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Adoção dos sistemas integrados na agropecuária do Brasil

The adoption of integrated systems in Brazil´s agriculture

Resumo:

O presente artigo avalia a importância de algumas variáveis que influenciam a adoção de sistemas integrados de produção, em especial, os Sistemas Agroflorestais (SAFs), nos estabelecimentos agropecuários brasileiros. Com esse intento, utilizam-se dados em painéis agregados a nível de municípios e modelos da econometria espacial. Os dados são provenientes dos censos agropecuários referentes aos anos de 2006 e 2017. Os resultados do modelo SARAR apontam que a dimensão do rebanho bovino em um município associa-se negativamente com a adoção dos SAFs. De outro lado, ajuntam-se positivamente, com a adoção dos SAFs, a concessão do crédito rural, a associação do produtor à cooperativa ou entidade de classe, a maior presença de estabelecimentos direcionados à atividade econômica florestal, a maior ocorrência de produtor com idade de 45 anos em diante, maiores presenças de áreas com pastagens degradadas e de produtor com posse estável da terra, bem como maior frequência de estabelecimentos com adoção de boas práticas agrícolas. Adicionalmente, constataram-se maiores efeitos diretos do que os indiretos nos transbordamentos espaciais (entre municípios) das variáveis explicativas supracitadas.

Palavras-chave:
sistemas agroflorestais; agropecuária; econometria espacial

Abstract:

This paper assesses the importance of some variables that influence the adoption of integrated production systems, especially the Agroforestry Systems (SAFs), into the Brazilian farms. In order to achieve this purpose, an aggregated panel data at the municipal level and spatial econometric models are used. Dataset were collected from Brazil´s Agricultural Censuses for the years 2006 and 2017. Results from the SARAR model indicate that the size of the cattle herd in each municipality is negatively linked with the adoption of SAFs. On the other hand, SAFs adoption is positively linked with the increase of rural credit loans, the association of the farmers into cooperatives or class entities, the greater presence of farms focused on forestry economic activity, the greater presence of farmers older than 45 years, the greater presence of areas with degraded pastures, greater presence of farmers with stable land tenure and the greater frequency of farms that adopted good agricultural practices. Additionally, there were greater direct effects than the indirect ones in the spatial spillovers (among municipalities) of the aforementioned explanatory variables.

Keywords:
agroforestry systems; agriculture; spatial econometrics

1. INTRODUÇÃO

O aumento da população mundial, assim como melhorias na situação econômica e consequente maior poder de compra por parte da população, decerto, conduzirão ao crescimento da demanda por alimentos a médio e longo prazos. O Brasil é um país que, certamente, proverá aumento da oferta de alimentos, seja mediante expansão da área cultivada e/ou do aumento de sua produtividade agropecuária (Oliveira et al., 2013Oliveira, P., Freitas, R. J., Kluthcouski, J., Ribeiro, A. A., Cordeiro, L. A. M., Teixeira, L. P., Melo, R. A. C., Vilela, L., & Balbino, L. C. (2013). Evolução de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF): Estudo de caso da Fazenda Santa Brígida, Ipameri, GO. Planaltina, GO: Embrapa Cerrados.).

O Território Brasileiro possui mais de 851 milhões de hectares (ha) e um total de 5.073.324 estabelecimentos agropecuários, que ocupam uma área total de 351,289 milhões de ha, segundo os resultados do Censo Agropecuário de 2017 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (2019). Censo agropecuário 2017: Resultados definitivos. Rio de Janeiro, RJ: IBGE.). Cerca de 41% da área total do País está alocada a estabelecimentos agropecuários. Por sua vez, 18,1% da área agropecuária brasileira em 2017 eram ocupados com lavouras (temporárias e permanentes), 45,4% com pastagens (naturais e plantadas), 32,8% com matas (naturais e plantadas) e 3,7% eram áreas não declaradas para uso.

Os números do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (2020)Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento - LAPIG. (2020). Recuperado em 1 de junho de 2020, de https://lapig.iesa.ufg.br/
https://lapig.iesa.ufg.br/...
apontam que, da área total de pastagens brasileiras no ano de 2018, cerca de 29,59 milhões de ha exibiam nível leve de degradação, 25,09 milhões de ha expressavam nível moderado de degradação, e 40,16 milhões de ha apresentavam degradação severa. Parte dessas áreas degradadas, uma vez recuperada, representa boa oportunidade para o País expandir suas produções vegetal e animal e atender à expansão da demanda mundial de alimentos, sem ter que desmatar novas áreas.

Visando associar a produção e conservação ambiental, e com vistas a recuperar as áreas que já se encontram em estado de degradação, os sistemas de integração surgem como opções à adoção de práticas mais sustentáveis de produção de alimentos. Sistemas integrados de produção têm como premissa básica combinar duas ou mais atividades agropecuárias na mesma área produtiva, ou seja, reunir agricultura, pecuária e/ou silvicultura na mesma fazenda. A utilização desses sistemas se exprime como um caminho capaz de garantir melhorias na produção de grãos, carne e madeira, com sustentabilidade e conservação dos recursos naturais (Magalhães et al., 2019aMagalhães, C. A. S., Pedreira, B. C., Tonini, H., & Farias Neto, A. L. (2019a). Produtividade agrícola, pecuária e florestal em diferentes sistemas de produção no norte de Mato Grosso. In A. L. Farias Neto, A. F. Nascimento, A. L. Rossoni, C. A. S. Magalhães, D. R. Ituassu, E. S. S. Hoogerheide, F. S. Ikeda, F. Fernandes Junior, G. R. Faria, I. Isernhagen, L. G. Vendrusculo, M. M. Morales & R. A. Carnevalli (Eds.), Primeiras contribuições para o desenvolvimento de uma agropecuária sustentável (pp. 164-173). Brasília, DF: Embrapa Agrossilvipastoril.).

Os sistemas de integração são estratégias que visam à produção sustentável, pois integram atividades agrícolas, pecuárias e/ou florestais realizadas na mesma área, em cultivo consorciado, em sucessão ou rotacionado, alcançando adequação ambiental das atividades e da propriedade. Constitui, pois, um meio que otimiza os ciclos biológicos das plantas e dos animais (Balbino et al., 2011Balbino, L. C., Barcellos, A. O., & Stone, L. F. (2011). Marco referencial integração lavoura-pecuária-floresta. Brasília, DF: Embrapa.).

Os Sistemas Agroflorestais (SAFs) são modalidades de sistemas de integração que, necessariamente, exibem o componente florestal como parte do sistema. Dentro dos SAFs estão a Integração Lavoura-Floresta (ILF), a Integração Pecuária-Floresta (IPF) e a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). Os SAFs são manejados a fim de considerar as demandas da atualidade sem prejudicar as gerações futuras. Eles devem ser conduzidos via manejo responsável e ético da terra, integrando o crescimento e a colheita de variados produtos (Behling et al., 2013Behling, M., Wruck, F. J., Antonio, D. B. A., Meneguci, J. L. P., Pedreira, B. C., Carnevalli, R. A., Cordeiro, L. A. M., Gil, J., Farias Neto, A. L., Domit, L. A., & Silva, J. F. V. (2013). Integração lavoura-pecuária-floresta. In A. Galhardi Junior, F. Siqueri, J. Caju & S. Camacho (Eds.), Boletim de pesquisa de soja 2013/2014 (pp. 306-325). Rondonópolis, MT: Fundação MT.).

Ainda que estudos apontem os benefícios supracitados, na prática, a adoção de Sistemas Agroflorestais ainda não é generalizada no Brasil. Ressalta-se que o conhecimento sobre os componentes em torno dos SAFs é de suma importância para compreender e incentivar os processos que possibilitam a adoção dos mesmos (Cordeiro et al., 2015Cordeiro, L. A. M., Vilela, L., Kluthcouski, J., & Marchão, R. L. (2015). Integração lavoura-pecuária-floresta - coleção 500 perguntas 500 respostas. Brasília, DF: Embrapa Cerrados/MAPA.). Há, entretanto, um défice de trabalhos que quantifiquem, por meio de modelos econométricos, os fatores determinantes da adoção dos Sistemas Agroflorestais, especialmente com base em dados de abrangência nacional no Brasil e disponibilizados pelos Censos Agropecuários de 2006 e 2017 (os dois últimos disponíveis quando da realização deste artigo).

Considerando o que foi retroapresentado, o objetivo geral deste artigo é identificar e avaliar a influência de algumas variáveis sobre a adoção de sistemas integrados pelos estabelecimentos agropecuários do Brasil. Como objetivos específicos do trabalho têm-se: (1) Identificar variáveis que influenciaram os produtores a terem decidido trabalhar com Sistemas Agroflorestais em suas propriedades rurais; (2) Estimar modelos econométricos que quantifiquem as influências dessas variáveis no uso de SAFs pelos estabelecimentos agropecuários brasileiros nos anos de 2006 e 2017; (3) identificar possíveis efeitos espaciais entre as variáveis explicativas da adoção de SAFs.

A razão de utilizar dados de 2006 e 2017 neste ensaio decorre do fato de esses serem os anos dos últimos Censos Agropecuários (quando da realização do escrito) que conduzem informações sobre o uso de SAFs na agropecuária brasileira.

Além da introdução, o artigo é composto de mais quatro seções. A seguir é procedida a fundamentação teórica sobre os conceitos, classificação e caracterização de sistemas de integração, e acerca das variáveis (ou fatores) que motivam os produtores a adotá-los. Na seção 3, estão a exposição da metodologia econométrica adotada e a exposição dos dados que foram usados. A seção 4 contém e analisa os resultados econométricos, enquanto a última seção detém as conclusões do ensaio.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Esta seção inicia-se (item 2.1) expondo o conceito, classificação e características dos sistemas de integração, em especial, dos sistemas agroflorestais. Em seguida (item 2.2), há a revisão da literatura concernente às variáveis que levam os agricultores à adoção de sistemas de integração.

2.1 Tipos de sistemas de integração: caracterização, classificação e conceitos

De acordo com Balbino et al. (2012)Balbino, L. C., Kichel, A. N., Bungenstab, D. J., & Almeida, R. G. (2012). Sistemas de integração: O que são, suas vantagens e limitações. In D. J. Bungenstab (Ed.), Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta: A produção sustentável (pp. 11-18). Brasília, DF: Embrapa., os sistemas integrados surgem, principalmente, nos seguintes arranjos: Integração Lavoura-Pecuária (ILP); Integração Lavoura-Floresta (ILF); Integração Pecuária-Floresta (IPF); e, por fim, a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). Os sistemas de integração podem ser implementados em estabelecimentos agropecuários com distintos perfis e tamanhos (tanto de grande, médio e pequeno portes). O tempo de uso de cada atividade na integração depende do sistema a ser adotado. A pecuária é passível de ser incluída no sistema por períodos de um mês a cinco anos. A lavoura pode ser utilizada por apenas cinco meses e chega a ser usada por até cinco anos. A atividade florestal também é suscetível de ser empregada para um ou mais cortes das árvores, a depender da espécie escolhida (Balbino et al., 2012Balbino, L. C., Kichel, A. N., Bungenstab, D. J., & Almeida, R. G. (2012). Sistemas de integração: O que são, suas vantagens e limitações. In D. J. Bungenstab (Ed.), Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta: A produção sustentável (pp. 11-18). Brasília, DF: Embrapa.).

As culturas e espécies animais e florestais mais comuns nos sistemas de integração variam de região para região brasileira. De modo geral, entretanto, na atividade da lavoura, predominam as culturas de arroz, milho, milheto, sorgo e soja. No segmento da pecuária, as atividades de bovinocultura e ovinocultura em pasto são as principais composições dos sistemas de integração. No segmento florestal, a árvore mais utilizada é o eucalipto, haja vista que as características da madeira desta espécie são bem adequadas às exigências dos mercados. Outras espécies florestais também são utilizadas, tais como acácia, mogno-africano, cedro-australiano, canafístula, grevílea, pinos e bracatinga (Cordeiro et al., 2015Cordeiro, L. A. M., Vilela, L., Kluthcouski, J., & Marchão, R. L. (2015). Integração lavoura-pecuária-floresta - coleção 500 perguntas 500 respostas. Brasília, DF: Embrapa Cerrados/MAPA.).

Os resultados do estudo de Reis et al. (2020)Reis, J., Kamoi, M., Latorraca, D., Chen, R., Michetti, M., Wruck, F., & Rodrigues-Filho, S. (2020). Assessing the economic viability of integrated crop−livestock systems in Mato Grosso, Brazil. Renewable Agriculture and Food Systems, 35(6), 631-642. http://dx.doi.org/10.1017/S1742170519000280.
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apontaram que, no geral, sistemas de produção integrados tiveram maiores níveis de produtividade e lucratividade, bem assim, experimentaram menores riscos econômicos do que os sistemas de produção especializados. Exceção ocorre apenas quando os preços de produtos agrícolas (em especial, dos grãos) estão mais altos. Neste caso, a atividade da lavoura (como sistema extensivo) proporciona melhores resultados econômicos do que o sistema integrado. Os autores também exprimem que, em locais onde as condições biofísicas e de mercado são adequadas para a produção dos sistemas integrados, a estratégia constitui uma maneira altamente lucrativa de intensificar a produção pecuária e, potencialmente, sobrar terras para outros usos, incluindo a conservação (Reis et al., 2020Reis, J., Kamoi, M., Latorraca, D., Chen, R., Michetti, M., Wruck, F., & Rodrigues-Filho, S. (2020). Assessing the economic viability of integrated crop−livestock systems in Mato Grosso, Brazil. Renewable Agriculture and Food Systems, 35(6), 631-642. http://dx.doi.org/10.1017/S1742170519000280.
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).

Os resultados do estudo de Magalhães et al. (2019b)Magalhães, C. A. S., Pedreira, B. C., Tonini, H., & Farias Neto, A. L. (2019b). Crop, livestock and forestry performance assessment under different production systems in the north of Mato Grosso, Brazil. Agroforestry Systems, 93, 2085-2096. http://dx.doi.org/10.1007/s10457-018-0311-x.
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apontaram que, em alguns casos, a introdução de árvores nos sistemas integrados é capaz de reduzir a produtividade de algumas culturas de grãos, como as do milho e a da soja. Este resultado condiz com as conclusões do estudo de Pontes et al. (2021)Pontes, L. S., Porfírio-Da-Silva, V., Moletta, J. L., & Telles, T. S. (2021). Long-term profitability of crop-livestock systems, with and without trees. Agricultural Systems, 192, 103204. - que realizou uma comparação econômica do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta com o sistema de integração lavoura-pecuária - o qual concluiu que o sistema que não possui o componente arbóreo (integração lavoura-pecuária) apresentou maior estabilidade da renda no decurso dos anos.

Os arranjos de sistemas integrados que exibem, necessariamente, o componente florestal na integração (ILF, IPF e ILPF) são chamados de Sistemas Agroflorestais (SAFs). Um sistema agroflorestal é considerado um sistema de manejo que combina árvores com atividades da lavoura e/ou pecuária em uma mesma área, via consórcio ou rotações, para obter sinergias entre os componentes do agroecossistema, proporcionando maior rendimento da terra, aumento da produção e maiores vantagens ao ecossistema como um todo, quando comparado aos sistemas extensivos de produção (Costa et al., 2012Costa, F. P., Cezar, I. M., Melo Filho, G. A., & Bungenstab, D. J. (2012). Custo-benefício dos sistemas de produção em integração. In D. J. Bungenstab (Ed.), Sistemas de integração lavoura pecuária-floresta: A produção sustentável (pp. 209-215). Brasília, DF: Embrapa.). Mencionam-se outros benefícios, como: melhoria na qualidade do solo, recuperação de pastagens degradadas, conservação da água, aumento do desempenho animal e redução da emissão de gases causadores de efeito-estufa (GEE) por unidade de alimento produzido (Reis et al., 2020Reis, J., Kamoi, M., Latorraca, D., Chen, R., Michetti, M., Wruck, F., & Rodrigues-Filho, S. (2020). Assessing the economic viability of integrated crop−livestock systems in Mato Grosso, Brazil. Renewable Agriculture and Food Systems, 35(6), 631-642. http://dx.doi.org/10.1017/S1742170519000280.
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).

Vale evidenciar que os Sistemas Agroflorestais são sistemas de produção altamente diversificados, usando muitas espécies florestais e culturas agrícolas de ciclo mais curto, e apresentam ou não animais. Canuto (2017)Canuto, J. C. (2017). Sistemas agroflorestais: Experiências e reflexões. Brasília, DF: Embrapa. aponta que, de uma perspectiva agroecológica, há uma ampla variedade de modelos e modalidades de se implementar um sistema agroflorestal, com diversificadas visões e escalas, reafirmando a ideia de que os SAFs são opções que visam não apenas à produção econômica, mas, também, equilíbrio ecológico. Nesta perspectiva, os SAFs não se restringem aos modelos dos sistemas de integração, geralmente envolvendo o plantio único de culturas (como o eucalipto). É a diversidade das experiências, com suas especificidades regionais e locais, a principal característica desta vertente de sistemas, que deve proporcionar incentivo à biodiversidade.

Esta vertente de sistemas agroflorestais aufere cada vez mais espaço em áreas menores, manejadas por pequenos agricultores familiares, assim como em assentamentos rurais de reforma agrária, conforme destacado por autores como Franco et al. (2017)Franco, F. S., Oliveira, J. E., & Alves, S. M. R. (2017). Construção participativa do conhecimento agroflorestal e monitoramento de indicadores de sustentabilidade em assentamentos rurais na região de Iperó, SP. In J. C. Canuto (Ed.), Sistemas agroflorestais: Experiências e reflexões (pp. 14-36). Brasília, DF: Embrapa., Amador (2017), eAmador, D. B. (2017). Educação agroflorestal e a perspectiva pedagógica dos mutirões agroflorestais. In J. C. Canuto (Ed.), Sistemas agroflorestais: Experiências e reflexões (pp. 37-54). Brasília, DF: Embrapa. Gomes et al. (2017)Gomes, H. B., Cullen Junior, L., Souza, A. S., Campos, N. R., & Marin, W. S. (2017). Sistemas agroflorestais: perspectivas e desafios na ampliação de sistemas produtivos sustentáveis para a agricultura familiar no pontal do Paranapanema, SP. In J. C. Canuto (Ed.), Sistemas agroflorestais: Experiências e reflexões (pp. 74-87). Brasília, DF: Embrapa.. Tais sistemas, caracterizados pela vasta diversificação da produção, influenciam na redução do desmatamento, segundo Amador (2017)Amador, D. B. (2017). Educação agroflorestal e a perspectiva pedagógica dos mutirões agroflorestais. In J. C. Canuto (Ed.), Sistemas agroflorestais: Experiências e reflexões (pp. 37-54). Brasília, DF: Embrapa..

2.2 Estudos acerca de fatores influentes na adoção de sistemas integrados

Alguns estudos de casos pretenderam identificar os fatores (ou variáveis) relevantes para explicar a adoção, por parte dos fazendeiros, de sistemas de integração e/ou de Sistemas Agroflorestais, e convergiram em suas conclusões. Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47. ressaltam que algumas características referentes ao estabelecimento agropecuário e ao produtor costumavam ser mais frequentes em propriedades que adotavam sistemas com integração do que em propriedades não adotantes desses sistemas. Um exemplo está na posse estável da unidade produtiva (garantia de posse da terra), maior tempo de experiência na atividade, disponibilidade de mão de obra durante todas as épocas do ano, e disponibilidade de informações técnicas e econômicas sobre os sistemas de integração na região. Vinholis et al. (2022)Vinholis, M. M. B., Carrer, M. J., Souza Filho, H. M., & Bernardo, R. (2022). Sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta no estado de São Paulo: Estudo multicasos com adotantes pioneiros. Revista de Economia e Sociologia Rural, 60(1), e234057. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9479.2021.234057.
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também apontam que algumas características dos produtores, como maior tempo de experiência na atividade agropecuária, e capacidades técnica, de inovação e gestão contribuíram para a adoção e adaptação dos sistemas integrados nos estabelecimentos agropecuários.

Poccard-Chapuis et al. (2014)Poccard-Chapuis, R., Alves, L. N., Grise, M. M., Bâ, A., Coulibaly, D., Ferreira, L. A., & Lecomte, P. (2014). Landscape characterization of integrated crop -livestock systems in three case studies of the tropics. Renewable Agriculture and Food Systems, 29(3), 218-229. http://dx.doi.org/10.1017/S174217051400009X.
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procuraram compreender o funcionamento de SAFs nos trópicos, por meio da comparação dos sistemas implementados em dois lugares: no Mali e no Cerrado brasileiro. Apesar de ambos os casos demonstrarem semelhanças do ponto de vista ecológico, eram geridos de maneiras bastante diferentes. A região do Cerrado brasileiro, cujos sistemas denotaram bons índices de rendimento produtivo, contava com uma gestão qualificada e boa estrutura de apoio, como acesso a créditos, equipamentos e suporte técnico. Já no caso dos agricultores da região do Mali, onde essa estrutura praticamente não existia, a gestão foi deixada aos próprios agricultores, e, como resultado, a produção foi bastante limitada em decorrência da falta de investimentos.

Santos et al. (2014)Santos, L. R., Raiol, C. S., Lima, F. B. C., & Leal, L. M. R. (2014). Factors for the adoption of agroforestry systems in the Eastern Amazon, Brazil. Revista de la Facultad de Agronomía, 113(2), 140-146., ao analisarem as áreas de agricultores familiares de Santa Maria do Pará (PA), constataram que o acesso à assistência técnica, experiência do agricultor com atividades agrícolas, nível de educação formal, título de propriedade da terra e participação em entidades de classe transportam influência positiva na adoção de Sistemas Agroflorestais.

Pompeu et al. (2012)Pompeu, G. S. S., Rosa, L. S., Santos, M. M., & Modesto, R. S. (2012). Adoption of agroforestry systems by smallholders in Brazilian Amazon. Tropical and Subtropical Agroecosystems, 15(1), 165-172. - em estudo de caso referente ao Município de Bragança (PA) - ressaltam que a decisão de agricultores em aderir aos Sistemas Agroflorestais foi fortemente influenciada pelos recursos financeiros fornecidos pelas agências governamentais de crédito, sendo tais recursos utilizados na compra de mudas e outros insumos, além do acesso à educação técnica por parte dos agricultores.

Schembergue et al. (2017)Schembergue, A., Cunha, D. A., Carlos, S. M., Pires, M. V., & Faria, R. M. (2017). Sistemas agroflorestais como estratégia de adaptação aos desafios das mudanças climáticas no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 55(1), 9-30. http://dx.doi.org/10.1590/1234-56781806-94790550101.
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realizaram uma análise do papel desempenhado pelos Sistemas Agroflorestais como medida adaptativa às mudanças climáticas no Brasil. Esses autores mencionam que a adoção de SAFs é condicionada por circunstâncias agronômicas, socioeconômicas e climáticas. Os autores compararam os municípios que optaram pela diversificação da produção por meio de SAFs com outros que não diversificaram suas atividades. Com isto, os autores conseguiram identificar os principais determinantes do uso destes sistemas, os quais são: propriedade da terra, financiamento, acesso a informações e à assistência técnica (variáveis socioeconômicas), disponibilidade de recursos hídricos e qualidade do solo (variáveis agronômicas), temperatura e precipitação (variáveis climáticas).

Por fim, o trabalho de Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
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estimou os determinantes da adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária em unidades produtivas do Estado do Mato Grosso e concluiu que, embora a difusão destes sistemas no Estado seja recente e dinâmica, o acesso à informação, educação, cultura, infraestrutura da cadeia de suprimentos e padrões históricos de uso da terra são os fatores mais importantes que influenciam os estágios iniciais da difusão do sistema ILP. Esses autores ainda apontam que a ocorrência dos sistemas de integração era mais frequente entre os agricultores com menor nível de endividamento. A pesquisa ainda apontou que alguns produtores até tinham acesso ao crédito rural, mas a ausência de infraestrutura e de informações foi uma barreira que dificultou o bom funcionamento dos sistemas já implantados. Nesse sentido, intervenções exclusivamente baseadas na concessão de crédito não são suficientes para garantir a disseminação em larga escala de inovações agrícolas complexas.

Os estudos supra-analisados são importantes pelo fato de reunir fatores que afetam a decisão dos agricultores em adotarem SAFs, mas são estudos que utilizam dados para municípios específicos e não consideram todo o País. Efeitos de transbordamento são factíveis de ocorrer entre as decisões de um agricultor usar SAFs em um município sobre a decisão de agricultores situados em municípios vizinhos em também adotar SAFs (pois há, muitas vezes, relações pessoais entre os agricultores, ou eles conduzem atividades similares, ou compartilham as mesmas comunidades religiosas, comerciais, ..., ou têm assistências técnicas em comum, por exemplo). Por isso, é possível que apareçam relações espaciais tanto na variável que capta o uso de SAFs, como entre as variáveis explicativas de sua adoção. Estas relações espaciais serão mais bem diagnosticadas usando modelos de econometria espacial, como os a seguir expostos.

3. METODOLOGIA

Esta seção divide-se em duas subseções. Em 3.1 são abordados os aspectos teóricos e metodológicos dos modelos econométricos utilizados no trabalho, além de ser realizada uma contextualização sobre a dependência espacial das variáveis e se mostrar o porquê de ela ser importante de se captar na metodologia empregada. Na subseção 3.2, são comentados os dados utilizados no artigo e os tratamentos que receberam.

3.1 Arcabouços teóricos e metodológicos

Por meio de modelos econométricos, este trabalho estima a importância de variáveis (ou fatores) influentes na adoção de Sistemas Agroflorestais por parte dos produtores rurais nos municípios brasileiros.

Existem algumas formas para organizar as informações das unidades amostrais utilizadas em um modelo econométrico. Neste artigo, recorreu-se a um painel com dados municipais referentes aos anos de 2006 e 2017. Esta modalidade de organização de dados possibilita uma modelagem mais acurada do fenômeno estudado, quando comparado ao modelo com dados cross-section (Gujarati, 2006Gujarati, D. (2006). Econometria básica. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.).

Se for constatada dependência espacial entre as observações a serem analisadas, presume-se que o comportamento dos dados não é estável através do espaço. Nesse caso, faz-se necessária uma análise minuciosa para averiguar se é possível lidar com a dependência espacial por meio de modelos econométricos convencionais ou se é necessário empregar modelos econométricos espaciais. Anselin (1989)Anselin, L. (1989). What is special about spatial data? Alternative perspectives on spatial data analysis (89-4). Santa Barbara, CA: National Center for Geographic Information and Analysis/University of California. aponta que a análise de dados espaciais desempenha um papel central na tradição científica e explica comportamentos de fenômenos que estão associados a alguma dimensão espacial.

Os modelos convencionais usando painel de dados são capazes de acomodar apenas o efeito espacial representado pela heterogeneidade espacial. Eles são os chamados modelos de efeitos não observados, que incorporam de maneira apropriada a heterogeneidade não observada e a dependência espacial (Almeida, 2012Almeida, E. (2012). Econometria espacial. Campinas, SP: Alínea.).

Os dados em painéis convencionais - que não fazem uso de componentes espaciais - são estimados por meio de: (a) MQO pooled ou dados empilhados, o qual considera que o intercepto do modelo e seus coeficientes angulares são constantes no tempo e no espaço. Este tratamento não é o mais adequado quando há efeitos individuais no modelo. Para isso, é necessário empregar os modelos de efeito fixo ou de efeito aleatório; (b) modelos de efeitos fixos, que consideram que os coeficientes angulares são constantes, e o intercepto varia entre os indivíduos ou no tempo; ou (c) modelos de efeitos aleatórios, que consideram que o intercepto possui um valor médio para todos os indivíduos, e os coeficientes angulares variam com o tempo e também entre os indivíduos.

Enquanto os dados forem tratados convencionalmente (não espacial), deve-se observar se há a presença de efeitos individuais nos modelos de dados em painéis. Havendo esses efeitos, os modelos devem então ser estimados por meio de efeitos fixos ou aleatórios. Assim, o primeiro passo é verificar se a melhor maneira de estimar o painel é apenas empilhando os dados ou se devem ser considerados os efeitos individuais. Para isso, utiliza-se o Teste de Breusch-Pagan, do tipo Multiplicador de Lagrange, cuja hipótese nula é de que o modelo não possui efeitos individuais (Gujarati, 2006Gujarati, D. (2006). Econometria básica. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.).

Quando rejeitada a hipótese nula do Teste de Breusch-Pagan, recorre-se ao Teste de Hausman para decidir se são os efeitos fixos ou os aleatórios que devem ser adotados. A condição da hipótese nula deste teste considera consistência dos estimadores de efeitos aleatórios. Por outro lado, quando há diferenças significativas entre elas, presume-se inconsistência dos estimadores de efeitos aleatórios em decorrência da possível correlação entre os efeitos não observados e as variáveis explicativas do modelo. Neste caso, devem ser empregados os efeitos fixos (Mutl & Pfaffermayr, 2011Mutl, J., & Pfaffermayr, M. (2011). The Hausman test in a Cliff and Ord panel model. The Econometrics Journal, 14(1), 48-76.).

Outro teste que pode ser utilizado para corroborar a decisão da escolha do modelo é o Teste F ou teste F de Chow, que confronta a viabilidade de se empregar o modelo de efeitos fixos versus o modelo pooled. A hipótese nula do teste considera que há igualdade nos interceptos e nas inclinações para todas as observações, e, portanto, o modelo pooled é o mais adequado. A hipótese alternativa considera que o modelo mais adequado a ser empregado é o modelo de efeitos fixos (Gujarati, 2006Gujarati, D. (2006). Econometria básica. Rio de Janeiro, RJ: Elsevier.).

Depois de escolhido o tratamento não espacial mais adequado, é necessário verificar se há autocorrelação espacial entre os dados. Para esta fase de testes, primeiro, recorre-se à Estatística I de Moran Global, que é um teste difuso adaptado para o contexto da análise da regressão linear que possibilita detectar se há autocorrelação espacial nos resíduos (Almeida, 2012Almeida, E. (2012). Econometria espacial. Campinas, SP: Alínea.).

Para ser realizado o Teste I de Moran Global, faz-se necessário o uso de uma matriz de pesos espaciais (W). É uma matriz quadrada com dimensão n x n, em que um peso espacial é utilizado para ponderar o grau de influência que as regiões exercem entre si, e assim retratar algum arranjo espacial, se existente. A contiguidade e a distância geográfica são os critérios passíveis de utilização para estruturar esta matriz (Almeida, 2012Almeida, E. (2012). Econometria espacial. Campinas, SP: Alínea.). Matrizes de contiguidade e de distância geográfica foram testadas neste trabalho, e a que exibiu melhor desempenho para a base de dados, ou seja, aquela que capturou a maior de relação espacial, foi a matriz de 5 vizinhos mais próximos1 1 Além de ter capturado maior associação espacial, a matriz de distância (como, por exemplo, a de 5 vizinhos mais próximos) também garante que não haverá ilhas, isto é, regiões sem qualquer vizinho (Almeida, 2012). . Ela será utilizada para implementação dos testes de identificação de autocorrelação espacial e estimação do modelo econométrico.

Quando o Teste I de Moran apontar autocorrelação espacial, recomenda-se o uso de testes focados que contenham a indicação do processo estocástico gerador da autocorrelação. É o caso do Multiplicador de Lagrange para detecção de erro espacial (Teste LMerro), que testa a viabilidade de o erro autorregressivo ser incorporado ao modelo econométrico; e o Multiplicador de Lagrange para detecção de defasagem espacial (teste LMlag), que testa a viabilidade de a defasagem espacial ser incorporada ao modelo econométrico (Florax & Graaff, 2004Florax, J. P. M., & Graaff, T. (2004). The performance of diagnostic tests for spatial dependence in linear regression models: A meta-analysis of simulations studies. In L. Anselin, R. J. G. M. Florax & S. J. Rey (Eds.), Advances in spatial econometrics (pp. 29-65). Berlin: Springer.).

Caso ambos os testes da defasagem espacial e do erro autorregressivo sejam estatisticamente significativos, devem ser calculadas as versões robustas desses testes. Enquanto a versão convencional do Multiplicador de Lagrange testa os resíduos do modelo sem efeito espacial, a versão robusta do mesmo teste é baseada nos resíduos do modelo de defasagem espacial (RLMlag) ou erro autorregressivo espacial (RLMerro).

Como lecionam Millo & Piras (2012)Millo, G., & Piras, G. (2012). SPLM: spatial panel data models in R. Journal of Statitical Software, 47(1), 1-38., quando constatado que os dados são espacialmente referenciados, e o fator localização exerce influência nas características individuais das unidades observacionais, deve-se recorrer ao uso da econometria espacial. Modelos econométricos espaciais estão contextualizados nos conceitos e teorias proporcionadas pela Nova Geografia Econômica (NGE). Esta última surgiu nos anos de 1980, revigorando a noção de que o espaço (considerando suas condições naturais e sua localização) exerce um papel importante em explicar a dinâmica das atividades econômicas, bem como incorporando relevantes elementos na compreensão das desigualdades entre as regiões (Krugman, 1998Krugman, P. (1998). What’s new about the new economic geography? Oxford Review of Economic Policy, 14(2), 7-17.).

Existem diversos modelos econométricos que atrelam os dados em painel à estrutura espacial, tanto para efeitos fixos quanto para efeitos aleatórios. A escolha do melhor modelo econométrico espacial depende dos aspectos teóricos e empíricos envolvendo o processo de dependência espacial subjacente ao fenômeno estudado (neste caso, o arranjo espacial dos Sistemas Agroflorestais no Brasil).

De modo geral, os modelos de dados em painel com dependência espacial são representados por:

Y i t = ρ WY i t + X i t β + WX i t τ + ε i t ε i t = λ W ε i t + e i t (1)

em que:

Yit = variável dependente, que neste artigo é a participação (%) dos estabelecimentos que usam SAFs em relação ao total de estabelecimentos agropecuários existentes no município i no ano t (2006 ou 2017);

Xit = vetor das variáveis independentes (que serão descritas no Quadro 1 e que foram, de certa forma, considerados nos trabalhos revisados na seção 2);

W = Matriz quadrada de pesos espaciais;

WYit = Defasagem espacial da variável dependente para a unidade i (município) no ano t;

WXit = Defasagem espacial das variáveis explicativas para a unidade i no tempo t;

Wεit = Defasagem espacial dos termos de erro;

τ = Vetor de coeficientes espaciais;

ρ e λ = Escalares espaciais.

Quadro 1
- Variáveis independentes que serão utilizadas no modelo econométrico

Com suporte na Equação 1, estimam-se diversos modelos usando dados de painel com dependência espacial a partir da imposição de variadas restrições aos parâmetros espaciais da equação. Os principais modelos espaciais são:

  • Modelo SAR, que considera apenas a dependência espacial da variável dependente;

  • Modelo SEM, que considera apenas a dependência espacial dos termos do erro;

  • Modelo SARAR, que considera a defasagem do erro e a defasagem da variável dependente;

  • Modelo SDM, que possui defasagens espaciais nas variáveis explicativas e na variável dependente;

  • Modelo SDEM, que considera defasagens espaciais nas variáveis explicativas e nos resíduos; e

  • Modelo GSM, que possui defasagens espaciais nas variáveis explicativas, na variável dependente e nos resíduos.

Para a escolha do modelo mais adequado, foram adotados: o Critério de Informação de Akaike (Akaike’s Information Criterion AIC), conforme proposto por Akaike (1974)Akaike, H. (1974). A new look at the statistical model indentification. IEEEE Transaction on Automatic Control, 19(6), 717-723.; e o Critério de Informação Bayesiano (Bayesian Information Criterion BIC), conforme expresso por Schwarz (1978)Schwarz, G. (1978). Estimating the dimensional of a model. Annals of Statistics, 6(2), 461-464.. Ambos os critérios são utilizados com frequência na modelagem estatística. O modelo que mostrar os menores valores do AKAIKE e do BIC é havido como o modelo ótimo e a ser estimado.

Adianta-se que, de acordo com os testes supracitados, o melhor modelo para o tratamento dos dados utilizados neste trabalho é o SARAR. Uma vez estimados os coeficientes das variáveis independentes e das variáveis independentes defasadas espacialmente, faz-se necessário calcular os impactos que essas variáveis exercem sobre a adoção dos SAFs pelos estabelecimentos agropecuários. No caso do modelo SARAR, os coeficientes da regressão não correspondem aos efeitos marginais que impactam na variável dependente.

Os efeitos marginais são divididos em efeitos diretos e efeitos indiretos. Os efeitos diretos são utilizados para verificar se determinada característica de uma unidade espacial tem algum efeito significativo sobre a variável dependente da própria unidade espacial. A razão pela qual os efeitos diretos das variáveis explicativas são diferentes das estimativas de seus coeficientes decorre dos efeitos feedback, que surgem como resultado dos impactos que passam pelos municípios vizinhos e voltam aos próprios municípios. Já os efeitos indiretos permitem observar se a variável dependente de uma unidade espacial sofre algum efeito em razão das características de seus vizinhos. Por intermédio do efeito indireto, em especial, avaliando sua significância estatística, identifica-se se há (ou não) transbordamento espacial do fenômeno estudado (Elhorst, 2012Elhorst, J. P. (2012). Dynamic spatial panels: models, methods, and inferences. Journal of Geographical Systems, 14(1), 5-28.).

No caso deste experimento, se ocorrer alguma modificação em alguma variável dos estabelecimentos agropecuários de um município, isso influenciará não apenas na adoção de SAFs pelos próprios estabelecimentos agropecuários do município, mas também na adoção de SAFs pelos estabelecimentos agropecuários dos municípios vizinhos. Para realizar esses cálculos, que levam em conta o transbordamento das variáveis dependentes e independentes, vale ressaltar a Equação 2, referente à matriz de derivadas parciais:

IδW1Ey1x1kEy1xNkEyNx1kEyNxNk (2),

sendo que:

I = Matriz identidade de ordem n, sendo n o número de unidades do modelo (número de municípios agregados em Áreas Mínimas Comparáveis - a serem explicadas no próximo item);

xk = Coeficientes associados às variáveis explicativas do modelo;

yN = Coeficientes associados à variável dependente do modelo;

δW = Produto da matriz de pesos espaciais por cada um dos coeficientes associados às variáveis explicativas defasadas (YN e εN ).

A matriz de derivadas parciais da expressão (2) possibilita a interpretação dos impactos (ou efeitos marginais): os elementos da diagonal principal são alusivos aos efeitos diretos; e os demais elementos (fora da diagonal principal) são alusivos aos efeitos indiretos (Elhorst, 2014Elhorst, J. P. (2014). Spatial econometrics: From cross-sectional data to spatial panels. Berlin: Springer. Spatial panel data models, pp. 37-93.).

3.2 Fonte e tratamento dos dados

Para alcançar o objetivo de quantificar as variáveis que influenciam a adoção dos Sistemas Agroflorestais pelos estabelecimentos agropecuários brasileiros, foram utilizados os dados dos censos agropecuários dos anos de 2006 e de 2017, agregados por Área Mínima Comparável (AMC), tanto para a variável dependente, como para as variáveis independentes. Os valores das variáveis aqui utilizadas foram recolhidos do Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) e empregados no modelo econométrico, que foi estimado por meio do software R.

A necessidade de se utilizar as AMCs deve-se ao fato de que o SIDRA disponibiliza dados nos planos municipais. De 2006 a 2017, entretanto, municípios foram criados no Território Brasileiro. Logo, o número de unidades municipais no Censo de 2017 era diferente do quantitativo expresso no Censo Agropecuário de 2006. Isto enseja restrições quando se tenta realizar as comparações entre os dois anos. Para contornar este problema, trabalhou-se com Áreas Mínimas Comparáveis (AMC), maneira de tornar possível a comparação por meio da união dos valores referentes aos municípios instituídos. Por esse pretexto, foi criada uma malha compatibilizada dos municípios brasileiros para ambos os anos (2006 e 2017), gerando, assim, 5.566 AMCs.

O Quadro abaixo contém as variáveis explicativas utilizadas para explicar a variável dependente do modelo, que é o percentual de estabelecimentos agropecuários que produzem via Sistemas Agroflorestais em cada AMC. As variáveis descritas no Quadro se baseiam na literatura revista na seção 2 deste artigo e na disponibilidade de dados nos Censos Agropecuários.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os dados foram organizados para assegurar um painel balanceado2 2 Um painel balanceado é aquele em que o número de observações é igual para todos os anos considerados. , composto por 5.566 AMCs para cada um dos anos de 2006 e 2017. Com isto, existem 11.132 observações para cada variável a ser considerada no modelo econométrico.

Seguindo o exposto na seção 3, inicialmente, foram realizados testes para a escolha do melhor modelo de dados em painel a ser adotado. O Teste de Breusch-Pagan, estimado para o modelo pooled, exibiu estatística qui-quadrado de 607,3, com 17 graus de liberdade, e que foi estatisticamente significativo a 1%. Com este resultado, percebe-se que há efeitos individuais no modelo. Logo, eles devem ser considerados por meio da utilização dos modelos de efeitos fixos ou aleatórios.

A próxima etapa foi realizar o Teste de Hausman para dados espaciais em painel, proposto por Mutl & Pfaffermayr (2011), eMutl, J., & Pfaffermayr, M. (2011). The Hausman test in a Cliff and Ord panel model. The Econometrics Journal, 14(1), 48-76. utilizado para avaliar a consistência do estimador de efeitos fixos comparada ao estimador de efeitos aleatórios. O modelo de efeitos aleatórios será inconsistente caso os efeitos individuais não observados estejam correlacionados com as variáveis independentes do modelo. A estatística qui-quadrado deste teste foi de 316,8, com 17 graus de liberdade e significância estatística ao nível de 1%. Para o Teste de Hausman não-espacial, que não considera a associação espacial na análise, a estatística qui-quadrado foi de 381,02, a qual também foi estatisticamente significativa ao nível de 1%. Como o teste apontou a rejeição da hipótese nula, há correlação entre os efeitos e os regressores. Com isso, os estimadores do modelo de efeitos aleatórios não seriam consistentes. Neste caso, os modelos de efeitos fixos também tiveram melhores comportamentos quanto à linearidade das variâncias dos resíduos. Conclui-se, então, que o modelo de efeitos fixos deve ser utilizado na estimação com dados em painéis.

A estatística do Teste F de Chow foi de 1,1975, com significância estatística ao nível de 1%. Portanto, o teste rejeitou a hipótese nula e confirmou que o modelo de efeitos fixos será o mais adequado para o estudo em andamento.

Uma vez que foi escolhido o modelo de efeitos fixos para tratamento dos dados em painéis (mas ainda não o modelo espacial), o próximo passo foi observar, por meio de testes difusos, se os resíduos do modelo empregado exibiam autocorrelação espacial. Desta maneira, o Teste I de Moran Global calculado para os resíduos do modelo (modelo este em que a variável dependente é o percentual de estabelecimentos que usam SAFs sobre o total de estabelecimentos agropecuários e as variáveis independentes são aquelas apresentadas no Quadro 1) mostrou estatística com valor 0,138 e que foi estatisticamente significativa ao nível de 1%. Isto indica haver associação positiva na intensidade em que os municípios vizinhos adotam SAFs em seus estabelecimentos agropecuários, ou seja, a adoção dos Sistemas Agroflorestais nos municípios não se distribui aleatoriamente no espaço brasileiro.

Na sequência, foram realizados os testes focados para indicação do processo estocástico gerador da autocorrelação. Por meio do Teste de Multiplicador de Lagrange para dados em painel empilhados, foram testadas a hipótese de ausência de autocorrelação, devido a uma possível defasagem espacial omitida (LMlag), e a hipótese de ausência de autocorrelação, em decorrência de uma possível omissão do erro autorregressivo espacial (LMerro). Como se lê na Tabela 1, as estatísticas das duas hipóteses foram estatisticamente significativas. Com isso, foram estimados os mesmos testes em suas versões robustas (RLMlag e RLMerro), e ambos foram novamente estatisticamente significativos ao nível de 1%.

Tabela 1
- Diagnóstico do processo estocástico gerador da autocorrelação, 2006 e 2017

Almeida (2012)Almeida, E. (2012). Econometria espacial. Campinas, SP: Alínea. aponta que o melhor modelo especificado deve exprimir os menores critérios de informação Akaike e BIC. Assim, a fim de selecionar o melhor dos modelos espaciais indicados na seção da metodologia, foram calculados os critérios de informação AIC e BIC para cada um dos modelos, conforme indicado na Tabela 2. O modelo SARAR (Spatial Autoregressive Model with Autocorrelation Error) foi o que apresentou melhor desempenho, visto que seus valores foram os menores, tanto do AIC quanto do BIC, em relação aos demais modelos.

Tabela 2
- Critérios de informação Akaike (AIC) e Bayesiano (BIC) dos modelos econométricos

A Tabela 3 apresenta os resultados das estimativas do modelo SARAR, o escolhido por exprimir os menores valores dos critérios de informação. Estas estimativas dizem respeito aos coeficientes das variáveis da regressão defasadas espacialmente.

Tabela 3
- Estimativas para os determinantes dos SAFs, de acordo com o modelo SARAR

Conforme detalhado na seção da metodologia, os coeficientes contidos na Tabela 3 não mensuram em si os efeitos marginais das variáveis explicativas sobre a variável dependente. A fim de considerar esses efeitos marginais (e observar se há ou não o efeito de transbordamento espacial), a Tabela 4 reúne os efeitos diretos, indiretos e totais das variáveis consideradas na estimação do modelo SARAR. No contexto deste experimento, as influências diretas quantificam a relação direta entre a adoção de Sistemas Agroflorestais pelas unidades produtivas do município i em face das variações de suas próprias características (as variáveis explicativas que foram empregadas). Os impactos indiretos mensuram a alteração dos Sistemas Agroflorestais das unidades produtivas do município i em decorrência da variação nas características das unidades produtivas do município j. Como, dos 17 efeitos indiretos, apenas dois não foram estatisticamente significativos, remata-se que esta defasagem espacial ocorre, apesar de ela não ser maior (em valor absoluto) do que o efeito direto.

Tabela 4
- Efeitos marginais das variáveis explicativas do modelo SARAR, 2006 e 2017

Analisando os efeitos diretos, indiretos e totais das variáveis explicativas sobre a intensidade de uso de SAFs (obtidos via o modelo SARAR, ver Tabela 4), chega-se à conclusão de que:

1) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘associação’ - que aborda aqueles estabelecimentos em que o produtor é associado a alguma cooperativa, entidades de classe, sindicatos, associações (inclusive de moradores) ou movimentos de produtores - foram positivas e estatisticamente significativas a, no mínimo, 5%, para os efeitos direto, indireto e total. Isto aponta que há uma associação positiva entre o número de estabelecimentos associados a essas entidades e a adoção de SAFs. O resultado está de acordo com o esperado pela literatura, ao apontar que, além da vantagem da disseminação de informações, o associativismo entre produtores é também um modo de suplantar as dificuldades encontradas na implantação de SAFs. Além disso, o associativismo conduz seus integrantes a melhores preços nas compras de insumos e nas vendas dos produtos, e torna a logística das compras e vendas mais eficiente - benefícios estes que contribuem para que produtores de SAFs alcancem a estabilidade financeira das atividades (Santos et al., 2014Santos, L. R., Raiol, C. S., Lima, F. B. C., & Leal, L. M. R. (2014). Factors for the adoption of agroforestry systems in the Eastern Amazon, Brazil. Revista de la Facultad de Agronomía, 113(2), 140-146.).

2) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘agricultura familiar’ - que considera aqueles estabelecimentos agrícolas que produzem por meio de mão de obra familiar - mostraram sinais negativos e foram estatisticamente significativos a 1% para os efeitos direto, indireto e total. Vale lembrar as considerações de Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47.: produtores de pequenas propriedades que têm a mão de obra familiar como principal fonte do fator trabalho tendem a ser menos capitalizados e não possuem condições de contar com trabalho assalariado temporário em períodos de maior demanda. Por isso, têm limitada adoção de SAFs.

3) As variáveis referentes às principais atividades econômicas dos estabelecimentos agropecuários são: ‘estabelecimentos agropecuários voltados à atividade pecuária’, ‘estabelecimentos agropecuários voltados à atividade lavoura’ e ‘estabelecimentos agropecuários voltados à atividade florestal’. As estimativas dos efeitos marginais associados às variáveis que abordam as atividades pecuária e florestal foram positivas e estatisticamente significativas a 1% para os efeitos direto, indireto e total. Já as estimativas dos efeitos marginais associados à variável referente à atividade lavoura foram negativas e estatisticamente significativas a 10% para os efeitos direto e total, e não estatisticamente significativa para o efeito indireto desta mesma variável.

Dentre essas três variáveis, a estimativa do efeito total com maior magnitude foi aquela associada à atividade florestal. Os Censos Agropecuários consideram a existência do componente arbóreo como requisito para o estabelecimento ser considerado um SAF. Logo, faz sentido que a produção florestal surja como principal atividade econômica do estabelecimento agropecuário que adote SAFs. Observa-se, também, que a atividade pecuária está associada positivamente com a adoção de Sistemas Agroflorestais, o que indica boa adaptação de animais e espécies arbóreas em um mesmo estabelecimento agropecuário. Junto a isso, de acordo com o modelo econométrico analisado, a atividade lavoura esteve associada negativamente à adoção de SAFs, fato indicativo de que, quando os produtores brasileiros optam por adotar sistemas integrados de produção, os sistemas de integração Pecuária-Floresta (IPF) costumam ser adotados com maior frequência do que os sistemas de integração Lavoura-Floresta (ILF). Os trabalhos de Reis et al. (2020)Reis, J., Kamoi, M., Latorraca, D., Chen, R., Michetti, M., Wruck, F., & Rodrigues-Filho, S. (2020). Assessing the economic viability of integrated crop−livestock systems in Mato Grosso, Brazil. Renewable Agriculture and Food Systems, 35(6), 631-642. http://dx.doi.org/10.1017/S1742170519000280.
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e Pontes et al. (2021)Pontes, L. S., Porfírio-Da-Silva, V., Moletta, J. L., & Telles, T. S. (2021). Long-term profitability of crop-livestock systems, with and without trees. Agricultural Systems, 192, 103204. reportam-se a aspectos que auxiliam, decerto, na compreensão deste resultado: produtores direcionados à produção de lavoura podem ser mais eficientes ao produzirem por meio de sistemas de produção extensivos, uma vez que, em alguns casos, a lucratividade advinda da produção exclusivamente da lavoura é maior [como mostrado por Pontes et al. (2021)Pontes, L. S., Porfírio-Da-Silva, V., Moletta, J. L., & Telles, T. S. (2021). Long-term profitability of crop-livestock systems, with and without trees. Agricultural Systems, 192, 103204.], ou mesmo porque o uso de árvores integradas à lavoura reduz a produtividade dos grãos, no caso de algumas culturas [como apontado por Magalhães et al. (2019b)Magalhães, C. A. S., Pedreira, B. C., Tonini, H., & Farias Neto, A. L. (2019b). Crop, livestock and forestry performance assessment under different production systems in the north of Mato Grosso, Brazil. Agroforestry Systems, 93, 2085-2096. http://dx.doi.org/10.1007/s10457-018-0311-x.
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].

4) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘rebanho’ - que considerou o número de cabeças do rebanho dividido pela área agrícola (ha) - ofereceram sinais negativos e foram estatisticamente significativas a 1% para os efeitos direto, indireto e total. Constata-se que um maior número de cabeças de rebanho por hectare está associado negativamente com a adoção dos SAFs. Este resultado está em consonância com o apontado por Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47.: entre os sistemas de integração contendo componente florestal (SAFs), especialmente no sistema IPF, há predominância de rebanhos menores e mais concentrados nas fases de cria e recria. Junto dos resultados avindos do parágrafo anterior, pode-se rematar que, apesar de estabelecimentos tendidos à atividade pecuária influenciarem positivamente na adoção de SAFs, isso acontece para pecuaristas de pequeno a médio porte. À medida que o pecuarista passa a aumentar o número de cabeças de rebanho no estabelecimento agropecuário, torna-se mais vantajoso para ele usar sistemas de produção especializados do que os diversificados (como no caso dos SAFs).

5) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘crédito rural’ - referente ao número de estabelecimentos agropecuários que obtiveram algum tipo de financiamento proveniente de instituições como cooperativa de crédito, governo, fornecedor, organizações não governamentais (ONGs), instituições financeiras ou outros agentes - foram positivas e estatisticamente significativas ao nível de 1%, para os efeitos direto, indireto e total. Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2...
também apontam que a disponibilidade de capital é um fator importante para a adoção de SAFs, e o crédito rural é uma das maneiras de o produtor aumentar o estoque de capital na fazenda. Segundo Cordeiro et al. (2015)Cordeiro, L. A. M., Vilela, L., Kluthcouski, J., & Marchão, R. L. (2015). Integração lavoura-pecuária-floresta - coleção 500 perguntas 500 respostas. Brasília, DF: Embrapa Cerrados/MAPA., ter recursos financeiros próprios ou acesso ao financiamento é um dos principais requisitos para adotar sistemas de integração, já que são sistemas mais complexos e que normalmente requerem investimento inicial maior do que os sistemas convencionais.

6) A variável que trata do nível educacional do produtor (escolaridade da pessoa que dirige o estabelecimento) contabiliza os produtores com ensino médio ou médio técnico completo, com ensino superior, e com mestrado ou doutorado. As estimativas dos efeitos marginais associados a essa variável foram negativas e com significância ao nível de 1% para os efeitos direto, indireto e total, mostrando que aqueles estabelecimentos cujos produtores possuem maior grau de escolaridade estão associados negativamente com a adoção de SAFs. Embora os sinais das estimativas desta variável não tenham sido os esperados pela literatura, a possível explicação para este resultado está na ideia de que produtores mais escolarizados acreditem que produzir por meio da monocultura seja economicamente mais vantajoso do que adotar SAFs, podendo ser menos suscetíveis a questões ambientais do que às econômicas.

Por meio de estudos de caso, Foguesatto et al. (2019)Foguesatto, C. R., Borges, J. A. R., & Machado, J. A. D. (2019). Farmers’ typologies regarding environmental values and climate change: Evidence from southern Brazil. Journal of Cleaner Production, 232, 400-407. http://dx.doi.org/10.1016/j.jclepro.2019.05.275.
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apontam alguns motivos pelos quais os produtores adotam (ou não) determinadas práticas de produção agropecuária. Produtores classificados como ‘apáticos’ (em razão do seu elevado sentimento de indiferença pelas questões ambientais) não manifestaram comportamento pró-ambiental, o que sugeriu baixa probabilidade de adoção de sistemas sustentáveis. O trabalho de Morgan et al. (2015)Morgan, M. I., Hine, D. W., Bhullar, N., & Loi, N. M. (2015). Landholder adoption of low emission agricultural practices: A profiling approach. Journal of Environmental Psychology, 41, 35-44. http://dx.doi.org/10.1016/j.jenvp.2014.11.004.
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, também, sugere alguns comportamentos de produtores que os tornam menos propensos à adoção de práticas sustentáveis: a ausência de uma percepção clara de que a prática lhe trará benefícios econômicos ou quando demonstram baixo nível de apatia ambiental.

7) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘idade do produtor’ - em que foram considerados os estabelecimentos em que a idade do produtor fosse a partir de 45 anos - foram positivas e estatisticamente significativas a 10% para os efeitos direto, indireto e total. Portanto, espera-se que produtores com maior idade influenciem positivamente na adoção de SAFs. Segundo Santos et al. (2014)Santos, L. R., Raiol, C. S., Lima, F. B. C., & Leal, L. M. R. (2014). Factors for the adoption of agroforestry systems in the Eastern Amazon, Brazil. Revista de la Facultad de Agronomía, 113(2), 140-146., os adotantes de sistemas de integração possuem mais tempo de experiência em atividades agropecuárias. Se considerado que a idade constitui uma proxy para a experiência do produtor, este resultado parece ser coerente com o encontrado na literatura.

8) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘relação terra/capital’ foram positivas e estatisticamente significativas a 1% para os efeitos direto, indireto e total. Os dados desta variável foram organizados da seguinte maneira: área agrícola das AMCs dividida pelo número de máquinas e implementos agrícolas dos estabelecimentos agropecuários das AMCs. Ainda que o valor da estimativa do efeito total tenha sido bem próximo de zero, este resultado não é o esperado pela literatura, uma vez que ele indica que estabelecimentos com menor número de maquinários agrícolas por hectare se associam positivamente com a adoção de SAFs. Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47. e Guarino & Noronha (2020)Guarino, E. S. G., & Noronha, A. (2020). Máquinas e equipamentos úteis para implantação e manejo de sistemas agroflorestais (SAFs). Monte Bonito, RS: Embrapa Clima Temperado. assinalam que algumas tecnologias agrícolas, como os sistemas de integração, demandam frequente uso de máquinas e equipamentos agrícolas, o que sugere um efeito positivo entre mecanização e adoção de SAFs. Guarino & Noronha (2020)Guarino, E. S. G., & Noronha, A. (2020). Máquinas e equipamentos úteis para implantação e manejo de sistemas agroflorestais (SAFs). Monte Bonito, RS: Embrapa Clima Temperado., entretanto, ressaltam que, entre os equipamentos utilizados para condução dos Sistemas Agroflorestais, destacam-se aqueles relativamente simples e de baixo custo, dos quais, em muitos casos, o agricultor já dispõe em sua propriedade, como, por exemplo: motosserra, motopoda, moitão, roçadeira, bomba costal, foice, subsolador manual de garfo, cavadeira e broca. De outra parte, os dados dos Censos Agropecuários sobre máquinas e implementos agrícolas consideram tratores, semeadeiras, plantadeiras, colheitadeiras e adubadeiras. Portanto, esses equipamentos abrangidos pelas pesquisas dos Censos Agropecuários são passíveis de não influenciar positivamente no uso de SAFs. De qualquer maneira, é importante haver constantes inovações de ferramentas e técnicas que propiciem segurança e facilidade no manejo dentro dos estabelecimentos agropecuários adotantes de Sistemas Agroflorestais (Guarino & Noronha, 2020Guarino, E. S. G., & Noronha, A. (2020). Máquinas e equipamentos úteis para implantação e manejo de sistemas agroflorestais (SAFs). Monte Bonito, RS: Embrapa Clima Temperado.).

9) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘orientação técnica na propriedade’ - em que foram contabilizados os estabelecimentos que receberam alguma orientação técnica, seja proveniente do governo, cooperativas, ONGs, empresas privadas, ou de quaisquer outras instituições - foram negativas e com significância estatística ao nível de 5% para os efeitos direto e total, e com significância estatística ao nível de 10% para o efeito indireto da mesma variável. Este resultado não foi aquele esperado pela literatura, uma vez que Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
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, Poccard-Chapuis et al. (2014)Poccard-Chapuis, R., Alves, L. N., Grise, M. M., Bâ, A., Coulibaly, D., Ferreira, L. A., & Lecomte, P. (2014). Landscape characterization of integrated crop -livestock systems in three case studies of the tropics. Renewable Agriculture and Food Systems, 29(3), 218-229. http://dx.doi.org/10.1017/S174217051400009X.
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, Santos et al. (2014)Santos, L. R., Raiol, C. S., Lima, F. B. C., & Leal, L. M. R. (2014). Factors for the adoption of agroforestry systems in the Eastern Amazon, Brazil. Revista de la Facultad de Agronomía, 113(2), 140-146. e Schembergue et al. (2017)Schembergue, A., Cunha, D. A., Carlos, S. M., Pires, M. V., & Faria, R. M. (2017). Sistemas agroflorestais como estratégia de adaptação aos desafios das mudanças climáticas no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 55(1), 9-30. http://dx.doi.org/10.1590/1234-56781806-94790550101.
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apontam que a demanda continuada por conhecimentos e capacitação técnica envolvendo tecnologias agrícolas é um fator importante para incentivar a adoção de SAFs (tendo em vista a complexidade e as exigências necessárias para adoção de sistemas integrados). Os dados utilizados para esta variável, entretanto, disponíveis nos Censos Agropecuários, não especificam a finalidade da orientação técnica recebida. Portanto, é possível que a orientação técnica dos estabelecimentos agropecuários considerada pelos Censos Agropecuários não esteja diretamente relacionada aos conhecimentos acerca de SAFs.

10) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável ‘pastagens degradadas’ foram positivas e estatisticamente significativas a 1% para os efeitos direto, indireto e total. Esse resultado reforça a hipótese de que os SAFs vêm sendo utilizados como estratégia para recuperação da produtividade dos solos degradados, uma vez que a introdução de espécies arbóreas é capaz de melhorar a qualidade do solo e aumentar a eficiência produtiva do estabelecimento agrícola (Macedo, 2013Macedo, J. L. V. (2013). Sistemas agroflorestais: Princípios básicos. Manaus, AM: Instituto Amazônia.).

11) A variável ‘relação terra/trabalho’, que aborda a área agrícola dividida pelo pessoal ocupado com e sem laço de parentesco com o agricultor nos estabelecimentos agropecuários, revelou estimativas com sinais negativos e com nível de significância a 5% para os efeitos direto, indireto e total. Quanto maior a relação terra/trabalho, menos se usam SAFs. Em outras palavras, estabelecimentos com maior número de trabalhadores/hectares estão associados positivamente com a adoção de SAFs. Segundo Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
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, esse resultado se explica em razão de os sistemas integrados necessitarem de mão de obra contínua à extensão do ano, o que resulta em maior eficiência do trabalho, se este for mais bem alocado para distintos usos produtivos.

12) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável que considera o produtor deter posse estável da propriedade foram positivas e estatisticamente significativas a 1% para os efeitos diretos, indiretos e total. Esse resultado vai ao encontro do que era esperado pela literatura, tais como Santos et al. (2014)Santos, L. R., Raiol, C. S., Lima, F. B. C., & Leal, L. M. R. (2014). Factors for the adoption of agroforestry systems in the Eastern Amazon, Brazil. Revista de la Facultad de Agronomía, 113(2), 140-146. e Schembergue et al. (2017)Schembergue, A., Cunha, D. A., Carlos, S. M., Pires, M. V., & Faria, R. M. (2017). Sistemas agroflorestais como estratégia de adaptação aos desafios das mudanças climáticas no Brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 55(1), 9-30. http://dx.doi.org/10.1590/1234-56781806-94790550101.
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, ao apontarem que os proprietários da terra são suscetíveis a estarem mais dispostos a arriscar e a demandar novas modalidades de produção, já que alguns SAFs requerem investimentos iniciais em que os melhores rendimentos do retorno serão usufruídos no longo prazo.

13) A variável ‘práticas agrícolas’ contabiliza os estabelecimentos agropecuários que adotavam boas práticas agrícolas, tais como: plantio em nível, rotação de culturas, pousio ou descanso de solos, proteção e/ou conservação de encostas, recuperação de mata ciliar, reflorestamento para proteção de nascentes, estabilização de voçorocas, manejo florestal, entre outras (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2019Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (2019). Censo agropecuário 2017: Resultados definitivos. Rio de Janeiro, RJ: IBGE.). As estimativas dos efeitos marginais associados a esta variável foram positivas e estatisticamente significativas a 1% para os efeitos direto, indireto e total, indicando haver uma associação positiva entre estabelecimentos adotantes de boas práticas agrícolas e a adoção de SAFs. Essa relação é justificada pelo fato de os SAFs serem um tipo de prática agrícola sustentável. Portanto, produtores propensos à adoção das outras boas práticas agrícolas (que foram englobadas pela variável no modelo), certamente estão dispostos a perfilhar, também, os SAFs. Como os sistemas de integração pressupõem interação e efeito sinérgico entre os componentes do sistema de produção, as boas práticas de manejo agrícola são complementares entre si no processo de produção sustentável (Vinholis et al., 2020Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47.).

14) A respeito da variável ‘produção agropecuária’, que contabilizou o valor da produção agropecuária (R$) dividido pela área agrícola (ha), ela mostrou estimativas com sinais negativos e estatisticamente significativas ao nível de 1% para os efeitos direto, indireto e total. Assim, estabelecimentos com maiores valores de produção por hectare tendem a não usar SAFs. A literatura que aborda o uso dessa variável realiza distintas considerações a respeito de sua relação com os SAFs. Por exemplo, Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47. ressaltam que, na maioria dos estabelecimentos com sistemas IPF, seus adotantes contam com outra fonte de renda, ensejando, assim, maior flexibilidade para testar o sistema. Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
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apontam que municípios com maior PIB são capazes de conter produtores agropecuários com maior renda, o que lhes permite maior capacidade para aquisição de insumos necessários à implementação de sistemas integrados. Associa-se, também, esse resultado aos casos em que os produtores com maiores recursos financeiros optam por produzir por meio de sistemas especializados, enquanto produtores menos capitalizados escolhem a adoção de sistemas integrados como meio de otimizar o lucro, visto que a diversificação da produção de mercadorias, muitas vezes, constitui estratégia utilizada por produtores que não possuem vantagem comparativa na produção especializada e não se beneficiam da economia de escala.

15) As estimativas dos efeitos marginais associados à variável que mensura o tamanho médio dos estabelecimentos agrícolas foram positivas, mas não estatisticamente significativas para nenhum dos efeitos direto, indireto e total. Os autores que mencionam esta variável em seus trabalhos [como, por exemplo, Gil et al. (2016)Gil, J. D. B., Berger, T., & Garret, R. (2016). Determinants of crop-livestock integration in Brazil: Evidence from the household and regional levels. Land Use Policy, 59, 557-568. http://dx.doi.org/10.1016/j.landusepol.2016.09.022.
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] não chegam a uma conclusão clara sobre seus efeitos na adoção de SAFs. Vinholis et al. (2020)Vinholis, M. M. B., Souza Filho, H. M. S., Carre, M. J., Barioni Junior, W., Bernardo, R., Casaca, A. A., Rojas, D. C., Tokuda, F. S., Pelinson, G. J. B., Santos Junior, A., Gonçales Júnior, I. D., Andraus, J. T. K., Justo, J. S., Martines, L., Guerreiro, M. F., Fadel, S. A. O., & Borges, W. L. B. (2020). Adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) em São Paulo. São Carlos, SP: Embrapa Pecuária Sudeste. Boletim de pesquisa e desenvolvimento, 47., contudo, apontam que, nos sistemas IPF, predominam propriedades rurais menores e com relevo mais ondulado.

Vale ressaltar que as estimativas reproduzidas na Tabela 4 apontam que, para todas as variáveis empregadas, os impactos diretos se mostraram superiores aos valores absolutos dos impactos indiretos. A interpretação desse resultado é que, malgrado as características das unidades vizinhas influenciarem na variável dependente, as mudanças das variáveis independentes dos próprios estabelecimentos agropecuários (no caso deste artigo, considerados pela média do município em que se situa) acarretam maiores variações na adoção de SAFs do que mudanças das mesmas variáveis dos outros estabelecimentos agropecuários situados nos municípios vizinhos.

Nota-se, também, que não houve mudança de sinal entre os efeitos diretos e os efeitos indiretos para todas as variáveis explicativas consideradas na Tabela 4. Ou seja, no caso das estimativas indicadas na Tabela 4, as características dos estabelecimentos agropecuários do município i e dos estabelecimentos de seus municípios vizinhos influenciaram a adoção dos Sistemas Agroflorestais na mesma direção, ainda que em intensidades diferentes.

Os resultados mostrados na Tabela 4 ressaltam que os estabelecimentos agropecuários de cada município brasileiro não se expressam como unidades de análises isoladas no espaço em relação à adoção de Sistemas Agroflorestais, pois estão interligados e produzindo ou recebendo efeitos espaciais (spillovers) relevantes em sua vizinhança.

5. CONCLUSÕES

Visando a contribuir com maiores informações e conhecimentos em torno dos Sistemas Agroflorestais - sistemas que procuram unir produção e conservação ambiental - este trabalho tencionou identificar e mensurar a importância dos determinantes da adoção de SAFs nos estabelecimentos agropecuários no Território Nacional.

De acordo com os testes (propostos pela literatura), o modelo econométrico espacial SARAR foi o que exibiu melhor ajuste para os dados desta pesquisa. Quanto às estimativas do modelo, a variável dimensão do rebanho se destacou como o principal determinante do uso de SAFs, e expressou coeficiente com sinal negativo. Conclui-se, portanto, que o maior número de cabeças de rebanho por hectare se associou negativamente com a adoção dos SAFs, indicando que, para pecuaristas de grande porte, deixa de ser vantajoso produzir por meio de sistemas de produção integrados e passa a ser mais lucrativo optar por sistemas de produção especializados.

A variável crédito rural associou-se positivamente com a adoção de SAFs pelos estabelecimentos agropecuários. Isto conforma um elemento para estimular a perfilhação deste sistema, por via, por exemplo, da ampliação das linhas de crédito do Programa ABC (agricultura de baixo carbono). Outras variáveis com resultados relevantes e que se associaram positivamente com a adoção de SAFs pelos estabelecimentos agropecuários foram: associação do produtor a cooperativas ou entidades de classe; estabelecimentos voltados à atividade econômica florestal; produtor com idade mínima de 45 anos; áreas com pastagens degradadas; produtor com posse estável da terra; e estabelecimentos com adoção de boas práticas agrícolas. Observou-se, também, maior impacto dos efeitos diretos do modelo econométrico SARAR, indicando que as mudanças das variáveis independentes do próprio município em que se encontra o estabelecimento agropecuário acarretam maiores variações na adoção de SAFs do que mudanças das mesmas variáveis nos municípios vizinhos em que se encontram outros estabelecimentos agropecuários.

Futuras pesquisas têm a oportunidade de usar microdados dos Censos Agropecuários e analisar distintos comportamentos das regiões brasileiras quanto à adoção de SAFs, validando e/ou aperfeiçoando o conhecimento proporcionado por este ensaio.

  • 1
    Além de ter capturado maior associação espacial, a matriz de distância (como, por exemplo, a de 5 vizinhos mais próximos) também garante que não haverá ilhas, isto é, regiões sem qualquer vizinho (Almeida, 2012Almeida, E. (2012). Econometria espacial. Campinas, SP: Alínea.).
  • 2
    Um painel balanceado é aquele em que o número de observações é igual para todos os anos considerados.
  • Como citar: Sene, S. M., & Bacha, C. J. C. (2024). Adoção dos sistemas integrados na agropecuária do brasil. Revista de Economia e Sociologia Rural, 62(1), e264625. https://doi.org/10.1590/1806-9479.2022.264625
  • JEL Classification: Q10, Q56, C20

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2022
  • Aceito
    18 Dez 2022
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