar relacionado aos relatos de perda de produção ocasionada pela alta incidência de pragas e doenças. Do total de informantes, 33% confirmaram que se depararam com pragas e doenças e como consequência erradicaram seus pomares. A redução da quantidade produzida também se relaciona com os indicadores canais e formas de comercialização.

A análise por Grupos permitiu observar que o Grupo A apresentou impactos negativos (Igrupo<0). Este Grupo era formado por duas UPAs, que utilizavam exclusivamente cultivares IAC. Apesar da primeira UPA não ter apresentado variações em seus indicadores entre T0 e T1, o impacto negativo se deu por conta da segunda unidade que diminuiu o número de plantas cultivadas e apresentou redução na quantidade produzida. Esta informação foi remetida à incidência de pragas e doenças. Salienta-se que ambas as unidades apontaram qualidade superior de cultivares IAC em relação a outras, informação quer perdurou entre T0 e T1 (impacto zero) (Figura 2). Assim, conforme os indicadores analisados, o IA teve um impacto negativo de 0,15 (Tabela 2 e Figura 2)

O Grupo B também apresentou impactos negativos, seguindo a lógica descrita para os casos, onde Igrupo<0 . De acordo com os indicadores analisados, o IB teve um impacto negativo de 0,13 (Tabela 2). Nota-se que este resultado é mais favorável ao Grupo B do que para o A, que pode ser atribuído pela combinação do uso de diferentes cultivares de maracujá-azedo em seus sistemas de produção. O único indicador positivo para o Grupo B foi o número de plantas cultivadas, evidenciando uma possível tendência de ampliação da área produtiva para fins de ganhos econômicos. Para os indicadores forma de comercialização e canal de comercialização o Grupo B teve impacto negativo, diferente do Grupo A que apresentou impacto zero (Figura 1).

4. CONCLUSÃO

A partir da proposição e aplicação de protocolo metodológico para AI, este artigo contribuiu com indicadores para caracterização socioeconômica de UPA e mensuração de impacto direto com o uso de cultivares frutíferas. Os indicadores de impacto permitiram identificação da relação causal entre a escolha da cultivar e seus resultados observados na UPA.

Para o estudo de caso com cultivares de maracujá-azedo pode-se observar a relação entre ações de P&D, difusão e adoção para o progresso técnico e para o desenvolvimento dessa cadeia produtiva. Nesse sentido, as informações qualitativas coletadas na pesquisa apresentaram demandas como por exemplo desenvolvimento de cultivares mais resistentes e tolerantes às pragas e doenças e com ciclos produtivos mais longos. O que poderia elevar a renda das UPAs por meio da obtenção de rendimentos superiores aos observados atualmente e a redução de custos para renovação de pomares.

A validação do protocolo em um conjunto de produtores de maracujá-azedo permitiu identificar que tanto os indicadores de caracterização socioeconômica como os de impacto são passíveis de serem utilizados para avaliar o impacto de outras cultivares de frutíferas.

Por fim, destaca-se que a construção de modelos de AI deve ser fundamentada, principalmente, pelo estudo do contexto em que o objeto avaliado está inserido. No caso de cultivares frutíferas, salientamos a importância do conhecimento dos processos de P&D, difusão e adoção, como também características socioeconômicas das UPAs e aspectos relacionados à comercialização das frutíferas conforme o protocolo metodológico para AI apresentado neste artigo.

Agradecimentos

Pesquisa financiada pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (processo n. 2015/24910-1).

  • 1
    A definição de uma UPA é: a) conjunto de propriedades agrícolas contíguas e pertencente ao(s) mesmo(s) proprietário(s); localizadas inteiramente dentro de um mesmo município, inclusive dentro do perímetro urbano; c) com área total ou superior a 0,1 ha; d) não destinada exclusivamente para lazer (São Paulo, 2019São Paulo. Secretaria de Agricultura e Abastecimento - SAA. Instituto de Economia Agrícola - IEA. Coordenadoria de Assistência Técnica Integral - CATI. (2019). Projeto LUPA 2016/17: censo agropecuário do estado de São Paulo.).
  • 2
    Forma de comercialização de produto refere-se fruta fresca, fruta para indústria, polpa e outros produtos artesanais.
  • 3
    Canal de comercialização do produto refere-se à distribuição da produção (total ou parte dela) para supermercado, restaurante e bar, hotelaria, estabelecimento alimentício, feiras livres, associação e cooperativa de produtores rurais, intermediários; centrais de abastecimento, entreposto comercial, exportação; indústria alimentícia, dentre outros.
  • 4
    Os dados obtidos para cada UPA resultantes do levantamento realizado foram organizados no MSOFFICE-EXCEL.
  • Como citar: Bezerra, L. M. C., Fredo, C. E., & Purquerio, L. F. V. (2023). Avaliação de variedades frutíferas: o caso do maracujá-azedo cultivado em São Paulo, Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 61(spe), e277344. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2023.277344
  • JEL Classification: JEL Q18 e Q19

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2023
  • Aceito
    25 Jun 2023
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